Palavras inteligentes encontradas por aí (sobre ontem à noite)

Há menos de 3 meses, o Inter era uma massa amorfa. A gente não conseguia dizer se os jogadores eram bons ou ruins porque não era possível sequer identificar uma intencionalidade naquele time.

Espero que não crucifiquem o Valencia, ele joga muito. Mas ontem perdeu duas chances com o gol aberto.

O mínimo seria fazer uma das chances e ninguém estaria falando de “nó tático” do Diniz. 🙂 Perdemos pelos erros capitais nas finalizações. E do Renê, que Ele toda a visão do lance e não fez o movimento para deixar o John Kennedy em impedimento. Para terminar ainda errou em bola em cima da linha.

O Coudet ainda vai melhorar bastante o time com uma pré-temporada bem feita. Só que para tanto teria que ficar… O Inter precisa de banco. Dizem que Coudet mexe mal, mas não apontam quem deveria entrar.

“Somos Azuis, Pretos e Brancos”: o Tricolor em busca de suas cores

“Somos Azuis, Pretos e Brancos”: o Tricolor em busca de suas cores

O presente texto é produção de Matheus Donay da Costa, que na época de publicação do texto estava no quarto semestre do curso de História da UFSM. Trata-se de uma revisão do livro “Somos Azuis, Pretos e Brancos”, do jornalista Leo Gerchmann. Matheus é integrante do Stadium- Grupo de Estudos de História do Esporte e das Práticas Lúdicas. Os resultados parciais deste trabalho foram já apresentados e o resumo publicado nos anais do XIV Encontro Estadual de História da Associação Nacional de História – Seção Rio Grande do Sul (ANPUH-RS), em julho de 2018.

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Quantas cores cabem em um clube de futebol? Na cidade da longevidade, Veranópolis (interior do RS), o clube homônimo carrega um título pouco comum no esporte: pentacolor. A seleção holandesa carimbou na história apelido que dialoga com sua cor, imponente e singular. Nos tempos de Cruyff cunhou-se o termo “Laranja Mecânica”. Na mesma década do sucesso holandês, as arquibancadas do estádio Olímpico transformavam o Grêmio num clube de 7 cores: as do arco-íris, por méritos da torcida Coligay.

Em 1903, ano da fundação, foi definido que o uniforme do Grêmio seria listrado nas cores azul e havana, com gravata branca. Por falta de oferta no comércio, o havana foi substituído pelo preto e assim se fazia o tricolor de Porto Alegre. É o que nos conta o jornalista Leo Gerchmann no seu livro Somos Azuis, Pretos e Brancos, publicação que provoca algumas inquietações em leitores curiosos.

Capa do livro “Somos Azuis, Pretos e Brancos”.

Comigo, a relação com o livro inicia-se no inverno de 2015 em Santa Maria. Lembro que fazia bastante frio e fui à feira do livro em busca da recém lançada obra da L&PM, o livro do Gerchmann. Indisponível, mandei mensagem para o autor. Em 2 dias, estava em destaque na banca da editora. Texto lido, alguns questionamentos na cabeça, novas histórias e personagens a conhecimento do público. Histórias que, conforme o autor, ficaram esquecidas ou deixadas em segundo plano por muito tempo por diversas razões.

O tempo passou, entrei no curso de História e, em contato com aquele universo cotidiano de palavras – historiografia, fonte, método, teoria – um ensinamento: ler a contrapelo. Assim voltei à obra do Leo, sabendo que não se tratava de uma produção acadêmica, ainda que fosse um livro de história (como está identificado na sua classificação). E a história, se pretendemos levá-la minimamente a sério, exige método. Logo de cara constatei: esta história pra mim começa no gelado inverno santamariense de 2015, para o Leo começa (ou se intensifica) numa noite fria de agosto de 2014, quando ocorre o episódio de racismo com o goleiro Aranha na Arena.

Não demorou muito para que o clube abrisse suas portas para o lançamento de Somos Azuis, Pretos e Brancos. Eis uma nova memória em disputa, diferente daquela difundida popularmente: o clube do povo (Internacional) versus o clube da elite branca (Grêmio). A proposta do autor é clara: acabar com a pecha atribuída ao tricolor, desfazer a injustiça. Marcos Rolim, autor do prefácio, é enfático: “A investigação histórica de Léo Gerchmann nos libertou”.

Mesmo que escrito por um jornalista e a obra seja reivindicada como livro-reportagem, chamo a atenção para um aspecto fundamental. Aqui, faço uso de um trecho do livro “Pesquisa Histórica e História do Esporte”, elaborado por diversos pesquisadores da área. “A questão é simples e óbvia, mas deve ser relembrada, inclusive porque é clara a característica multiprofissional do campo de investigação (no qual atuam “historiadores de formação”, mas também oriundos de outras áreas): qualquer que seja a opção teórica/metodológica adotada, a história do esporte é sempre história. São os debates da disciplina-mãe (bem como das ciências humanas e sociais como um todo) que devem nortear a atuação do pesquisador, independentemente da sua área original de formação.”

