Play, jouer, spiel para música, jogos, brincadeiras

Em inglês, se diz “play football”, mas também “play music”. Quando as crianças brincam também se diz “play”.

Em alemão, jogar futebol é “Fußball Spielen” e se diz “spiel Musik” para tocar música. (Para jogar cartas é “Karten spielen”).

Em francês se diz “jouer de la musique”. Ou seja, aqui também o sentido de tocar música vem do jogo. Para jogar xadrez usa-se igualmente o verbo “jouer”.

Certamente, tais usos indicam que a música era e é também entrenimento.

Nos saraus, as pessoas circulavam em torno dos músicos em ação como se estes estivessem jogando xadrez.

Nas residências onde havia instrumentos, as pessoas pegavam partituras e convidavam alguém para jogar, para brincar de música de câmara. Muitas vezes, os músicos, amadores ou não, desconheciam a partitura apresentada. E tocavam tudo na primeira leitura. Ou à primeira vista, como dizem os músicos.

Mesmo Schubert, que participava de saraus chamados schubertíadas — na verdade saraus onde eram executadas obras suas –, costumava aparecer com novas partituras debaixo do braço que eram tocadas à primeira vista. Muitos dos seus lieder (canções) foram estreados deste modo.

Calma, a Elena e o Carrara ensaiaram o que vão tocar hoje, mas gostaríamos de recuperar — aqui nesta sala da Bamboletras, com o piano do StudioClio — este espírito de jogo da música de câmara. De jogo entre os músicos. Para nossa alegria e fruição.

Meus 66 anos e o recital de Elena Romanov e André Carrara

Ontem tivemos uma noite sublime proporcionada por Elena Romanov e André Carrara na Livraria Bamboletras. Todo mundo saiu entre o sorridente e o emocionado e olha que observo há mais de 50 anos as caras em pós-concertos. Conheço as feições transformadas das pessoas após a satisfação musical.

Como o recital foi um presente pedido por mim e apresentado por mim — me meti até no repertório… — vou deixar aqui o depoimento de alguns dos presentes. Sintam a temperatura dos mesmos:

Zeca Azevedo: Ontem às 20h, na Livraria Bamboletras, tive o privilégio de presenciar o recital de Elena Romanov (violino) e André Carrara (piano), no qual eles interpretaram magnificamente sonatas de Handel, Schubert e Beethoven. Música de beleza incomparável, que capturou meu cérebro de batráquio miserável de tal modo que anulou todos os demais pensamentos/ruídos produzidos por ele. Foi entrega total à música (como deve ser). Fui rebocado de casa pelo querido amigo Roberto Malater Guimarães e a experiência valeu a pena. Tive a oportunidade de parabenizar o igualmente querido Milton Ribeiro pelo aniversário, comemorado em altíssimo nível com o citado recital, o primeiro de uma série de eventos do tipo que acontecerão na Bambô, e de conversar bastante com alguns dos presentes no local, pessoas inteligentes e acessíveis. Como não podia deixar de ser, voltei para casa com um CD (“Avenida Angélica”, de Vitor Ramil) e um livro (“Intocável”, alentada biografia de Michael Jackson). Foi o de sempre: custo a sair de casa, mas quando saio geralmente gosto muito da experiência. É que sou esperto e seletivo: saio de casa quando sei que vou me divertir e me instruir de verdade.

Bernardo Frederes Kramer Alcalde: Milton, eu não tenho palavras para definir o que aconteceu ontem… É difícil até de pensar a respeito – porque mesmo pensar exige alguma ordem, uma hierarquização, um senso de prioridade… E quando tudo é essencial e inevitável e imprescindível, o que deixar de lado, o que deixar para depois?

Diante de todas as minhas limitações emocionais e intelectuais para lidar com tudo isso, vou suprimir o ego e as pretensões e me limitar a um pouco, muito sincero: muito obrigado. Eu nunca vou esquecer dos teus aniversários de 66, dia em que nos abraçaste com todos os teus sacerdócios – letras, notas, camaradagem… e até derrota do Inter. Com direito a igreja e tudo…

]Por favor, transmita minhas felicitações e agradecimentos à solista.

