Uma contribuição para os dicionários: o cu na língua portuguesa

Uma contribuição para os dicionários: o cu na língua portuguesa

Mas há muito mais:

— Só se tirar do cu com pauzinho (falta de recurso).
— Quem tem cu, tem medo.
— A boca fala, o cu paga.
— A língua é o rebenque do cu.
— No cu não vai nada? (quando quiserem te fazer alguém de otário).
— Cuzão (várias acepções).
— Pau no cu (várias acepções).
— Quem tem cu, tem medo.
— Cu cagado (pobre).
— Parece que nem senta em cima do cu (esnobe, sem noção).
— Não tem cu e quer ter sobrecu (pessoas que gastam demais ou que se consideram superiores).
— Cu de ferro (pessoas que estudam muito).
— Abaixo do cu do cachorro (pessoa muito chinelona).
— Cu de arrasto (cagalhão, bunda mole. baba ovo, baba egg, lambe saco, puxa saco, Bibo Nunes).
— Cu de boi (situação sem freio, sem limites).
— Tá com cu que é uma rosa (pessoa que está se ferrando a torto e a direito. Pessoa azarada ou com grande prejuízo).
— Não tem merda no cu pra cagar (é metido).
— Estar com o cu fazendo bico (estar de buxo cheio, comeu demais).
— Baita cu-de-boi (confusão).
— O bom e velho “vai toma no cu” (embora controverso ainda não perdeu a elegância).
— Ralar o cu no prego (trabalhar feito um condenado e ganhar uma ninharia).
— Cuiudo (sortudo).
— Não me fode o cu a beijos (não tenta me enrolar).
— Nem passando um arame farpado pelo cu (não faço de jeito nenhum).
— Tá com o cu que não passa nem sinal de wi-fi (a pessoa fez algo errado e agora está com medo das consequências).
— No cu, papagaio (vá se foder).
— Cu de bêbado não tem dono.
— Cu man (homem asqueroso).
— Não tem um cu que o periquito roa (é pobre — Amapá).
— Tá com o cu na reta (vai se envolver em alguma merda).

Dia Nacional da Consciência Negra: os cartões-postais dos linchamentos da Ku Klux Klan

Dia Nacional da Consciência Negra: os cartões-postais dos linchamentos da Ku Klux Klan

Retirado daqui.
Tradução livre deste blogueiro

A humanidade pode ser pior do que você imagina, muito pior.

Terrorismo é definido como “o uso de violência e intimidação na busca de objetivos políticos”. A mídia ocidental gosta de pintar terroristas com rostos morenos, mas uma das mais horríveis campanhas de terror aconteceu no século passado em solo norte-americano — os estimados 3.436 linchamentos de homens e mulheres negros americanos entre 1882 e 1950, com o objetivo de controlar e intimidar a população negra pouco antes libertada. Não muitas coisas são mais perturbadoras do que ser confrontado com a evidência visual do lado sombrio da humanidade, especialmente quando são evidências de um ódio generalizado e da violência de um ser humano para com o outro. Este ódio veio do medo e foi impulsionado pela religião e pela crença de que os assassinatos são atos de moralidade. Esta violência visava intimidar e suprimir quaisquer aspirações que uma comunidade possa ter por igualdade e um futuro melhor.

Quando me deparei com a coleção de cartões-postais norte-americanos de James Allen e John Littlefield, publicada em um livro intitulado Without Sanctuary: Lynching Photography in America, notei quão importante é conhecer essas imagens, hoje mais do que nunca. Esses cartões-postais foram feitos para comemorar eventos que fizeram muitos brancos norte-americanos se sentirem orgulhosos — de sua raça, de sua superioridade, de sua civilização e de sua inteligência. Eles tiraram fotos de suas realizações nojentas e covardes para serem conhecidas e lembradas. Nas costas, eles escreveram para amigos e familiares numa empolgação de sociopatas. Esses cartões-postais capturam turbas testemunhando com alegria o assassinato de rapazes e moças, cujo crime mais grave foi a cor da pele. Os cadáveres pendurados e carbonizados nesses cartões-postais viviam em um mundo que contava os dias até seu assassinato, a partir do momento em que colocavam ar em seus pulmões infantis. Essa história é poderosa, de revirar o estômago e de importância essencial. E o mais impressionante sobre essas fotos é que elas não apagam os perpetradores como muitas histórias e memoriais fazem hoje, preferindo focar em quem foi vitimado em vez de naqueles que orgulhosamente — e com o apoio do governo — torturaram, estupraram e assassinaram pessoas. Os assassinos nessas fotos estão orgulhosos, são homens adultos olhando para a câmera com a convicção sorridente de que o adolescente que eles acabaram de matar, um contra cem, merecia seu ódio, medo e frustração. Nenhum grande júri era necessário; a lei estava nas mãos dos assassinos. 

A história não é linear. A história está acontecendo ao nosso redor, o tempo todo. Essas fotos são contexto, são realidade, são fotos do terrorismo norte-americano. Esteja ciente de que essas fotos são repugnantes e muito reais.

O linchamento de Elias Clayton (19 anos), de Elmer Jackson (19) e de Isaac McGhie (20), em 15 de junho de 1920, Duluth, Minnesota.

Por James Allen

Eu tenho um brique, sou um catador, um colecionador. É minha vida e minha vocação. Eu procuro itens que algumas pessoas não querem ou não precisam mais e os vendo para outros que precisam. As crianças são catadoras naturais. Eu fui uma delas. Eu brincava com isso desde quando colecionava abelhas em potes.

Meu pai trazia para casa sacos de lona estufados com nomes de bancos, sacos de moedas de cobre ou meio dólar e nós, crianças, sentávamos em volta dos montes de moedas como se estivéssemos em volta de uma fogueira e gritávamos sons de bingo quando encontramos alguma moeda especial.

As mães não aconselham seus filhos a serem catadores. Nenhum adulto deseja ser chamado disso. No Sul dos EUA, é um termo pejorativo. É coisa de gente muito humilde e ignorante, talvez ladra. Tenho tentado trazer dignidade a meu trabalho, viajando incontáveis ​​estradas em meu estado natal, adquirindo coisas que creio serem úteis e reveladoras — móveis feitos à mão, potes feitos por escravos, colchas remendadas e bengalas esculpidas. Muitas pessoas que me vendem estão sobrecarregadas de bens, ou prontas para irem para o lar dos idosos ansiando pela morte. Alguns são vendedores são relutantes, outros ansiosos. Alguns são amáveis, gentis e acolhedores, outros são mesquinhos, amargos e meio enlouquecidos pela vida e pelo isolamento. Nos EUA tudo está à venda, até uma vergonha nacional. Um dia, deparei-me com um cartão-postal de um linchamento. Os cartões-postais pareciam triviais para mim, eram produtos de segunda mão. Ironicamente, a busca por essas imagens me trouxe um grande senso de propósito e satisfação pessoal.

O linchamento de Thomas Shipp e Abram Smith. Este foi um grande encontro de linchadores acontecido no dia 7 de agosto de 1930, em Marion, Indiana. Inscrito a lápis na moldura: “Bo aponta para seu niga.” Fora da moldura está escrito: “Klan 4º Joplin, Mo. 33.” Achatadas entre o vidro e o papel há cabelos da vítima. ”
Este é o cadáver carbonizado de Jesse Washington suspenso em um poste. O verso diz “Este é o churrasco que fizemos ontem à noite, minha foto está à esquerda com uma cruz sobre seu filho Joe.” 16 de maio de 1916, Robinson, Texas.

O estudo dessas fotos gerou em mim um enorme medo dos brancos, medo da maioria, dos jovens, da religião, dos aceitos. Talvez certo cuidado a respeito dessas coisas já estivesse em mim, mas certamente não tão ativamente como após a primeira visão de um frágil cartão-postal de Leo Frank morto em um carvalho. Não foi o cadáver que me impressionou, foram os rostos delgados como cães de uma matilha, circulando atrás da morte. Centenas de mercados de pulgas depois, um comerciante me puxou de lado e em tom conspiratório me ofereceu um segundo cartão, este de Laura Nelson, presa como uma pipa de papel em um fio elétrico. A visão de Laura criou uma camada de pesar sobre todos os meus medos.

Acredito que os fotógrafos destes cartões foram mais do que espectadores dos linchamentos. A arte fotográfica desempenhou um papel tão significativo no ritual quanto a tortura. A luxúria impulsionou sua reprodução e distribuição comercial, facilitando a repetição infinita da angústia. Mesmo mortas, as vítimas não tinham abrigo.

O linchamento de JL Compton e Joseph Wilson, vigilantes. Ocorreu no dia 30 de abril de 1870, em Helena, Montana. A inscrição impressa no canto superior direito diz: “Hangman’s Tree, Helena Montana”. O verso deste cartão afirma: “Mais de vinte homens foram enforcados nesta árvore durante os primeiros dias.”
O corpo espancado de um homem afro-americano, apoiado em uma cadeira de balanço, roupas respingadas de sangue, tinta branca e escura aplicada no rosto e na cabeça. Na parede, há a sombra de um homem usando uma vara para apoiar a cabeça da vítima. Postal de 1900.

Essas fotos provocam em mim um forte sentimento de negação e um desejo de congelar minhas emoções. Com o tempo, percebo que meu medo do outro é medo de mim mesmo. Então, esses retratos, arrancados de outros álbuns de família, tornam-se os retratos da minha própria família e de mim mesmo. E os rostos dos vivos e os rostos dos mortos se repetem em mim e na minha vida diária. Já vi John Richards em uma estrada remota do condado, balançando-se em passadas de cavalinho de pau, cabeça baixa, olhos no chão. Já encontrei Laura Nelson em uma mulher pequena e robusta que atendeu minha batida na porta de uma varanda dos fundos. Em seus olhos profundos, observei uma multidão silenciosa desfilar em uma ponte de aço brilhante, olhando para baixo. E na Christmas Lane, a apenas alguns quarteirões de nossa casa, Leo, um menino pequeno, com a fralda da camisa para fora e o boné descentrado, vai para as orações do sábado.

