Bom dia, Odair (e uma proposta para a diretoria do Inter)

Bom dia, Odair (e uma proposta para a diretoria do Inter)

Odair é uma ameba atrapalhada. O que ele fez ontem foi verdadeiramente irritante. Já que Patrick fazia finalmente boa partida jogando pela esquerda, em cima de Marcus Rocha, nossa sumidade tirou Patrick de lá enfiando Wellington Silva em seu lugar. Como tem acontecido, WS sucumbiu. E Patrick também. WS tem uma jogada terminal. Ele dribla para o meio e chuta para fora. Tudo acaba ali.

O Inter atuava bem no primeiro tempo. O 1 x 0 saiu barato. Tinha mudar, né, Odair?

Heitor, Fuchs e Nonato. A dose de jogadores das categorias de base foi demais para Odair. Seu bom futebol foi um exagero. Tinha que mudar. | Fotos: Ricardo Duarte / SCI

Se realmente Nonato tinha que sair — teria pedido para sair no intervalo, fato do qual duvido muito, mas OK –, o substituto natural seria Neílton, mas este parece que foi punido por entrar bem em dois jogos consecutivos. Ou seja, Odair acabou com o time numa substituição. Alguém tinha dito que o guri se sentira mal, só que… Só que na coletiva Odair disse que o retirou para dar mais intensidade ao time. Bem, isso já é do campo das piadas.

Ontem o Odair criticou Nonato, falou que Fuchs e Heitor sentiram o jogo. Nunca vi o Odair falando dos passes errados do Patrick, nem da inoperância do Parede, da atual inutilidade do Sóbis, do péssimo preparo físico do Uendel e nem da ruindade do Klaus. Queimar guri é fácil. Cagão.

E entramos no segundo tempo completamente batidos. Estávamos vencendo o jogo. A formação mais ofensiva e “intensa” fez o Inter recuar. É muita burrice. O gol de empate do Palmeiras saiu em jogada de Marcus Rocha…

E tomamos o maior sufoco, com direito inclusive a gol do Palmeiras anulado pelo VAR. Quanto a nós, nem chutamos mais no gol deles.

Depois, quando o bom Bruno Fuchs sentiu cãimbras, Odair completou a obra. Em vez de colocar um armador, colocou em campo o péssimo Klaus, que quase entregou o jogo duas vezes. Sim, novamente. Ora, era o final do jogo, por que não recuou Lindoso e botou um atacante?

Bem, Heitor, Nonato, Patrick, Lindoso, Fuchs e Nico fizeram boa partida. Já Sóbis, Uendel, WS e Odair…

Sim, Patrick fez bos partida | Foto: Ricardo Duarte / SCI

Então, estou fazendo uma proposta para a comissão técnica do Inter. O amado Odair segue treinando o Inter, mas eu faço as trocas durante os jogos. Por R$ 1.000 cada partida, pagos em dinheiro no dia seguinte ao jogo, sob pena de multa cavalar, faço o favor de pensar pela Ameba Hellmann. Não me custa nada. Sou barato e o passaremos menos vergonha.

E as vaias ao Odair vão diminuir. É um bom negócio!

.oOo.

Agora, teremos uma semana livre de jogos até o fim de semana. Um perigo, pois dará mais tempo a Odair. A próxima partida é sábado, 05/10, às 21h, contra o Cruzeiro, no Mineirão.

Odair e a noite das quedas dos técnicos

Odair e a noite das quedas dos técnicos

A quinta-feira marcou as quedas de Cuca, substituído por no São Paulo por Fernando Diniz, e de Rogério Ceni no Cruzeiro. Eu não queria nenhum dos três, queria Roger Machado, e estou esperando ansiosamente pela queda do Odair das incríveis escalações, burras substituições e que faz menos gols do que o time de 2016 que caiu para a segunda divisão.

O que ele fez contra o Flamengo foi bolsonarista e terraplanista de tão tolo. Entrou com 4 volantes e, ao ver seu lateral expulso, em vez de colocar ali Edenílson — não gosto de ver Ed ali, mas fazer o quê?, era uma emergência — retirou seu único atacante de velocidade.

Depois do jogo, Odair e a diretoria culparam o juiz… Sim, claro, foi uma arbitragem repugnante, mas perderíamos do mesmo jeito, pois não fizemos nossa parte.

E para mim ficou óbvio que o Grêmio está muito melhor do que o Flamengo. Era para o Mengo ter enfiado uma sacola, jogamos todo o segundo tempo com nove homens, só que o Inter chegou a empatar a partida. Os cariocas vão precisar muito da arbitragem para chegarem à final. Só que a Libertadores costuma apresentar juízes menos corrompíveis.

Odair está cheio de problemas para escalar o time contra o Palmeiras, mas o maior deles é ele mesmo. | Foto: Ricardo Duarte / SCI

Hoje, os 50 anos de Abbey Road

Hoje, os 50 anos de Abbey Road

O texto abaixo é um catadão recolhido por aí de várias fontes. Não tive tempo de fazer algo mais pessoal. Bem, ficou enorme e com umas coisinhas que eu jamais escreveria, principalmente lá na descrição das canções. Mas não poderia deixar passar a data. Afinal, amo Abbey Road.

Abbey Road completa hoje 50 anos. É o melhor disco do grupo e um dos melhores do rock, ainda hoje parece vem e atual. Foi o 12º álbum de estúdio dos Beatles. Foi lançado em 26 de setembro de 1969 e leva o mesmo nome da rua de Londres onde situa-se o estúdio Abbey Road. Foi produzido e orquestrado por George Martin para a Apple. Trata-se de um álbum denso, adulto, com evidente tom de despedida. Os quatro membros deram uma trégua nas discussões sobre quem geriria os assuntos da banda e se voltaram novamente para a música. Saindo da sombra que sempre lhe foi imposta pela dupla Lennon & McCartney, George Harrison veio à tona com Something e Here Comes the Sun. Ringo compôs e cantou Octopus’s Garden. Paul e John voltaram a colaborar um com o outro, não obstante a disputa de quem seria o melhor.

Agora, meio século depois, as desavenças pessoais e financeiras que levaram ao fim dos Beatles estão esquecidas e restam as canções. Não é pouca coisa!

A primeira semana de gravações do álbum começou com uma má notícia. George Martin, que acabara de reassumir a produção musical da banda, chamou Emerick de lado e disse: “John sofreu um acidente de carro na Escócia com Yoko. Não estão gravemente feridos, mas deverão ficar no hospital e John ficará longe do estúdio por pelo menos uma semana”.

Notícia ruim, pois John estava ferido, mas ao mesmo tempo boa. Semanas antes, Paul, George e Ringo pareciam ter voltado aos velhos tempos dos Beatles. Naquele junho/julho de 1969, eles estavam cordiais uns com os outros, cooperativos nas canções ainda em fase de elaboração e aparentemente distantes do fracasso e das tensões pessoais havidas durante as gravações de Let it Be. No fundo, todos temiam que a presença de John estragasse o clima.

Seu temperamento cáustico poderia minar a aparente boa vontade que reinava entre os demais. Nenhum deles tentou interferir de maneira impositiva no trabalho do outro. Na verdade, depois de uma imensa crise de egos durante as gravações do Álbum Branco e do desânimo que marcou Let it Be, os três músicos pisavam em ovos. Até cooperavam, mas mantinham entre si uma distância segura.

Apesar de ter sido o penúltimo álbum lançado pela banda, foi o último a ser gravado. As músicas do último disco lançado pelos Beatles, Let It Be, foram gravadas alguns meses antes das sessões que deram origem a Abbey Road.

George Martin produziu e orquestrou o disco junto com Geoff Emerick como engenheiro de som, Alan Parsons como assistente de som e Tony Banks como operador de fitas. Martin considera Abbey Road o melhor disco que os Beatles fizeram. E não é por menos: ele é o mais bem acabado de todos e um dos mais cuidadosamente produzidos (comparável somente a Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band). Sua estrutura foi bastante pensada e discutida, e as visões discordantes dos integrantes da banda só contribuíram para a riqueza da criação final.

Como dissemos acima, também foi em Abbey Road que George Harrison se firmou como um compositor de primeira linha. Após anos vivendo sob a sombra de Lennon e McCartney, ele finalmente emplacou dois grandes sucessos com este álbum: Here Comes the Sun e Something. Ambas as canções foram regravadas incessantemente ao longo dos anos, sendo que Something chegou a ser apontada pela revista Time como “a melhor do disco” e como a segunda música mais interpretada no mundo, atrás somente de Yesterday, também dos Beatles.