Com base na leitura de Somos Azuis, Pretos e Brancos, tentei pinçar as fontes utilizadas, afinal, é impossível revisitar o passado sem acessá-las. Nas primeiras páginas, as fontes são indicadas como documentos abertos de forma irrestrita pelo Grêmio (no livro aparecem ainda algumas colunas de jornais e fotografias), além do auxílio do Memorial Hermínio Bittencourt e do Museu do Grêmio, ambos pertencentes à instituição, além de alguns entrevistados. Todavia, o grande problema de Somos Azuis, Pretos e Brancos reside aqui, nas fontes.

Fontes orais

Num mundo tomado pelas fake news, quem preza pela qualidade de uma informação/afirmação demanda que ela seja corroborada de alguma forma. Assim, toda e qualquer conclusão há de ser amparada em fontes concretas, estilhaços do passado que nos oferecem caminhos para buscar acessar o que já aconteceu. Em Somos Azuis, Pretos e Brancos, constantemente são expostos relatos orais de entrevistados. Frente a esta situação, me questiono: o que Gerchmann faz em seu livro é história oral?

Na historiografia, a pertinência dessa metodologia é constantemente debatida. Afinal, é a história relatada por um indivíduo, com suas crenças, suas emoções, sua subjetividade. História oral não é um fim em si mesma, e sim um meio de conhecimento (Alberti, 2007). Quando se estuda um tema através da oralidade, é preciso estudar os diversos discursos produzidos pelos entrevistados, ou seja, as variadas narrativas tornam-se objeto de análise.

Vamos aos casos de Somos Azuis, Pretos e Brancos. No segundo capítulo, Gerchmann expõe uma situação em que o Internacional não aceitava analfabetos. A fonte? “Relatos de pessoas que viveram os primórdios do clube”, segundo ele. Mas quem são essas pessoas? Quando isso foi sabido? Curiosamente, esse tipo de produção de história nos remete muito ao que Gerchmann critica em seu texto: histórias transmitidas sem responsabilidade, que perpetuam atribuições que a princípio não condizem com a instituição. Aliás, a denúncia é interessante. Uma investigação contundente poderia trazer informações inéditas acerca de uma eventual exclusão por parte do Internacional.

Em outro momento, Léo recorre a Tarciso (atacante negro do Grêmio dos anos 70 e 80). Para corroborar a tese, diz Tarciso: “Nunca sofri preconceito no Grêmio. Fui muito bem acolhido e vivi grandes alegrias. Sou muito grato ao torcedor gremista e ao povo do Rio Grande do Sul.”  Contudo, vale pontuar que Tarciso é o segundo maior artilheiro da história do clube. A acolhida e o trato com um jogador de glórias dentro das quatro linhas podem transcender (ou amenizar) muitas barreiras raciais, não?

Somos Azuis, Pretos e Brancos é recheado dessas conclusões amparadas por uma metodologia pouco crítica, que arbitrariamente escolhe o que considerar e o que relevar. Utilizar as palavras de um jogador negro para descartar a discriminação no clube é no mínimo duvidoso. O mesmo ocorre com a transcrição de falas de Alcindo, o maior goleador do Grêmio. Segundo ele, sempre achou estranho quando diziam que o clube era segregacionista. “Xingamentos racistas? Oriundos apenas da torcida do Internacional.

Analisando todas essas passagens do seu livro, é notório que há um esforço em fazer história através da metodologia oral. Ao passo que há este esforço, há também muitas idas na contramão de uma história oral coesa. Primeiramente, por afirmações não corroboradas por outros tipos de fontes. Em segundo lugar, por considerar a narrativa dos seus entrevistados (o restrito nicho de dois ex-atletas negros do Grêmio) provas irredutíveis. Não há crítica ou investigação histórica, como recomenda-se. A compreensão também fica menos nítida por não saber que tipo de perguntas Gerchmann fez às suas fontes e como conduziu as entrevistas.

Fontes documentais

Trabalhando com documentos, Leo Gerchmann dedica um capítulo inteiro para o primeiro estatuto do clube, uma consolidação das primeiras atas. Segundo ele, um documento de vanguarda que seria aceito por qualquer entidade progressista do nosso século. Aqui, me chama a atenção as interpretações extraídas dos artigos do estatuto. Dos deveres dos sócios, o artigo 6 exige bom comportamento no recinto da sede e fora dela. Léo celebra tal exigência no comentário que a segue. Mas afinal, o que seria um bom comportamento no ano de 1911, pouco mais de 20 anos após a proclamação da República, em uma Porto Alegre em constante crescimento urbano e industrial?

