O Novo Papa – A Opinião do L`Osservatore Ateo

Eu publiquei o texto abaixo em meu ex-blog. Era o dia 7 de abril de 2005 e o mundo só falava na complicada eleição do novo Papa. Foi uma época insuportável, só se falava em santidades, mudanças, etc. Não sei por quê, fui atacado por um bando de católicos furiosos que reclamavam que… Bem, melhor reproduzir parte do mais tranquilo comentário da época, feito por um sujeito habitualmente fascista:

Caro Milton, o que me tem fascinado ultimamente é a enorme preocupação dos não-católicos com o que se passa na Igreja Católica. Infelizmente o que acontece é que o Vaticano é considerado simplesmente como uma super-estrutura política, o que é, mas sem levar em conta a sua dimensão espiritual e moral, quando é essa dimensão lhe dá a relevância única que ela tem no mundo crente e não-crente. Se lhe interessar o que filosoficamente penso do assunto, passe no meu blogue…

E lá no “blogue” dele o que havia era uma louvação sem fim ao Wojtila. Ele devia saber, pois veio o Ratzinger e tudo seguiu exatamente igual. Mas achei divertido reler sobre as esperanças de mudanças que até os católicos tinham na época. Tolinhos… Foram mais de 100 comentários, a metade me ofendendo. Hoje, passados 4 anos e fora do período de campanha eleitoral às claras, não vejo nada de extraordinário no post.

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Há algo estranho em minha conformação cerebral que impede a instalação de noções como Deus, milagres, religiões, etc. Porém, reconheço a importância que tais fés têm para a humanidade e sei ser impossível um mundo formado por pessoas sem Deus, apesar de pensar que é assim que sempre estivemos. É com este espírito cético (louco para tirar em sarro) e respeitoso (sabendo que, infelizmente a religião é inerradicável) que escrevo o post abaixo.

Minha formação religiosa é inexistente. Nunca frequentei igrejas, nunca me senti tentado a recorrer a algo superior quando as coisas foram mal ou bem, não li a Bíblia e não conheço nem aqueles movimentos que devemos fazer com a mão direita quando entramos numa igreja. Minha proximidade com o Espírito Santo limitou-se aos torneios de pingue-pongue que jogava, ainda criança, na Igreja Metodista Central de Porto Alegre.

Para mim, é desconfortável ver e ouvir a mídia nestes dias. Além da nauseante super-oferta de Vaticano, penso que a ignorância dos comentaristas esteja muito próxima à minha. As descrições incompletas dos rituais que cercam a morte do Papa e a futura eleição causam-me frouxos de riso. A simbologia parece impermeável a eles e os abandonaria se não soubesse da importância política que tem a escolha do chefe da Igreja Católica.

Ouço e leio todas as notícias que me passam por perto e não posso evitar mal estar e irritação com as longas digressões acerca da santidade de Wojtyla. Quando começam tais delírios, desligo o rádio ou mudo de artigo. Os vaticanólogos reais, os entendidos nestas questões políticas, dão-me clara impressão de que João Paulo II teve um prelado mais longo do que desejaria o Colégio de Cardeais. Ele era o Papa que deveria empurrar pela linha de fundo o comunismo polonês e, se possível, fazer o mesmo com os vizinhos. Ajudou a fazer o serviço, mas viveu demais. Neste ínterim, revelou-se um marqueteiro de primeira e um conservador que impediu avanços que estavam maduros até mesmo em seu meio. Dizem os especialistas que a maioria dos Cardeais desejariam finalmente “dar continuidade aos milimétricos passos em direção ao mundo” – expressão minha – e que, para tanto, seria melhor haver papados de aproximadamente dez anos, ao invés de um super-papado conservador de 26. Além disto, dizem eles que a tendência histórica é da alternâcia entre papas conservadores e “liberais”.

Se estes caras têm razão, o novo Papa será um septuagenário bom de conversa e que saiba jogar no ataque. Não seria eleito novamente um volante brucutu de 58 anos. Mais: seria alguém que, finalmente, daria os tais passinhos em perseguição ao mundo. Abro o jornal e leio Dom Claudio Hummes, arcebispo de São Paulo, dizer vagamente: “O próximo Papa será diferente”. Esperamos que sim, Dom Claudio.

Os passinhos seriam (1) a permissão para os padres casarem. Cá para nós, isto é uma maldade prima-irmã da autoflagelação. A igreja está atrasadíssima na liberação destes seres humanos para que eles possam ter prazer sexual, filhos e — grandes problemas — futuras viúvas, pensões e herdeiros que não sejam a oniparente Santa Madre. Na mesma linha está (2) a liberação da pílula para as mulheres e (3) dos preservativos para os homens. Somos os únicos seres vivos que mantêm relações sexuais por puro prazer — por que é tão difícil reconhecer isto? — e sabemos quão positivo para um casal é ter uma vida sexual saudável e prazerosa. A igreja poderia dar uma forcinha a seus fiéis, não? Outro item necessário seria a eliminação de um machismo que nem os CTGs (Centros de Tradições Gaúchas) mantêm mais, ou seja, (4) o da exclusão feminina nos postos de importância do clero. Hoje, se não há uma impossibilidade de direito, é factualmente impossível a ascensão de uma Papisa. Não é um absurdo?

Aborto, eutanásia e tudo aquilo que acompanha o progresso científico (pesquisas com células-tronco, etc.) ficariam para depois. Calma, a atualização far-se-á passo a passo, bem devagarinho.

Espero que um dia, provavelmente quando este blogueiro já estiver morto, a igreja torne-se a verdadeira reserva moral da humanidade. Neste dia, ela aceitará que muçulmanos, judeus, budistas e gente como eu (ético até a medula quando não se trata de roubar livros, não-cristão, bom e mansinho) mereçam viver tranquilamente no Céu, talvez em local privé, convivendo com um monte de ateus e cristãos legais.

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Yeda e Lya, Lya e Yeda, Lyeda

Yeda na Jerônimo Coelho (centro de Porto Alegre):

E Lya Luft no fofo blog da desgovernadora: bem aqui. O post é patético, mas os comentários são imbatíveis.

