Como ser eleito Deputado Federal com grande votação

A história do diabo é a história do progresso.

Flusser

Se você é de um partido decente, esta é a grande chance de sua vida. Uma aposentadoria vitalícia, benesses, diárias, bom salário, assessores, distância do Grêmio, o ideal. O que é um partido decente? Ora, PT, PSTU e PSol. O resto não. Não me venham com PV e sua candidata freirinha, pois de religião estou cheio e se trata exatamente disso.

Você não vai gastar nada, mas quando lhe derem “aqueles 10 segundos” a coisa tem que render como metro quadrado de shopping.

Você dirá o que segue:

Sou Milton Ribeiro e sou ateu. Sou favorável ao aborto livre coberto pelo INSS e não vejo a maconha como algo pior do que o cigarro. Vote no homem, no mito, no Milton Ribeiro.

Está na hora da gente contrapor aos deputados católicos e evangélicos — que são o mesmo — uma bancada ateia. Mas sou contra as religiões e  inclusive contra o ateísmo militante, tão próximo da religião. A gente precisa ser superior aos grupinhos e só aparecer na hora do bota pra capar. Afinal, a Dilma já disse que aborto é coisa para o Congresso, não para ela. Concordo.

Os ateus são pessoas que são sustentadas por um conceito real que os apoia. Eles são numerosos e transitam normalmente na mesma faixa, não cada um em faixa própria. Existe os grandes filhos da puta, claro — há aquele blogueiro cujas iniciais são “as mesmas de seu blog menos 1” (por exemplo, o blog é BS e o nome AR, entendem?) — mas posso garantir que o número de FDPs religiosos é muito, muito maior.

Por motivos profissionais, tenho assistido a propaganda eleitoral. Insuportável. Nada, ninguém se distingue, nem o Tiririca, que apenas faz humor voluntário. Bem, enquanto você não se candidata com o discurso que cunhei exclusivamente para você, deixo algumas instruções para o ato sagrado (céus, que bobagem) do voto:

Não votar em:

— quem mistura religião com política;
— quem parece ou é pastor;
— quem é conservador ou de direita (não me digam que direita e esquerda não existem mais, por favor);
— quem criminaliza sistematicamente os movimentos sociais (MST, povos indígenas, etc.);
— quem é criacionista;
— quem é homofóbico;
— quem é sexista;
— quem, gratuitamente, fala mal da América Latina;
— quem usa a frase “meu antecessor ou quem está lá não fez nada”, pois certamente fez e pode ter sido péssimo.

Porém, se você for de direita, seja verdadeiro e abrace o PP ou o DEM, OK? Não me venha com sucedâneos.

A chuva antes de cair, de Jonathan Coe

O mundo gira e gira e vai lentamente mudando, porém uma das coisas que não se altera é a importância da literatura inglesa. Se hoje temos Martin Amis e Ian McEwan na lista de maiores autores contemporâneos, é melhor acrescentar mais um nome: Jonathan Coe.  O autor — nascido em Birmingham no não tão longínquo ano de 1961, na gloriosa data de 19 de agosto — escreveu nove romances, além das biografias de James Stewart e de Humphrey Bogart. Coe também exerce o mais do que glorioso ofício de crítico de música erudita.

É surpreendente que o taciturno autor de A chuva antes de cair tenha desenvolvido seu doutorado sobre o impagável Tom Jones de Henry Fielding, que já tenha recebido prêmios como autor satírico, que tenha sido membro de uma banda e que a música seja um aspecto central em suas obras, pois nada disso ocorre neste romance.

A chuva antes de cair, quinto e excelente romance de Coe publicado no Brasil, tem alguma música e nenhum riso, mas é perfeito e realista como poucos. Estou chegando ao final da minha vida e por razões que, espero, ficarão claras para você, sinto ter uma obrigação contigo… O que eu quero que você tenha, Imogen, acima de tudo, é uma noção da tua própria história…, são as palavras de Rosamond ao iniciar a gravação de uma série de quatro fitas cassete destinadas à neta de uma prima: Imogen. A protagonista descreve, uma a uma, 20 fotos, que são a base para esclarecer os principais fatos da biografia da neta.

Quando do início da trama, Rosamond acaba de falecer e, como uma das herdeiras, a sobrinha Gill fica encarregada de encontrar Imogen a fim de repassar-lhe sua parte da herança; porém, ao visitar a casa de Rosamond para buscar qualquer coisa, ela encontra algo mais — quatro caixas de fitas cassetes numeradas junto a um montinho de fotos com um bilhete: “Gill, são para Imogen. Se não conseguir encontrá-la, ouça-as você mesma”.

O que se ouve nas fitas é descrição de cada uma das fotos acompanhadas das circunstâncias em que foram tiradas. Elas servem como atalhos para que o autor não necessite construir elos entre cada cena. O artifício é bom não apenas por este motivo, mas pelo fato de que a descrição de cada uma das fotos — com seus rostos, felicidade, esgares ou indiferença — pavimenta um caminho em linha direta com a vida interior de cada personagem. Este livro de som (audição da fitas) e imagem (fotos)  é escrito tranquilamente em tom melancólico e inexorável; é uma narrativa fluente que vai pouco a pouco preenchendo as lacunas da curiosidade do leitor, mas deixando o melhor para o final.

O tema principal do livro é a disputa, o ciúme, o ódio e a indiferença existentes nas relações entre as mães e filhas do romance. Parece haver uma tragédia transmissível de uma para outra. Na verdade, Coe brinca com a experiência do leitor, pois conseguimos prever o que irá ocorrer e o motivo, só não adivinhamos como. Prova de que há relações que carregam em si germes de conflitos prontos a estourar quando da ocorrência de problemas ou descontrole. Talvez este jogo com o leitor seja o maior mérito deste notável romance.