Após as desastrosas sessões de gravação do álbum então chamado de Get Back (mais tarde intitulado Let It Be), Paul McCartney sugeriu ao produtor George Martin que os Beatles se reunissem e fizessem um álbum “como nos velhos tempos… como a gente fazia antes”, gravado ao vivo, sem overdubs e, logicamente, livres dos conflitos que começaram com as sessões do White Album. Martin levou em consideração o acontecido de ter sido produtor secundário do álbum Get Back e aceitou, mas com a condição que a banda se comportasse “como nos velhos tempos”, e ele seria tratado como o “produtor dos velhos tempos” também. Queria o consentimento de Lennon, que aceitou. O resultado final acabou sendo este grande álbum, considerado por muitos críticos como o melhor da banda, e segundo a revista Rolling Stone o 14° melhor álbum de todos os tempos.

Quando foi gravado na época do vinil, o álbum tinha dois lados bem distintos entre si, a fim de agradar tanto a Paul McCartney como a John Lennon individualmente. O lado A, que ia de “Come Together” a “I Want You”, foi feito para agradar a Lennon. É uma coleção de faixas individuais, enquanto que o lado B (para agradar a McCartney) contém uma longa coletânea de curtas composições que seguem sem interrupção. A sequência de juntar músicas inacabadas criadas por McCartney e Lennon em um enorme pout-pourri foi ideia de Paul, constituindo-se numa espécie de ópera dentro do disco. No entanto, diferente de Sgt. Pepper’s, considerar Abbey Road um disco conceitual é um engano. “È um bom disco de Rock&roll”, disse Harrison.

Sobre as músicas:
Come Together

A música que abre Abbey Road é uma das marcas registradas de John Lennon. Foi feita a pedido do guru do LSD, Timothy Leary, que concorreria a governador da Califórnia e tinha como tema da sua campanha a frase: “Let’s Get It Together” ou “Vamos Pra Frente Juntos”. A inspiração política não veio, mas Lennon terminou a música e a incluiu no disco. A “luz” veio de uma canção de Chuck Berry, “You Can’t Catch Me”, da qual Lennon copiou inclusive parte de um verso. Anos depois, Lennon admitiu a “influência” de Berry e foi levado à Justiça, mas a ação acabou em um acordo. No decorrer da canção, Lennon faz um barulho com a boca, uma espécie de “chuuunc!”, que na verdade ele quer dizer “shoot me”, algo como “atire em mim”, ou “injete em mim” (uma gíria para o uso de heroína). Paul McCartney não gostava desse trecho por achar que teriam problemas com a Justiça, ou mesmo com os fãs e sabendo que Lennon não retiraria, ele decidiu tocar seu baixo tão forte e alto de maneira que cobrisse a fala. Lennon não queria guitarra nessa música, mas McCartney achou que sem base e só no piano, o som ficaria vazio. Também deu uma ideia do solo que acabou entrando. George Martin escreveu numa nota do disco LOVE que “Come Together” é sua música favorita da carreira dos Beatles.

Something
Escrita por George Harrison para sua esposa na época, Pattie Boyd. Foi escrita durante o White Álbum, e a primeira estrofe foi baseada na música “Something in the Way She Moves” de James Taylor, assinado pela Apple na época. Refinada durante as filmagens de Let It Be, (é possível ver Lennon dando umas dicas de composição para Harrison) a música foi oferecida para Joe Cocker, mas acabaram voltando atrás e gravando a canção. Primeira música de Harrison a ser lado A de um single, “Something” foi regravada por Frank Sinatra. McCartney cantou essa música com Eric Clapton no Concert for George em 29 de novembro de 2002, um ano após sua morte.

Maxwell’s Silver Hammer
Perguntado a Ringo Starr posteriormente qual foi o pior momento ao lado dos Beatles, Starr respondeu: ‘Sem dúvida, as gravações de “Maxwell’s Silver Hammer”‘. Também não é para menos: Levaram três dias inteiros para gravar, inclusive com Lennon desistindo de participar dizendo que “era mais uma ideia estapafúrdia de Paul”, Harrison teve que reprisar o solo muitas vezes e acabou cansando também e Starr odiava a ideia de ter que tocar bateria sem bater na caixa, com a baqueta batendo na coxa para marcar o tempo (só no refrão ele toca normalmente). McCartney argumentava que apenas queria “tudo dando certo”, ou seja, “tudo do seu jeito”. Apesar da melodia agradável, “Maxwell’s Silver Hammer” conta, através de versos cheios de humor negro, a história de um maníaco homicida chamado Maxwell, que com seu martelo de prata sai matando todos por aí. McCartney estava convencido de que ela seria um sucesso, o que acabou não ocorrendo.

Oh! Darling
Esta canção de McCartney é mais uma brincadeira ao estilo dos anos 50 do que uma composição a ser levada a sério. Toda a banda parece se divertir, e a qualidade dos Beatles como músicos fizeram famosa “Oh! Darling”. Para poder realizar o vocal gritado e rasgado que caracteriza a música, McCartney realizava apenas um trecho da gravação dela por dia, no início da manhã, para que sua voz tivesse o tom e a força necessária. Lennon dizia durante as gravações que ele deveria fazer essa parte por ser mais seu estilo de voz. No álbum Anthology 3 é possível ver uma versão em que Lennon canta esse trecho e no final alguns trechos dele comemorando a notícia do divórcio de Yoko do seu primeiro marido.

Octopus’s Garden
Segunda colaboração de Ringo Starr para a banda como compositor (a primeira havia sido “Don’t Pass Me By”, do Álbum Branco). Foi inspirado numa viagem à ilha italiana da Sardenha durante as férias do último disco, quando se deparou com uma excursão turística que falava sobre a vida dos polvos. A guia turística explicava que os polvos para se protegerem, juntavam pedras coloridas em frente às suas tocas criando uma espécie de jardim, assim sendo: “Octopus’s Garden” ou “Jardim dos Polvos”. Harrison ajudou Starr na composição (essa cena pode ser vista no filme Let It Be), porém deu total crédito a Starr. Além disso Harrison colaborou com Starr nas suas músicas a solo “Photograph”, e “It Don’t Come Easy”. A letra simples que lembra temas infantis, a simpatia de Starr e a competência dos outros Beatles em acompanhá-lo tornaram “Octopus’s Garden” uma canção muito querida entre os fãs ao longo dos anos. Embora o baterista já tivesse tido duas músicas cantadas por ele nas listas de sucesso (“Yellow Submarine” e “With a Little Help from My Friends”), essa foi a primeira e única vez que Starr faria sucesso com uma composição sua nos Beatles. Nalguns shows dos Oasis, Noel Gallagher cantava essa música no final da canção “Whatever”.

I Want You (She’s So Heavy)
A composição menos convencional de John Lennon em Abbey Road. Uma das músicas mais longas dos Beatles (com 7 minutos e 47 segundos), é formada por duas melodias inacabadas, unidas em uma só canção, sendo a primeira ensaiada durante as sessões de “Get Back” em fevereiro de 1969 com Billy Preston nos teclados, e a segunda durante as sessões de Abbey Road, com a duração de mais de 8 minutos (editada depois). Teoricamente esta é uma canção de amor, mas a fúria e a levada de Blues levam “I Want You” para o contraponto de “She’s So Heavy”. Muitos críticos a consideram como uma música de rock progressivo, por sua estrutura, o “solo falado” e a duração. Foi usado o sintetizador Moog durante a canção e no final, para o efeito “vento”. Foi pedido por Lennon ao engenheiro Geoff Emerick que “cortasse exatamente aqui” na marca de 7:44, criando um silêncio abrupto editado para o final do lado A. Outra versão é de que o rolo de fita teria acabado mesmo, durante a gravação. Nessa data, 20 de agosto de 1969, durante as finalizações dessa música, foi a última vez em que todos os Beatles estiveram juntos, tocando em um estúdio. Existe um bootleg com Paul cantando essa canção.

Here Comes the Sun
Este é outro grande sucesso de George Harrison em Abbey Road, regravado inúmeras vezes ao longo dos anos por artistas como Peter Tosh e Richie Havens. O clima cheio de otimismo desta música tem uma explicação, que ele deu em entrevista uma vez: “Escrevi essa música na época em que a Apple parecia uma escola: Assine isto, assine aquilo… Parecia que o inverno na Apple duraria para sempre, então um dia tirei folga pra ir a casa de Eric Clapton e o alívio de estar naquele jardim ensolarado era tão maravilhoso que peguei o violão de Eric e escrevi “Here Comes The Sun”. Foi inspirada na música “Badge” do Cream (banda de Clapton) e pode-se notar a presença forte do sintetizador Moog, muito usado em Abbey Road. Contou apenas com George, Ringo e Paul, pois John estava se recuperando de um acidente de carro. A banda gravou as “palmas” e George e Paul gravaram os “backing vocals” muitas vezes para sobrepor o som. Com um capotraste na 7ª casa do violão, foi possível deixar o riff num Lá maior e com a mesma estrutura de “If I Needed Someone” com o padrão de frases repetidas ao longo da canção. Joe Brown cantou essa música em “Concert for George.”