Ainda no estatuto, Gerchmann não poupa exclamações para salientar um trecho que exige o respeito às nacionalidades, crenças e opiniões de seus consócios. Me pergunto de novo, quais são as crenças e as opiniões dos consócios do Grêmio em 1911?  Para validar a ideia de que este artigo do estatuto sugere um clube democrático (como é feito no livro), seria indispensável saber quais são as crenças.

O autor ainda endossa um trecho que fala em “vedar a entrada no recinto do Grêmio às pessoas que achar inconvenientes” traçando um paralelo com a atualidade, onde o Grêmio e outros clubes têm tentado fazer com as torcidas organizadas. Mas afinal, deveriam as torcidas organizadas serem vedadas e tratadas como inconvenientes? Uma posição pouco comum entre aqueles que defendem um futebol popular.

Fontes fotográficas

Imagem em destaque da capa do livro “Somos Azuis, Pretos e Brancos”.

Outro recurso que é muito utilizado no livro são as fotografias, principalmente no capítulo “Os negros além de Adão”. Ainda que seja muito sugestiva, uma foto não contém em si uma verdade absoluta. São inúmeras as variáveis: luz, sombra, estado de conservação, revelação do filme, principalmente fotografias em preto e branco.

No livro são apresentadas fotos de jogadores identificados como negros e mulatos pelo autor, com propósito de desmentir a história de que Tesourinha, apenas em 1952, teria sido o primeiro jogador negro do Grêmio. Buscando por outras fontes que dessem alguma pista, encontrei a biografia de Tesourinha publicada por Sergio Endler em 1985. Ele afirma: “Na verdade o Grêmio já utilizara em sua equipe jogadores considerados “baianos”. Isto é, homens com algum traço biológico negro, mas com predominância branca na sua aparência física.”

Todavia, Endler não trata o tema com a devida precisão, o que exigiria uma  investigação mais profunda. No mais, jornais da época (que não são abordados no livro) acusam a estreia de Tesourinha como um marco histórico, o fim de um preconceito de 50 anos vigente no clube. Aliás, cabe aqui uma ressalva acerca do uso de jornais: eles também não são detentores da verdade, produzem discurso com base em diferentes variáveis, como a ideologia dos proprietários, interesses econômicos, políticos, entre outros. Pra mim, a questão dos primeiros jogadores negros do Grêmio permanece ao menos aberta à discussão. Requer uma análise mais apurada, que cruze outras bibliografias e fontes históricas.

Jornal do Dia, em 15/02/1952, trata como bombástica a especulação do jogador “colored” Tesourinha.

O historiador (ou qualquer um que se sujeite a construir uma história) está fadado à arbitrariedade. Escolhe qual fonte vai trabalhar, qual vai deixar de fora, como vai produzir o texto. Seria inocente pensar o contrário. Acontece que em Somos Azuis, Pretos e Brancos a arbitrariedade soa gritante, demonstra-se escancarada a cada parágrafo, revelada em contextos mal explicados ou sequer mencionados. No capítulo chamado “Prejuízos do Marketing”, Gerchmann discorre sobre um período de crise no Grêmio, onde se cunhou a “cruel e indevida caracterização de elitismo”.

Os anos 40, de fato, não foram fáceis para o clube. O rival Internacional empilhava campeonatos gaúchos com o time que ficou conhecido por Rolo Compressor e que contava com jogadores negros no elenco. A abertura do Grêmio era quase que uma necessidade para interromper a hegemonia colorada. Para o autor, este episódio de crise foi meramente socioeconômico, longe de qualquer questão racial. Um período em que, para se reerguer, o clube foi atrás da sua “essência”.

Mas afinal, o que seria “voltar à essência”? Este período turbulento só é retomado posteriormente por Gerchmann no capítulo “Preconceito? Algo a ser combatido por todos”, um espaço onde procura (com muita resistência) reconhecer notórios episódios racistas na instituição.

Nos anos 40, se destaca uma figura no clube chamada Aurelio Py, antigo presidente do Grêmio e conselheiro à época. O livro reproduz na íntegra o discurso de posse de Py, chamado “O credo do bom gremista”, que em algum momento diz: “Creio no Grêmio porque, trabalhando pelo aprimoramento da raça, colabora na formação de uma raça eugênica para o nosso futuro.” Gerchmann faz uma citação interessante aqui, explicando a eugenia através de Francis Galton, que seria “o estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente.” 

O que chama a atenção é a conclusão tomada pelo autor, que a partir desta definição conclui que a eugenia citada por Aurelio Py seria a recuperação da alma gremista vitoriosa, e não uma referência à raça no sentido biológico. Como escrevi anteriormente, tal capítulo propõe-se a reconhecer erros, ainda que seja extremamente resistente. Isso porque todo e qualquer evento citado precede ou antecede da palavra “ato isolado” ou “episódio menor”.