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2666, de Roberto Bolaño (1ª Parte – La parte de los críticos)

A primeira parte de 2666 é dedicada às peregrinações dos críticos Jean-Claude Pelletier (francês), Manuel Espinoza (espanhol), Liz Norton (inglesa) e Piero Morini (italiano) em busca do famoso escritor desaparecido de nome impossível: Benno von Archimboldi. Há um culto em torno de Archimboldi, eterno candidato ao Nobel e autor reconhecido mundialmente por especialistas, diferentemente da Cesárea Tinajero de Os Detetives Selvagens. Ele seria uma espécie de Thomas Pynchon alemão, um autor sem fotos, sem biografia e muito estudado. Sabe-se que é muito alto, tendo deixado rastros de sua existência aqui e ali.

A paixão por Archimboldi faz com que os críticos fiquem amigos, formem uma espécie de confraria logo atacada por outras e acabem todos amando a inglesa Liz Norton, às vezes em dupla. As histórias de Bolaño vão novamente saindo umas das outras de forma absolutamente hipnotizante. É difícil largar o livro. Em dado momento parte dos críticos resolvem seguir uma pista mais do que tênue e partem para procurá-lo em Santa Teresa, na fronteira do México com os EUA, onde sabemos que ocorrerão os crimes contra mulheres. Um grande livro, um livro genial? Sim, não tenho motivos para duvidar. Porém La parte de los críticos não é um romance completo e creio que os herdeiros de Bolaño têm razão em não editá-lo separadamente. É uma fantástica abertura de romance. Ponto.

Bolaños volta a fazer arte nas belíssimas trocas de foco narrativo. O final de La parte de los críticos é pura música com suas recapitulações resumidas. O efeito poético dos encontros de Espinoza com Rebeca, entremeadas das conversas noturnas com Pelletier e pela narrativa de Liz Norton de sua viagem à Turim é arrasadora. Ronaldo Bressane chamou inteligentemente a prosa de Bolaño de fluxo de onisciência. É a melhor defnição que li até agora para um narrador que se mascara por detrás de inúmeros personagens com uma única e muito perceptível voz. Bolaño não esconde-se, mas filtra.

Agora, farei uma pequena interrupção para ler o último livro de Carol Bensimon e depois retorno ao 2666, mas exatamente à La Parte de Amalfitano, onde já sei que os 4 críticos vão apenas e simplesmente sumir, para voltar daqui a centenas de páginas.

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Porque hoje é sábado, Michelle Obama

Ontem, na reunião do G20, Michelle Obama mostrou como se faz para demonstrar privadamente repugnância ou desaprovação a alguém. É uma mulher de classe.

Beijou o primeiro-ministro inglês Gordon Brown.

Fez o mesmo com o holandês Balkenende.

Dançou a balalaica com o russo Medvedev.

Demonstrou à mulher do “This is the guy” o motivo pelo qual nunca seremos campeões no basquete feminino. E nem no masculino.

Seguiu cumprimentando efusivamente o japonês Hatoyama após beijá-lo — vi o beijo no YouTube.

Ouviu Sarkozy dizer ao seu ouvido: “Olha o safado do teu marido cheirando o pescoço da Carla!”.

Beijou também o vizinho canadense Stephen Harper.

Mas, e ainda assim para não ficar muito chato, apenas estendeu de longe a mão ao palhaço Silvio Berlusconi, que, burro, fez questão de deixar clara a rejeição.

O tratamento glacial apontado tolamente por Berlusca rendeu ao italiano um olhar bastante severo do maridão (engraçadíssimo…, vejam só)…

… e tornou a discreta desfeita notícia mundial. Concordo inteiramente com Michelle.

Afinal, não se deve obrigar nenhuma mulher a dar beijinhos num sujeito que paga publicamente prostitutas. Uma primeira dama, então, nem se fala.

E foi assim que Michelle Obama tornou-se a estrela de um Porque é Hoje é Sábado de peitos e bundas tapados. Ela foi perfeita.

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25 de setembro de 1994, 19h40, Bárbara

Te vi poucos segundos depois de apareceres
a médica passou a toda velocidade, estava sorrindo
o teu grito era imenso, um bocão de 2,5 Kg
ela te limpava, dizendo nossa ela é forte
e aí te peguei, tu estavas toda rígida,
ainda berrando, embrulhada em panos,
quem eras?

Cuidei muito de ti, tu eras pequena
e me enxergavas imenso
o que sempre me diminuía;
te acostumaste com minha falta de jeito
sempre bem escondida
sob a torrencial chuva de bobagens
das quais sou refém

A infância foi uma infância
e tu nem lembras mais que me pedias, rindo sedutora
na porta da creche
pai, me entrega daquele jeito?
e eu te entregava na porta, segura por um pé, de ponta cabeça
dizendo pelo amor de deus
fiquem com esta porcaria

E aí houve a separação
e deixei tudo para o dado e para ti

mas querias vir
eu cá dizendo que deixara tudo para ti lá
tu dizendo não
e vieste para cá
para mim
para nós

Confesso sem vontade nenhuma de dizer, que tua decisão me (nos) assustou
imaginava anos de despojamento vendo de longe tua formação
quando pediste e pediste e pediste por meses para vir
e, bobo que sou, quando quis ajustar a vida cá
recuperando algo que deixará lá
vi só egoísmo, ódio e cus-
tas

Mas
como foi bom;
quando penso no futuro
quando estou infeliz de dar dó
ou alegre porque houve alguma coisa legal
e a vida voltou a ser uma aventura boa e estamos os
três rindo na cama ou na mesa, penso em ti e o resto vira
lenda e o medo da vida vira medo do dia em que tudo acabará
— pois acabará, querendo ou não —
e que seja numa noite após um desses dias em que mal nos suportamos,
de tão debilóides

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Gabarito

–- Quantas sinfonias Mozart escreveu?
— 40, pois a 37 foi depois descoberta como de Michael Haydn, irmão de Franz Josef. A numeração vai até 41, mas são 40. A Sinfonia Nº 37 não existe.

— Quantas variações há nas Variações Goldberg?
— 30.

— E quantas há nas Diabelli?
— 33.