Cláudia Beylouni Santos: Glympses da celebração do aniversário do querido Milton Ribeiro @miltonrib , em que a querida e maravilhosa Elena Romanov Elena Romanov tocou em duo com o excelente André Carrara @andrecarrarapiano , assim estreando os saraus a se realizarem na Livraria Bamboletras @bamboletras com o magnífico PianoClio do @studioclio .

O ambiente estava muito gostoso, próprio ao prazer mesmo. As lindas almofadas arranjadas para nos acomodarmos à vontade no gargarejo me remeteram às livrarias com vida intrínseca e voltadas ao cerne de sua função na comunidade e no humano, como é a Bamboletras. Muito querido o detalhe de o Milton homenagear a sua mãe, cujo protetor de teclado agora volta à ativa.

Foi uma noite muito bonita. A música nos arrepiou. O ingresso era a compra de um livro, o meu escolhido foi A Filosofia de Andy Warhol, obra que eu não conhecia, mas imagino bem própria a ajudar a se sobreviver aos tempos de cada vez maior culto a celebridades pela celebridade em si, da mais insignificantemente provinciana à mais universal, com tão pouca ou nenhuma conexão ao valor essencial que eventualmente traduzam.

Esqueci de deixar a contribuição espontânea, que terei muito gosto em fazer oportunamente: a música de excelência oferecida merece toda a nossa retribuição. Que seria de nossa alma sem esse bálsamo? Foi uma noite aconchegantemente muito amorosa de comunhão de arte em estado puro e por sua própria virtude nos fazendo bem. Longa vida aos saraus na Bambô!

Iracema Gonçalves: Adorei a estreia do espaço musical da Bamboletras. Os músicos estavam maravilhosos em especial minha cunhada! Belo presente de aniversário!!!
Feliz novo ano!! Muita saúde, o resto se corre atrás!!!🥰❤️😘😘😘

Maria Luiza Bastian: Amei o recital, Elena toca para meu coração, profunda, tocante, lágrimas contidas o tempo inteiro. Amei também a última peça, a do bis.

Lucia Ramos da Silva: Nós, os convidados, recebemos de presente uma apresentação de excelência. Pra sonhar e recordar. Viva a Bamboletras!
Obrigada Milton Ribeiro!

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Não tenho palavras para agradecer a Francisco Marshall pelo piano e a competência do Person Losekann Fontes no preparo do mesmo. Vocês são demais.

Abra e Leia, lido por Rafaela Dilly Kich

Publicado no Instagram da autora.

Um dos aspectos mais belos do ato da escrita, a meu ver, é a possibilidade de eternizar o cotidiano em palavras.

“Abra e Leia”, livro de contos de Milton Ribeiro (@editorazouk, 2021) é exatamente isto: um presente elegante que, ao ser desembrulhado, traz histórias que provocam lágrimas, riso, reflexão social, alívio à mente.

Também uma importante lembrança de que a vida “comum” é, em verdade, uma profusão borbulhante de pequenos grandes atos magníficos – ora sincrônicos, ora caóticos.

Atos estes que conduzem a leitora e o leitor a, invariavelmente, lembrarem de suas próprias perdas, ganhos, sortes, azares e amores vividos.

Como ocorre quando se escuta uma orquestra, Milton convoca também nossa subjetividade à interpretação: alguns contos parecem inacabados. Um convite à imaginação.

E, de fato, se não houvesse a palavra somada à imaginação, para onde iriam todas estas histórias?

Grata a ti, @miltonrib, por eternizá-las.

O autor que se propõe a observar a vida sob a lente do detalhe, do aparentemente banal – e nem por isso menos extraordinário – é um ser humano generoso, acredito.

E a ti que me acompanha por aqui, fica esta baita dica de leitura. 😊