Because
Foi usado o sintetizador Moog por Harrison na introdução de guitarra e foi inspirada no “Moonlight Sonata” de Ludwig van Beethoven, que Yoko tocava enquanto Lennon pedia para tocar de trás para frente (John sempre pedia isso). Cada vocal foi gravado em cada linha de microfone e sobreposto 3 vezes cada, totalizando 9 vozes. Enquanto gravavam os Beatles exigiram a presença de Ringo na sala de estúdio, mesmo sem participar, apenas para “dividir aquele momento de harmonia” segundo o engenheiro de som Geoff Emerick. As versões solo dos vocais podem ser ouvidas no disco Anthology 3. “Because” é interpretada por Elliott Smith e está na trilha sonora dos créditos finais de Beleza Americana (1999), filme de Sam Mendes.

You Never Give Me Your Money
Aqui começa a grande obra de Abbey Road, o pout-pourri formado pelas canções inacabadas de John Lennon e Paul McCartney. Esta foi criada por Paul e divide-se, na verdade, em três cançonetas distintas: Em “You Never Give Me Your Money”, a música em estilo clássico e a letra pessimista, mal disfarça sua insatisfação com os rumos da banda, principalmente os financeiros – culpando seu agente na época, Allen Klein. Ele dizia: “Ele só nos dava papéis e mais papéis e quando perguntávamos sobre dinheiro e a situação da Apple ele desconversava dizendo que éramos músicos e não homens de negócios”. Logo em seguida entra “Magic Feeling”, com a voz de Paul lembrando cantores dos anos 50 e fala sobre estar desempregado e sem perspectivas de futuro, algo que remete em suas próprias situações: “But all that magic feeling/Nowhere to go” traduzindo: “Todo aquele sentimento mágico/Não há lugar para ir”. As vozes referenciais de “Because” e “Sun King” entram aqui também. Em seguida vem “One Sweet Dream”, que descreve um sonho dourado, algo como a volta por cima: “One sweet dream/Pick up the bags and get in the limousine” ou “Um doce sonho/Pegue suas malas e entre na limousine” nessa parte da canção, George usa arpejos similares aos de “Here Comes The Sun” com um “amplificador Leslie” o que registra essa espécie de guitarra que mais tarde se tornaria sinônimo do “estilo Harrison”. E para finalizar, com um baixo inspirado e sons de grilos e outros bichos no final, uma frase com rima, onde os Beatles contam até sete e dizem que “todas as crianças boazinhas vão para o céu”, emendando com a próxima, “Sun King”. Alguns trechos dessa canção voltam na música “Carry That Weight.”

Sun King
Música escrita por Lennon cujo nome original da canção era “Here Comes The Sun King”, mas foi encurtado para “Sun King” a fim de evitar confusões com a música de Harrison “Here Comes The Sun”. Com um vocal triplo não tão elaborado como “Because” a música utiliza em seu meio alguma palavras em Inglês, Espanhol, Italiano e Português. Segundo Lennon: “Começamos a brincar de falar outras línguas e simplesmente misturamos tudo! Paul sabia um pouco de espanhol que aprendeu no colégio, inventamos algumas palavras sem sentido e o restante tiramos de jornais. “Los Paranoias”, por exemplo, era uma notícia sobre a gente”. Outro ponto interessante nessa música foi o efeito “cross-channel movement” que consistia em mudar o som de um canal para o outro (direita para esquerda e ao contrário, simultaneamente). Em entrevista de 1987, George disse que, para o timbre da guitarra, se inspirou em “Albatross” da banda Fleetwood Mac com o reverb, “Na época eu disse, vamos fazer igual o Fleetwood Mac com reverb… Não ficou muito parecido mas foi o ponto de origem”.

Mean Mr. Mustard e Polythene Pam
Ambas as músicas são de John Lennon, compostas durante a viagem à Índia em 1968. “Mean Mr. Mustard” foi baseada num fato real descrito por um jornal sobre um homem miserável que escondia dinheiro onde podia para que as pessoas não o forçassem a gastá-lo. Ele não se inspirou muito para escrever e obviamente descreveu no Anthology, anos depois como “um lixo escrito num pedaço de papel na Índia”. Foi encontrada uma versão “demo” gravada na casa de Harrison em Esher que aparece no Anthology 3, onde é possível saber que o nome da irmã de Mustard era Shirley que foi mudado para Pam pela oportunidade de associar com a música seguinte: “Polythene Pam”. Para compor “Polythene Pam”, Lennon se inspirou no encontro que tivera anos antes com um amigo poeta de Liverpool, Royston Ellis (descrito por John na famosa entrevista pela Playboy em 1980, como “o homem que introduziu os Beatles nas drogas.”) e sua namorada Stephanie. Na ocasião, ela estava vestida com uma roupa de polietileno. Há também a história sobre Pat Hodgett, fã dos tempos do Cavern que costumava comer polietileno e era conhecido como Polythene Pat. Esta é a terceira música do medley seguida por “She Came in Through the Bathroom Window.”

She Came in Through the Bathroom Window
Esta música composta por Paul McCartney faz parte da última canção do primeiro medley. No começo da emenda, John Lennon diz, “Please, come out now. (risos) Oh, look out!” Então alguém diz “You should…” que é cortado pela entrada da música. Mike Pinder, da banda de Rock progressivo e psicodélico The Moody Blues, conta no DVD The Classic Artists Series: The Moody Blues, lançado em 2006, que contou a Paul uma história de uma groupie que entrou pela janela do banheiro de Ray Thomas (outro membro da banda) e passou a noite com ele. Paul ouvindo o conto com sua guitarra na mão, em seguida disparou: “Ela entrou pela janela do banheiro…”. Paul gravou a guitarra solo enquanto George Harrison gravou o baixo. Levaram 39 takes para gravar a guitarra base e a bateria, e essa canção do medley demorou quase 2 dias para ficar pronta.

Golden Slumbers e Carry That Weight
Estas são duas das mais conhecidas músicas de McCartney em Abbey Road. A primeira foi criada após o beatle ter visto em um livro de sua meia-irmã Ruth um poema de Thomas Dekker, do século XVII, em formato de canção de ninar. Paul disse: “Pensei que eram muito tranquilizadores, uma antiga canção de ninar, mas não conseguia ler a melodia na partitura. Então peguei os versos e coloquei minha música neles.” Ele também tentou atingir sua voz num ponto alto como se fosse uma ópera, porque era um tema muito épico. Na música seguinte, “Carry That Weight”, Paul aproveita para voltar a trocar farpas com os Beatles e com Allen Klein: “Boy, your gonna carry that weight/ for a long time” ou “Rapaz, você vai carregar esse peso/por um bom tempo”. Paul poderia estar cantando para Lennon, algo como “se você deixar a banda, você vai carregar esse peso por muito tempo” ou para si próprio que tentou ser o gerente da banda após a morte de Epstein. No filme “Imagine” de John Lennon, ele diz: “Paul estava cantando sobre todos nós”. No meio dela ele introduz trechos de “You Never Give Me Your Money”, com a letra diferente. Paul toca piano e guitarra, George toca baixo e guitarra e Ringo bateria. John não participou desse medley (apenas gravou os backings posteriormente, com os quatro juntos, uma raridade em suas canções) devido a um acidente de carro com Yoko e seu filho Julian. Uma orquestra foi adicionada após as gravações. Essa música é a terceira parte do segundo medley e conta com a próxima música “The End.”

The End
O título desta música de Paul McCartney diz tudo: ela não só fecha o disco, mas também a carreira dos Beatles antes da separação. Foi a última canção a ser gravada pelos quatro Beatles e a última canção do medley. Lennon disse na entrevista da Playboy: “Aquilo é Paul McCartney. A frase final carrega uma filosofia cósmica que prova que quando Paul quer algo, ele consegue.” Ringo faz o único solo de bateria em toda sua carreira. Paul dividiu o solo de guitarra em 3 partes e deu para George e John tocarem uma parte fazendo assim uma sobreposição de solos. “The End”, antes chamada de “Ending” era para ser a última música do disco, mas “Her Majesty” acabou entrando no álbum. Essa sequência está presente até hoje nos shows de Paul McCartney e a frase final ecoará para sempre como o epitáfio da banda na história da música: “And in the end/The love you take/Is equal to the love you make” ou “E no final/O amor que você recebe/ É igual ao amor/Que você faz.”