— Havia muitos Johann na família Bach. Johann Sebastian era o … (primeiro, oitavo, quadragésimo?)
— O 15º.

— Quantos e quais foram os sinfonistas que bateram as botas após a nona e não iniciaram ou completaram a décima?
— Deixa eu ver… Beethoven, Schubert, Bruckner, Spohr, Dvorak, Mahler. Acho que são 6.

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— Qual foi o primeiro livro escrito por Dostoiévski após a prisão?
— Humilhados e Ofendidos, ao menos penso que tenha sido…

— Qual é o romance de Machado de Assis que Milton Ribeiro mais ama?
— Memorial de Aires.

— Qual é o autor gaúcho que é leitura obrigatória para o vestibular da Univ. Federal do Espírito Santo?
— Dyonélio Machado (Os Ratos).

— Qual é o nome da pesquisadora que participa de um ménage à trois em 2666?
— Liz Norton.

— Qual é o romance de James onde os personagens principais mudam-se pouco a pouco dos EUA para a Inglaterra, enquanto os que estavam na Inglaterra vão para os EUA?
— The Ambassadors.

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Atualização das 9h08: ainda não olhei com muita atenção, mas acho que meu amigo Rômulo Arbo levou as putas e a Celina (que desconheço) levou o Noturno, certo?

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Promoção relâmpago!

Descobri que tenho dois livros duplicados de Bolaño: Noturno do Chile e Putas Assassinas.

Ganha Noturno do Chile aquele que responder corretamente ou acertar o maior número das questões abaixo. Em caso de empate, o primeiro a comentar leva.

— Quantas sinfonias Mozart escreveu?
— Quantas variações há nas Variações Goldberg?
— E quantas há nas Diabelli?
— Havia muitos Johann na família Bach. Johann Sebastian era o … (primeiro, oitavo, quadragésimo?)
— Quantos e quais foram os sinfonistas que bateram as botas após a nona e não iniciaram ou completaram a décima?

Ganha Putas Assassinas aquele que responder corretamente ou acertar o maior número das questões abaixo. Em caso de empate, o primeiro a comentar leva.

— Qual foi o primeiro livro escrito por Dostoiévski após a prisão?
— Qual é o romance de Machado de Assis que Milton Ribeiro mais ama?
— Qual é o autor gaúcho que é leitura obrigatória para o vestibular da Univ. Federal do Espírito Santo?
— Qual é o nome da pesquisadora que participa de um ménage à trois em 2666?
— Qual é o romance de James onde os personagens principais mudam-se pouco a pouco dos EUA para a Inglaterra, enquanto os que estavam na Inglaterra vão para os EUA?

Promoção válida até as 23h59 de hoje! Neste horário, publicarei o gabarito…

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A loteria na Babilônia, conto de Jorge Luis Borges

Numa semana meio maluca de reformas em casa e necessidade de trabalhar fortemente fora do trabalho habitual para reforço financeiro, fui hoje a um café acompanhado do fantasma de Borges dentro de uma edição argentina de Ficciones. Ele, logo de cara, no conto La Lotería en Babilonia, envia um recado a quem lerá a narrativa.

…nadie había ensayado hasta entonces una teoría general de los juegos. El babilonio no es especulativo. Acata los dictámenes del azar, les entrega su vida, su esperanza, su terror pánico, pero no se le ocurre investigar sus leyes laberínticas, ni las esferas giratorias que lo revelam.

Em seguida, outra curiosidade: a “interpolación del azar” é semelhante à teoria do Barão de Itararé citada por Graciliano Ramos em Memórias do Cárcere? Passemos a palavra a Graciliano, que chamava o Barão pela junção de seu nome, Apporelly (Aparício Torelli):

Apporelly sustentava que tudo ia muito bem. Fundava-se a demonstração no exame de um fato de que surgiam duas alternativas; excluía-se uma, desdobrava-se a segunda em outras duas; uma se eliminava, a outra se bipartia, e assim por diante, numa cadeia comprida. Ali onde vivíamos, Apporelly afirmava, utilizando seu método, que não havia motivo para receio. Que nos podia acontecer? Seríamos postos em liberdade ou continuaríamos presos. Se nos soltassem, bem: era o que desejávamos. Se ficássemos na prisão, deixar-nos-iam sem processo ou com processo. Se não nos processassem, bem: à falta de provas, cedo ou tarde nos mandariam embora. Se nos processassem, seríamos julgados, absolvidos ou condenados. Se nos absolvessem, bem: nada melhor esperávamos. Se nos condenassem, dar-nos-iam pena leve ou pena grande. Se se contentassem com a pena leve: descansaríamos algum tempo sustentados pelo governo, depois iríamos para a rua. Se nos arrumassem pena dura, seríamos anistiados, ou não seríamos. Se fôssemos anistiados, excelente: era como se não houvesse condenação. Se não nos anistiassem, cumpriríamos a sentença ou morreríamos. Se cumpríssemos a sentença, magnífico: voltaríamos para casa. Se morrêssemos, iríamos para o céu ou para o inferno. Se fôssemos para o céu, ótimo: era a suprema aspiração de cada um. E se fôssemos para o inferno? A cadeia findava aí. Realmente ignorávamos o que nos sucederia se fôssemos para o inferno. Mas ainda assim não convinha alarmar-nos, pois esta desgraça poderia chegar a qualquer pessoa, na Casa de Detenção ou fora dela.

Mas, falemos um quase nada sobre minha leitura: é claro que a parábola proposta por Borges extrapola sua função de ser uma realidade menor que representa uma maior. A loteria É a própria realidade da Babilônia. Ou seja, é a própria vida. A loteria e seus acasos é análoga à vida e vice-versa, regulada por suas regras, condições e infinitas contingências.

A relação mais óbvia que me ocorreu nesta rápida leitura enquanto tomava café é aquela entre a Compañía e a Igreja com suas “ventas de suertes”, o funcionamento silêncioso de Deus, “seu carácter antiguamente plebeyo” e com o total desprezo a quem não participa de sua… loteria.

