Elena e a guerra

Elena veio para o Brasil no começo de 1998. Era verão aqui, inverno na sua Bielorrússia e ela mal falava inglês. O português era-lhe inteiramente desconhecido, mas a vida estava difícil na Europa Oriental, às vezes era complicado até conseguir cumprir as necessidades mais básicas — como, por exemplo, comer –, mas ela tinha uma arma: uma sólida formação musical que a ensinara a tocar maravilhosamente o violino. E ela viajou algum tempo depois de seu marido na época, que já fora aceito na Orquestra do Teatro Amazonas, em Manaus. E Elena foi para o mesmo local a fim de fazer um teste.

Era uma jovem mãe com uma filha de 5 anos e uma gravidez de 5 meses. O avião da Aeroflot chegou 2 DIAS (!!!) atrasado ao Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, fazendo-a, é claro, perder a conexão para a capital amazonense. Era uma bielorrussa falando russo em Congonhas. Ou seja, ampliando o quadro, era uma mulher falando russo num local onde ninguém a entedia, acompanhada de uma filha pequena, um inquilino na barriga e mais bagagem. A confusão e o nervosismo já tomava conta de nossa heroína quando apareceu uma pessoa que conhecia a língua num balcão que não tinha nada a ver com o problema. A moça se apresentou e encaminhou Elena para Manaus.

Lá chegando, ela não conseguia acreditar. Saíra de Minsk com -35°C e chegara a Manaus com 35°C. Mas não eram só os 70° de variação. Quando saiu do avião, ela teve a sensação de que se chocara contra uma desconhecida parede de calor úmido. E a inacreditável umidade tornava qualquer movimento difícil, ainda mais grávida, com filha e bagagem. Detalhe: e tendo que cuidar de dois violinos — o dela e o da filha –, o que não é o menor problema de um músico.

Mesmo com a notória barriga, foi aceita na orquestra como violinista. Cada vez mais grávida, por assim dizer, e sem saber uma palavra da língua que hoje fala tão bem, costumava tomar banho, levar a filha para passear nas calçadas quentes, sujas e esburacadas da cidade, e voltar para tomar outro banho. E a vida ia se ajeitando. Porém, um dia, ela saiu para a rua e voltou rapidamente para o apartamento. Estava em pânico. É que algo de muito grave tinha acontecido. Entrara em pânico. Não havia ninguém na rua. O que ocorrera? Do que eles, os russos, não sabiam?

De repente, ela ouviu explosões e ficou tão agitada que quase fez Nikolay nascer prematuramente. Viera certamente para um país em guerra. Começou a chorar e a pensar numa forma de proteger a si e à família. Mas as explosões eram apenas a comemoração de um gol.

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