Her Majesty
Esta é a “faixa escondida” de Abbey Road. Ela surge após um silêncio de 14 segundos, no fim de “The End”, e dura apenas 23 segundos, com Paul cantando acompanhado do violão. Originalmente ela estava entre as músicas “Mean Mr. Mustard” e “Polythene Pam” (O primeiro acorde da faixa é na verdade a última nota de “Mean Mr. Mustard”, e a música acaba abruptamente porque ela emendaria com o primeiro acorde de “Polythene Pam”), mas como Paul não gostou da posição original da música, e pediu para o engenheiro de som John Kurlander, para retirar e destruí-la, porém era norma da EMI nunca jogar fora nem destruir nada dos Beatles. Então ele adicionou a música para frente do final do disco para separá-la e esperar por uma futura aprovação o que acabou acontecendo. Paul disse mais tarde: “Foi um acidente, coisa típica dos Beatles”. O estilo “dedilhado” foi tirado da música “They’re Red Hot” de Robert Johnson, que influenciou outros guitarristas como Eric Clapton e Keith Richards. Foi criada por Paul após os Beatles terem recebido os títulos de Membros do Império Britânico (MBE) das mãos de Elizabeth II, em 1965. Na primeira edição do disco, ela não foi creditada na capa do LP (vinil), apesar de vir creditada no selo do disco vinil.

Capa
A famosa fotografia da capa do álbum foi tirada do lado de fora dos estúdios Abbey Road em 8 de agosto de 1969 por Iain Macmillan. A sessão de fotos durou dez minutos. John, sempre muito apressado, só queria “tirar a foto e sair logo dali, deveríamos estar gravando o disco e não posando pra fotos idiotas”. Detalhe: a ideia da foto foi de Paul McCartney. Foram feitas seis fotos. Paul McCartney escolheu a que achou melhor. A foto foi objeto de rumores e teorias de que Paul estaria morto, vítima de um acidente de carro em 1966. Apesar de ter sido apenas uma brincadeira e puro marketing do grupo, a lenda ainda é assunto de alguns beatlemaníacos. Na capa do LP, os Beatles estão a atravessar a rua numa faixa de segurança a poucos metros do Estúdio Abbey Road, e ficou marcada para sempre para muitas pessoas.

A foto conteria supostas “pistas” que dariam força ao rumor de que Paul estava morto: Paul está descalço (segundo ele, naquele dia fazia muito calor, e ele não estava aguentando ficar com nada nos pés), fora de passo com os outros, está de olhos fechados, tem o cigarro na mão direita, apesar de ser canhoto, e a placa do fusca (em inglês, beetle) estacionado é “LMW”, referindo-se às iniciais de Linda McCartney Widow (“Linda McCartney Viúva”) e, abaixo, o “281F”, supostamente referindo-se ao fato de que McCartney teria 28 anos se (if, em inglês) estivesse vivo (o I em “28IF” é realmente um “1”, mas isso é difícil de se ver na capa. Um contra-argumento é que Paul tinha somente 27 anos no momento da publicação de Abbey Road, embora alguns interpretem isso como que ele teria um dia 28 anos se ele estivesse vivo.). Os quatro Beatles na capa, segundo o mito “Paul está morto”, representariam o padre (John, cabelos compridos e barba, vestido de branco), o responsável pelo funeral (Ringo, em um terno preto), o cadáver (Paul, em um terno, mas descalço – como um corpo em um caixão), e o coveiro (George, em jeans e uma camisa de trabalho de denim). Além disso, há um outro carro estacionado, de cor preta, de um modelo usado para funerais e eles andam em direção a um cemitério próximo a Abbey Road. Notem também que, atrás do Paul, tem um carro como se estivesse passando pelo mesmo lugar que ele está. Outra suposta pista seria que, na contracapa do álbum, ao lado esquerdo da palavra Beatles, haveria 8 pontos formando o número 3 (sendo, então, “3 Beatles”). O homem de pé na calçada, à direita, é Paul Cole, um turista dos Estados Unidos que só se deu conta que estava sendo fotografado quando viu a capa do álbum meses depois.

As 15 piores capas de discos eruditos de todos os tempos

As 15 piores capas de discos eruditos de todos os tempos

A Gramophone elegeu as piores capas de discos eruditos de todos os tempos.

~ 1 ~

A vencedora foi esta, com a legenda que será compreendida por quem conhece Os Planetas, de Holst: “Westminster Gold, the bringer of insanity”.

~ 2 ~

O segundo lugar foi esta capa onde Birgit Nilsson parece estar fugindo do massacre da serra elétrica. A revista colocou a seguinte legenda: “As if Salome wasn’t dramatic enough”.

~ 3 ~

Não dá para saber se esta é propaganda de esmalte, de alongamento ou se é música. O que tem a ver a Dvořák com… pés? Bem, ele os tinha. Eu também tenho e provavelmente você que me lê também. Quem sabe aquele Dvořák no topo tenha sido um erro de impressão?

~ 4 ~

Esta é genuinamente assustadora. O halo ao redor do cabelo de Sylvia Sass e a expressão em seu rosto evocam “Carrie, a Estranha”. As canções de Strauss são ótimas, mas, como também tem Wagner, não sei se me atreveria a chegar próximo o suficiente para ouvir o disco.

(Elena diz que esta é a expressão de quem olha para a partitura de Strauss pela primeira vez).

~ 5 ~

O disco é excelente. Tenho aqui em casa. Apesar da falta de nosso sotaque, tem alto nível artístico, só que a capa…

Michael Tilson Thomas aparece como algo entre Ace Ventura e Monty Python. O colorido, a folharada, a arara no braço, a cara de Rambo de quem parece não estar gostando muito do dia de folga — talvez pensando numa queimada. Uma verdadeira Arma Brasileira em tempos pré-bolsonaristas.

~ 6 ~

O megabrahmsiano Al Reiffer talvez dissesse que Brahms é alimento essencial para a alma, mas esta metáfora ficou um tanto deselegante na mão do capista. Ovos, bacon e Brahms. Bach seria a cerveja da alma? (Ele era cervejeiro, para quem não sabe). Eu, como chocólatra, fico pensando que compositor representaria a delícia maior.

Mas derivo. Curtam esta linda capa.

~ 7 ~

A escolha desta capa só pode ser compreendida por ingleses. A capa não é horrível, mas a caracterização bíblica de Bryn Terfel remete, para nove dentre dez ingleses, ao filme “A Vida de Brian”, do Monty Python.

A revista diz que Terfel parece um figurante que fugiu do filme… Para piorar, o nome de Terfel é…

~ 8 ~

Bach significa ribeiro, rio pequeno. No encarte, está escrito que “O mar simboliza todas as composições de Bach.” E tudo bem, assim encerra-se a justificativa para a imagem. Vai ver que sou chato e fico pensando, para além da feiura, no mal que a água salgada fará ao instrumento. Pensando que a cadeira será levada daquela pedra escorregadia, nas roupas molhadas, na violoncelista nadando com o arco fora d`água, no cello submerso. Penso também que o som do mar me impediria de ouvir a música. Por outro lado, reflito se a manipulação fotográfica também simboliza Bach. Grande Bach, que sobrevive a tudo.

~ 9  ~

A capa que desaparece e reaparece foi umas das eleitas como piores capas de discos eruditos de todos os tempos pela revista Gramophone.

Lembra da emoção daqueles quase hologramas da década de 1980? Você virava uma imagem nas mãos e de repente via uma nova imagem aparecer? É o mesmo tipo de coisa, só que não é. É o arremedo do kitsch.

~ 10  ~

A estimada violinista Lara St. John estava na casa dos vinte anos quando fez essa gravação. Só que ela parece muito mais jovem do que isso na capa. Parece uma criança. Parabéns. Porém se ela, após tirar a foto, começasse imediatamente a tocar a Chaconne da Partita Nº 2, a peça seria proibida por Bolsonaro ou por algum membro de nosso governo fundamentalista. Os politicamente corretos também ficariam hostis, pois pensariam em pedofilia. Ai, estou confuso. Parabéns. Acabo de lembrar que a Chaconne é uma peça que Bach escreveu pela morte de sua primeira esposa, Maria Barbara, mas isto não deve ter nada a ver. Já disse que estou confuso, não me incomodem.

~ 11 ~

Veja. Mats Rondin é um violoncelista e ele inicia o disco com o Vocalize de Rachmaninov. Porém, quando vi a capa, achei que ele fosse um cantor e que cantasse tão bem, mas tão bem, que até os cães aceitavam o fato e lambiam suas cordas vocais. Não tenho nenhum problema com os cachorros. Eu amo os cães. Quem não gosta deles? Eles são uma das poucas alegrias da vida. (Uma das outras não são os gatos). Se este ainda fosse um álbum de música clássica para cães (eles existem), teríamos… bem, um álbum de música clássica para cães. Mas não é. Anos depois, a capa foi alterada. Na nova, Rondin carrega seu cello atrás e em cima da cabeça. Atravessado.

~ 12 ~

Discordo da 12ª escolha de pior capa da Gramophone. É uma capa feita para crianças e o nome do disco em finlandês é ‘Nallekarhu Konsertissa’, ou seja, ‘Ursinho de Pelúcia em Concerto’ e o complemento é ‘Favoritos da Música para Crianças’. Claro que a foto poderia ser mais fofa, mas o cômico aqui funciona, Ou não?.