Porém, o que interessa mesmo a mim é o conto extremamente irônico e divertido, que mostrou-me que posso fazer uma leitura fluida de Borges em sua língua e que isto é um enorme privilégio para quem vem de uma língua materna que produziu literatura bastante inferior…

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Noite de autógrafos e mais

Sexta-feira, Marcos Nunes deixou este conto nos comentários deste blog. Eu não estou dizendo que aqui os comentários são habitualmente melhores do que o post?

Noite de autógrafos

Olhava para todos que entravam na livraria, ele ali, sentado numa cadeira estofada velha, posto atrás de uma mesa, tendo à sua direita dezenas de exemplares de seu último livro, cujo lançamento se dava naquela noite, mas parece que não, ou pela divulgação ruim, ou pelo desinteresse dos leitores pelo volume, ou ainda pelo próprio e quase anônimo autor.

Pagara pela edição, pequena, enviara algumas cartas, convencera alguns amigos a comparecer, contava com algumas presenças, mas as poucas que vieram foram rapidamente embora, sob um constrangimento às vezes desalmado, ora piedoso, mas o comentário mais regular era “Será que ele não desistirá nunca?”

Seu segundo romance, depois de um primeiro volume de poemas e outro de contos. Alguns elogios, principalmente aos contos, alguns do volume, não todos. O primeiro romance não teve êxito, ele mesmo reconheceu. Mas apostava tudo nesse segundo, escrito com vagar, revisto dezenas de vezes, corrigido, reduzido ao mínimo, escrita seca, com um mínimo indispensável de adjetivos, trama complexa, densa. Um amigo escreve um prefácio super elogioso, e o investimento desta vez valeria a pena.

Assim pensava antes dessa noite. Depois de algumas vendas, mais ninguém. Pudera, não servia-se nem cafezinho neste lançamento! Pela livraria circulam pouquíssimas pessoas. Entre elas, percebe um sujeito pequeno, pele um pouco morena, cabelos encaracolados vastos, castanhos com fios brancos, óculos redondos sobre sobrancelhas grossas entre um nariz algo grande e caído sobre os lábios murchos. Parecia um estudante daqueles eternos, que freqüentam os bancos escolares à fuga das responsabilidades da vida adulta. Teria vindo para o lançamento e encontrava-se perdido, sem entender que o escritor era ele, tão óbvio, sentado atrás de uma mesa antiquada, repleta de volumes novos, ainda cheirando a tinta?

Um tipo esquisito. Fuçava um livro e outro, lendo, lendo… Sorriu e pronunciou alto o nome “Carver!” quando se deparou com o volume recém-lançado. Malditos norte-americanos! Escrevem qualquer coisinha e vendem aos milhares, milhões! E o que são afinal Fritzgerald, Hemingway, Faulkner? Bah, evocadores da barbárie! Voltou a olhar o cara, mas ele não estava no mesmo lugar. Reencontrou-o, mas sem qualquer livro na mão. Prestou atenção: sob as vestes largas, havia coisa ali. Tomara que seja pego, o salafrário. Ladrãozinho de meia tigela, e ainda por cima com um péssimo gosto.

Cansou de esperar. Pegou um volume dos seus, sobre a mesa, e o pôs entre as páginas do jornal do dia, que carregava consigo por conter um aviso do lançamento. Uma pequena nota. Foi andando devagar, tentando representar o papel de um freqüentador qualquer da livraria. Terá o ordinário notado na sua presença anterior à mesa? Sabe-se lá. Mas chegou perto dele, sorrindo com simpatia mas mantendo um ar de conspirador. O outro também sorriu para ele, mas com um ríctus de dor. Sofrerá alguma doença? Estará de ressaca? Será que ele não comeu hoje? Chama-o com um olhar, e o outro se aproxima com naturalidade, enquanto ele age da forma mais suspeita possível. Quando estão bem juntos, o escritor passa para o outro o jornal e, dentro dele, um exemplar de seu livro.

— Vai, leva. É novo. Lançado hoje. Coisa boa.

Com a maior pachorra do mundo, o outro saca o livro do meio do jornal, folheia, lê o prefácio em poucos segundos, fazendo uma vista d’olhos, devolve o volume para o escritor e guarda consigo o exemplar do diário.

— Me gusta robar libros, fala com extrema simpatia o leitor, certamente lotado de exemplares surrupiados sob suas roupas (deve ter livro até na bunda, pensou o escritor).

– Me encanta se alguien se arriesgar a robar un libro mio, respondeu o escritor.

Mais uma vez o outro sorriu, e se foi. Cara esquisito, nem brasileiro é. Desgraçado. Prefere o idiota do Carver, o idiota do…, o idiota do…, inventivava, ficando possesso, quando notou que não estava mais com o próprio livro na mão. Grandessíssimo filho de uma puta, pensou consigo mesmo, mas se deu conta que não, falara a frase, e bem alto. Continuou então no mesmo tom, sorrindo às escâncaras. Grandessíssimo filho de uma puta, grande cara! Que ao menos o desgraçado leia o que me roubou – foi com essa frase que terminou sua explicação ao dono da livraria sobre a razão daquele sonoro escândalo. Lágrimas nos olhos de tanto rir, não sei.

Aos amigos, tudo.

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No dia anterior, Cassionei Petry publicara aqui trecho de uma entrevista de Roberto Bolaño:

R. Me gusta robar libros. Aunque ya no puedo robar, sería bastante vergonzoso ser atrapado, pero cuando era inédito, robé muchísimos. Pero muchos, muchos… Una vez con un amigo –que también era un buen robador de libros- hicimos una apuesta en la Avenida Corrientes, cuando había muchas librerías (creo que todavía hay bastantes): fuimos a Corrientes y Callao y nos pusimos uno de cada lado de Corrientes, y la idea era llegar hasta Cerrito habiéndonos robado por orden los siete tomos del En busca del tiempo perdido de Marcel Proust en librerías sucesivas.