Coe chamou seu livro de “um bocado experimental”, expressão com a qual não concordo. O livro é consistente, excelente mesmo, mas não é nada experimental. Aliás, o experimentalismo parece ter sido varrido da boa ficção nos últimos anos. Não sei se diria que os escritores atuais escrevem para um público do passado ou ao menos passadista, posso apenas dizer que o trio de ingleses citados constroem romances clássicos a ponto de, aceitas as regras do “bem escrever”, não trabalharem novos recursos de linguagem. Mas como são bons!

A primeira Missa a gente nunca esquece

A primeira vez que ouvi a Missa em Si Menor, BWV 232, de Johann Sebastian Bach foi na interpretação de Karl Richter (1926-1981) e da Orquestra Bach de Munique. Hoje, após a revolução das interpretações com instrumentos originais, é uma gravação de valor apenas histórico, mas mesmo assim, é ABSOLUTAMENTE IRRESISTÍVEL para mim e, se não vou às lágrimas, é porque o supergo segura a barra.

Abaixo, o Cum Sancto Spiritu, trecho central da maior obra musical já escrita em todos os tempos — não, exagero nenhum, estou ultrabem acompanhado nesta opinião.

Se não aparecer a imagem, clique aqui.

E agora, o belíssimo e estranhamente melódico — em obra tão contrapontística — Agnus Dei lá quase do final.

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Do autoritarismo

Não, o assunto não é futebol. É sobre algo que sempre me fascinou: o comportamento das massas, mesmo no microcosmo de um pequeno grupo em pé numa arquibancada.

O Chivas ganhava o jogo por 1 x 0 e estávamos todos nervosos ou apavorados com a possibilidade, naquele momento bem real, de perdermos a Libertadores para um time inferior. Foi quando meu vizinho acendeu um cigarro de maconha. Nada anormal num estádio de futebol  — o cheiro de maconha é uma das fragrâncias mais comuns nestes locais. Só que de repente um grupo de pessoas começou a berrar desorganizada e histericamente:

— Apaga, apaga, apaga essa merda!

Olhei para trás e vi um grupo de senhores cujos rostos pareciam ter saído de uma foto de milicos das muitas ditaduras que nosso continente viu durante os anos 60 e 70. Tinham as caras cortadas à foice, rostos irritados e seriíssimos como se estivessem apanhando de mexicanos. E se mostravam cada vez mais agressivos:

— Fracassado, viciado, maconheiro, filho da puta, vagabundo, traficante! Apaga esta bosta! Apaga agora, porra!

O fumante a meu lado, de olhos vermelhos certamente em função da derrota parcial de seu time, estava apavorado, sem saber se iam chamar a Brigada Militar ou se ia apanhar ali mesmo. Só que naquele exato momento Rafael Sóbis fez o gol de empate.

Como se tivéssemos ensaiado por horas, todos, mas todos os que estavam em volta e que não tinham sido torturadores no passado, ato contínuo se abraçaram ao maconheiro e passaram a gritar, pulando no mesmo ritmo:

— A-cen-de! A-cen-de! A-cen-de!

Éramos uns 20… Confesso não ter conferido a face dos milicos após a vingança.

Preconceito de Classe

Tenho um amigo que pensa que o preconceito de classe é tão grave ou mais do que o racial, até por sempre ficar impune. Fico na dúvida quando ele fala isso, mas logo penso naquela assessora do Serra que garantiu que o candidato era apoiado por uma “massa cheirosa” e no resultado desta e de outras ações de “classe superior” do grupo: hoje estão sendo punidos por um desempenho pífio de sua tartaruguinha. Também acabo de pensar nos empresários que foram beneficiados pelo governo Lula mas que não podem de modo algum aprovar o governo de um torneiro mecânico sem formação universitária, mesmo que ele tenha garantido estabilidade e maior consumo. Trata-se de puro preconceito de classe.

Célia Ribeiro, em sua coluna dominical no caderno Donna de Zero Hora, publicou, em 22/08, um texto que passa ao largo de suas habituais considerações inofensivas sobre elegância e etiqueta, invadindo com duas patas o terreno mal-cheiroso do preconceito de classe. Destaco um trecho da coluna:

Dia desses, entrei no banheiro de um shopping, por volta das três horas da tarde. Todas as pias da bancada de mármore estavam ocupadas por funcionárias das lojas que escovavam os dentes com o maior esmero, diante do espelho, formando espuma da pasta dental na boca. Havia mais duas senhoras à espera para lavar as mãos, mas nada levou aquelas vendedoras a acelerar sua higiene bucal (bom senso seria os shoppings oferecerem aos seus funcionários banheiros privativos para deixá-los mais à vontade).

Se isso não ocorre, que elas escovem os dentes no banheiro comum, rápida e discretamente, sem ruído, deixando os detalhes para aprimorar na pia de casa, no final do dia. E, cá para nós, não é nada favorecedora a imagem de um rosto no espelho, com as bochechas infladas pelo vaivém da escova.