A silhueta do cadáver do afro-americano Allen Brooks pendurado no arco em Elk, cercado por espectadores. O linchamento aconteceu em 3 de março de 1910 na cidade de Dallas, Texas. Inscrição impressa na borda, “LYNCHING SCENE, DALLAS, MARCH 3, 1910”. Inscrição a lápis na borda: “Tudo bem e gostaria de receber um postal seu, Bill’. O verso do cartão diz “Bem, John – este é um registro de um grande dia que tivemos em Dallas … Um negro foi enforcado por agressão a uma menina de três anos. Eu vi a agressão.”
Os cadáveres de cinco homens afro-americanos, Nease Gillepsie, John Gillepsie, “Jack” Dillingham, Henry Lee e George Irwin com espectadores.6 de agosto de 1906. Salisbury, Carolina do Norte.
Cartão postal do linchamento de Will James, Cairo, Illinois 1909
Bennie Simmons, ainda vivo, embebido em óleo de carvão antes de ser incendiado. 13 de junho de 1913. Anadarko, Oklahoma.
O linchamento de Leo Frank. 17 de agosto de 1915, Marietta, Geórgia. Sobreposta à imagem: “o fim de Leo Frank, enforcado por uma turba em Marietta. Agosto 17. 1915. ”

Imagens do linchamento de Frank Embree, Fayette, Missouri 1899

Que tal uma dica de gramática?

Autor desconhecido

Vamos com uma que quase todo mundo tem dificuldade:

POR QUE/ PORQUE / POR QUÊ/ PORQUÊ – DOMINE A ORTOGRAFIA DE UMA VEZ POR TODAS! 👇

1) Use “por que” (separado, s/ acento) em perguntas: “Por que a Michele recebeu R$ 89 mil do Queiroz?

2) Use “porque” (junto, s/ acento) em respostas: “Porque eu precisava dar um jeito de receber o $ das rachadinhas”.

3) Use “por quê” (separado, c/acento) quando estiver no final de perguntas, próximo ao ponto de interrogação. “Mas todo mundo sabia que esse traste não valia nada, votaram nele por quê?

4) Use “porquê” (junto, com acento) quando estiver substantivado. Se não souber o que isso significa, use quando a palavra puder ser substituída por “a razão”. “O combate à corrupção nunca foi o porquê de a elite ter votado nele”.

Negligência de governos destrói o Museu Nacional: acompanhe a sequência do corte de verbas

Negligência de governos destrói o Museu Nacional: acompanhe a sequência do corte de verbas

Um incêndio consumiu quase todo o Museu Nacional do Rio de Janeiro. Há apenas dois meses, a instituição tinha comemorado os 200 anos de sua criação.

O Museu foi fundado por Dom João VI em 1818 e possuía o quinto maior acervo do mundo, com mais de 20 milhões de peças, e era referência para pesquisadores de várias áreas. Suas obras contavam uma parte importante da história antropológica e científica da humanidade.

Lá estava o fóssil — com mais de 11 mil anos — de Luzia, a mulher mais antiga das Américas, cuja descoberta nos anos 1970 alterou todas as pesquisas sobre a ocupação da região.

Também havia a reconstrução do esqueleto do Angaturama Limai, o maior dinossauro carnívoro brasileiro, com quase todas as peças originais, algumas com 110 milhões de anos.

Foi queimado igualmente o sarcófago da sacerdotisa Sha-amun-em-su, mumificada há 2.700 anos e presenteada a Dom Pedro 2º em 1876, e que nunca tinha sido aberto. A coleção de múmias egípcias e a de vasos gregos e etruscos evidenciam o perfil mundial do acervo, que também abrigava o maior conjunto de meteoritos da América Latina.

Porém Bendegó, o maior meteorito já encontrado no país com mais de 5 toneladas, sobreviveu intacto.

.oOo.

O Museu Nacional encontrava-se sob a guarda da UFRJ, ou seja, sofrendo com os cortes da Educação, recebendo apenas R$ 13.000 de manutenção mensal para seus 20 milhões de itens de História e Arte brasileira. Não me digam que o incêndio de hoje não é resultado das políticas da quadrilha — com Supremo, com tudo — que atualmente ocupa o Planalto, que não é resultado do Centrão que está destruindo o país há bem mais de um governo. Claro, o governo anterior igualmente não tratou nada bem a cultura — imaginem que o Museu teve de fechar as portas, em 2015, por falta de verbas para o pagamento dos funcionários, em pleno governo Dilma. Mas é agora que se orquestra um grande ataque à cultura. Os governos estaduais e municipais começaram a combater o meio cultural do país que não os apoia. Sartori e Marchezan estão fazendo o seu tanto do RS e em Porto Alegre, assim como Pezão e Crivella no RJ.

Aliás, no mesmo sentido, Bolsonaro defende a extinção do Ministério da Cultura… Ele pensa que uma secretaria seria o suficiente para tratar do assunto.

Vejamos: em 2014, ano em que as atenções estavam voltadas para as arenas da Copa do Mundo, foram repassados apenas R$ 427 mil para o Museu. Em 2015 foi ainda pior: R$ 257 mil. Subiu um pouco em 2016, R$ 415 mil. No ano passado, foram 246 mil e agora, no ano do bicentenário, somente R$ 54 mil. A estrutura apresentava sinais visíveis de má conservação, como fios elétricos expostos e paredes desencascadas, rachaduras na estrutura, sem falar na falta de dispositivos anti-incêndio. A Petrobras, através da Lei Rouanet, ajudou a manter o museu até a Lava a Jato. Com a crise da empresa, cessou o patrocínio.

Bem, o dinheiro destinado para a manutenção do Museu Nacional era equivalente a 10 auxílios-moradia do Judiciário. Agora, nem precisam mais ter esse gasto. Me apavora o fato de que o Theatro Municipal, o MAM, o Jardim Botânico, o Real Gabinete Português, a Biblioteca Nacional, etc., — para não falar em instituições de outros estados –, estejam sob as mãos de governantes como os nossos. Já o STF e o Congresso Nacional devem estar limpíssimos e conservadíssimos, ao menos seus prédios.

Foto: Mídia Ninja

A mais bela e estarrecedora capa de revista (Planeta ou Plástico?)

A mais bela e estarrecedora capa de revista (Planeta ou Plástico?)

“Planeta ou plástico?” A capa da nova edição da revista National Geographic é impactante: traz um saco plástico como iceberg. Nos EUA, no Reino Unido e na Índia, os exemplares serão enviados aos assinantes embalados em papel — o objetivo é que isso aconteça no mundo todo, com todas as edições, até o final de 2019. A revista também está ‘poluindo’ seu feed do Instagram para que os seus 88 milhões de seguidores vejam fotos dramáticas da poluição por plástico pelo mundo. As ações são apenas o início de uma campanha que deve durar anos. “A crise do plástico não foi criada da noite para o dia e não será resolvida assim. Como a marca mais seguida no Instagram e uma empresa de mídia global que atinge consumidores em 172 países, queremos usar nosso alcance para impactar e reunir nossos públicos para resolver desafios globais como a crise dos plásticos”, explicou a diretora de marketing da National Geographic Partners, Jill Cress.

Capa Nat Geo

Gente, propina é para beber

Gente, propina é para beber

“A palavra propina foi inventada pelos empresários para tentar culpar os políticos — ou pelo Ministério Público”, disse Lula ontem.

Pois é, não está correto. Segundo Idelber Avelar, no Facebook, “propina vem do latim ‘propinare’, que quer dizer simplesmente ‘dar de beber’. Propinare vem do grego προπίνω (propíno), formado de προ- (pro, antes) + πίνω (píno, beber): beber antes de alguém, ou seja, fazer um brinde. Propino tibi salutem! Eu te saúdo, antes de beber. Não custa lembrar que em espanhol ‘propina’ significa ‘gorjeta’. A palavra francesa é ‘pourboire’, literalmente: para beber”.

gorjeta

Idelber tem razão e ainda me chamou para que eu invocasse o auxílio de minha mulher Elena. Perguntou a tradução de “davat na tchai”. Fiz a pergunta assim, em não-cirílico, para a Elena, que explicou: “É dar para o chá. É o que você paga para o garçom, o acréscimo pelo serviço. Usa-se também para pagar alguma coisinha acima do combinado para alguém que faz o serviço a fim de que ele possa tomar um chá. Mas é claro que deverá tomar uma vodka”. Completou dizendo que o mais utilizado é чаевые (tchaievíe), mais fino e clássico. Tchékhov, Dostô e Tolstói usavam. O cara deixa a grana na mesa e diz “tchaievíe”.

O Temer poderia dizer que levou gorjeta pois o Joesley o confundiu com um garçom, escreveu um dos comentaristas. Outro lembrou que, em Portugal, propina é uma taxa anual que se paga para frequentar a universidade pública!

Aconselhamento de casais: o último pingo é necessariamente das cuecas?

Aconselhamento de casais: o último pingo é necessariamente das cuecas?