Imagem da webserie no canal oficial do Grêmio no Youtube. Título é o mesmo do livro de Leo Gerchmann e conta a trajetória de diversos jogadores negros no clube.

Problemático tanto no uso de fontes como nas interpretações, vejo a narrativa do livro como outro ponto a ser debatido. São constantes os malabarismos retóricos para desvincular o Grêmio de qualquer origem elitista e segregacionista e acabar com a imagem de “bom moço” do Internacional. A escrita fala por si só, com palavras escolhidas minuciosamente, principalmente quando Gerchmann discorre sobre os primórdios do Grêmio e sua relação com a família Mostardeiro (que vendeu terrenos para o clube e foi sócia da instituição).

Fica notório em passagens como “Mostardeiro e Dona Laura eram um casal de origem humilde que fez fortuna com muito trabalho e tino empreendedor”. Conta também que Dona Laura promovia festas para trabalhadores, muitos deles ex-escravos e que lá se liam poesias socialistas. Fatos alheios à história do Grêmio mas que transmitem uma ideia, ainda que inconsciente, de aproximação popular do clube no seu início. Quanto à atribuição do Internacional à uma origem elitista, faço questão de reproduzir as palavras de Gerchmann:

“Antes de entrar no segundo motivo para a adoção do nome Internacional pelo rival do Grêmio, quero contar um pouco mais sobre esse Internacional de São Paulo. Vejam bem como o mundo dá voltas. Em 1933, em dificuldades financeiras (como o nosso Internacional também viveu por aqui em razão da crise de 1929, o Internacional paulista, cujo uniforme era igual ao do Milan ou do Atlético Paranaense (listras vermelhas e pretas na vertical), fundiu-se ao Antarctica Futebol Clube. Juntos, originaram o Clube Atlético Paulista, que, por sua vez, em 1937, uniu-se ao Estudantes. Daí, saiu o Estudantes-Paulista, que, em 1938, foi incorporado ao São Paulo FC. Sim, o São Paulo Futebol Clube! O Internacional de São Paulo, um dos inspiradores do nome que acabou sendo adotado pelo homônimo de Porto Alegre, é uma das vertentes do São Paulo, o clube paulista tido como mais elitizado, como sede no luxuoso bairro Morumbi, na capital paulista. Que coisa!”

A ideia é simples mas trabalhosa: busca associar, através do Inter de São Paulo (clube onde jogavam os irmãos Poppe, fundadores do Inter de Porto Alegre) e suas diversas uniões e fundições, uma ligação entre luxo, elitismo e o Internacional. Um malabarismo trabalhoso.

História x Memória

Clube se apropriou do título da obra em suas publicações oficias.

Enfim, poderia discorrer tantas outras linhas sobre as diversas passagens contidas em Somos Azuis, Pretos e Brancos. Porém, detenho-me aqui à uma conclusão: tal livro deve ser encarado como um produtor de memória, não de história.

Reproduzo aqui outro trecho do livro “Pesquisa Histórica e História do Esporte” (2013), que melhor elucida essa diferença: “Nesse ponto diferenciam-se os trabalhos do que Marieta de Morais Ferreira (2002) definiu como “historiadores” e “produtores de memória” (history makers). O segundo grupo seria composto por autores que produzem trabalhos sem se ater aos cuidados metodológicos; esses acabam por considerar suas fontes como se fosse um retrato fiel do que ocorreu no passado. Ao utilizarem relatos orais, reproduzem discursos de memória como história, apresentando assim um ponto de vista particular do ocorrido como um estudo crítico do passado.”

Memória e História não são sinônimos, mesmo que conversem entre si. A História precisa, enquanto ciência, ser crítica, suportada por metodologias. Ser carrasca com as fontes, ir à exaustão com perguntas aos documentos. A memória, esta sim, permite a subjetividade, a parcialidade, a reformulação do passado condicionado pelo presente. Se aproxima-se do tipo de conteúdo apresentado por Gerchmann: uma obra importante, sim, que traz à luz uma discussão de extrema relevância, mas que soa oportuna, visto o contexto de sua publicação. O tema é caro e tanto Grêmio quanto Internacional precisam de suas histórias passadas a limpo, para além das fontes institucionais. Precisam da história, não da memória. Memória os milhões de aficionados produzem diária e incansavelmente.

Se no inverno de 2015 quase fui convencido pelo texto do Gerchmann, três anos depois, Somos Azuis, Pretos e Brancos me causa inquietação. Ainda há muita coisa a ser investigada. Há muita conduta a ser revista nos dias atuais para que não voltamos às crises dos anos 40. Que continuemos a tentar descobrir nossas cores, sobretudo, com rigor.