P. ¿Lo lograron?

R. Sí, yo lo logré. Él no. Él creo que robó cuatro, tres, no llegó. […] De todas maneras, me doy cuenta de que perdí el don. Lo más extraño de cuando robaba libros es que yo sentía, físicamente, una especie de aura que me hacía invisible, y que efectivamente era así, porque he salido de librerías con libros de este porte (indica con sus brazos un tamaño enorme), así, al hombro, y no me veían. Era una cosa que tal vez, la gente me miraba y decía “no, no puede ser que se lo esté llevando de una manera tan evidente”… Pero ahora ya no lo siento más. […] Uno de los momentos más gratificantes fue ver a una persona robándose un libro mío cuando yo estaba en una Feria del Libro y que viniese a que yo se lo firmase. Cuando se lo firmé le dije “te agradezco mucho que te hayas robado este libro”, pero también le dije “está todo bien, genial”. Me encantó. Me encantó que alguien se arriesgara a robar un libro mío.

(entrevista de Bolaño a Rodrigo Fresán)

Arturo Belano, seu alter-ego, no romance “Los detectives salvajes” também rouba livros. Se bem me lembro um outro escritor ensina a Belano esta arte.

Mais Bolaño, citado pelo mesmo Cassionei logo após o dia do aparecimento do conto de Marcos Nunes:

Los libros que más recuerdo son los que robé en México DF, entre los dieciséis y los diecinueve años. […] En México había una librería extraordinaria. Se llamaba Librería de Cristal y estaba en la Alameda. Sus paredes, incluso el techo, eran de vidrio. Vidrio y vigas de hierro. Examinada desde fuera, parecía imposible poder robar un libro allí. Sin embargo, la tentación de hacer la prueba pudo más que la prudencia y al cabo de un tiempo lo intenté. El primer libro que cayó en mis manos fue un pequeño tomo de Pierre Louis… […] Pero fue una novela la que me sacó y me volvió a meter en el infierno. Esta novela es La caída, de Camus […] Después de Camus todo cambió. Recuerdo el ejemplar: era un libro de letras muy grandes, como un primer abecedario, de pocas páginas, de tapas duras, con un dibujo horrendo en la portada, un libro difícil de sustraer y que no supe si ocultar bajo la axila o en la espalda, pues no se amoldaba a mi americana de estudiante cimarrero, y que al final saqué a vista y paciencia de todos los empleados de la Librería de Cristal, que es una de las mejores formas de robar y que había aprendido en un cuento de Edgar Allan Poe.”

P. ¿Ha robado algún libro que luego no le gustó?

R. Nunca. Lo bueno de robar libros (y no cajas fuertes) es que uno puede examinar con detenimiento su contenido antes de perpetrar el delito.

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Goodbye Pork Pie Hat, de Charlie Mingus, com letra de e interpretado por Joni Mitchell (e mais)

Dica do Vinicius (sem acento).

Ou aqui. Um show bobinho de 1980 com Jaco Pastorius, Pat Metheny, Michael Brecker… Uf! Logo abaixo, repetida, a lindíssima letra escrita por Joni. E, lá embaixo, como extra, coloco o célebre solo de Pastorius que seguia Pork Pie no show.

Goodbye Pork Pie Hat

When Charlie speaks of Lester
You know someone great has gone
The sweetest swinging music man
Had a Porkie Pig hat on
A bright star
In a dark age
When the bandstands had a thousand ways
Of refusing a black man admission
Black musician
In those days they put him in an
Underdog position
Cellars and chittlins’

When Lester took him a wife
Arm and arm went black and white
And some saw red
And drove them from their hotel bed
Love is never easy
It’s short of the hope we have for happiness
Bright and sweet
Love is never easy street!
Now we are black and white
Embracing out in the lunatic New York night
It’s very unlikely we’ll be driven out of town
Or be hung in a tree
That’s unlikely!

Tonight these crowds
Are happy and loud
Children are up dancing in the streets
In the sticky middle of the night
Summer serenade
Of taxi horns and fun arcades
Where right or wrong
Under neon
Every feeling goes on!
For you and me
The sidewalk is a history book
And a circus
Dangerous clowns
Balancing dreadful and wonderful perceptions
They have been handed
Day by day
Generations on down

We came up from the subway
On the music midnight makes
To Charlie’s bass and Lester’s saxophone
In taxi horns and brakes
Now Charlie’s down in Mexico
With the healers
So the sidewalk leads us with music
To two little dancers
Dancing outside a black bar
There’s a sign up on the awning
It says “Pork Pie Hat Bar”
And there’s black babies dancing…
Tonight!

Ou aqui.

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A nova tatuagem de Elisabetta Gregoraci (ver post anterior)

Mesmo sem ignorar o nem tão sutil significado subliminar desta obra de um amigo — cada amigo que arranjo… –, fico feliz com a nova tatuagem que La Gregoraci adotou, não obstante a oposição do marido.

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A extraordinária caixa de comentários de ontem…

… não merece um novo post hoje. Divirtam-se com os comentários do post abaixo!

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Enrique Vila-Matas ironiza Paulo Coelho em documentário…

… a 1 minuto e 9 segundos…

… da terceira parte (3/6) de um excelente documentário sobre Roberto Bolaño.

Também aqui.

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Introdução à leitura de "2666", de Roberto Bolaño

Sim, eu não suportei a angústia. Quando fui a Montevideo, ele estava bem na entrada da Puro Verso. Abri o livro de 1125 páginas, vi que era de leitura confortável, com pontos de parada a cada duas ou três páginas; pensei que um livro daquele tamanho poderia ser mais um problema ortopédico do que literário para o leitor, mas que se repetiria na tradução brasileira. Ademais, para que serve o espanhol que conheço se recuasse ante o original de um escritor que amo? Comprei 2666 e voltei, não sei por quê, direto para o hotel. Abri o livro na primeira página e li a epígrafe:

Um oásis de horror em meio a um deserto de tédio.

CHARLES BAUDELAIRE

Oásis de horror… E, na página seguinte, a importante Nota Explicativa que traduzo a seguir da original:

Nota de los herederos del autor

Ante la posibilidad de una muerte próxima, Roberto dejó instrucciones de que su novela 2666 se publicara dividida en cinco libros que se corresponden con las cinco partes de la novela, especificando el orden y periocidad de las publicaciones (una por año) e incluso el precio a negociar con el editor. Con esta decisión, comunicada días antes de su muerte por el propio Roberto a Jorge Herralde, creía dejar solventado el futuro económico de sus hijos.