Uma leitora de nosso blog — autodenominada “Nojentinha” — observou atentamente seu marido quando este entrou desnudo no quarto. Recém saído do banheiro, ele se deitou ao lado dela. Ela então viu que na ponta do seu pênis havia uma gotinha de cor amarela. Pior, havia pentelhos polvilhados de gotículas de mesma coloração. Houve choque, gritos, rejeição. O pobre homem foi chamado de nojento, assim como toda a raça masculina — a nossa, imaginem. Sem dúvida, um sério problema matrimonial. Ela me pergunta se tais fatos são normais na vida de casal.

Ora, Nojentinha, infelizmente minha resposta é SIM. Trata-se de um simples problema hidráulico. Imagine uma mangueira com um dos lados fechado. Não adianta atirá-la para todos os lados a fim de que a água saia. Não funciona nem para o mangueirão do jardim nem para a mangueirinha de seu marido.

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Então você provavelmente perguntará: se o porco do meu marido não consegue livrar-se dos pingos logo após a mijada libertadora, por que eles molharão a cueca dali a alguns minutos?

A explicação é simples: a coisa é lenta, Nojentinha. Na medida que algum mililitro (ml) de líquido seja reabsorvido pela uretra marital (ou na medida em que o líquido evapore), estará criada a condição para que o pingo seja substituído pelo ar. Então, quando o pênis ficar em determinado ângulo favorável à entrada de ar, o pingo marital, amarelo e brilhante, pingará sobre a cueca. É tão inevitável quanto a mangueira de seu jardim, que fica mijona após alguns minutos.

Há duas soluções: (1) o seu marido permanecer no banheiro aguardando por todos os pingos ou (2) troque-o por uma mulher.

Os leitores que desejarem outros esclarecimentos sobre a vida adulta podem usar a caixa de comentários. Eu explico tudo.

Ele pode ser maravilhoso, mas vai pingar sua Mash.
Ele pode ser maravilhoso, mas vai pingar sua Mash.

Na Inglaterra, fracassa suicídio coletivo homeopático

Na Inglaterra, fracassa suicídio coletivo homeopático

Notícia antiga, mas plenamente válida em função do que ouvi anteontem no Tuim.

homeopatia

Precisamente às 10:23 da manhã do último dia 30 de janeiro, mais de 400 céticos britânicos ingeriram quantidades maciças de remédios homeopáticos buscando uma “overdose” que, se a homeopatia funcionasse, deveria ter causado sérias consequências. Felizmente, como se queria demonstrar, todos saíram ilesos deste protesto público contra a venda de “remédios” homeopáticos que não possuem qualquer efeito comprovado além do placebo. Uma overdose de pílulas de açúcar não tem efeito maior do que uma bala. De doce, claro.

“Pensamos que não se deveria vender pílulas de açúcar a pessoas que estão doentes. A homeopatia nunca funciona melhor que um placebo. Os remédios são tão diluídos que não há nada neles”, declarou Michael Marshall, da Sociedade de Céticos de Merseyside. E nestas declarações, Marshall estava incrivelmente apenas repetindo as declarações de quem vende tais produtos e mesmo daqueles que os receitam. Explica-se.

Um dos principais alvos da campanha 10:23 foi a cadeia de farmácias “Boots”, que oferece produtos homeopáticos em suas prateleiras lado a lado com remédios que realmente possuem algum efeito. O mais impressionante é que há meses o principal responsável pela rede de farmácias, Paul Bennett, já havia admitido que os produtos são vendidos porque são populares, e não porque sejam efetivos no tratamento de qualquer doença.

“Não tenho nenhuma prova de que esses produtos funcionam. Trata-se da livre escolha do consumidor, e um grande número de nossos clientes crêem que são eficazes”, declarou ao Comitê de Ciência e Tecnologia à Câmara dos Comuns em Londres. A rede de farmácias parece feliz em respeitar a livre escolha de seus clientes quando isto significa lucrar vendendo produtos que não funcionam.

Em resposta ao protesto cético contra a venda de produtos inócuos a consumidores incautos, mesmo o Conselho de Homeopatas da Nova Zelândia já foi forçado a reconhecer que seus produtos não contêm “substâncias materiais”. A porta-voz do conselho, Mary Glaisyer, admitiu publicamente que “não resta nenhuma molécula da substância original”. É reconhecidamente apenas água ou açúcar. Vale repetir, como Bennett reconheceu, sem nenhum efeito comprovado.

Mesmo antes da demonstração cética, um episódio no início de dezembro de 2009 que poderia ser trágico terminou cômico quando a filha do músico Billy Joel, Alexa Ray Joel, tentou se suicidar tomando uma overdose de remédios. O detalhe é que as pílulas eram de “Traumeel”, um produto homeopático para tratar dor nas articulações. Alexa Ray Joel ligou para a emergência e foi rapidamente tratada, mas ainda que não o fosse “nada iria acontecer porque não há nada [no produto]”, disse o Dr. Lewis Nelson, toxicologista do Centro Médico da Universidade de Nova Iorque. Mal sabia ela que estava comprovando a ineficácia dos produtos homeopáticos.

A ausência de qualquer efeito, mesmo em “overdoses” como as ingeridas pelos céticos britânicos, pode soar mesmo benéfica para alguns, já que pelo efeito placebo muitos dizem sentir-se melhores. Tentativas de suicídio que terminam cômicas… que mal haveria na homeopatia? Isto é, além de sustentar uma indústria multimilionária feliz em cobrar altos valores por produtos sem qualquer eficácia real?

Resulta que há prejuízo social muito concreto, incluindo sofrimento e mortes desnecessárias nada engraçadas.

Como relata o jornalista Simon Singh, homeopatas podem oferecer aconselhamento de saúde claramente nocivo. Questionados sobre se pais deveriam imunizar seus filhos com a vacina tríplice, de 168 homeopatas consultados, 77 responderam mas apenas dois indicaram a vacinação. “É evidente que a enorme maioria dos homeopatas não encoraja a imunização”. Aconselhamentos infelizes como estes contribuíram para o ressurgimento de surtos de sarampo em vários países, incluindo o próprio Reino Unido, onde recentemente os casos passaram de dezenas para milhares.

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Vale notar que o surgimento destas milhares de crianças afligidas pela doença muito real e facilmente prevenível está relacionado também com um estudo de 1998 extremamente deficiente supostamente associando a vacina tríplice ao autismo. Andrew Wakefield, autor do trabalho original que espalhou medo e contribuiu para reduzir o número de crianças vacinadas, foi recentemente julgado pelo Conselho Geral de Medicina britânico como tendo agido de forma “desonesta e irresponsável”, com “notório desprezo” às crianças que foram sujeitos de sua pesquisa.

Seria cômico se não fosse trágico: não só seus resultados não puderam ser reproduzidos por ninguém, havendo indicações de que Wakefield os fraudou. Também se descobriu que o médico estava em verdade tentando patentear sua própria vacina tríplice alternativa, além de ser pago para depor em um julgamento defendendo a ligação da vacina tradicional ao autismo, com algumas das crianças em seu estudo sendo filhas dos mesmos pais envolvidos na ação judicial.

Tudo indica que o suposto médico contra as vacinas queria apenas vender suas próprias vacinas. A saúde pública, o bem-estar de milhões de crianças não foi sua principal preocupação, e como consequência, a taxa de imunização caiu e mais de mil doentes ao ano surgiram onde antes surgia apenas um punhado.

A vacina tríplice é segura e múltiplos estudos independentes da Polônia, Dinamarca, Finlândia, o próprio Reino Unidoe Japão provam que e não possui qualquer relação com o autismo – no Japão, a tríplice foi interrompida após 1993, sem qualquer feito sobre os índices de autismo.

Não muito diferentes de Wakefield, as farmácias que produzem e vendem produtos homeopáticos não são iniciativas corajosas contra as grandes indústrias farmacêuticas. Ao invés, a indústria homeopática está mais do que feliz em lucrar com aquilo que não possui efeito comprovado, e reconhecidamente não possui qualquer substância ativa. A medicina alternativa é em grande parte apenas uma forma alternativa de lucrar com doentes sem esperança.

O que só se torna mais revoltante nos casos em que tais doentes podem encontrar esperanças concretas de prevenção e cura na medicina “convencional”. Indo desde a vacinação, um dos mais poderosos recursos médicos a controlar e erradicar moléstias da paralisia infantil à varíola, até casos como o de Daniel Hauser, felizmente curado do câncer pela medicina, ou o de Gloria Sam, infelizmente morta através da homeopatia.

Nada cômico.

Marx e Hegel, “Nietzche” e a Martin Claret

Marx e Hegel, “Nietzche” e a Martin Claret

O PSDB e até Reinaldo Azevedo condenaram o pedido de prisão de Lula, mas gostaria de me deter na piada que é a argumentação do MP. O processo da prisão de Lula deflagrado pelo MP de São Paulo entrará para a história como uma ode à ignorância e à irresponsabilidade. O humor involuntário dos absurdos cometidos é hilariante. No documento, é citada a dupla Marx e Hegel em lugar de Marx e Engels, o que demonstra a total falta de intimidade dos promotores com a história da humanidade e a profundidade ideológica do documento. Além do mais, esqueceram de um “s” no nome de Nietzsche, coisa que um Control C-Control V resolveria mesmo que não se soubesse que a coisa mais típica da língua alemã seja a sequência das letras “sch”. E, como se não fosse suficiente, interpretaram seu conceito de super-homem de forma infantil. Creio que é fundamental também salientar que citaram edições da Martin Claret, a editora que faz as piores e mais vergonhosas traduções em nosso país. Um fiasco criado pela nossa educação de baixo nível e arrogância de altíssimo calibre. Os três patetas abaixo ficarão famosos em todo o mundo ao descortinarem nossa estupidez.