Achei que Célia foi pra lá de infeliz. Ela deveria, no máximo, dirigir sua crítica exclusivamente à administração dos shoppings e não qualificar as mulheres escovadoras de “funcionárias” e as mulheres esperadoras de “senhoras”. Todas são mulheres, provavelmente trabalhadoras. Simples assim, minha cara colunista. O tom da crítica, com descrições de bochechas infladas e baba saindo pela é muito preconceituoso. Queria ler Célia dizendo o mesmo de uma senhora…

Estranho, lembro agora de que uma ou duas vezes fui atingido por suspiros impacientes por ter resolvido lavar o rosto num shopping. Tenho a pele oleosa e penso que às vezes sou um sebo ambulante. O pessoal não gosta e nesse caso nãop se trata de preconceito de classe.

Portanto, fica aqui uma pergunta para Célia Ribeiro: devo lavar o rosto num banheiro de shopping ou apenas fazer os números 1 e 2 e lavar as mãos, hein?

"O Sétimo Selo": Bergman usa o cinema para reflexão

André Setaro
Publicado originalmente no Terra

Ingmar Bergman (14/07/1918 – 30/07/2007), um dos maiores pensadores do cinema, morreu há três anos, com 89 anos de idade completados poucas semanas antes de seu passamento. A coluna lembra o genial cineasta através de seu belo “O sétimo selo”.

Não apenas um cineasta, mas um autor completo, um pensador que se vale do cinema para refletir suas angústias, suas dúvidas, refletir sobre a condição humana, Ingmar Bergman é um dos maiores realizadores cinematográficos de todos os tempos. Houve uma época, nos idos dos 60 e 70, que o seu nome despertava imensa curiosidade e, por causa dela, formou-se um verdadeiro culto ao diretor, que alguns chamaram de bergmania. Se na primeira fase de sua carreira não conheceu o sucesso nas bilheterias, considerado pelos exibidores um cineasta maldito, a partir dos meados dos anos 60 um mercado se abriu para suas obras. Principalmente na sua “fase psicanalítica” – “Cenas de um Casamento”, “Face a Face”, “Sonata de Outono”… Os filmes de Bergman que mais aprecio, no entanto, exceção se faça a “A Paixão de Ana” (1970), e, também a “O Silêncio”, são aqueles da primeira fase, notadamente “O Sétimo Selo” “Morangos Silvestres”, “A Fonte da Donzela”, “Noites de Circo”, “Mônica e o Desejo”, “Sorrisos de uma Noite de Verão”, “Juventude”, entre outros. No frigir dos ovos, entretanto, posso dizer que admiro a todos os seus filmes.

“O Sétimo Selo”, obra-prima da primeira fase do cineasta, ainda que produzido em 1956, somente em 1976, vinte anos depois de sua realização, foi lançado no Brasil através da distribuidora “Cinema 1” e, aqui na Bahia, apresentado neste mesmo ano no antigo cine Nazaré da Praça Almeida Couto. Já “Morangos silvestres” obteve estréia ainda na segunda metade do decurso dos 50, conseguindo grande impacto e estupefação na época de seu lançamento Alegoria tragicômica em forma de mistério medieval, com um desenvolvimento livre do imaginário da Idade Média, “O sétimo selo” ( “Det sjunde inseglet”) tem sua fábula estruturada na volta de Antonius Blok (Max Von Sydow) à Suécia após dez anos de luta na cruzada e o jogo que estabelece com a Morte num tabuleiro de xadrez. Antonius e seu lacaio Jons (Gunnar Blornstrand) se dirigem, por uma longa jornada, ao castelo onde moram, e, no caminho, contemplam uma terra arrasada pela peste. Este itinerário de Blok, do erro inicial à Verdade final, é conduzido com extrema maestria por Ingmar Bergman, que se utiliza, aqui, do cinema, como um veículo “filosofante” e reflexivo acerca da condição humana. No percurso, Blok e Jons encontram vários personagens, mas apenas um casal de artistas mambembes se constitui num remanso de paz e tranquilidade, longe da mesquinharia e da hipocrisia dos outros. Blok, entretanto, continua o jogo de xadrez com a Morte (impressionante caracterização de Bengt Ekerot), mas esta, de repente, ganha partida. Vencedora, precisa levar consigo todos os personagens, deixando na vida somente o casal de cômicos (Bibi Andersson e Nils Poppe), o único capaz de desfrutá-la de maneira pacífica e feliz.

“O Sétimo Selo”, antes da consagração definitiva que se daria, um ano depois, em “Morangos silvestres”, já coloca Bergman, no panorama internacional, como um dos grandes cineastas do século XX. Trata-se de um filme, a rigor, gnoseológico em que se estuda a origem e a possibilidade do conhecimento por parte do homem. Por autor, os filmes de Bergman se constituem, na verdade, em variações sobre um mesmo tema. Em todos eles, presentes: a incomunicabilidade dos seres, a angústia do estar-no-mundo, a inevitabilidade e o mistério da morte, os tormentos da relação amorosa… “O sétimo selo” volta às raízes do cinema nórdico de Victor Sjostrom e Mauritz Stiller, à floração sueca, quando a natureza tinha uma forte influência no comportamento das personagens. Assim, “Det sjunde inseglet” pertence à série de filmes que Bergman realizou e que possuem um “decór” histórico, ainda que o fato de a ação localizada na Idade Média não tira a esta obra magistral seu caráter contemporâneo. O homem que Bergman estuda é o homem do aqui e do agora.

Veja-se o caso dos dois protagonistas principais, o Cavaleiro e seu lacaio, que formam, a seu modo, um binômio no qual se debate o tema das fontes das possibilidades de conhecimento – não somente o conhecimento de Deus mas de tudo aquilo que escapa à constatação estrita dos sentidos. Elementos de mistérios – a bruxa, a peste, a procissão penitencial.., simbolismos e participações insólitas, como a personagem da Morte, criam, em “O sétimo selo”, um clima tenso ao qual contribuem uma planificação e uma iluminação ( do artista Gunnar Fischer antes de Bergman trabalhar com o iluminador Sven Nykvist) cuidadas com esmero.