Después de su muerte y tras la lectura y estudio de la obra y del material de trabajo dejado por Roberto que lleva a cabo Ignacio Echevarría (amigo al que indicó como persona referente para solicitar consejo sobre sus asuntos literarios), surge otra consideración de orden menos práctico: el respeto al valor literario de la obra que hace que de forma conjunta con Jorge Herralde cambiemos la decisión de Roberto y que 2666 se publique en un solo volumen, tal como él habría hecho de no haberse cumplido la peor de las posibilidades que el proceso de su enfermedad ofrecía.

ou

Nota dos herdeiros do autor

Diante da possibilidade da uma morte próxima, Roberto deixou instruções para que seu romance 2666 fosse publicado em cinco livros correspondentes às cinco partes do romance, especificando a ordem e a periodicidade das publicações (uma por ano) e até mesmo o preço para negociar com o editor. Com esta decisão, enviada dias antes de sua morte pelo próprio Roberto a Jorge Herralde, pensava deixar resolvido o futuro econômico de seus filhos.

Após sua morte e depois da leitura e estudo da obra e do material de trabalho deixado por Roberto, Ignacio Echevarría (o amigo que indicou como seu conselheiro literário) surgiu com outra consideração de ordem menos prática: o respeito ao valor literário da obra, que faz com que, em conjunto com Jorge Herralde, alteremos a decisão de Roberto e que 2666 seja publicado primeiro em um só volume, como o autor teria feito se não tivesse sido cumprida a pior das possibilidades que oferecia seu processo de doença.

(Trad. sem muita revisão feita por mim)

Então, lembrei de que estava em Montevideo e que seria interessante, além de econômico, voltar a comportar-me como um turista e não como um literato inveterado que fica lendo em seu hotel não obstante a viagem. Eu que deixasse a leitura para Porto Alegre. Retornei à 18 de julho e à Puro Verso, sabendo que o tesouro estava guardado no hotel e combinei o almoço com a Claudia no Panini`s da Travessa Bacacay, na Cidade Velha, bem perto da outra Puro Verso, a de seis andares. Neste ínterim, não fiz muita coisa que não fosse fuçar em alguns antiquários em busca do Spica perfeito.

Quando a Claudia chegou, comemos o maravilhoso almoço de sempre do Panini`s, lembro que falamos  no preço das roupas, no estado das meus blusões e, levados pelo Cabernet Sauvignon, em John Kennedy Toole. e sua mamãe. Na verdade, bebemos tanto que foi necessário um pit stop no hotel. onde ele, 2666, estava.

E agora estou lá pela página 140, faltando umas 900 para ler. Meu estado é: maravilhado. É curioso: em minha opinião, estou fazendo uma leitura fundamental para quem queira acompanhar a cena literária contemporânea, mas não há, no Brasil, meu ambiente, grande ressonância a Bolaño. Aliás, não há ressonância a nada que não seja perecível, efêmero. É nosso país. Para nossa sorte, há o Uruguai e a Argentina aqui perto. E há os blogues portugueses. Lá, faltam 9 dias, 14 horas, 39 minutos e vinte e seis segundos para 2666 ser lançado. Há um blog que acompanha o pré-lançamento e toda a reação ao livro. Ele faz uma contagem regressiva atá a data de lançamento, 26 de setembro de 2009. Há comentários por toda a blogosfera lusitana, parece haver autêntica expectativa, debate, existem tentativas talvez exageradas de arranjar-lhe um bom lugar na história da literatura, divulga-se opiniões de gente que leu (por mais amalucadas que sejam) e a cultura parece ser até assunto de conversa nas ruas. Isso em Portugal.

Para viver bem do Brasil, há que se acostumar com nossa estupidez. Quando a Cia. das Letras lançar o livro haverá matérias amadorísticas naqueles mesmos jornais, a Cultura dará desconto para quem fizer a compra antes do lançamento, vão chamá-lo de Livro do Ano, o bom Sérgio Rodrigues vai publicar uma crônica provocativa a seus leitores lançando a dúvida — Bolaño é superestimado ou não? — e será uma pequena confusão de leitores e não-leitores (a maioria) a iniciarem o enterro uma obra que, puxa, deveria ser ao menos debatida. E estamos, por incrível que pareça, na América Latina. E o livro lida com personagens e problemas muito, mas muito mesmo, latino-americanos. E com licença que vou ler mais um pouco.

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Desgoverno Yeda pega fogo

O dia cheio da desgovernadora: abriu um blog de grande relevância, apareceram novas gravações, mais do que comprometedoras, e quase virou churrasco para a peonada. Uma bela carne de pescoço.

Vamo queimá uns arquivo, tchê Yeda?

Oigaletê, que deu certo!

Uia que fogo bonito! Chega de queimá arquivo no Paranoá!

Governadora? Lhe saltou alguma fagulha? A senhora tá em chamas?

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Saudades de Robert Altman (1925-2006)

Eles vendem sapatos, eu faço luvas. Mas isso não é nada. Apenas estamos em negócios ligeiramente diferentes.

ROBERT ALTMAN, sobre os grandes estúdios de Hollywood

Quando Robert Altman faleceu, em 2006, o mundo ficou mais burro. O mestre, autor mordaz de filmes polifônicos e que se contrapunham às convenções narrativas de Hollywood, deixou-nos acompanhados de seus oitenta filmes, sendo que alguns estão dentre os melhores que vi: Short Cuts (1993), McCabe and Mrs. Miller ou Onde os Homens são Homens (era este o título no Brasil?) (1971), M.A.S.H. (1970), Nashville (1976), O Jogador (1992), Kansas City (1996), O Exército Inútil (1983), Três Mulheres (1977), Quinteto (1978) e Assassinato em Gosford Park (2001). São filmes que ficarão. Há também o maravilhoso Brewster McCloud – Voar é com os pássaros, de 1970, com aquele vertiginoso voo da câmera entre as nuvens. Diretor especialmente querido entre os atores americanos — para quem costumavam trabalhar em seus pequenos papéis recebendo o piso da categoria –, sua ausência está sendo sentida por mim. Não podemos dizer que não foi reconhecido, como pode ser conferido na lista abaixo. Foi um diretor de cinema que eu amava por ter feito da desigualdade entre seus filmes um método — nunca se sabia como seria o próximo –, por ter dado notável importância à linguagem dentro de um esquema tão industrial e por fazer filmes seríssimos e artísticos, ao lado do maior dos deboches.