Os Três Patetas: Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo
Os Três Patetas: Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo

Ou seja, são citações que os patetas dos procuradores Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo devem ter copiado de alguém tão culto como eles, mas que aceitaram o desafio de escreverem Nietzsche, errando as letras em um documento oficial que prenderia um ex-Presidente da República e que deveria entrar para a História do país pela porta da Frente.

marx e hegel

Meu amigo Éder Silveira brinca dizendo que o MP teria citado também “O Pequeno Príncipe” de Maquiavel. Acho que a citação deve ter sido “Tu és responsável pelo cativeiro”. Na verdade, meus amigos, a situação do país é tão grave que Engels estaria se passando por Hegel. Mais sério, Outro amigo meu, Alexandre Constantino diz que é “impressionante e preocupante esta falta de qualidade técnica e a voracidade da justiça. Principalmente, se procedimentos assim extrapolam para o cidadão comum, no dia a dia dos processos”. E eu sei que extrapolam. Já senti isto na carne com duas decisões das quais, se não tivessem sido contra mim, daria risadas, como fazem meus amigos até hoje.

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10 proibições surpreendentes que ainda afetam as mulheres em 2016

Da RFI

Dia oito de março marca o Dia Internacional das Mulheres e, se é verdade que muitos avanços podem ser registrados em termo de direitos, ainda persiste uma série de proibições que somente afetam as mulheres.

Campanha das Nações Unidas para os direitos da Mulher
Campanha das Nações Unidas para os Direitos da Mulher

1. Afeganistão: proibido usar maquiagem

Além da maquiagem, as mulheres não podem usar saltos, não podem mostrar os tornozelos ou rir em voz alta. As afegãs também não têm o direito de trabalhar fora de casa e de sair nas ruas sem a presença de um membro masculino da família. Já houve casos de punição com amputação dos dedos por uso de esmalte, que também é proibido.

2. Iêmen: proibido sair de casa sem permissão

De acordo com a lei, uma mulher casada é obrigada a viver com o marido e nunca deve sair de casa sem sua aprovação. Existem poucas exceções, como casos de emergência, por exemplo, ou visita aos pais, se estiverem doentes.

3. Arábia Saudita e Maldivas: vítimas de estupro podem ser punidas

Além de não conseguir proteger as vítimas de estupro, alguns países, como Arábia Saudita, punem essas mulheres por terem saído de casa sem a presença de um homem. Nas Maldivas, uma adolescente de 15 anos, que tinha sido estuprada, foi considerada culpada de “fornicação” e condenada inicialmente a oito meses de prisão domiciliar e a 100 chibatadas. O veredicto acabou sendo cancelado.

4. Brasil: o aborto é autorizado apenas em casos bem definidos

Com o aumento dos casos de microcefalia vinculado ao vírus Zika, o debate sobre a legalização do aborto foi reaberto. É legal abortar apenas quando a gravidez representa um risco à vida da gestante ou quando a concepção foi resultado de um estupro. O ministro da Saúde Marcelo Castro (PMDB-PI) chegou a falar para as mulheres não engravidarem: “Sexo é para amador, gravidez é para profissional”.

5. Somália: proibido usar sutiã

Desde 2009, as mulheres somalis que usam sutiã estão sendo chicoteadas em público pelo grupo radical islâmico Al Shabaab. Elas estão acusadas de violar as leis do islã ao enganar outras pessoas sobre o estado natural dos seios e também suscitando o desejo sexual.

6. Marrocos: vítima de estupro pode ser forçada a se casar com agressor

Em 2012, Amina, uma marroquina de 16 anos, cometeu suicídio depois que um juiz a sentenciou a se casar com seu suposto estuprador, de acordo com uma lei que invalida as acusações de estupro caso as partes decidam se casar.

7. Irã: 77 cursos universitários são proibidos às mulheres

Biologia ou Literatura Inglesa fazem parte dos cursos que as mulheres não podem escolher em 36 universidades do país. Por quê? Um diretor acadêmico avaliou que estas não são disciplinas adequadas à natureza feminina.

8. Arábia Saudita: mulheres não podem dirigir

Se as mulheres não podem dirigir é simplesmente porque “a condução afeta os ovários”, afirmou um líder religioso. “A maior parte das mulheres que dirige carros de maneira repetitiva produzem crianças que sofrem com distúrbios clínicos”, adicionou.

9. Suazilândia: proibido vestir calça

Nesse pequeno país africano, última monarquia do continente, usar calças é considerada uma forma de desrespeito. Recentemente uma mulher foi proibida de participar de uma eleição porque vestia calças. Uma lei parisiense parecida autorizava mulheres a usar calças apenas se tivesse uma autorização da polícia. A lei datava de 1800 e não tinha mais poder jurídico, mas foi cancelada oficialmente apenas em 2013.

10. Estados Unidos, Arkansas: homem pode bater na esposa uma vez por mês

A lei faz parte de um conjunto de velhos textos misóginos que não são mais aplicados na prática. Na Carolina do Norte, mulheres precisam estar cobertas com pelo menos 15 metros de tecido. No Michigan, os cabelos da mulher pertencem ao marido.

Por que o cinema não é ensinado nas escolas?

Por que o cinema não é ensinado nas escolas?

É fato conhecido de que a educação no Brasil não funciona. Sei por experiência própria. Fiz trabalhos comunitários dando aulas de matemática na periferia de Porto Alegre e, mais do que a maioria, posso falar sobre como muitos meninos vão para o Ensino Médio sem saber como fazer uma regra de três. Alguns até entendem o conceito, mas ignoram a operação de divisão… Sei também como é complicado manter esses garotos atentos. Eles não têm a menor vivência do que é concentrar-se sobre um tema ou ouvir longamente alguém falar. O assunto deste texto pode parecer uma filigrana, uma ingenuidade, algo como um telhado de 16 m² colocado sobre o crime ambiental de Mariana e seus imensos arredores, mas talvez tenha alguma lógica.

Cena de Numa Escola de Havana
Cena de Numa Escola de Havana

Não tenho nada contra a literatura e outras artes — sou mais apaixonado pela literatura e pela música do que pelo cinema! –, mas creio que o cinema tem a peculiar característica de poder mostrar a nossa e outras realidades de forma desconstruída e facilmente analisável. Tudo isso em duas horas e de forma coletiva, concomitante. Ou seja, imaginem uma sala de aula onde fosse apresentado, por exemplo, o notável filme cubano Numa Escola de Havana (foto acima). É bem diferente de todos lerem um livro, cada um em sua circunstância. Há que considerar também que muitos alunos vêm de famílias disfuncionais, são muito pobres e simplesmente não conseguem isolamento para ler. Além do mais, uns leem pela metade, outros leram faz tempo e talvez lembrem mal do livro, etc. O cinema não. Ele pode ser apresentado in loco e a discussão a respeito dele pode ocorrer logo após sua apresentação, com todos os detalhes presentes na memória.

O cinema não é apenas diversão, é multidisciplinar e, digamos, multiuso. Não encontro argumentos para não colocar o cinema como uma das ciências humanas nas escolas. Seria uma matéria que apoiaria outras, tais como história, literatura e filosofia. O cinema tem a característica de nos mostrar diferentes culturas e formas de pensar, de abalar valores e conceitos. Suas histórias de duas horas desnudam fatos e seus modus operandi, dando novos olhares a fatos conhecidos, estimulando a discussão.

Claro que os filmes teriam que ser clássicos de qualidade indiscutível. As famílias já viram o filme do Oscar do ano passado e as porcarias e filmes médios deveriam ficar de fora. Porém, produções de mais de 20 anos e que permanecem poderiam dar apoio a aulas de história, geopolítica, ética e conhecimentos gerais.

Isto não significa que cinema seja uma arte maior do que as outras. Mas creio que ele seja mais educacional que as outras, talvez por poder ser coletivo. Hhá peculiaridades no cinema — sua instantaneidade, sua facilidade e concomitância de apreensão — que o tornam muito adequado para a criação de espírito crítico nos jovens. Como se não bastasse, o cinema, com seus personagens, torna possível um pensamento afetivo, aquele mais próximo da ética, além de possibilitar o contato com novas estéticas.

Quando eu escrevo ensinar cinema, não quero formar diretores  ou roteiristas de filmes, mas dar uma boa visão da história da jovem arte cinematográfica. Há maravilhosos e exemplares filmes que exploram fatos históricos assim como posturas e resultados de políticas. É claro que os filmes a serem discutidos não seriam os de 007 ou American Pie, e sim as obras mais relevantes sobre os temas escolhidos.

Sou uma pessoa muito preocupada com a baixa qualidade de nossa educação. Vejo nossas crianças deprimidas ou desinteressadas nas salas de aula. Causa ou consequência, nossos professores são péssimos. Aloizio Mercadante, ministro da Educação, tem toda a razão ao dizer que “Se o Brasil formasse médicos como forma seus professores, muita gente morreria”. Sou um filho da educação pública — nunca paguei para estudar, deste o maternal até o ensino superior — e sei que lá se formam garotos para conviver com o fracasso escolar diante daqueles egressos dos colégios particulares (que são um pouco menos péssimos que os públicos). Então, diante da incompetência, da falta de informação e da óbvia infelicidade, acho que devemos mostrar outras realidades, vidas e aspirações para que nossos filhos possam ter adolescências mais suportáveis e críticas.

Estava lendo sobre o legado da ditadura militar para a educação brasileira…

Estava lendo sobre o legado da ditadura militar para a educação brasileira…
 O meu Julinho era chamado de Colégio Padrão nos anos 60 e início dos 70. Era o exemplo que devia ser seguido. Já hoje...
O meu Julinho era chamado de Colégio Padrão nos anos 60 e início dos 70. Era o exemplo que devia ser seguido. Já hoje…

Peguei apenas em parte — ainda bem — a Reforma do Ensino de 1971 que unificou o antigo primário com o ginásio, criando um curso de 1º grau de oito anos, hoje chamado de Ensino Fundamental, que “instituiu a profissionalização universal e compulsória no ensino de 2º grau, visando atender à formação de mão de obra qualificada para o mercado de trabalho”. O texto do artigo tem um ar de coisa temporária, mas várias de suas características perduram até hoje.