Em “O Sétimo Selo”, como a afirmar a condição de autor do cinema moderno, Bergman mostra uma constância temática e estilística, um universo ficcional próprio e um estilo – que faz o artista! – pessoalíssimo. À guisa de um pequeno exemplo, que se veja alguns personagens secundários, os quais, vêem se repetindo nos filmes de Bergman de filme a filme: o casal dos artistas ambulantes (presentes desde Noites de Circo até O Rosto”; a controvérsia estabelecida entre o ferreiro e sua mulher – contraponto e complemento. Nas palavras do ensaista Claude Beylie (no indispensável “As obras-primas do cinema, Martins Fontes): “A mensagem é clara. Continuamos ameaçados pela peste, que se chama, hoje, guerra nuclear, e, diante deste perigo, não há outro recurso além dos corações puros. Bergman opõe ao fanatismo e à intolerância, “O leite da ternura humana”. No entanto, seu filme nada tem de dogmático. Ele joga o jogo da ingenuidade iconográfica, desenvolve livremente o imaginário medieval. Faz-nos pensar em Durer, nas xilogravuras de Hans Beham, na “dança macabra” de Orcagna. A reflexão filosófica é irrigada sem cessar por um onirismo límpido e, até, por traços de humor, notadamente através do personagem do escudeiro.”

André Setaro é crítico de cinema e professor de comunicação da Universidade Federal da Bahia (Ufba).

A volta do "Ao Mirante, Nelson!"

Logo após Idelber Avelar, temos o retorno de Nelson Moraes à blogosfera. Eram e são meus blogs preferidos. O leiaute do novo Ao Mirante desagrada a este daltônico, mas a verdade é que só me importo mesmo com os textos. Vai para o Google Reader já.

E, para lembrar do cerrado, não esqueçam que Charlles Campos agora tem o seu.

P.S. — Estou absolutamente puto da vida. Cheguei ao trabalho com um monte de coisas para imprimir e a geringonça impressora não sai do offline. Estou louco para reinstalar tudo e perder duas horas enquanto o suporte dorme…

Amor à Literatura

Recebi uma intimação para responder este questionário. Na verdade, acho um saco estes pedidos e sempre os ignoro, mas como é sobre literatura, vamos lá. Tentei descobrir o primeiro autor das perguntas, mas entreguei os pontos.

1. Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?

Esta pergunta é sobre que livro gostaríamos de SER. Interessante. Então, desejaria ser alegre. Sugeriria tornar-me a Modesta proposta para evitar que as crianças da Irlanda sejam um fardo para os seus pais ou para seu país de Jonathan Swift. Opcionalmente poderia ser o irresistivelmente cômico Uma Confraria de Tolos de John Kennedy Toole ou quem sabe — tornando-me mais reflexivo, sutil e elegante — os esplêndidos Contos de Machado de Assis. Em qualquer um dos casos, porém, seria muito solicitado pelos ouvintes; seria popularíssimo, sem dúvida.

Quem não leu Fahrenheint 451 ou não viu o filme de mesmo nome de François Truffaut, ficará sem entender a última frase do parágrafo anterior… ou talvez tudo.

2. Já alguma vez ficaste apanhadinho(a) por um personagem de ficção?

Sem dúvida, este questionário veio de Portugal. Apanhadinho é igual a “ficar caidinho” ou “ficar apaixonado”.

Uma vez, numa roda de amigos discretamente alcoolizada, uma das mulheres perguntou aos homens presentes quais teriam sido as mulheres de suas vidas. Por azar, coube a mim ser o primeiro a responder. Sou dono de proverbial franqueza, de lendária sinceridade e, depois de olhar para minha insegura cara-metade da época, declarei: a mulher de minha vida é certamente alguém que quis e nunca tive e da qual só imagino delícias, perfeições, calma e carinho. É alguém de quem não conheço os defeitos. A mulher de minha vida é… E disse um nome conhecido daquelas pessoas que quedaram-se boquiabertas.

Hoje, fiquei pasmo ao ver que as “mulheres de livros” pelas quais me apaixonei têm igualmente amores irrealizados. A primeiríssima é Sílvia, que aponto polemicamente como a maior personagem de Erico Veríssimo. Ela é a principal habitante de O Arquipélago, terceiro volume da trilogia O Tempo e o Vento. Sílvia é casada com outro, mas seu grande amor é Floriano, com quem apenas dialogava, trocava cartas e a quem escrevia um diário. A segunda é Sarah Woodruff, do romance de John Fowles A Mulher do Tenente Francês e a terceira é Leen do romance Casa sem Dono, de Heinrich Böll. A história de Sarah é muito conhecida, ainda mais depois da indicação de Meryl Streep ao Oscar, no papel de Sarah. Já Leen é obscura. Ela morre aos 19 anos, na página 124 de minha edição, após morar um ano com Albert, personagem principal do livro de Böll. O vendaval de sua entrada e saída em Casa sem Dono destroçou temporariamente minha vida.

3. Qual foi o último livro que compraste?

(Anotação: nunca fazer esta pergunta à Caminhante.)

Foram dois, ambos comprados num sebo: Os Duelistas de Joseph Conrad e A chuva antes de cair, de Jonathan Coe.

4. Qual o último livro que leste?

Foram dois.  A Borra do Café de Mario Benedetti e A chuva antes de cair de Jonathan Coe.