~ 13 ~

Gosto muito da naturalidade desta capa. Você chegaria tão perto de um leão? Acha normal colocar uma tuba sobre a cabeça do bicho vestindo terno branco? Tudo dentro da rotina.

~ 14 ~

Que lindo! Uma foto de família para os netinhos! Fico feliz de ver a Sra. Dermota com saúde. Mas não há algo assustador nas pinturas, na iconografia religiosa e na ausência de luz natural?

~ 15 ~

Para um homem que sempre exerceu rigoroso controle sobre sua imagem quanto Herbert von Karajan, estes são registros um tanto comuns… E basta ouvir certas gravações dele para que você desconfie que ele, de vez em quando, se ligava num auto-boicote. Na foto escolhida pela revista, ele parece que vai sair à noite em busca de um(a) parceiro(a).

Na seguinte, ele vira um camafeu.

Depois, um anjo saído dos tubos de um órgão.

E tenta fugir num carro veloz.

Corra, Herbert, corra!

Feliz Aniversário, Shostakovich

Minha querida filha Bárbara está de aniversário hoje. Comecei o dia fazendo uma visita a ela. Mas o 25 de setembro é também o aniversário de Shostakovich. Para quem conhece sua música, esta versão de Feliz Aniversário é hilariante. Quem não conhece não vai entender nada. Há trechos de dois quartetos. Bem, mas vocês descobrirão.

Uma Temporada no Escuro (Minha Luta 4), de Karl Ove Knausgård

Uma Temporada no Escuro (Minha Luta 4), de Karl Ove Knausgård

É incrível como minha vida é regulada pelos livros. Uma série de livros mais ou menos insatisfatórios me deixaram triste. Então peguei o quarto volume da autobiografia do Knausgård e tudo melhorou. Textos bem escritos salvam, apesar de que este foi o livro mais fraco dos quatro que li da série Minha Luta.

A Noruega é um país muito diferente do Brasil, claro. Lá, um estudante de boas notas, que termina o curso secundário, pode tentar uma vaga para dar aulas para crianças em regiões remotas do país, ganhando um bom salário. Foi o que fez Knausgård. Aos 18 anos e já interessado em tornar-se escritor, ele foi mandado por um ano para Håfjord, no norte do país, onde o inverno é uma noite contínua e o verão é puro dia. Numa comunidade de pescadores com 250 habitantes e na cidade vizinha não muito maior, ele deu aulas, tomou frequentes bebedeiras, escreveu, cuidou para não manter relações sexuais com alunas — afinal, elas tinham apenas dois ou três anos a menos do que ele e eram uma grande atração –, escreveu, entrou em conflito com superiores, escreveu, tentou perder a virgindade inúmeras vezes com outras mulheres — sempre tendo que enfrentar uma vergonhosa ejaculação precoce –, escreveu, viveu e escreveu. O plano era o de ganhar dinheiro suficiente para passar o ano seguinte viajando e ter tempo livre para se dedicar à escrita em um local calmo. O plano deu certo.

Neste quarto volume, a narrativa permanece leve, franca, rápida e envolvente. Na verdade, Knausgård me faz sempre grudar no livro. Ele não se preocupa muito com a cronologia e, lá pela página 200, retorna dois anos em sua vida e permanece ali até a página 400, quando volta a Håfjord. O livro tem 495 páginas.

A história dos romances é a da vida do autor. Uma vida comum, mas narrada com tal maestria proustiana que torna-se espelho de nossa própria existência, com suas temporadas boas ou escuras. As quase quinhentas páginas são lidas como se fossem 100. Queremos saber mais de Karl Ove, porque a identificação com os seus medos, decisões erradas e contradições revelam um caráter humano. Ele parece nos mostrar o tamanho da vida, nem enorme nem desconsiderável, nem simples nem inviável.

A ideia da escuridão perpassa todo o volume — nas entrelinhas e literalmente. É uma metáfora de um momento da vida em que tudo parece decisivo, até pela imaturidade para se lidar com os problemas. E há sempre o pai, o pai. Knausgård sempre volta àquela figura violenta e opressiva que assombra sua vida. Neste volume, há a separação dos pais e primeiros sinais da devastação que a bebida faria, tão bem contada no primeiro volume, A Morte do Pai.

Minha Luta é um imenso painel — já li 2000 páginas nos 4 primeiros volumes — que mostra um homem buscando crescer e se desenvolver, livrando-se de culpas, vergonhas e da autoridade do pai, mas também é uma história sobre como a vida pode ser boa. É muito complicado não se identificar… Minha infância não teve nada em comum com a dele. Mas como temos sentimentos em comum! Quantas vezes ele fala de mim, mesmo vivendo uma realidade muito diferente!

Recomendo.

Foi bem ali, no Círculo Polar Ártico, o local onde Knausgård deu suas aulas. Sim, frio, mas ele não reclama dele, só da escuridão no inverno.

Bom dia, Odair (com os lances de Inter 1 x 0 Chapecoense)

Bom dia, Odair (com os lances de Inter 1 x 0 Chapecoense)

O Inter entrou em campo contra a Chapecoense com o mesmo time que tinha perdido a decisão contra o Athlético-Havan. Odair disse que não queria substituir ninguém porque quem saísse acabaria apontado (ou sugerido) como culpado pela perda do título da última quarta-feira.

Isto é, a forma que ele escolheu para preservar seus atletas, o grupo e o apoio interno para manter-se no cargo foi torturando a torcida.

E torturou mesmo. Foi um jogo cruel.

Bruno: atuação lastimável | Foto: Ricardo Duarte / SCI

Jogamos malíssimo, eram só ligações diretas, nada de armação ou cérebro. A coisa só melhorou com a entrada de Neílton jogando pelo meio, na linha de três que precede Guerrero. Aliás, pobre Guerrero, lutando sempre sozinho contra a zaga adversária.

Uendel e Bruno foram figuras ridículas, no que foram acompanhados por Patrick.

A torcida vaiou o time mesmo antes de ele entrar em campo. Os influencers remunerados e as pessoas sensíveis ficaram cho-ca-dos. Bem, não têm vivência suficiente ou conhecimento sobre o que é o futebol.

Então, para os tolinhos que reclamaram das vaias da torcida do Inter, sugiro a leitura do clássico do inglês Nick Hornby. Aqui vai uma palhinha, sobre as primeiras vezes que Hornby foi a um estádio:

O que mais me impressionou foi o quanto a maioria das pessoas à minha volta detestava, realmente detestava, estar ali. (…) [Nas plateias de que eu participara em outros tipo de eventos] eu nunca observara rostos contorcidos de fúria, desespero ou frustração. A diversão como sofrimento era uma ideia inteiramente nova para mim, e parecia ser algo que eu vinha aguardando.

(Nick Hornby, “Febre de Bola”)

Mas vencemos o jogo, apesar de dois gols injustamente anulados pelo VAR.

Vocês acham que agora eu vou comentar o VAR? Não, isso também todo mundo está falando. Falemos de outro fato, falemos sobre a cera.

Garanto que no jogo de ontem contra a Chapecoense e no de quarta-feira contra o Athlético-PR, em cada um deles, tivemos menos 10 minutos de bola rolando em razão da cera. Sem exagero, no jogo de quarta, o Wellington Martins estava rolando no chão aos 3 SEGUNDOS de jogo! A cada bola dividida, nas duas partidas, havia um Neymar sofrendo dores terríveis, entrada de médicos e do carro maca. Quando o jogador machucado pousava ao lado do gramado, logo erguia-se e pedia ao árbitro para voltar a campo, no que era atendido, claro. Também a cada falta, lateral ou tiro de meta eram perdidos preciosos segundos que, somados, devem dar mais do que os dez minutos de que falei. A Fifa dá muita atenção ao futebol europeu onde as equipes não fazem cera, mas não estabelece regras para nós.

Bem, estamos isolados em quarto lugar no Brasileiro, mas com uma enorme fila agarrada à nossa cola. Agora, na 21ª rodada, às 21h30 desta quarta-feira, 25, o Inter vai ao Rio de Janeiro enfrentar o líder Flamengo. Já no próximo final de semana, retornamos ao Beira-Rio para enfrentar, no domingo, 29, às 16h, o Palmeiras. Ao menos esses não fazem cera.

Quem você pensa que sou?, de Safy Nebbou

Quem você pensa que sou?, de Safy Nebbou

Eu e Elena acabamos de assistir ao excelente ‘Quem você pensa que sou?’, de Safy Nebbou.

Trata-se de uma história moderna onde o Facebook é utilizado para que se crie um perfil falso de uma jovem, só que a autora é uma Juliette Binoche cinquentona.