É um tema que me fascina — desculpem, sou fascinado por todo gênero de decadência. Penso que foi ali que começou o apavorante declínio cultural de nosso país. Minha mulher nasceu na Belarus e ficou estarrecida com o nível das escolas onde matriculou seus filhos quando emigrou para o Brasil. O mesmo acontece com os amigos uruguaios que conheço. Eu era aluno de um colégio público de excelente nível, o Júlio de Castilhos, e vi bem de perto o começo do desmonte do ensino público no país. Hoje, minha escola é exemplo negativo.

Lembro que uma das justificativas utilizadas para a profissionalização à fórceps era a de que Jesus Cristo fora carpinteiro… Sim, os milicos disseram isto, lembro bem. O resultado desta troca da educação generalista pela técnica é a tragédia que vemos.

Pois a incultura está por todo o lado, disseminada. As escolas particulares são igualmente muito deficientes, são uma falsa salvação para os filhos da classe média. Domingo passado, dei uma olhada de leve nos manifestantes e a desinformação estava plasmada nas faixas e na postura geral. Nossa ignorância perdeu de vez o pudor. Fico pensando nos meus amigos esclarecidos de direita. Devem estar envergonhados com certas coisas que foram ditas e mostradas. Mas não creio que seja muito inteligente ridicularizar os manifestantes por sua idiotia e equívoco. Essa gente faz barulho e é numerosa. Portanto, têm considerável poder. E votos. Este é o principal motivo pelo qual sou contra o voto obrigatório. Somos governados pelas pessoas eleitas por uma maioria que sabe pouco sobre a política do país. Daí, nosso Congresso… Bem, mas eu dizia que não é muito inteligente ridicularizá-los, é necessário entendê-los. Só não sei como. Cadê a lógica? As leis de formação de seus pensamentos?

Neste fim de semana, soube que um presidente de uma Associação de classe tinha pedido demissão. Acompanhava seu caso de longe. Iniciou defendendo os interesses do grupo que representava. OK. Logo, enrolado pelos chefes e confuso, perdeu alguns apoios ao dar suas primeiras pelegadas. Evangélico, invocou a família e a Bíblia para justificar-se. Também foi assessorado por uma pessoa que se candidatou nas últimas eleições — esta também sem nenhuma formação e informação política. Recentemente, às portas de uma greve, nosso personagem deu outra pelegada por puro medo, desobedecendo a base e, finalmente, teve que se demitir do cargo. O pior é que está por aí, dando discursos cheios de razão, com a cabeça erguida de ignaro orgulho, a Bíblia na mão e a família como bengala. Vou lhes contar.

Há muita gente boa, gente que é autodidata, acadêmica ou simplesmente inteligente. Mas nota-se sinais de decadência cultural em todo o lugar. Na música que se ouve, na lista de livros mais vendidos, nos aplausos fora de hora, no não entendimento de noções um tantinho mais complexas, nas caixas de comentários, na utilização indiscriminada dos conceitos do politicamente correto.

O desmonte da educação foi feito em poucos anos. Em menos de dez anos a coisa estava feita. Mas penso que, para voltarmos aos níveis dos anos 60, precisaremos de uns 50 anos, porque até os professores são péssimos atualmente. Tudo deveria começar por melhores professores. Enquanto isso, estaremos no Reino da Asneira.

Um dia glorioso de trabalho em Montevidéu

Elena Romanov, Roberto Markarian e eu na sala do reitor
Elena Romanov, Roberto Markarian e eu na sala “del Rectorado”

Fizemos uma bela entrevista com Roberto Markarian, Reitor da Udelar, Universidade da República do Uruguai. Na entrevista, fica claro o que é uma ‘pátria educadora” e a dimensão humana de um sistema gratuito e laico de ensino. Foram 63 minutos de perguntas e respostas, mas a Elena disse que o conteúdo equivale a um livro. Pedi ajuda a vários amigos acadêmicos para melhorar minhas perguntas e o resultado foi estupendo.

Acho que vou dividir a entrevista em duas partes para que não seja cansativo para o leitor e lhe dê certo tempo para refletir sobre modelos totalmente diferentes — e mais racionais — dos nossos. Tive a sorte de conhecer o genial Markarian durante os anos 80 quando ele fazia mestrado em Porto Alegre após sete anos de prisão durante a ditadura militar uruguaia. A mim, resta agora ser digno de Markarian, dos amigos e da Elena, que me ajudou com fotos, sugestões 100% aceitas e também com alguns questionamentos..

A tal Pátria Educadora corta livros de nossas crianças

A tal Pátria Educadora corta livros de nossas crianças

Por Graça Ramos

O Salão FNLIJ do Livro para Crianças e Jovens era para ser só festa, como tem sido há 17 anos, mas o que encontrei lá foram editores arrasados com notícias oriundas dos governos federal, capitaneado pelo PT, e do Estado de São Paulo, comandado pelo PSDB. Ambos estão suspendendo compras de livros que deveriam ser entregues a estudantes e professores. Os dois partidos rivais na última disputa presidencial aproximam-se no desprezo à leitura.

Copiado de http://esoemfoco.blogspot.com.br/
Copiado de http://esoemfoco.blogspot.com.br/

O governo de Dilma Rousseff deverá prorrogar para o próximo ano os programas de distribuição de livros literários a escolas públicas previstos para este ano. A informação foi repassada a editores do segmento infantojuvenil por técnicos vinculados ao Ministério da Educação (MEC). Os cortes orçamentários são responsabilizados pela suspensão das compras, não anunciada oficialmente. Mas que, na prática, já está acontecendo no âmbito do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) em função da morosidade no cronograma de atividades, o que equivale a um adiamento.

Os avisos dão conta ainda de que o presidente do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), Antônio Idilvan Alencar, nomeado pelo ex-ministro Cid Gomes (PROS), argumentou contra os cortes, sendo voto vencido. A justificativa dada pelos técnicos da equipe do novo ministro, Renato Janine Ribeiro, é que cortes precisam ser feitos e as obras de literatura são consideradas menos prioritárias. Prorrogada a entrega dos livros do PNBE, aproximadamente 6,7 milhões de exemplares deixarão de chegar aos leitores de escolas públicas de todo o País este ano.

Grandes números – O outro corte foi assumido semana passado, sendo mais expressivo em números, mas localizado em um só estado. O governo de Geraldo Alckmin informou aos editores a suspensão da chamada pública relativa ao ano de 2013 do Programa Estadual do Livro, responsável por abastecer os Programas Sala de Leitura, Leitura do Professor e Apoio ao Saber nas escolas de ensino fundamental e médio, além daquelas inseridas na Educação de Jovens e Adultos. Cerca de 18 milhões de livros que deveriam estar nas mãos de alunos e professores paulistas desde o ano passado não serão entregues. Os cortes orçamentários também foram responsabilizados pela atitude drástica.

O menosprezo à leitura dissemina-se em outras instâncias: a Prefeitura de São Paulo, há quatro anos, não compra livros de literatura para os programas Minha Biblioteca, Acervo Inicial, Acervo Complementar e Sala de Leitura. Portanto, nas gestões do PSD, de Gilberto Kassab, e de Fernando Haddad, do PT. No município do Rio de Janeiro, a situação é melhor, pois permanecem os projetos de compra para creches e aluno concluinte, embora tenha sido suspenso o programa Biblioteca do Professor, que entregava 16 obras literárias aos docentes. Algo próximo de 370 mil exemplares. E, observo, a Prefeitura, via Secretarias de Cultura e Educação, manteve o apoio ao Salão FNLIJ, viabilizando a presença de 17 mil alunos e a compra de livros pelos professores – os outros patrocinadores foram a Petrobras e o Instituto C&A.

Ainda no âmbito federal, ações do Programa de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) 2014, considerado prioritário na campanha da presidente Roussef, também estão bastante atrasadas. Consultadas sobre atrasos e suspensão dos programas, as Assessorias de Comunicação do MEC e do FNDE, responsável pela execução dessas ações, deram resposta semelhante, que, analisada, só confirma o quadro de descaso.

Diz o email enviado pelo MEC: “Os resultados das avaliações do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático) estão previstos para publicação no dia 29/06. E os do PNBE em outubro/novembro. No caso do PNLD Pacto, os resultados já foram divulgados e os guias finalizados, portanto estão em preparação para aquisição. O PNBE temático também já teve resultado divulgado, mas ainda aguarda avaliação da área responsável, a SECADI”. Abaixo, avalio item por item o estado desses e outros programas.

Tudo indica que o PNLD 2016 está dentro desse prazo anunciado, pois dele não se fala em prorrogação, pelo entendimento de que são livros essenciais de disciplinas como matemática, história, física. E, há duas semanas, em reunião com a Abrelivros (Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares), a Diretora de Apoio à Gestão Educacional da Secretaria de Educação Básica, Manoela Dutra, disse que espera divulgar os resultados na segunda quinzena de junho.

Estranhamento – Quanto ao PNBE, a informação de que só em outubro/novembro sairão os resultados dos livros escolhidos leva à conclusão de que obras de literatura não serão compradas em 2015. Leva-se tempo no processo de negociação com as editoras, e dezembro fica muito próximo da data do anúncio informado pela Comunicação do órgão. O estranho é que, há algumas semanas, tive acesso a uma planilha do MEC com o cronograma do PNBE 2015 que apontava ser o prazo para publicação do resultado das avaliações dos livros escolhidos o dia 28 de julho. Tal data permitiria a entrega dos volumes ainda este ano. O que, reitero, pelo visto, não ocorrerá.