Referências Bibliográficas:

ALBERTI, Verena. Manual de História Oral. 3ª Ed. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2007

ENDLER, Sergio. Tesourinha.1ª Ed. Porto Alegre: Editora Tchê!, 1984.

GERCHMANN, Leo. Somos Azuis, Pretos e Brancos. 1ª Ed. Porto Alegre: L&PM Editores, 2015

MELO, V. A. et al. Pesquisa Histórica e História do Esporte. 1ª Ed. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2013

 

O mascote do River Plate é uma galinha?

O mascote do River Plate é uma galinha?

Sim.

O River Plate não tem um mascote oficial. No entanto, a imagem de uma galinha passou a ser usada pelo clube depois de uma brincadeira da torcida do Banfield, da década de 1960, que soltou uma galinha branca com uma faixa vermelha, reproduzindo o emblemático uniforme. Quando o River entrou em campo, um torcedor do Banfield soltou uma galinha branca com uma faixa vermelha, reproduzindo o emblemático uniforme. A ave foi chutada para longe pelo atacante Más e depois sacrificada no vestiário do Banfield, o que hoje certamente geraria um escândalo mundial. A brincadeira teve enorme repercussão nos estádios e na imprensa argentina, a ponto de o inventor da gozação jamais ter revelado seu nome com medo de ser agredido pela torcida do River. Chegou a receber ofertas polpudas para aparecer em programas de TVs, mas sempre respondia: “Isto não paga o que vai acontecer comigo”. Ele está com 80 anos e continua exigindo anonimato.

Certa vez, os torcedores do Chacarita Juniors atiraram uma galinha para o campo. O goleiro Pumpido, do River Plate, quis afastar o animal e deu-lhe um pontapé. A ave teve morte imediata no gramado.

“Nem gosto de falar nisso”, confessa o arqueiro. “É um episódio feio da minha carreira.”

Goleiro do River, Nery Pumpido chuta uma galinha em jogo contra o Chacarita em 1984

Bom dia, Mano Menezes

Bom dia, Mano Menezes

Como sou jornalista, jamais minto para meus 6 leitores. Deste modo, dir-lhes-ei AGORA toda a verdade.

No início de 2022, Mano Menezes foi abduzido. Você é inteligente, então não preciso escrever bobagens como “abduzido por extraterrestres”. Em seu lugar, foi colocado um androide de inteligência superior. E o Mano não-humano, o Não Mano, o InuMano, por assim dizer, chegou a escalar Pedro Henrique, Alemão (depois Romero) e Wanderson no ataque CONTRA O PALMEIRAS. O jogo acabou 3 x 0 para nós. Só que aquele não era Mano, claro. Imaginem que ele chegou a deixar Edenílson na reserva! Isto prova inequivocamente que se tratava de um androide!

No início deste ano, acabou a experiência alienígena. Eles devolveram o Mano humano, aquele que nem toneladas de Imosec cura a diarreia. Sim, devolveram o c@gão. O que não tem volantes bons e então escala dois, como se a soma de dois ruins resultasse em um bom. Para comprovar, experimentem colocar dois cantores ruins cantando.

Nosso presidente foi enganado: renovou o contrato do Mano Inumano e recebeu um Mano com soltura intestinal. Esqueçam aquele Mano aventureiro que só queria a beleza e o sonho no futebol. Aquele era o androide.

E não briguem com a notícia — não minto.

Abaixo, uma foto do androide de 2022. Saudades dele!

O InuMano foi visto recentemente tocando guitarra no grupo Metallica.

Minha lista dos dez melhores jogadores de futebol de todos os tempos

As dez primeiras posições ficaram com 6 latino-americanos e 4 europeus. Não vou botar em ordem para evitar a briga entre pelezistas, messistas, maradonistas e croifistas.

Di Stefano
Garrincha
Maradona
Messi
Pelé
Ronaldo Fenômeno

Beckenbauer
Best
Cruyff
Zidane

Procurei utilizar nomes de caras que costumam “desaparecer” das listas, mas que acho cracaços. Gente como Scholes, Rivelino, Bremner, Bochini e Rivaldo, por exemplo. Não deu…

Meus times

Eu torço pelo Inter-RS, mas tenho simpatia pelo Liverpool, Arsenal, Manchester United, Benfica, Barcelona, Roma, Napoli e Brasil de Pelotas.

E nutro certa antipatia pelo Grêmio, Juventude, Corinthians, Lazio, Real Madrid, City e Juventus.

Ah, sou muito promíscuo: gosto também do Leeds United, do St. Pauli e de suas histórias.