5. Que livros estás a ler?

Estou clássico. Leio Ensaios de Montaigne e Os Duelistas de Conrad.

6. Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?

Penso que nunca mais me apaixonarei por livros como na juventude. O que lia durante a adolescência e até os vinte e poucos anos marcou-me muito mais do que qualquer coisa lida depois. Todos os meus livros vêm de lá:

Contos de Machado de Assis (relidos depois);
Contos de Anton Tchekhov (relidos depois);
Grande Sertão: Veredas de Guimarães Rosa;
Doutor Fausto de Thomas Mann (relido depois);
Dom Quixote de Cervantes.

Bem, se a fiscalização da ilha fosse camarada, acrescentaria um Manual de Sobrevivência…

Algo com Nuno Mindelis, por favor

Porque esse angolano foi uma das melhores coisas que vi em São Paulo.

Nuno Mindelis – You don’t have to go (gravado ao vivo no Mr. Blues)

Nuno Mindelis – Tenho Medo

Nuno Mindelis – While we cry

Nuno Mindelis – Hey Joe

A nota biográfica que há no YouTube da primeira canção que apresentei:

Nuno Mindelis nasceu em 07 de agosto de 1957, em Cabinda, Angola. Seu interesse pela guitarra começou muito cedo, quando tinha apenas 5 anos de idade e com 9 anos já construia e tocava suas próprias guitarras.

Ouvindo Blues desde a infância, sua primeira influência foi de Otis Redding, Booker T & The MG (Steve Cropper-guitarrista da gravadora Stax, Donald ”Duck” Dunn e Al Jackson).

Mais tarde, unido a um primo mais velho no Canadá, Nuno passou a tocar em uma banda em jams e em clubes locais, permanecendo por lá aproximadamente um ano. Em 1976, após um ano de separação da família, se reuniu a eles em sua casa no Brasil.

Até meados de 1990 nada acontecia, até que uma gravação independente, feita fora do país, começou a ser tocada nas rádios locais. Em 1991 ele foi convidado a gravar seu álbum de estréia em carreira solo: ”Blues & Derivados”, que recebeu muitos elogios da mídia Brasileira.

Em 1992 ele gravou seu segundo álbum solo: ”Long Distance Blues” da Movieplay Records. Este álbum teve participação de Larry McCray, guitarrista da banda de Gary Moore, e do músico J.J. Milteau, tocando Harpa. Mais uma vez a crítica foi favorável e Nuno foi muito bem recebido pela mídia Brasileira. Nesse ano, paralelamente à excursão promotional do álbum, Nuno participou de um festival de Blues em São Paulo também participaram: Robert Cray, Otis Clay, Ronnie Count, Lonnie Brooks, e Bo Diddley.

A revista americana ”Guitar Player” citou em 1994, Nuno Mindelis como destaque e finalmente em 1998, Nuno foi reconhecido como o melhor ”Blues Guitarrist’ do ano’.

Em 1995 Nuno foi convidado tocar no 20o aniversário do Antone’s em Austin, no Texas, abrindo para Junior Wells e Guy Forsite, Clarence Gatemouth Brown e Storyville. As manchetes do jornal do Austin Blues anunciavam a chegada de Nuno como ”Fera Sulamericana está chegando!”. Nesse mesmo ano Nuno gravou ”Texas Bound”, com participação de Tommy Shannon & Chris Layton da ritmica do ”Double Trouble” de Stevie Ray Vaughan.

Em 1999 Nuno lançou ”Blues On The Outside” e mais uma vez a mídia aplaudiu. Atualmente, Nuno Mindelis é considerado pela mídia e pelos fãs como o melhor guitarrista de blues brasileiro’.

Frases:

”O Blues é simples, mas não é fácil. São dois adjetivos muito diferentes”.
”O Brasil tem uma boa platéia Blues, mas a mídia ainda a trata como um mercado muito restrito”
…”já temos musica local forte, não precisamos consumir coisas e fora.”

Porque hoje é sábado, Gisele Bündchen

Não negue, você ficou decepcionado.

Pois, para os padrões do PHES, Gisele Bündchen tem pouca substância.

E, além do mais, trata-se de uma figurinha encontrável em qualquer banca.

Porém, ela precisava deste sábado. Trata-se de uma ação humanitária.

Nossa, essa mulher linda está sofrendo muito…

… ela é gaúcha…

… quase não come nada…

… deu uma grana para a reconstrução do Haiti…

… e é torcedora daquela aGremiação crepuscular.

Precisa, portanto, de um consolo, de um ombro amigo, …

… de um x-bacon numa das lancherias da frente do Beira-Rio, …

… observando o Absoluto contra o céu azul.

Céu da cor de seus olhos, a contragosto acostumados à escuridão.

Na boa, Gi, não adianta dar dinheiro para esta outra reconstrução.

Hoje, aquilo é Cartago. É mais complicado do que qualquer Haiti.

Confissões de um homem sem caráter

Por Franciel Cruz
(espalhando coisas boas a meu respeito)
(ver última frase do quarto parágrafo)

Com seu inconfundível timbre que passeia entre o mar da Bahia e as montanhas dos Gerais, a mineira Jussara Silveira, talvez a melhor e mais baiana cantora da atualidade, fez a fundamental profissão de fé no Bolero Maria Sampaio. Ouçam: “Amigos são parentes que pude escolher”. Porém, um amigo sacana metido a erudito (esta raça de gente ruim) garante-me que os autores da referida canção, Almiro Oliveira e J. Veloso, se inspiraram na seguinte assertiva do francês Deschamps: les amis — ces parents que l’on se fait soi-même, que, numa tradução malamanhada, seria algo como “Amigos são familiares que cada um escolhe sozinho”.