O PNBE temático de 2013 vem sendo negociado com editoras desde setembro de 2014. Até o momento não foram assinados contratos. Portanto, há um atraso de dois anos na entrega das obras de referência destinadas aos alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio. O PNBE Indígena 2015 também se encontra sem qualquer notícia. Está atrasada ainda a largada do PNBE de 2016, que deveria ter publicado edital no final de 2014, como era a praxe do calendário do MEC. O órgão alega aos editores que o documento se encontra em fase de confecção, pois houve mudanças na equipe de avaliação e estão sendo preparados novos critérios para a próxima edição. Já o PNBE do Professor 2015 parece ter sido abortado, nada se sabendo dele, e estamos na metade do período letivo.

No caso do PNLD/ PNAIC, que busca garantir a alfabetização das crianças até os oito anos como determina o Plano Nacional de Educação (PNE), a habilitação das editoras já foi concluída. Porém, os contratos, o que inclui definição de tiragem e preço, não foram assinados. O atraso pode não significar nada para burocratas que definem cortes em orçamentos, porém, atrapalha a formação de alunos em seus anos iniciais de aprendizado de Português e Matemática e pode incidir negativamente na meta do PNE. Outro indício que preocupa é a possibilidade do PNAIC do próximo ano não acontecer, pois o  FNDE está convocando editores para apresentarem os contratos internacionais – que dizem respeito a obras traduzidas – mas solicitando vigência para 2016.

Transparência – Considero absurdo o governo não adotar transparência e deixar de explicar para a sociedade os cortes de orçamentos, programas e prazos. Também me chama atenção que, naquilo que se refere à literatura infantojuvenil, não exista uma entidade capaz de capitanear as insatisfações e cobrar do governo respostas mais efetivas. Seja de professores, de pais e, especialmente, de editores. Somente no final do mês, um grupo destes últimos participará de audiência pública em Brasília para cobrar transparência nas contas de programas de educação e formação do leitor. A demora e a timidez no enfrentamento mais agressivo da questão provocam a sensação de que associações que cuidam dos negócios do livro no Brasil – como Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), Abrelivros, Liga Brasileira de Editores (LIBRE) e Câmara Brasileira do Livro (CBL) – não se unem, deixando de estabelecer marca representativa e forte na defesa da importância da literatura para crianças e jovens.

Diante de tal desarticulação, talvez esse papel devesse ser assumido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), cujo Salão tem a mesma idade do PNBE – portanto, tendo usufruído do fortalecimento que os programas institucionais de leitura possibilitaram ao segmento. Afinal, embora nele nenhuma mesa tenha se dedicado ao tema dos cortes nos programas, a Secretária-Geral da entidade, Beth Serra, resumiu toda a questão colocada para a sociedade brasileira: “a conquista de 20 anos de programas de leitura não pode ser interrompida”, disse.

Ela falou na abertura da instrutiva palestra da educadora argentina Emília Ferreiro, que apresentou pesquisa sobre como as crianças percebem três instâncias literárias – o autor, os personagens e o narrador – e demonstrou como essa percepção está contaminada pela linguagem das telas digitais. O que me levou a pensar que o Brasil, ao desconsiderar a importância dos programas de leitura nesse cenário dominado pelas tecnologias, poderá fomentar gerações de leitores precários.

A tragédia do Sistema Cantareira: mas não era para sermos o celeiro de água do mundo?

A tragédia do Sistema Cantareira: mas não era para sermos o celeiro de água do mundo?

Fico fascinado pelo provável fim do Sistema Cantareira. Mesmo sendo ignorante no assunto, busco informações diariamente. Trata-se de um gênero de tragédia que infelizmente deverá tornar-se comum nos próximos anos. Como o fazer político é cada vez mais campo de empresários e religiosos com uma minoria de quixotes, não vejo como escapar de uma sucessão de tragédias como essa do Cantareira.

Acompanhar o dia-a-dia do Sistema Cantareira é como acompanhar a marcha do placar de um jogo com atualizações on-line. O jogo parece previamente perdido, mas a atração que sinto por observar a decadência da coisa faz-me permanecer atento. Claro que não é uma questão pessoal. São Paulo viverá um cenário de enorme privação, dependente da vazão natural da água, sem reservas, o que fará com que o abastecimento de água ocorra, quem sabe, duas ou três vezes por semana, em horários limitados. E o atual sistema era para atender a 8 milhões de seres humanos.

Entendam, neste cenário, que não está muito longe de ocorrer, a população só será atendida se chover, já que não haverá água nos reservatórios. Como está agora, a matemática reencher o Cantareira e evitar situações extremas não é simples. Depende de chuvas muito acima da média, o que não deverá acontecer devido ao desmatamento, e diminuição do consumo. Não é nada divertido.

Toda esta situação crítica ocorre justamente na maior cidade do país que é — é ainda? — o maior manancial e celeiro de água do mundo. Os políticos, a grande imprensa e o Ministério da Agricultura não gostam de falar nisso, mas o caso do Cantareira é filho do desmatamento.

Existe uma relação entre as árvores, quaisquer árvores, com as chuvas. Basta ver que a mata que ronda Bombinhas, onde estou, gera chuvas diárias. Pouca gente lembra disso. As matas, a arborização urbana ou mesmo as plantas de jardim podem ajudar a aumentar a umidade da atmosfera, gerar nuvens de chuva, reduzir a irritação da poeira no ar e ainda diminuir o calor. E o que ronda o Cantareira é o desmatamento.

Os primeiros lances demonstram o desespero da Sabesp e a estupidez dos políticos. Eles querem apenas a diminuição do consumo, como se isso fosse resolver o problema. Na causa do mesmo, todos evitam falar. A partir da conta de fevereiro, serão cobrados 40% de multa para quem consumir até 20% a mais do que a média entre fevereiro de 2013 e janeiro de 2014. E quem ultrapassar 20% dessa média será multado em 100% sobre o gasto com água, o que representará metade de uma conta certamente alta.

Ampliar a produção de água de outros sistemas, como o do Billings e outros, são alternativas apenas viáveis, segundo os especialistas, a médio ou longo prazo, pois eles não foram projetados para demandas tão altas. Como o Cantareira atende a 8 milhões de pessoas, seria necessária fazer a ampliação dos sistemas existentes além de novas estações de tratamento. São coisas demoradas. Uma alternativa seria a de lançar água não tratada na rede, mas isso poderia contaminar os usuários. Seria água não potável, já pensaram?

Tem gente que fala em êxodo da população da cidade, como num filme americano de bomba nuclear, mas como isso ocorreria? Não sei.

Da raiz do problema — o desmatamento, o descontrole e desrespeito ecológico –, quase ninguém fala. Parece que a culpa é apenas das chuvas e estas são mandadas (ou não) aleatoriamente, por São Pedro.

cantareira

Férias ateias

Por Hélio Schwartsman

Nestas férias, levei as crianças para passar uma temporada num acampamento ateu nos EUA. Durante duas semanas eu, minha mulher e os dois garotos fizemos programas familiares na região de Washington DC, fustigada por um calor senegalês. Eram 40 graus à sombra. Na semana seguinte, enquanto eu e Josiane gozávamos um idílio romântico, os gêmeos Ian e David, agora com dez anos, eram iniciados nos evangelhos de Dawkins, brincando com outras crianças enquanto recebiam lições de ciência e ceticismo. Era um daqueles acampamentos de filme, em que os meninos dormiam em cabanas de madeira bem primitivas no meio de uma floresta e derretiam marshmellow na fogueira.

Minha ideia inicial não era a de doutrinar os garotos, que já são por constituição dois bons ateuzinhos. Pretendia apenas promover uma viagem em família e aproveitar para reciclar-lhes o inglês, aprendido no período em que moramos em Michigan, internando-os num “summer camp”. Mas, durante minhas buscas na internet por um lugar adequado, sempre topava com descrições que frisavam os “valores cristãos” ali ensinados. Aos poucos, aquilo foi me deixando irritado. Os garotos já aprendem mais valores cristãos do que eu desejaria na escola católica em que estudam em São Paulo (não tenho nada contra religiosos desde que promovam um bom ensino). Eu queria apenas um acampamento de verão que fosse divertido. Assim, num momento de exasperação, joguei no Google “atheist summer camp” e, para minha surpresa, apareceu o Camp Quest, no qual logo os matriculei.

Trata-se, na verdade, de uma rede com acampamentos em vários Estados dos EUA e no Reino Unido. Eles até tentam, sem muito esforço, negar a pecha de ateus, preferindo termos como “secular” e “freetought” (pensamento livre), mas o caráter da instituição fica claro no nome com que batizaram a barraca em que Ian e David ficaram: “Magic of Reality”, título do último livro de Richard Dawkins, em que ele explica ciência e prega ateísmo para crianças.

Os garotos adoraram. Ressentiram-se um pouco de não ter conseguido jogar futebol como pretendiam, mas divertiram-se a valer, aprenderam os rudimentos do pensamento crítico e atualizaram seu inglês. Ian, que tem um talento especial para idiomas, chegou arrastando um sotaque levemente sulista, já que a maioria dos “campers” vinha da Virgínia, de Maryland e da Carolina do Norte.