A partir desta premissa quase vulgar, o filme parte para nos falar de desejo, separações, frustrações e da proximidade da morte, tudo dentro do pacote de uma história que nos engana várias vezes. Fala também da invisibilidade de alguns problemas reais.

Grande atuação de Binoche como Claire / Clara e de Nicole Garcia como a psicanalista dela.

Recomendo.

O Triste Fim de Jair Messias Bolsonaro, por José Eduardo Agualusa

O Triste Fim de Jair Messias Bolsonaro, por José Eduardo Agualusa

Jair acordou a meio da noite. Mandara colocar uma cama dentro do closet e era ali que dormia. Durante o dia tirava a cama, instalava uma secretária e recebia os filhos, os ministros e os assessores militares mais próximos. Alguns estranhavam. Entravam tensos e desconfiados no armário, esforçando-se para que os seus gestos não traíssem nenhum nervosismo. Interrogado a respeito pela Folha de São Paulo, o deputado Major Olimpio, que chegou a ser muito próximo de Jair, tentou brincar: “Não estou sabendo, mas não vou entrar em armário nenhum. Isso não é hétero.”

Michelle, que também se recusava a entrar no armário, fosse de dia ou de noite, optou por dormir num outro quarto do Palácio da Alvorada. Aliás, o edifício já não se chamava mais Palácio da Alvorada. Jair oficializara a mudança de nome: “Alvorada é coisa de comunista!” — Esbravejara: “Certamente foi ideia desse Niemeyer, um esquerdopata sem vergonha.”

O edifício passara então a chamar-se Palácio do Crepúsculo. O Presidente tinha certa dificuldade em pronunciar a palavra, umas vezes saía-lhe grupúsculo, outras prepúcio, mas achava-a sólida, máscula, marcial. Ninguém se opôs.

Naquela noite, pois, Jair Messias Bolsonaro despertou dentro de um closet, no Palácio do Crepúsculo, com uma gargalhada escura rompendo das sombras. Sentou-se na cama e com as mãos trêmulas procurou a glock 19, que sempre deixava sob o travesseiro.

— Largue a pistola, não vale a pena!

A voz era rouca, trocista, com um leve sotaque baiano. Jair segurou a glock com ambas as mãos, apontando-a para o intenso abismo à sua frente:

— Quem está aí?

Viu então surgir um imenso veado albino, com uma armação incandescente e uns largos olhos vermelhos, que se fixaram nos dele como uma condenação. Jair fechou os olhos. Malditos pesadelos. Vinha tendo pesadelos há meses, embora fosse a primeira vez que lhe aparecia um veado com os cornos em brasa. Voltou a abrir os olhos. O veado desaparecera. Agora estava um índio velho à sua frente, com os mesmos olhos vermelhos e acusadores:

— Porra! Quem é você?

— Tenho muitos nomes. — Disse o velho. — Mas pode me chamar Anhangá.

— Você não é real!

— Não?

— Não! É a porra de um sonho! Um sonho mau!

O índio sorriu. Era um sorriso bonito, porém nada tranquilizador. Havia tristeza nele. Mas também ira. Uma luz escura escapava-lhe pelas comissuras dos lábios:

— Em todo o caso, sou seu sonho mau. Vim para levar você.

— Levar para onde, ô paraíba? Não saio daqui, não vou para lugar nenhum.

— Vou levar você para a floresta.

— Já entendi. Michelle me explicou esse negócio dos pesadelos. Você é meu inconsciente querendo me sacanear. Quer saber mesmo o que acho da Amazónia?! Quero que aquela merda arda toda! Aquilo é só árvore inútil, não tem serventia. Mas no subsolo há muito nióbio. Você sabe o que é nióbio? Não sabe porque você é índio, e índio é burro, é preguiçoso. O pessoal faz cordãozinho de nióbio. As vantagens em relação ao ouro são as cores, e não tem reacção alérgica. Nióbio é muito mais valioso que o ouro…

O índio sacudiu a cabeça, e agora já não era um índio, não era um veado — era uma onça enfurecida, lançando-se contra o presidente:

— Acabou!

Anhangá colocou um laço no pescoço de Jair, e no instante seguinte estavam ambos sobre uma pedra larga, cercados pelo alto clamor da floresta em chamas. Jair ergueu-se, aterrorizado, os piscos olhos incrédulos, enquanto o incêndio avançava sobre a pedra:

— Você não pode me deixar aqui. Sou o presidente do Brasil!

— Era. — Rugiu Anhangá, e foi-se embora.

Na manhã seguinte, o ajudante de ordens entrou no closet e não encontrou o presidente. Não havia sinais dele. “Cheira a onça”, assegurou um capitão, que nascera e crescera numa fazenda do Pantanal. Ninguém o levou a sério. Ao saber do misterioso desaparecimento do marido, Michelle soltou um fundo suspiro de alívio. Os generais soltaram um fundo suspiro de alívio. Os políticos (quase todos) soltaram um fundo suspiro de alívio. Os artistas e escritores soltaram um fundo suspiro de alívio. Os gramáticos e outros zeladores do idioma, na solidão dos respetivos escritórios, soltaram um fundo suspiro de alívio. Os cientistas soltaram um fundo suspiro de alívio. Os grandes fazendeiros soltaram um fundo suspiro de alívio. Os pobres, nos morros do Rio de Janeiro, nas ruas cruéis de São Paulo, nas palafitas do Recife, soltaram um fundo suspiro de alívio. As mães de santo, nos terreiros, soltaram um fundo suspiro de alívio. Os gays, em toda a parte, soltaram um fundo suspiro de alívio. Os índios, nas florestas, soltaram um fundo suspiro de alívio. As aves, nas matas, e os peixes, nos rios e no mar, soltaram um fundo suspiro de alívio. O Brasil, enfim, soltou um fundo suspiro de alívio — e a vida recomeçou, como se nunca, à superfície do planeta Terra, tivesse existido uma doença chamada Jair Messias Bolsonaro.

* Publicado originalmente na revista “Visão” de Portugal.

Um doido varrido

Um doido varrido

Às vezes temos revelações inesperadas décadas depois.

Há um sujeito casado com uma colega da mãe dos meus filhos. Por algum motivo, nestes mais de 20 anos pós-separação, eu cruzava muito com ele. Ele ou me cumprimentava efusivamente ou me ignorava por completo.

Eu achava que ele era de lua ou tinha um parafuso a menos.

Hoje, na saída do cinema, esgueirando-se entre as pessoas, passaram em fila a colega — oi, tudo bem? –, o tal sujeito — que me ignorou, agindo verdadeiramente como um grosso — e uma cópia idêntica dele — que me cumprimentou alegremente — oi, Milton, tudo bem, sempre no cinema ou com um livro na mão, hein? Ele até me abraçou e bateu nas minhas costas.

Pois é, o cara tem um irmão gêmeo com o mesmo corte de cabelo e tudo. E eu pensando que ele fosse doido varrido.

Cena do filme “Gêmeos, Mórbida Semelhança”.

Bom dia, Odair (com os melhores lances da fragorosa derrota)

Bom dia, Odair (com os melhores lances da fragorosa derrota)

A vitória do Athlético-Havan foi merecida e inapelável. Eles tem menos qualidade em termos de jogadores, mas são muito mais organizados e facilmente contiveram o Inter no Beira-Rio.

Gostaria que esta fosse a última foto de Patrick publicada neste blog. Ele é o símbolo da derrota de ontem. | Foto: Ricardo Duarte / SCI

Fizemos uma boa pressão em alguns minutos do primeiro tempo, perdemos alguns gols e ficamos até otimistas com nosso gol de empate. Mas o 1 x 1 do primeiro tempo transformou-se em um 1 x 2, não em 2 x 1. E ao natural.

No segundo tempo não tivemos mais chances de gol. Imaginem que Cuesta concluiu uma cobrança de escanteio nesta etapa. E foi só.

A única reclamação que nos sobra é o fato do árbitro ter permitido a cera dos paranaenses. Não houve quase jogo. Desde os primeiros segundos havia sempre um cara do Athlético jogado no chão, pedindo atendimento.

Então, amigos, um aviso. Quando Wilton Pereira Sampaio estiver apitando e teu time vencendo, é só rolar no chão. Os minutos de desconto serão poucos e não há amarelo para quem finge lesão e nem para quem leva anos para bater uma falta ou lateral. Ele não gosta de se incomodar com essas coisas.

De resto, quem jogou foi o adversário. Sim, o time do capitão Wellington Risadinha e de Cirino nos deu um baile em nossa casa.

Como disse a Maria de Abreu, Nico López cobrou escanteio, correu pra cabecear, pegou rebote, cruzou de volta em uma espécie de mini escanteio e recebeu próximo à marca do pênalti para concluir. Fim, foi este nosso ataque.