Talvez seus maiores seguidores sejam o Paul Thomas Anderson de Magnólia e, curiosamente, o Quentin Tarantino de Pulp Fiction, que utiliza narrativas paralelas análogas às que Altman às vezes apresentavam, além dos longos diálogos em livres-associações.

Dia desses, revi o incomum Três Mulheres na Net. Altman faz as três atrizes principais — Shelley Duvall, Sissy Spacek e Janice Rule — renderem como nunca, principalmente Duvall. Apesar do parentesco com Persona: a silenciosa muralista vivida por Janice Rule, o ritmo da narrativa, a absorção da personalidade da personagem de Duvall por parte de Spacek, Três Mulheres é o mais americano e crítico dos filmes. Suas cenas de cowboys e policiais sobre motos, a rejeição do que não é cool, o uso do automóvel com a repetida ironia do vestido, a amostragem de um país cafona e engraçado que impõe comportamentos e posturas infantis ou idiotizadas. Sim, é um filme difícil de descrever. Ao lado de passagens que parecem de sonho, construídas por um Tarkóvski cheio de inspiração, há a mais deslavada comédia, na atuação patética e exata da grande Shelley Duvall. Creio que há ambientes e estados de alma que podem apenas ser criados pelo cinema e Três Mulheres é único em seu clima corrosivo, kitsch e humano, filmado com a maior elegância formal. OK, perdi. Altman me deu uma surra nesta tentativa de descrever seu filme. Mas continuo louco para rever suas principais obras.

Abaixo, então, uma prova do surpreendente reconhecimento que Altman recebeu em vida:

– Ganhou a Palma de Ouro, no Festival de Cannes, por “M*A*S*H*” (1970).

– Ganhou o prêmio de Melhor Diretor, no Festival de Cannes, por “O Jogador” (1992).

– Ganhou o Leão de Ouro, no Festival de Veneza, por “Short Cuts – Cenas da Vida” (1993).

– Ganhou em 1996 um Leão de Ouro especial no Festival de Veneza, em reconhecimento à sua carreira.

– Ganhou o Urso de Ouro, no Festival de Berlim, por “Oeste Selvagem” (1976).

– Ganhou o Prêmio FIPRESCI, no Festival de Berlim, por “Secret Honor” (1984).

– Recebeu 5 indicações ao Oscar, na categoria de Melhor Diretor, por “M*A*S*H*” (1970), Nashville (1975), “O Jogador” (1992), “Short Cuts – Cenas da Vida” (1993) e “Assassinato em Gosford Park” (2001).

– Recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Filme, por “Nashville” (1975).

– Ganhou um Oscar honorário em 2006, em reconhecimento à sua carreira no cinema.

– Recebeu 4 indicações ao Globo de Ouro, na categoria de Melhor Diretor, por “M*A*S*H*” (1970), “Nashville” (1975), “O Jogador” (1992) e “Assassinato em Gosford Park’ (2001). Ganhou por “Assassinato em Gosford Park”.

– Recebeu uma indicação ao Globo de Ouro de Melhor Roteiro, por “Short Cuts – Cenas da Vida” (1993).

– Recebeu uma indicação ao BAFTA de Melhor Filme, por “O Jogador” (1992).

– Recebeu 3 indicações ao BAFTA de Melhor Diretor, por “M*A*S*H*” (1970), “Cerimônia de Casamento” (1978) e “O Jogador” (1992). Ganhou por “O Jogador”.

– Recebeu uma indicação ao BAFTA de Melhor Roteiro, por “Cerimônia de Casamento” (1978).

– Recebeu 4 indicações ao César de Melhor Filme Estrangeiro, por “Nashville” (1975), “Cerimônia de Casamento” (1978), “O Jogador” (1992) e “Short Cuts – Cenas da Vida” (1993).

– Ganhou o prêmio de Melhor Diretor no Independent Spirit Awards, por “Short Cuts – Cenas da Vida” (1993).

– Ganhou 3 vezes o Prêmio Bodil de Melhor Filme Americano, por “Nashville” (1975), “O Jogador” (1992) e “Short Cuts – Cenas da Vida” (1993).

– Ganhou o Prêmio do Público na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, por “Jazz’34” (1996).