Essa pequena mágica, a mudança de acento, esconde uma espécie de segredo de polichinelo da psicologia, algo que está bem na nossa cara, mas que nos recusamos a ver: pais importam muito menos para a formação dos filhos do que estamos dispostos a admitir. Quem primeiro lançou essa tese foi Judith Harris em “The Nurture Assumption – Why Children Turn Out the Way They Do” (a hipótese da criação – por que crianças se tornam o que se tornam), lançado em meio a muita polêmica em 1998. Esse foi um dos bons livros que li nas férias.

Harris sustenta que a socialização dos jovens não se dá através dos pais, como nossa cultura prega, mas por meio de seus pares, isto é, de outras crianças da mesma faixa etária e sexo. Um dos muitos argumentos que ela usa para apoiar sua teoria é o fato de que filhos de imigrantes não terminam falando com a pronúncia dos pais, mas sim com a dos jovens com os quais convivem. Pode parecer até meio banal, mas a conexão linguística é especialmente interessante para o debate hereditariedade X educação porque ela é uma das poucas características que não embaralha fatores genéticos e ambientais. Com efeito, o idioma que falamos e a forma como o fazemos não são determinados pelos genes, mas só pelo meio em que vivemos. E, nesse meio, a força dos pares claramente prevalece sobre a dos pais. Harris se pergunta se esse mesmo esquema não valeria para outras características, ainda que entremeadas com condicionantes genéticas, como personalidade, religiosidade, propensão a vícios, a cometer crimes etc.

E ela acredita que sim. Para a pesquisadora, a influência dos pares supera a dos pais em quase tudo. É apenas por uma herança cultural relativamente recente, que valoriza sobremaneira a criação, que imaginamos o contrário. É verdade que existe toda uma biblioteca de pesquisas supostamente científicas que aponta para os efeitos paternos, mas Harris afirma que esses estudos sofrem de graves falhas metodológicas. Eles continuam a ser produzidos porque dizem o que queremos ouvir.

Boa parte das conclusões a que Harris chegou tem como base os estudos de gêmeos e adotados, que permitem não apenas discriminar efeitos genéticos de ambientais como também distinguir, nesta segunda categoria, o que seria o ambiente reprodutível (aquilo que passa para todos os que são criados no mesmo lar, escola etc.) do ambiente único (aquilo que faz parte da história exclusiva de cada indivíduo). E a somatória desses trabalhos aponta de forma mais ou menos clara que o ambiente reprodutível, onde os efeitos gerados pela criação se incluiriam, tem muito pouca força no longo prazo.

Um caso eloquente é o do comportamento criminoso. Um estudo dinamarquês que mantinha registros dos pais biológicos e dos adotivos e acompanhava o desenvolvimento das crianças, inclusive as condenações penais que receberiam como adolescentes e adultos, mostrou que 15% dos filhos de pais sem problemas judiciais criados por delinquentes acabaram tornando-se criminosos. Já entre os descendentes de gente honesta criados por pais adotivos também honestos, a taxa de desencaminhados foi de 14%, uma diferença irrisória.

A história muda um pouco para os filhos de criminosos criados por pais honestos. Aqui, a delinquência atingiu 20%, um bom indício de que a genética influi na sanha infracional. Na ponta final temos os filhos de criminosos educados por criminosos. A taxa de desviados nessa categoria foi de 25%. Esse seria um sinal de que a criação, afinal, faz diferença, ainda que apenas para o mal. Mas o resultado deve ser relativizado à luz de um outro dado. Nas cidades pequenas, o efeito do pai adotivo criminoso simplesmente desaparecia, o que se explica se pensarmos menos em termos de pais e mais da vizinhança em que a criança cresceu. De novo, são os pares que importam mais.

Para Harris, essa sensibilidade extrema do ser humano a seus iguais faz sentido do ponto de vista da evolução. No ambiente darwiniano em que nossa espécie passou a maior parte do tempo, tornar-se órfão ainda em tenra idade era, senão a regra, ao menos uma possibilidade bastante concreta. A melhor chance de um jovem sobreviver nessas condições era ser capaz de aprender e socializar-se com o grupo, não com os genitores.

A hipótese encontra amparo no fato de que crianças que são criadas em condições razoáveis de vínculos, vá lá, amorosos, por um dos pais ou um substituto pelo menos até os quatro anos acabam se tornando adultos funcionais mesmo que, dos 4 aos 18, passem por um festival de horrores em orfanatos ou nas ruas. Já quando traumas e abusos vêm antes dos quatro anos, o mais provável é que a criança se torne um adulto problemático, mesmo que, depois da idade crítica, seja tratada a pão de ló. Na Idade da Pedra em que o homem foi forjado, perder os pais antes dos quatro e não encontrar nenhum substituto equivalia a uma sentença de morte.

Para Harris, o efeito dos pares sobre o indivíduo é inafastável. Mesmo que a criança seja rejeitada pelos colegas num bullying maciço e não tenha nenhum amigo, ainda será ao grupo de semelhantes que ela irá se comparar e do qual tirará suas referências e inferirá as regras sob as quais o mundo funciona. É nesse processo de comparações e busca de inserção social que ela consolidará as características de sua personalidade, em boa medida genéticas.

O que o ambiente moderno fez, sustenta a pesquisadora, é criar uma multiplicidade de nichos por causa das grandes aglomerações em que vivemos. Entre caçadores-coletores, as crianças são “criadas” pelo grupo de jovens que reúne tipicamente meninos e meninas de várias idades. Hoje em dia, com escolas de centenas de alunos, o garoto(a) socializa-se apenas com coleguinhas do mesmo sexo e idade. O resultado é a exacerbação das características. Meninas se tornam hiperfemininas e meninos, hiperativos. O mau aluno encontra outros maus alunos, que constituirão um grupo onde rejeitar a escola é percebido como uma característica positiva. O mesmo vale para a violência e o uso de drogas. Na outra ponta, podem surgir subculturas que valorizem a leitura, a utilização de computadores e outras “nerdices”.

O livro de Harris é muito bom. Mesmo que não compremos todas as suas conclusões pelo valor de face, é difícil rejeitar todas as evidências que ela oferece e seguir acreditando piamente no mito da boa criação. E reconhecer que o papel dos pais não era bem aquilo que imaginávamos não significa que os genitores sejam inúteis ou impotentes.

Para começar, cada um deles fornece 50% da matéria-prima, que são os genes. A melhor maneira de ajudar o futuro de seu rebento é encontrar um bom(a) parceiro(a) para gerá-lo. Depois disso, é preciso mantê-lo vivo pelas próximas duas décadas e recebendo quantidades adequadas de nutrientes e informações. A fase até os quatro anos de vida é especialmente sensível. Se você não cometer abusos nem submetê-lo a maus-tratos nessa janela, o mais provável é que ele se torne um adulto funcional.

Há ainda outras maneiras de influir. É bem verdade que você pode pouco contra os pares, mas, como adulto, tem o poder de determinar a área em que a família vai viver o que, em boa medida, determina os colegas e amigos que ele terá à sua disposição. Se o seu filho está nas piores companhias, em vias de tornar-se um marginal, você pode mudar-se para uma cidade menor, onde não será tão fácil encontrar um grupo de “bad boys”. Não é garantia de dar certo, mas é uma chance.

Outra coisa que pais podem fazer é transmitir hábitos e práticas que não são escrutinados pelo grupo e, portanto, tendem a manter-se incontestados. É nessa categoria que entram coisas como cozinhar ou tocar piano. É difícil uma criança ser ridicularizada por algo que não entra nas conversas do grupo e, portanto, ninguém sabe que ela faz. Se a prática não é condenada, pode ser conservada.

De resto, o importante, como já coloquei num outro texto em que comentava aspectos da criação, é aproveitar a jornada. Mesmo que o poder dos pais de imprimir características duradouras aos filhos seja pequeno, o de gerar momentos prazerosos que se consolidarão em memórias carregadas por toda a vida é quase ilimitado. E, como sabe todo ateu, a capacidade de deixar lembranças é a única forma de transcendência cientificamente comprovada.

Duas grandes homenagens ao Índio

Sempre ao lado das minorias e buscando vencer a barreira do conservadorismo da sociedade brasileira, este blog tem defendido sem tréguas o indígena do Brasil. Devemos sempre lembrar que os índios já habitavam nosso país quando os portugueses aqui chegaram em 1500. Desde aquela data, o que vimos foi o desrespeito e a diminuição das populações indígenas. Este processo ainda ocorre, pois com a mineração e a exploração dos recursos naturais, muitos povos indígenas ainda estão perdendo suas terras. Desta forma, deixamos duas imagens cuja pujança e emotividade conquistará os visitantes deste pequeno órgão.

Baita cocar de uma mulher Seioux.
Feliz Dia do Índio!

* A segunda imagem foi roubada de José Luiz Rosa Filho, no Facebook. A primeira veio de nosso banco de imagens particular.

Como fazer cocô em ambientes de trabalho ou em locais muito frequentados

Claro, você não os faz no meio da sala, faz naquele recinto particular, mas mesmo assim é educado tomar certas precauções. Lembro de que uma ex que, quando foi conhecer meus pais, sentiu aquela intransponível e invicta pressão interna. Como não usava a minha técnica, infestou o ambiente e meus pais logo conheceram suas qualidades mais sórdidas. Mas vamos ao que interessa, às lições!

1. Procure o banheiro mais longínquo. Claro, você não vai infestar o ambiente próximo a uma sala lotada se há um banheiro no andar de baixo ou no de cima ou se há aquele recinto impopular que ninguém procura. Use-o.

Nunca faça isso!
Nunca faça isso! (copiado de um blog; sem direitos, espero)

2. Como sentar para cagar. É sempre adequado tirar a roupa antes. Então, após este ato preliminar você deve tentar sentar de forma a tapar com sua bunda todo o buraco disponível. O motivo é simples: fazendo assim você estará vedando sua produção do ambiente externo. Permaneça assim até o final. A posição do amigo da foto ao lado revela que ele não aprendeu com a experiência ou que deseja fazer com que todos participem de suas idas aos pés. Um sacana, claro.