As mancadas mais vergonhosas de Tite contra a Croácia

As mancadas mais vergonhosas de Tite contra a Croácia

Claro que a Croácia fez uma grande partida e que, apesar disso, tivemos as melhores chances. Claro que a Croácia fez seu gol no único chute que tentou e que isto caracteriza um baita azar nosso, mas mesmo assim cometemos erros primários. Vou citar 3 grandes erros.

1. No primeiro tempo, Vinícius Jr. tinha sempre 3 marcadores pelo lado esquerdo de ataque. Ora, o jogo de futebol é de 11 contra 11 jogadores. O fato de Vini receber marcação especial significava que Raphinha tinha apenas um ou quase nenhum marcador do outro lado do campo. Jamais tentamos viradas rápidas de jogo, nem diretas, nem aquelas que passam por um dos volantes. Passamos o primeiro tempo tentando furar inutilmente uma muralha. E Tite retirou o bom Vinícius… Ele queria que o cara vencesse 3 marcadores?

2. A foto abaixo. Nela, a Croácia recupera a posse de bola e parte para um contra ataque 4 contra 4. Não há problema ter seis caras no campo adversário, mesmo ganhando o jogo e faltando 4 minutos para o final. O problema é que, então, não se pode perder a bola de jeito nenhum. É hora do maldito tiki-taka da Espanha. É hora do passe seguro e improdutivo, não de tentar dribles, bolas altas e outras aventuras. Ou é hora de atacar com poucos, claro.

3. Desde que o samba é samba é assim. Os primeiros batedores de pênatis são os melhores. É uma lei. Tudo para pressionar o adversário. A invenção de deixar Neymar para o bater o último — que ele nem precisou bater — tem nome, Tite: é burrice.

Futebol e rock progressivo

Hoje, cruzei na rua com um amigo, ou ex-amigo, que não vê e nem entende de futebol, mas que o critica, assim como critica quem acompanha a Copa.

Ele começou com seus disparates — que dispara a cada 4 anos — e eu respondi que, para ficar somente na área do entretenimento, ele também jamais saíra da adolescência ouvindo apenas besteiras perecíveis. Perguntei quando ele iria chegar ao jazz e além. Mais: falei que o rock progressivo que ele ouve é um simulacro para intelectuais de péssimo ouvido.

Não concordo inteiramente com o que disse, disse mais para contrapor, mas ele deu meia volta e foi embora ofendido. Estou mesmo sem paciência e um pouco culpado, imaginando quantos discos do Yes ele vai ouvir hoje…

Viram França e Inglaterra hoje? Quem passa?

As 3 vezes que vi Pelé ao vivo

As 3 vezes que vi Pelé ao vivo

A primeira foi em 68, no Olímpico, contra o Inter, pelo Robertão. Eu tinha 11 anos e era a data de aniversário de Pelé, que completava 28 anos. Levaram um enorme bolo pra dentro do campo. O jogo foi 3 x 1 pro Santos e ele passou o jogo inteiro dando passes geniais. Fez o terceiro do Santos. Não lembro do gol. Lembro do nosso, marcado por Claudiomiro.

Depois, vi-o no Festival de inauguração do Beira-Rio em 69, num amistoso contra a Argentina. Brasil 0 x 1 Argentina. Ele, muito marcado, fez pouco. Lembro que Tostão jogou demais naquela noite de segunda-feira, mas perdemos. E era a grande Seleção do Saldanha. Perfumo anulou Pelé.

Por último, vi-o novamente no Beira-rio contra o Inter. Inter 0 x 2 Santos pelo Brasileiro. Foi entre 71 e 74, sei lá. Mas do resto tenho certeza. Houve um momento em que Pelé foi matar uma bola e ela bateu em sua canela. Todo mundo riu e vaiou. Já vi atitudes mais inteligentes. Logo depois, Edu cruzou uma bola fortíssima a meia altura para a área do Inter. A bola era para Pelé. Ele ergueu a perna e, mais tirando o pé do que chutando, fez com que a redonda batesse na parte interna de seu pé direito, subisse por cima de Gainete e entrasse no gol. A torcida do Inter aplaudiu. Fazer o quê?

Esta última imagem é a que fica comigo quando penso em Pelé. Esta e a daquela cabeçada no Estádio Azteca. Quando ele morrer, tenho certeza de que lembrarei delas e da crueldade do tempo.

Você entende de futebol?, de Carlos Guimarães

Você entende de futebol?, de Carlos Guimarães

Em casa, eu vejo futebol com o som da TV desligado. Não suporto os clichês vazios da maioria dos comentaristas do esporte. Na verdade, não há grandes conhecedores entre os analistas de táticas de futebol e quem se preocupa — ou enxerga — a parte tática, fica muito decepcionado com o papo, ainda mais que sua paixão está envolvida.