Na ausência de D`Alessandro, entramos com Wellington Silva. WS jogou muito mal, mas nada igual a Patrick. Só uma administração idiota de grupo — como a que faz Odair — justifica o fato de ele não ter saído ainda no primeiro tempo. E, quando chegou a hora de substituí-lo, no intervalo, entrou outro medalhão… Sóbis foi seu substituto, entrando fora de posição — jamais foi meio-campista — e conseguiu ser ainda pior do que Patrick. E, olha, era difícil, mas ele conseguiu. Ou Sóbis joga como centro-avante ou adeus. Agradecemos os gols e os títulos, só que não dá mais.

Sóbis conseguiu o milagre de entrar pior do que Patrick. Era difícil. | Foto: Ricardo Duarte | SCI

Quem deveria entrar? Alguém da posição, ora. Temos, sim, temos, mas Odair raramente os escala.

Duvido muito, porém, se Odair quiser dar alguma evolução ao time nas próximas semanas, deveria começar o jogo de domingo, em casa contra a Chapecoense, com Heitor na posição de Bruno — que foi péssimo ontem –, Zeca na de Uendel, Nonato na de Patrick e Neílton como primeiro reserva, pois ele jogou muito bem domingo passado em Minas.

Isso para começar.

Mas ele vai seguir com seus amigos com a finalidade de manter-se no cargo.

E, deste modo, nada acontecerá de bom conosco. Talvez tenhamos que comemorar uma vaga cagada na Libertadores ou nem isso.

P.S. — O único colorado que deu volta olímpica nos últimos 8 anos foi Odair, sozinho, após eliminar o Palmeiras. Mais uma burrada.

O Brasileiro e o Foco na Véspera da Decisão

O Brasileiro e o Foco na Véspera da Decisão

Os colorados não estavam dando grande atenção ao Campeonato Brasileiro e, agora, nervoso, na véspera do jogo mais importante do ano — a decisão da Copa do Brasil no Beira-Rio — olho para o que vem depois e… Puxa, estamos bastante bem no Brasileiro! Mesmo jogando quase sempre com os reservas, estamos isolados no quarto lugar, com poucas chances de sermos campeões, mas vivos. Interessante.

No último domingo, pela manhã, vencemos o Atlético-MG em BH por 3 x 1. Foi uma vitória indiscutível de um time com bons jogadores como o lateral direito Heitor, o meio-campista Nonato, o lateral esquerdo Zeca, o armador Neílton — eu gostava muito dele no Vitória — e, pasmem, a ressurreição de Pottker, que fez boa partida e dois gols.

O time reserva repete a mania dos titulares. Somos o melhor time do Brasileiro no enfrentamento com os dez times da parte de cima da tabela e o 13º contra os mortos da segunda página.

É a eterna mania de fazer bondades aos moribundos. Cuidado, domingo, às 11h, pegamos a Chapecoense no Beira-Rio.

Mas o que interessa hoje, nosso FOCO tem que ser o jogo de amanhã, onde decidimos se vamos ficar mais um ano sem títulos importantes — já são 8 — ou se vamos mudar a história recente. É dia de esquecer as cagadas de Odair e dar total apoio ao time. O Athlético é um time pra lá de nojento em vários sentidos. É rápido e bem treinado, mas também é a instituição que apoiou Bolsonaro e ainda tem o patrocínio da Havan. Ou seja…

A questão política me afeta, mas o jogo poderia ser contra o querido St. Pauli (*) que eu desejaria vencer com todas as minha forças. Nossa questão é o nosso retorno não só à primeira divisão como ao convívio com os  vencedores. Nossa questão é demonstrara que nosso DNA de vencedores está em plena validade. Nossa questão é aumentar a sala de troféus.

Eu estarei lá, atento e na expectativa, com a camisa vermelha e sem cachaça na mão. OK, talvez depois. Antes só uma cerveja para entrar no clima.

.oOo.

(*) O St. Pauli (Fußball-Club Sankt Pauli von 1910) foi o primeiro clube alemão a banir o ingresso no próprio estádio de torcedores adeptos do nazismo. Em 2005, o clube começou também a organizar obras de beneficência para terceiros. Por exemplo, a equipe e os torcedores criaram a iniciativa viva com água de sankt pauli, uma colheita de fundos para a aquisição de distribuição de água para as escolas de Cuba. No último domingo, O St. Pauli venceu o clássico citadino contra o Hamburgo por 2 x 0, pela segunda divisão alemã.

Salvador Allende, 11 de setembro de 1973

Salvador Allende, 11 de setembro de 1973

Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento: soldados do Chile, comandantes-em-chefe titulares, o almirante Merino, que se autodesignou comandante da Armada, e o senhor Mendoza, general rastejante que ainda ontem manifestara sua fidelidade e lealdade ao Governo, e que também se autodenominou diretor geral dos carabineiros.

Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores: Não vou renunciar! Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. [Eles] têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos.

Trabalhadores de minha Pátria: quero agradecer-lhes a lealdade que sempre tiveram, a confiança que depositaram em um homem que foi apenas intérprete de grandes anseios de justiça, que empenhou sua palavra em que respeitaria a Constituição e a lei, e assim o fez.

Neste momento definitivo, o último em que eu poderei dirigir-me a vocês, quero que aproveitem a lição: o capital estrangeiro, o imperialismo, unidos à reação criaram o clima para que as Forças Armadas rompessem sua tradição, que lhes ensinara o general Schneider e reafirmara o comandante Araya, vítimas do mesmo setor social que hoje estará esperando com as mãos livres, reconquistar o poder para seguir defendendo seus lucros e seus privilégios.

Dirijo-me a vocês, sobretudo à mulher simples de nossa terra, à camponesa que nos acreditou, à mãe que soube de nossa preocupação com as crianças. Dirijo-me aos profissionais da Pátria, aos profissionais patriotas que continuaram trabalhando contra a sedição auspiciada pelas associações profissionais, associações classistas que também defenderam os lucros de uma sociedade capitalista. Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e deram sua alegria e seu espírito de luta. Dirijo-me ao homem do Chile, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque em nosso país o fascismo está há tempos presente; nos atentados terroristas, explodindo as pontes, cortando as vias férreas, destruindo os oleodutos e os gasodutos, frente ao silêncio daqueles que tinham a obrigação de agir. Estavam comprometidos.

A historia os julgará.

Seguramente a Rádio Magallanes será calada e o metal tranqüilo de minha voz não chegará mais a vocês. Não importa. Vocês continuarão a ouvi-la. Sempre estarei junto a vocês. Pelo menos minha lembrança será a de um homem digno que foi leal à Pátria. O povo deve defender-se, mas não se sacrificar. O povo não deve se deixar arrasar nem tranquilizar, mas tampouco pode humilhar-se.

Trabalhadores de minha Pátria, tenho fé no Chile e seu destino. Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se. Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

Viva o Chile! Viva o povo! Viva os trabalhadores! Estas são minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão. Tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição.

Salvador Allende, 11 de setembro de 1973.

Bom dia, Odair, mantenedor de Patrick (com os principais lances da covardia de ontem)

Bom dia, Odair, mantenedor de Patrick (com os principais lances da covardia de ontem)

A filha de Odair chama-se Vitória. Deve ter nascido em casa, pois, se tivesse sido em hospital, se chamaria Tentando Segurar um Empatezinho Hellmann.
(de um amigo)

Ainda temos boas possibilidades de sermos campeões da Copa do Brasil 2019, apesar de ontem termos encaminhado consistentemente uma tragédia. Desde os tempos de Fernando Carvalho, instalou-se a Síndrome da Retranca Fora de Casa. Via de regra, longe do berço entramos timidamente para ganhar num contra-ataque ou para empatar… Ou para perder de pouco. Ora, se deu certo contra o Barcelona, há de dar também contra a Chapecoense e afins. Só que não.

Faz uns 8 anos que este esquema não funciona, mas parece que ser cagão mantém os empregos. Pois é, o que parece passar longe das mentes da direção colorada é que para se fazer uma boa retranca há que ter 100% de comprometimento, de atenção, e de manter a bola no pé de vez em quando.

Ontem, por exemplo, tivemos um meio campista que jogou 90 minutos e que foi desarmado 16 vezes. Sim, 16 vezes! Falo de Patrick. E nisto não estão contados os passes errados.

Enquanto a taça brilhava na Arena da Baixada, Odair usava seu eterno esquema cagão | Foto]]: Ricardo Duarte / SCI

Nico, Uendel e Edenílson — Ed foi culpado direto pelo gol ao errar uma brilhatura em nosso meio de campo e perder uma bola simples — fizeram péssimas partidas, mas nada comparável ao horrível Patrick. Todas as arrancadas do louco lento deram errado. E ele não manteve posição, ia lá pra frente, foi e é um peladeiro. O mapa de calor e os impedimentos marcados costumam indicar que Patrick é muitas vezes nosso homem mais avançado em campo. Mais do que Nico López e até Guerrero. Suas funções táticas são as mais incompreensíveis do esquema de Odair.