3. Como puxar a descarga. Nada de se limpar antes de puxar a descarga! É óbvio você não precisa ver as proporções de seus dejetos nem abanar para eles em despedida; então, você vira o corpo e puxa a descarga sem abrir o mundo ao bem guardado ar pestilento que seu corpo mantém preso. Ora, basta pensar que você não precisa ver sua vida interior, a menos que desconfie de alguma doença, caso em que você deve observar bem o cagalhão e até tirar fotografias para seu médico analisar.

4. Como se limpar. Não, não levante. Tire ainda mais vantagens da posição. Todo ganho secundário é importante. Afinal, sua posição lhe abre acesso livre ao orifício anal. Realize aquele movimento lateral e, rapidamente, limpe-se sentado. Essa coisa de levantar pode fazer que uma nádega roce na outra, transformando num mingauzinho o cocô que lhe grudou no ânus.

5. Onde colocar o papel. Aqui está uma informação fundamental, talvez a mais importante de todas. Nunca bote o papel naquela caixinha mal cheirosa que há ao lado do vaso e sim dentro dele. Grande parte do trabalho anterior estará perdido se você dispuser suas coisas parcialmente ao ar livre. Em minha casa, por exemplo, o lixinho só serve para abrigar desodorantes velhos e papéis de sabonete. Os higiênicos vão todos para dentro do vaso.

Peça fundamental para a felicidade doméstica
Peça fundamental para a felicidade doméstica

6. Acessório. Nas construções antigas, os canos são mais estreitos e após algumas semanas vamos entupir a saída da privada. A profilaxia sugerida é ter um daqueles desentupidores domésticos ao lado  do vaso. Quando a água não descer, logo na primeira vez,  já deve ser utilizado. Não procrastine! Se você fizer isso, nunca haverá problemas para você ou para o prédio. As construções novas raramente entopem, mas mesmo assim, seguro morreu de velho.

7. Lavar as mãos. Apenas as mulheres devem fazê-lo.

Experimente e depois relate sua experiência! Queremos saber!

A Rádio da Universidade (Parte II) & Como Inventei os Blogues

Publicado no dia 5 de dezembro de 2003.

Meu último post teve repercussão inteiramente diversa dos anteriores. A repercussão positiva veio na forma de entusiasmados e-mails e telefonemas de apoio. Estes, na maioria de pessoas pertencentes ao Departamento de Música da UFRGS e à propria Rádio, não queriam ser identificados. Uma pena. A repercussão negativa veio dentro dos comentários do blogue, misturada a outros apoios. Fiquei discutindo com um grupo de alunos inteligentes e articulados – mas dos quais discordo! -, que desejavam, além de defender a profe (ou sora, segundo meus filhos), manter o que pensam ser um laboratório. Um laboratório público, bem entendido.

Estes talvez não precisem se preocupar, pois representam hoje o poder; mas suas idéias me deixaram pasmo. Algumas delas: a RU foi um equívoco por 45 anos e agora seus rumos estão sendo finalmente corrigidos… A gloriosa RU tem de ser dos alunos… Os ouvintes de música erudita melhor fariam se fossem para a Internet a fim de montar suas próprias rádios… Puxa, o correto não seria o inverso? Se a PUC tem uma rádio-laboratório, por que a UFRGS não pode manter uma? Com a Internet, isto é fácil de viabilizar. Há também, na idéia dos alunos, a crença de que somos elitistas, ricos, etc. Realmente, não nos conhecem. Somos pessoas de todas as classes sociais e muitos tornaram-se músicos ou apaixonados ouvintes por vivenciarem a antiga RU. Assim como não me conhecem as pessoas que querem que eu brigue sozinho pelo retorno da RU às origens, pois não podem aparecer, têm medo de retalhações, etc. Democrático, não? A continuidade lógica destas idéias obtusas leva-me a pensar também na extinção da OSPA (Orquestra Sinfônica de Porto Alegre). Por que não? Afinal, o que o Estado tem a ver com a arte?

Sugiro que o missão-devaneio que há no site da rádio mude imediatamente, seguindo a sugestão de uma amiga. De “Especializada em Música Erudita” para “Especializada na formação de novos comunicadores”. Maus comunicadores, pois serão especialistas em criar o que melhor lhe aprouverem , não a se adaptar a um meio de comunicação pronto, que é o que encontrarão na vida real. Vida real… Acho melhor voltar logo à literatura, à música e a meus comentários sobre qualquer assunto. Toda a vez que falamos na UFRGS vem junto uma política muito chata e complicada… Para terminar: se a Prof. Sandra de Deus quiser falar comigo, não há problema, basta vir a meu blogue e escrever qualquer coisa. Logo após, entrarei em contato. Se ela quiser, até peço desculpas pelas brincadeiras com seu nome.

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Eu inventei os blogues. Um dia visitei o site de Sergio Faraco e pensei em como seria interessante àqueles que o lessem se ali houvesse uma espécie de diário do escritor. Trata-se do maior contista brasileiro. Imaginei como seria bom se tivéssemos notícias sobre novas obras, sobre o último jogo de sinuca, sobre mecânica de automóveis e sobre tudo o que lhe passasse pela cabeça, desde considerações eruditas até abobrinhas. Fiquei pensando numa entrevista que ele concedera. Gosto de carros, de todos os esportes e de muitas outras coisas que nada têm a ver com prática literária. O prazer não me dá remorso. Onde não há prazer não há proveito, escreveu Shakespeare. Não sou como esses escritores que só sabem falar de literatura e cujas obras nunca se equivalem ao que sabem ou pensam saber. Falo de qualquer coisa, estou atento ao acontece ao meu redor. Não vivo num buraco, alimentando-me de sopa de letrinhas.

Nesta vontade de saber mais sobre Faraco, pensei que deveria existir alguma coisa pronta na Internet, um software que funcionasse como um diário, só que utilizada por gente interessante. Isto é, inventei internamente a idéia de blogue – nada brilhante para quem está sempre divagando -, depois fui para o Google e o descobri em 5 minutos. Entrei em alguns e fiquei decepcionado, era tudo muito fútil. Então, fiz a seguinte pesquisa: “Blog+Beethoven+111+Mann”. Imaginei que esta curiosa quase-livre-associação deveria fazer com que eu encontrasse um blogue de alto nível que estivesse a comentar o famoso oitavo capítulo de Doutor Fausto de Thomas Mann. E encontrei. Era o blogue do Zadig. E era brilhante. Tudo aconteceu em menos de 1 hora. Hoje, tenho outros amigos e amigas de mesmo tamanho na bloguesfera, mas Zadig foi o primeiro e o primeiro… (completem vocês)

Fiz-lhe um enorme comentário e recebi de volta um e-mail ainda maior me explicando detalhadamente o que era um blog. Ontem, recebi um belo e-mail do Zadig (que também atende por Adalberto Queiróz ou BetoQ) me propondo um texto a quatro mãos. Milton, numa dessas últimas Bravo! tem um artigo sobre o qual desejaria trabalhar a quatro mãos (se pensamos em escrever pelo teclado) ou a duas (se pensarmos na velha e boa lapiseira): seria como voltarmos ao problema bem situado por você quando falou sobre a…

Como dizer não? Gostei muito da proposta e do assunto, que vou deixar em segredo. No e-mail, havia também notícias de uma cirurgia de apêndice da Sherazade. O Zadig (com quem divido teto, prazeres, sonhos e dívidas, nessa ordem exata) me mostrou um texto do seu blog… Ela está em fase recuperação de uma apendicite e logo vai viajar para o casamento da filha Maíra, que mora fora do Brasil. Somaram-se duas ansiedades: uma boa – Maíra vai casar e está muito feliz; outra preocupante – Helenir adoeceu. Graças a Deus, tudo vai bem na sua recuperação, mas o susto ficou.

Eles são goianos e moram em Goiânia, mas estudaram na UFRGS (olha ela aí de novo, gente!). Maíra nasceu aqui em Porto Alegre e o casal tem outra filha, presumivelmente goiana. Temos muita coisa em comum. Muito legal conhecer você: minha mulher Helenir (que também é doida por Balzac) comentou quando viu partes do seu blog (ela não tem muita paciência com a web): “Mas este cara é seu irmão – leu tudo que você lê, gosta de muita coisa que você gosta. Infelizmente, não do Grêmio.”

É verdade. Sou colorado. Muito. E ele fuma charutos, enquanto eu detesto qualquer fumo; e ele é neo-católico, eu sou indiferente; e ele fala e escreve em francês, eu só fiquei francófilo antes da guerra e volto a ficar sempre que vejo a Juliette Binoche sorrir; e ele não gosta de cinema, eu o amo; e ele às vezes bebe além da conta, eu, só um cálice. Mas somos parecidos e amigos.

Conversamos várias vezes por semana. Já trocamos mimos pelo correio. Eles também o fizeram com o Guiu Lamenha, mas não sou ciumento, gosto de apresentar meus amigos uns aos outros. …não paro de ouvir a Missa de Bach que você me enviou. Como é possível não deixar o pensamento voltar-se a Deus ouvindo aquilo, Milton? É, Zadig, será duro me convencer, mas acho que se houver uma justiça divina melhor que a brasileira, estou salvo. Nos encontraremos no julgamento e vamos ser absolvidos, não se preocupe! Afinal, só faço mal à Sandra de Deus… Porém, como garantia, espero conhecer o cerrado e vocês pessoalmente antes.