Então, o mediador (ou tradutor) entre o que se vê e o que é comentado é bastante insatisfatório.

Mas há uma nova geração de jornalistas-conhecedores ou estudiosos. Infelizmente, estes ainda não chegaram às grandes redes.

Um deles, na minha opinião o melhor dentre os gaúchos, acaba de lançar seu segundo livro: “Você entende de futebol?”, com o substítulo “E outros ensaios sobre o jogo e a mídia”.

Seu nome é Carlos Guimarães e seus textos jamais ofenderão sua inteligência. Sim, ele é o herdeiro de Ruy Carlos Ostermann e Lauro Quadros.

E estará autografando o livro na próxima quinta-feira aqui na Bamboletras. Apareça aqui para pegar seu exemplar autografado e levar um papo com o Carlos. Talvez ele saiba quem vai ganhar a Copa…

Carlos Guimarães

1966, a Copa divisora de águas: Pelé caçado, Rattín expulso

A Copa do Mundo de 1966, na Inglaterra, foi um divisor de águas na história das Copas. Foi a primeira a ser disputada na casa dos ingleses e estes queriam aproveitar a oportunidade para ganhar o título pela primeira vez. Foi uma das Copas mais violentas já disputadas.

Até 66 não podia ser feita substituição de jogadores durante os jogos. Se alguém se machucasse não podia ser substituído. A seleção tinha que jogar com menos jogadores. Alguns exemplos foram se acumulando. Logo na primeira Copa, o goleiro André Thepot, da França, foi substituído pelo zagueiro Chantrel quando se contundiu durante o jogo. Em 58, num lance casual com Vavá, o zagueiro Jonquet, da França, quebrou a perna. Em 62, Pelé se contundiu sozinho no jogo contra a Tchecoslováquia e não pode ser substituído.

Em 66, Pelé foi caçado no jogo contra Portugal e passou a fazer número em campo, tudo às vistas do juiz inglês. Foi um jogo absolutamente inacreditável nos dias de hoje. Portugal tinha um bom time, tinha Eusébio, mas abusou demais na violência.

Outro fato decisivo foi a expulsão do capitão argentino Rattin no jogo contra a Inglaterra. O juiz era da Alemanha, não falava inglês, nem Rattin. O Rudolf Kreitlein expulsou o argentino por indisciplina e pela expressão do rosto de Rattín, embora o alemão não entendesse espanhol. Os argentinos reclamaram, alegando nenhum motivo da expulsão de Rattín, que solicitou um intérprete. O jogo parou por dez minutos, antes que Rattín saísse. Ele se recusou a sair de campo e acabou sendo escoltado por vários policiais. Não satisfeito, pegou uma bandeira do Reino Unido e amassou. Por isto, a FIFA obrigou os árbitros a utilizarem cartões amarelos e vermelhos.

Estes dois fatos contribuíram para as medidas tomadas para a Copa de 70, no México. Já poderiam ser feitas duas substituições durante o jogo e hoje já evoluiu para três e até quatro se tiver prorrogação. E foram instituídos os cartões amarelos e vermelhos para facilitar a comunicação entre árbitros e jogadores.

Um Outro Futebol, de Roberto Jardim

Um Outro Futebol, de Roberto Jardim

A importância do futebol no Brasil não se reflete em nossa literatura. Há alguns grandes livros, mas o volume de publicações é infinitamente menor do que o espaço que o futebol ocupa na vida, na cabeça e nas conversas dos brasileiros, para não falar nos vastos espaços concedidos ao esporte nos veículos de comunicação. Então, quando é lançado um livro que faz uma minuciosa intersecção entre o esporte e a vida aqui fora — refiro-me à política, ao racismo, às ditaduras, à homofobia e ao futebol feminino, coisas que a imprensa, digamos, “não gosta muito de falar” — temos que saudá-lo.

A obra de Roberto Jardim cumpre brilhantemente o que promete. É realmente um outro futebol, uma outra abordagem. Temos 204 páginas de pequenos textos abordando fatos em sua imensa maioria desconhecidos do público futebolista. Eu mesmo, um viciado em futebol, ignorava a esmagadora maioria do que é (bem) narrado no livro. Há jogadores e técnicos que foram verdadeiros heróis e há tristes vítimas.

O que fica claro é que a intersecção que citei é bem maior do que se imagina. E todos os que pensam que o futebol não se mistura com política — que é o que diz fazer a Fifa, um dois vilões do livro –, minha nossa, não há nada que os defenda. O futebol é uma grande repositório de metáforas e conhecimento e, como tal, vive não apenas dentro das quatro linhas ou dos estádios.