Patrick não funciona fora do Beira-Rio, este é outro fato. Edenílson não jogou nada, mas, assim como Nico, é sempre uma possibilidade, tanto que ambos perderam gols. Já Patrick nem isso.

E ele não foi substituído! Aliás, foram novamente lamentáveis as substituições de Odair. Só faltou tirar novamente o Cuesta.

Mesmo assim, sem insistência e fechados, chutamos e tivemos mais oportunidades de gol.

Mas temos que (sobre)viver com Odair e, pior, torcer por ele. Sim, irei ao Beira-Rio berrar a favor daquela ameba. Tenho que tornar esse burro campeão.

Há um adversário, claro. O Athletico é um time limitado, mas muito bem treinado. Joga tudo o que pode com jogadores como Welligton Martins e Marcelo Cirino, ambos corridos do Beira-Rio por deficiência técnica. O Patético não eliminou Flamengo e Grêmio à toa e, por termos perdido ontem, vamos passar trabalho no Beira-Rio para tentar uma vitória por dois gols. Será a vez de eles se retrancarem. Eles têm um meio-de-campo sem Patrick, isto é, veloz, porém a zaga é ruim de doer.

É VAMO, VAMO, INTER e fim.

O Inter retorna a campo no próximo domingo (15/09), às 11h, quando enfrenta o Atlético Mineiro no Independência. O jogo encerra o primeiro turno do Brasileiro. A volta do Inter ao Beira-Rio acontece na partida de decisiva contra o Athlético, time que apoiou institucionalmente o repugnante governo atual e tem o patrocínio do véio da Havan. A partida será no dia 18/9, às 21h30.

Vamos vencer, PQP!

Impossível ficar indiferente à capa do último CD de Cecilia Bartoli

Impossível ficar indiferente à capa do último CD de Cecilia Bartoli

Cecilia Bartoli acaba de anunciar seu novo álbum, Farinelli, com um programa de árias inspirado na figura do famoso castrato, provavelmente um dos melhores cantores da história. O álbum (no qual a cantora tem a colaboração do notável Giardino Armonico de Giovanni Antonini) estará à venda no dia 8 de novembro. Mas o que certamente não deixará ninguém indiferente é a imagem da capa, onde Bartoli aparece com barba. Piscadela aos transexuais? Auto-ironia? Marketing astuto? Uma mistura das três coisas?

A verdade é que Bartoli tem uma longa história de capas excêntricas, e não é a primeira vez que os castrati despertam sua imaginação. Alguns se lembrarão, há dez anos, de seu álbum Sacrificium, onde seu corpo havia passado por um processo de “marmorização” que a transformou em uma estátua.

Os jornais pré-programados

Os jornais pré-programados

Me incomodam os jornais, sites, colunistas e comentaristas das redes que desejam agradar seus leitores com opiniões previsíveis e consensuais. Ah, a sede de aplausos… Ah, vou falar bonito pra minha bolha… Significa que a opinião emitida tem em vista um objetivo que se esgota na vaidade e na fragilidade de quem a divulga. Se tivesse um jornal, escolheria os meus colunistas por um critério. Trataria de descobrir o tamanho da vaidade, se a pessoa precisa muito ser amada. Se sim, adeus. Se não, fique por aqui fugindo dia a dia do que esperam de ti.

Um saco

Posso dizer que posso adivinhar as manchetes de cada site a respeito de determinado assunto. É sempre a mesma pasmaceira previsível. É como diz Chico Buarque em “A História de Lily Braun”:

Nunca mais romance
Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing
Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz

Ilíada, de Homero (trad. de Christian Werner)

Ilíada, de Homero (trad. de Christian Werner)
A capa externa da caixa homérica da Ubu Editora

Por Leonardo Antunes (*)

Há quatro anos, Christian Werner lançava sua tradução da Odisseia pela Cosac Naify. Àquela ocasião, Guilherme Gontijo Flores escreveu uma resenha para a Folha de São Paulo louvando o trabalho e celebrando o fato de que nosso sistema literário esteja produzindo novas traduções dos clássicos: um sinal de vitalidade de nosso meio, veredito com que concordo plenamente.

Agora pela Editora Ubu, Werner não só relança sua Odisseia como também publica uma tradução inédita da Ilíada. Salvo engano, creio que essa seja a tradução de Homero de mais longo período de gestação entre aquelas de que dispomos em português.

Digo isso porque, em 2002, quando iniciei meus estudos sob a tutela do professor, a tradução já estava sendo gestada. Desde então, Werner se tornou uma das figuras mais respeitadas no campo de estudos homéricos no Brasil, tendo também publicações e repercussão no exterior. Durante esses mais de 15 anos, vem se dedicando ao estudo dos poemas épicos gregos, tendo escrito inúmeros artigos e livros acadêmicos a esse respeito.

Creio que esse seja o grande diferencial de sua tradução, que Gontijo comparou, em 2014, à de Frederico Lourenço, também professor e pesquisador de literatura grega. Além de serem ambas oriundas de um cenário acadêmico, essas traduções também têm em comum o verso livre. Porém, creio que as semelhanças terminem aí.

Enquanto o texto de Lourenço parece focar-se na fluência como critério primeiro, a tradução de Werner, por sua vez, prima pelo cuidado extremo com a linguagem de Homero. Ela é concisa, como a de Odorico Mendes e de Haroldo de Campos, mas não pelo mesmo modo que a desses poetas, que buscavam impor uma dicção própria ao texto. A tradução de Werner é concisa pela emulação da parataxe grega, das frases coordenadas uma após outra, e que são vertidas com extremo rigor palavra por palavra, de modo quase interlinear.

É o tipo de trabalho que facilmente poderia se tornar infiel ao texto de partida em uma característica importantíssima: a da legibilidade – Homero, apesar de seu vocabulário vasto, não é difícil de ser lido por quem sabe grego. Mas também nisso Werner se mantém próximo ao texto do lendário aedo, evitando palavras desnecessariamente raras. Quando elas ocorrem, são para emular a raridade de um vocábulo pouco usual no texto grego ou para dar uma potencialidade de sentido precisa a um termo-chave para a interpretação da obra.

Ainda que a ordenação pouco usual da linguagem poética emulada por Werner possa causar um pouco de dificuldade de início, justamente por sua uniformidade cuidadosamente lavrada não demora para que o leitor se acostume com essa dicção que emula características fundamentais de Homero, jamais recriadas em português de forma tão criteriosa.

Também os paratextos, em que o tradutor explica minuciosamente suas escolhas e critérios, são um excelente apoio tanto para novos leitores de Homero quanto para estudantes da área. O box com os dois poemas conta ainda com o brilhantismo de uma introdução assinada por Richard P. Martin, no início da reedição da Odisseia.

Borges, que não sabia grego, dizia que conhecia bem Homero pela quantidade de traduções que tinha em sua biblioteca. Com essa nova tradução de Werner, nós também ficamos um pouco mais próximos de conhecer melhor o grande épico grego, pelas características que ficam tão bem aclaradas em sua tradução e em contraste com as demais.

.oOo.

(*) Leonardo Antunes é poeta, tradutor e professor de Literatura Grega na UFRGS.

Um dia normal

Um dia normal

O dia começou cedo. Muito cedo. Acordei às 6h15 para receber a pessoa que faz a faxina na livraria. Na situação em que o comércio se encontra, não dá para pagar hora extra a cada faxina. Então eu venho, abro as portas e fico lendo na frente da livraria. Hoje deu 40 páginas de Knausgård. Deste forma, o dia começou bem. Enquanto vocês aproveitavam os últimos minutos aquecendo as bochechas em seus travesseiros, eu lia prazerosamente um autor de que gosto muito.

Depois, fui até o fórum onde trabalha minha filha. Não conhecia, ela trabalha num local bonito e limpo, em uma mesa em L cheia de processos e com um monitor. Senti falta do cheiro de café. Ah, se ela soubesse o quanto eu desejo que ela tenha uma vida menos atribulada do que a minha!

Agora, ela me manda pelo Whats a foto de uma xícara de café, feito após minha saída…

Agora, de volta ao trabalho, espero que a Elena me chame para fazermos uma reunião com um pessoal que representa a Unimed. Estou pagando “apenas” R$ 1402,41 por mês e quase não fico doente. Deveria receber uma medalha da instituição por pagar o plano há 20 anos quase sem utilizá-lo. Num mundo ideal, este valor deveria baixar.

E depois vou ter que enfrentar a uma fila na Caixa porque meu cartão deixou de funcionar e, deste modo, não consigo usar o caixa eletrônico. Aliás, os cartões da Caixa são de péssima qualidade. É o segundo que tenho que trocar em menos de um ano.

E assim a vida passa.

Ainda bem que a livraria não vai de todo mal.