Foda-se a erudição! Nada entendo de francofilia, direitos autorais e pouco me importa quem vai receber os royalties. O fato é que, há coisa de dois anos, eu escolhi uma nova família: o Impedimento. Foi amizade e admiração à primeira lida. A cada texto era como se a gente já se conhecesse desde sempre. E mais grave: contrariando toda e qualquer lógica, fui acolhido com uma generosidade assombrosa. E quando digo acolhimento não me restrinjo ao sentido figurativo, de dar guarida aos meus desajeitados rabiscos. Nécaras.

Um exemplo? Recebam.

No início de setembro do ano passado, comuniquei a estes meus novos parentes que iria descer a ribanceira rumo a Porto Alegre para orientar o Esporte Clube Vitória na peleja contra o Grêmio. Ato contínuo, Milton Ribeiro, a quem eu não conhecia nem de vista, de nariz ou de chapéu (chupa, Machado de Assis!) abriu as portas de sua casa, oferecendo-me uma excelente estadia, regada a bons papos e rangos de alta qualidade – não necessariamente nesta ordem. E tudo isso sem pedir nada em troca, antes que os hereges comecem a propagar maledicências. Afinal, até onde eu sei, Milton é gaúcho, mas não pratica.

Pois bem.

Tentando retribuir tamanha gentileza, como se existisse alguma forma de retribuição, fiz algo que contraria minha religião. Entreguei a um torcedor de outro time o bem mais precioso dos 18 continentes: uma camisa do Vitória. E ele vestiu o manto Rubro-Negro com orgulho – e fiquei puto. Por quê? Ora. Mesmo tendo sido eu o autor do presente, não conseguia conceber alguém que não torce para o meu Leão envergando a indumentária sagrada.

Aliás, este meu xiitismo leva-me sempre a indelicadezas.

Na antevéspera da final da Copa do Brasil entre Vitória x Santos, por exemplo, estava perdido na noite suja paulistana bebendo com Izabel Marcilio. Lá pra tantas, ela fala sobre suas duas paixões: O Corinthians e o Bahia. Sob o efeito de diversas canjebrinas e do incurável fanatismo, sentenciei. “Quem torce para mais de um time não tem caráter”. A menina Bel, que também possui uma generosa alma impedimentística, relevou.

Quero dizer, relevou, vírgula, pois mulher é bicho vingativo.

No início desta semana, ao ver que eu despejei no Terra Magazine minhas dores e orgulhos inúteis de glórias idem, ela partiu para o fulminante contra-ataque. “Chegando no Terra? Massa, Franciel. Quando tiver mais chegado, pergunte a Bob Fernandes (editor da disgrama) se ele é Baêa ou Santos, que isso de torcer pra dois times, que eu saiba, é coisa de mau caráter”.

Engoli em silêncio, pois não gosto de contrariar mulher.

Quarta, inclusive, a minha Patroa telefonou para esta gloriosa repartição convocando-me para ver um show de um cara com nome jogador francês: Tiganá Santana, exatamente às 20h. Eu quase disse não, mas pensei em meu espinhaço e recorri a Marisa Monte: “Claro, meu bem. O que é que a gente não faz por amor?”.

E fui. Porém, o ponteiro do relógio acelerava e o desinfeliz não parava de cantar. Eu nada ouvia porque minhas vastas emoções e pensamentos imperfeitos estavam voltadas para a partida entre Inter x Chivas. Exatamente às 21h23, o francezinho sai do palco. A plateia pede bis e eu peço uma guilhotinha. Vontade da zorra de enforcar todos aqueles hereges.

Vendo meu desespero, ela pergunta: “O que é que tá acontecendo?” Eu digo: “Nada. É que hoje tem a decisão da Libertadores e estou preocupado com meus amigos gaúchos”. E ela, de bate-pronto: “Não sabia que angústia era contagiante”.

Nem eu. Chego em casa esbaforido e vejo que a porra do time colorado foi contaminado pelo meu nervosismo. Ninguém acerta zorra de nada. Ninguém, vírgula, um viado mexicano manda uma bola no ângulo. 1 x 0. Penso logo nos pênaltis. Afinal, já haviam me ensinado que “No futebol da arquibancada, prova de caráter é ser pessimista”.

Começa o 2º tempo e Rafael Sobis continua enojando meu baba. E quando ele perde uma bola boba na lateral, não resisto e grito para todo o norte e nordeste de Amaralina: “CELSO ROTH, FILHO DA PUTA, bote Alecsandro, carajo, este conhece de futebol, pois já jogou no Vitória. Não quero nem saber se o matador está machucado”. Nem termino o xingamento e Sobis manda a criança para o barbante.

Então, chego à úncia conclusão possíevel naquele momento: sabe tudo este Roth, não foi à toa que começou a carreira treinando o Brioso Rubro-Negro.  O quê? Vai trocar Sobis por Damião? Este Roth não toma jeito. Continua o mesmo sacana que um dia botou Petkovic no banco para colocar Alex Mineiro.  No entanto, Leandro Damião, honrando o sobrenome de nordestino, sai numa correria desabalada como se fora um fugitivo da seca e só para na terra prometida: 2 x 1.

Ninguém dorme mais no pacato nordeste de Amaralina. Nem meu filho, que há poucos dias me propiciara ETERNAS EMOÇÕES, suporta minha algazarra quase solitária e larga a seguinte: Meu pai, você é um alienado.  Nem ligo. Afinal, desprovido de qualquer resquício de caráter, estava comemorando meu primeiro título Internacional.