Times de refugiados, times e jogadores insultados, mulheres proibidas de jogar futebol, lutas pela democracia em diversos países, farsas, homofobia, está tudo no livro de Jardim. Há muitos casos que deveriam ser conhecidos. Se tivéssemos mais futebol em nossa ficção, vários deveriam servir de inspiração a autores, tais suas forças. Por exemplo, o caso do jogador inglês Justin Fashanu — que li na fila para votar — me tocou profundamente pela absoluta falta de saída para um jogador que sai do armário. O bombardeio que ele sofreu foi implacável e deu no que deu. Outro exemplo, você sabia que o futebol feminino foi proibido no Brasil por Getúlio Vargas em 1941 e só permitido em 1979? Sim, o preconceito gerou 38 anos de proibição.

Confessadamente inspirado em Futebol ao Sol e à Sombra, de Eduardo Galeano, Um Outro Futebol é um grande livro que recebeu texto introdutório de Xico Sá e orelha de Sérgio Rodrigues.

Recomendo!

Obs.: o livro terá lançamento no próximo sábado (15 de outubro), às 16h30, na Bamboletras, com a presença de Luís Augusto Fischer, Leo Oliveira e de vocês!

Roberto Jardim

Taison

Eu sei que Taison pouco fez em 2022, mas acho que seu retorno ao Inter valeu e muito. Ele foi protagonista no Gre-Nal mais importante deste século — aquele que mostrou ao pessoal do Humaitá qual seria seu lugar este ano. Nós vencemos com aquele gol dele de cabeça. Quando eles pensavam que poderiam retirar a tampa do caixão no Beira-Rio, ele foi lá e pregou a coisa. Foi fundamental e até hoje fico feliz de entrar no GloboEsporte sem vê-los no grupo da elite.

Arerê, Taison!

Eu e meus foras

Eu e meus foras

Como todo mundo está fazendo, agorinha eu e Elena falávamos sobre a Ucrânia quando eu comecei a citar os ucranianos que conhecia. E eu citei Shevtchenko, goleador no Milan e grande jogador de futebol.

Minha mulher me olha com aquele ar de desalento sem fim, pois pensava que eu, um (pseudo)erudito, falava de Tarás Hryhórovych Shevtchénko, o maior poeta do país.

Na opinião dela, isto é como conhecer Beethoven só como o cachorro do filme. E, para mim, taras sempre foi outra coisa.

Tarás Hryhórovych Shevtchénko (Moryntsi, 1814 — São Petersburgo, 1861)

Lupi, dor de cotovelo e hino do Grêmio

Lupi, dor de cotovelo e hino do Grêmio

Eu estava agorinha explicando para a Elena o que era Música de Fossa, cantando partes de canções de Maysa e Lupicínio. Não chegava a ser exatamente um seminário sobre dor de cotovelo, mas quase. Então, eu lhe disse que toda a grande obra de Lupi eram os vários opus de suas frustrações amorosas à exceção de uma música.

— Qual é?
— O hino do Grêmio.
— Quer dizer que eles chamaram um derrotista para escrever seu hino???

Neste momento me caiu a ficha.

Aliás, várias fichas.

Lupicínio Rodrigues: autor do hino daquele time

O Walking Football

O Walking Football

Lembrando Santiago Ortiz Monsalve

Eu não conhecia o walking football. Quem primeiro conversou a respeito comigo — pois o praticava no País de Gales — foi o Santiago citado acima. Ele, apesar de jovem, jogava o walking football com pessoas idosas em Swansea e dizia que era complicado porque em hipótese alguma podia-se correr atrás da bola. Só se pode caminhar, sempre com um pé no chão, como a marcha atlética das Olimpíadas, por exemplo. Como driblar, como evitar que a bola nos fuja? Como se calcula o chamado ponto futuro? Como se bate uma falta?

Bem, nunca joguei, mas o walking deve ser ótimo. Imagine seguir jogando futebol, mesmo depois dos 60 anos? Imagine um futebol inclusivo e preparado para ter menor impacto físico e que ao mesmo tempo favorece uma longevidade ativa?

O esporte pode ser praticado tanto em ambientes internos quanto externos e existem milhares de times em todo o Reino Unido, com jogadores com mais de 50, 60 e 70 anos. O esporte também se tornou popular entre mulheres.

Embora baseado no futebol, o walking tem cerca de 50 diferenças em relação ao futebol padrão. Por exemplo, se um jogador corre, é marcado um tiro livre para o adversário. Essa restrição, juntamente com a proibição de carrinhos, tem como objetivo evitar lesões e facilitar a prática do esporte por aqueles que são fisicamente desfavorecidos. O jogo era originalmente jogado sem goleiros — embora haja variações — e a bola nunca deve ser chutada acima da altura da cabeça. Diferentes bolas são usadas nas variações indoor e outdoor do esporte. E o tamanho do campo pode variar para se adequar a diferentes locais.

E mais não sei, mas gostaria de tentar.