Essa homilia é dedicada a Teixeirinha.

Originalmente escrito para o Impedimento.

Milton Ribeiro faz aniversário e é entrevistado

(Escrito há dois anos. Discretamente atualizado.)

A entrevistadora, que presumo recém chegada à menopausa, entra em minha casa a fim de me entrevistar para o Programa Hoje é Meu Dia. O programa apresenta aniversariantes e hoje é o caso. Eu tinha preenchido uma ficha candidatando-me ao programa. Improvisa-se um palquinho em minha casa. Ficamos sentados em frente a meus livros. Desculpo-me pela bagunça, mas o câmera diz para deixar assim, pois o cenário tem personalidade. Sentamos lado a lado, eu e a apresentadora.

P (à guisa de introdução) – Nosso entrevistado de hoje, Milton Ribeiro, está completando 53 anos. É um dia feliz! Ele está muito bem para sua idade. Se excetuarmos o Viagra ou o Cialis, meus caros espectadores, Milton não usa medicamentos  de uso contínuo, o que demonstra que ele é mais um prodígio de boa saúde física encontrado por nosso prestigiado programa. Saúde física e mental, conforme vocês poderão comprovar pelo bom humor de nosso entrevistado.

P – Como você mantém esta atitude positiva perante a vida?

R – Bem, como a vida não tem mesmo sentido, logo percebi que poderia optar por várias posturas, todas equivalentes. Poderia me desesperar a cada vicissitude, ou rir delas; escolhi rir. Poderia roubar e matar, mas como prefiro ser bem aceito, escolhi ser bom. Acho que poderia ser bem mais imbecil, porém gosto de cultura e de me informar e aí está um sério problema. É difícil ser pra cima e informado ao mesmo tempo, mas tenho tentado.

P – Entendo. Mas o Sr. deve tentar mais. Confiamos no Sr.!!! Ho, ho, ho!

R – Estou na luta.

P – O Sr. nunca ficou deprimido, certo?

R – Olha, houve episódios em que quis me matar, principalmente durante minha separação, mas digamos que o grande bobo que há em mim emergiu novamente após uns meses e voltei a ficar assim.

P – Nada grave, portanto.

R – Sem dúvida, nada grave. Foram apenas seis meses em que me deprimi. Minha atitude positiva perante a vida fez com que eu me livrasse de todo o insuportável estresse dando de presente todo o pouco que construíra e hoje estou aqui, em perfeita forma.

P – Você então possui uma disposição natural para a felicidade?

R – Sem dúvida. Eu nasci daltônico, estrábico, tenho pés chatos, minha voz é horrível, sou meio cambota, estou engordando e perdendo cabelo, mas só pensei nisso agora. Prova de que sou feliz e mais: de que a felicidade é proteger-se de si mesmo. É o que faço. Sempre.

P – E então? O Sr. é a prova de que as pessoas não devem desistir de seus sonhos?

R – Hum… Sem dúvida.

P – E quais são seus sonhos hoje?

R – Comprar um Karmann-Ghia, ler livros que não me encham o saco, fugir de ver TV, esquecer os jornais da grande imprensa e a música ambiente, reentrar em forma, ouvir música…

P – Vejam, meus amigos, são coisas simples! A felicidade ESTÁ nas coisas simples.

R – Sim, parecem simples, mas tem muito mais…

P – Desculpe interromper. Acho que nossos telespectadores querem saber como você chegou aos 53 anos sem tomar medicação alguma.

R – Eu ia vivendo numa boa até que fui ao cardiologista. Fui porque quis, imotivadamente. Nunca tive nada. Mas descobri que meu colesterol estava batendo nos 300.

P – Ho, ho, ho. Que coisa!

R – Pois é. Aí comecei a tomar um Lípitor antes de dormir e a coisa caiu para 100.

P – Sensacional!

R – Sim, eu sempre obedeci os médicos direitinho.

P – E então, tudo resolvido!

R – Claro, como eu sou alguém naturalmente feliz, ignorava que podia ser perigoso transformar o próprio sangue em água.

P – E então?

R – Hoje tomo meio comprimido e a coisa vai bem.

P – Viram? Tudo se resolve com bom senso, ho, ho, ho. E o peso?

R – Eu adquiri 10 quilos nos últimos trinta anos.

P – Só?

R – Sim, se seguir assim, viverei o suficiente para experimentar a obesidade mórbida.

P – Ho, ho, ho. Não é maravilhoso? E você não acha que poderia manter o peso atual?

R – Não.

P – Mas por quê?

R – Olha, eu tomei Sibutramina de 15 mg por dia e tinha a mesma fome incontrolável. Desisti. Quando chega ao final da tarde, penso tanto em chocolate que até esqueço de desejar a morte súbita de algumas pessoas.

P – Nada de maus sentimentos, nada de maus sentimentos! Diria até que sua chocolatria, ho, ho, ho, é muito boa para afastar maus sentimentos.

R – Sim. A chocolatria me salva deles e passo a sonhar apenas com Alpinos e que tais.

P – Ho, ho, ho. Você tem muitos amigos?

R – Sim, esta é uma parte boa da minha vida.

P – Maravilha, uma vida social intensa. E a vida sexual?

R – Olha, quando a coisa começou a falhar fui a um médico que garantiu que meu único problema era mental.

P – Um problema mental! Que bom que não era grave!

R – Ele me disse que se eu me preocupasse muito com os problemas, geraria um aumento de adrenalina no sangue e que esta adrenalina faria com que uma válvula não funcionasse bem.

P – Apenas um problema hidráulico!

R – Sim, claro. Se não vedar bem, o sangue sai. É como uma Hydra estragada.

P – Hidra, como assim?

R – Hydra, uma válvula que se usa em privadas.

P – Ho, ho, ho. Perfeito.

R – Aí, ele me perguntou se minha vida era exageradamente problemática, pois o estresse causa a produção em excesso de adrenalina.

R – E você?

P – Eu respondi que na época estava com um advogado, buscando a obter a guarda de minha filha.

P – Ho, ho, ho. E então?

R – Ele se apavorou. Pois do jeito que minha situação se encontrava, teria dificuldades de fazer uma boa vedação. O sangue iria embora e o pau…

P – Ho, ho, ho. Estamos entrevistando Milton Ribeiro e são 19h43 minutos em Porto Alegre.

R – …

P – E… Bem, isso significa que se você não tiver grandes preocupações, a válvula funciona e sua vida sexual também?

R – Sem dúvida! Pois não tenho problemas físicos, só os mentais causados pela adrenalina.

P – Então pode ser solucionado!

R – Claro. Foi por isso que fiz o seguinte raciocínio: como não sou rico e, portanto, meus problemas não são de fácil solução, deveria considerar seriamente a necessidade de tornar-me uma besta quadrada, um bobo alegre.

P – E conseguiu?

R – Venho tentando.

P – E será que é mesmo necessário tornar-se um bobo alegre…? Ho, ho, ho.

R – Não, mas é uma questão de prevenção. E, dentro de minha estratégia, tenho que seguir esta trilha, entende? Sou obrigado.

P – Maravilhoso!

R – Mas há desvios que atrapalham.

P – Quais?

R – Eu ligo a TV de manhã e sinto aquela adrenalina voltando. Ou dão péssimas notícias ou é vulgar pra caralho.

P – Pra car… ho, ho, ho! A TV pode ser boa, Sr. Milton, pode ser sim!

R – Sim, porém há sempre mais. Por exemplo, vou ler um bom livro, mas este me dá SEMPRE uma visão por demais realista, ouço uma bela música mas ela é SEMPRE meio trágica.

P – Ora, o mundo não é bom para os intelectuais. Por isso, os cientistas inventaram o Viagra. Só para vocês, conforme o Sr. demonstra.

R – Você está ficando irritada e isto não é bom… Lembre-se que não devo me estressar. É mesmo um remédio para intelectuais?

P – Deve ser!

R – É que desconheço pessoas felizes. Não apenas intelectuais. Todos são infelizes, mesmo que racionalizem. Todos morrerão.

P – Vocês são muito desagradáveis.

R – Como?

P – Desagradáveis. Os intelectuais gostam de ficar tristes e de dizer! Fazem dramas.

R – E você é feliz?

P – O entrevistado é você. Não interessa o que eu penso. Nem se penso.

R – Você pensa. Só que mal. Pensa que as pessoas possam ser felizes e satisfeitas quando ninguém é assim. A gente é bom ou ruim, interessante ou desinteressante, branco ou preto, engraçado ou sisudo, sociável ou não, mas é sempre insatisfeito.

P – Você não serve para nosso programa.

Fala para o câmera:

P – Ele não irá ao ar no “Hoje é meu Dia”. Procuraremos outra pessoa. Ou um ator contratado, talvez.

R – OK, não posso me estressar.

P – Passe bem. Vocês não têm nada a acrescentar!

R – Vocês?

P – Vocês, os metidos, os idiotas. Imagina falar mal da TV! Na TV! Passe bem!

Ela levanta e faz um sinal ao câmera. Ele faz tsc, tsc, tsc, e diz escolhem cada abobado, acho que não leram a ficha… A entrevistadora manda o câmera apressar-se.

O monumental FIASCO de meu querido sobrinho

Em 16 de agosto de 2006, o Inter disputava sua segunda final de Libertadores. Deu tudo certo, mas o fiasco de Filipe G. foi monumental. Estava 2 x 2 e, se o São Paulo fizesse o terceiro, iríamos para os pênaltis. Os paulistas pressionavam. Nem era muita pressão, como pude ver depois, mas ali, na hora, antecipávamos a hora e a vez em que tomaríamos o gol.

Então, aos 40 do segundo tempo, Filipe G. não suportou mais a pressão e declarou:

— Vou assistir o final no banheiro!

Assistir? Ato contínuo, ele se dirigiu ao referido recinto. Eu perguntava repetidamente a meu filho quantos minutos ainda tínhamos de jogo e lancei-lhe um olhar assassino quando ele, sempre consultando seu cronômetro, respondeu pela quarta vez que estávamos aos 42 do segundo tempo. Mas o importante nessa história é o Filipe. Ele entrou no banheiro com seu rádio a toda altura. Lá, encontrou uma seita.

— Desliga AGORA essa m… Aqui ninguém ouve rádio!

Ele observou o local. Havia umas 30 pessoas escondidas no banheiro, caminhando de um lado para outro, em silêncio, tentando adivinhar o que lhes dizia o som do estádio.

Charlles Campos passa de pedra a vidraça

Um dos maiores e mais queridos comentaristas deste sítio acaba de abrir um blog. Mas espero que ele continue assíduo e pedra neste local. Bem, sem maiores delongas, AQUI está ele em toda sua amplitude de vidraça. Visitem-no! Não esqueçam que as visitas e os comentários são nosso melhor combustível.

Longa vida ao novo blog!