Obs.: Fonte consultada para os prêmios de Robert Altman: Adoro Cinema

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Fim de semana

O som insuportável da TV; o toque do telefone que nunca ouço por estar longe; a volta do esquema chama-derrota de Tite — deu certo!; os fones a toda altura em meus ouvidos para escapar ao barulho de TV; a cadelinha vira-latas parada na sala, olhando para o nada; o almoço bom com truta e alcaparras com a menina na porta do restaurante entregando a senha — sua cara de desgosto; a terrível chuva que parou; a vitória perfeita do injustiçado Rubens Barrichello; a postagem e a leitura dos comentários ao Porque Hoje é Sábado; as refeições sempre acompanhadas de vinho; o gerente do supermercado perguntando se encontrei tudo o que precisava; o telefone que toca sem parar no vizinho; os Concertos para Piano de Mozart ouvidos um atrás do outro nos fones; o som insuportável da TV chegando até meus ouvidos quando a música fica tranquila — como poderá ser tranquila com a intromissão estúpida da TV? –; a ida à competição de hipismo no meio do barro, meus tênis molhados e a vontade de encontrar umas galochas quaisquer; a vitória da Bárbara, as fotos no podium, sua queda de bunda no barro; a frase do professor dizendo que a Claudia é a responsável por ter mostrado o hipismo a minha filha; a ótima tarde de sábado ouvindo Corelli e lendo o Pamuk que fez bem ao Nobel; o sumiço do meu filho — Pai, domingo, vou almoçar no restaurante húngaro com uns amigos, para facilitar já durmo lá… –; o cheiro de pipoca combinando com a infantilidade da TV; os machucados nas mãos de minha mãe por ter feito a cadeira de rodas andar; a enfermeira dela nos pedindo leite desnatado — Não temos, não temos, só semidesnatado ou natural, Semidesnatado então, por favor –; a pizza boa do sábado à noite; o vinho no fim; a indisposição da Claudia após comer e elogiar o pudim; minha dor de cabeça por ter lido sem óculos — por que repito sempre esta merda? –; o ir dormir com ela (a dor de cabeça) bem cedo; o acordar sem dores com Pamuk e Barrichello; a revisão sobre o que escrevera Vinícius Jatobá acerca do livro, minha concordância; a Bárbara acabando o percurso com cara de sonhadora sobre o cavalo; a beleza das bergamotas compradas por R$ 0,75 o quilo quando vi que tinha apenas R$ 2,00 na carteira (agora tenho R$ 1,25); o ter levado comida do restaurante para o jantar de domingo — uma espécie de truta à belle meunière mais canelones muito bem feitos –; a Roma fazendo dois a um no Siena; o jogador que morreu; o dia cinza, mas já sem chuva; meu filho que estudou sábado pela manhã, sumiu e agora volta apressado porque tem que estudar, ou não; o curativo nas mãos de minha mãe, ela me olha sorrindo, mostrando que nunca compreenderá que tem que tirar as mãos das rodas; algo me incomodando muito, a TV sempre ligada emitindo vozes excessivamente alegres; a impressão de que Brendel comeu uma nota no Concerto Nº 23, Não, não, sim, comeu sim, penso; os cocôs da cachorra no andar de baixo; a reorganização dos 1200 discos de vinil, as decorrentes dores nas costas que incomodam menos que o som da TV; os 3000 CDs fora de ordem, depois os livros, Vou morrer; a chegada de meu filho aos berros pela casa; o almoço de sábado em minha sogra, mais vinho, inevitável com aquela comida…; o café feito por minha concunhada; os erros de Guiñazu entregando o jogo; o MSN apitando; a raiva de meu filho — tapas insistentes nas pernas, Puta merda!; os beijos melados em meu afilhado, que tem a convicção de que sou louco; minha irmã chegando para visitar a mãe; a tosse da Bárbara; a indisposição da Claudia; os ferimentos de minha mãe, agora na cama; minha melancolia; o desejo de conhecer Istambul.

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El Roto no El Pais de hoje

Enviado por Helen Osório.

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Charles Mingus – Goodbye Pork Pie Hat

Sugestão de meu filho Bernardo, novamente. Aquele Marsalis de três domingos atrás também foi sugestão dele.

Ao vivo no Festival de Jazz de Montreux de 1975: Charles Mingus [baixo] Don Pullen [piano] George Adams [sax] Gerry Mulligan [sax barítono] Benny Bailey [trompete] Danny Richmond [bateria]. Falta o nome de um dos músicos, penso.

Atualização de segunda-feira, 7h42: Não falta mais: é Jack Walrath [trompete]. Obrigado, Vinicius (sem acento).

Ou aqui.

Logo após a morte de Mingus, Joni Mitchell lançou o espetacular disco Mingus, onde punha letras e interpretava “canções” de Charlie Mingus. Aqui está a bela letra que recebeu Goodbye Pork Pie Hat, escrita pelo baixista em homenagem a Lester Young.

Goodbye Pork Pie Hat

When Charlie speaks of Lester
You know someone great has gone
The sweetest swinging music man
Had a Porkie Pig hat on
A bright star
In a dark age
When the bandstands had a thousand ways
Of refusing a black man admission
Black musician
In those days they put him in an
Underdog position
Cellars and chittlins’

When Lester took him a wife
Arm and arm went black and white
And some saw red
And drove them from their hotel bed
Love is never easy
It’s short of the hope we have for happiness
Bright and sweet
Love is never easy street!
Now we are black and white
Embracing out in the lunatic New York night
It’s very unlikely we’ll be driven out of town
Or be hung in a tree
That’s unlikely!

Tonight these crowds
Are happy and loud
Children are up dancing in the streets
In the sticky middle of the night
Summer serenade
Of taxi horns and fun arcades
Where right or wrong
Under neon
Every feeling goes on!
For you and me
The sidewalk is a history book
And a circus
Dangerous clowns
Balancing dreadful and wonderful perceptions
They have been handed
Day by day
Generations on down

We came up from the subway
On the music midnight makes
To Charlie’s bass and Lester’s saxophone
In taxi horns and brakes
Now Charlie’s down in Mexico
With the healers
So the sidewalk leads us with music
To two little dancers
Dancing outside a black bar
There’s a sign up on the awning
It says “Pork Pie Hat Bar”
And there’s black babies dancing…
Tonight!

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Porque hoje é sábado, Catherine Zeta-Jones

Tenho certeza de que, quando jovem, …

… jamais Catherine Zeta-Jones imaginaria casar com um ser tão repugnante como este:

Anyway, tudo o que a gente não quer presumir é que ela seja uma débil mental.

OK, ela não chegou ao absurdo de casar com Nicholas Cage, …

… mas sua escolha ficou próxima ao nível mais baixo da evolução humana (Cage).

Ela, que poderia fazer-se acompanhar de qualquer um de nós — todos belos espécimes…

… cheios de inteligência superior –, escolheu logo aquele ser.

Para completar minha incompreensão, acabo de saber que ela aniversaria no mesmo dia de Shostakovich e de minha filha.

A julgar pelos precedentes, é genial!

O País de Gales recebeu seu mais belo rebento em 25 de setembro de 1969, em Swansea.

Ela esteve intoleravelmente linda em Chicago, filme pelo qual ganhou um Oscar. Realizou excelente trabalho.

Fez o bom Traffic, onde teve pequena e inesquecível participação.

Depois, foi a única atração do ridículo O Terminal, ao lado do picolé de chuchu Tom Hanks.

Sempre as más companhias masculinas, Cathy.

Você é lindíssima, você merece muito mais que aquele nojento, querida.

Você merece alguém que esteja lendo 2666 e cuja mulher esteja na Argentina.

É minha opinião.

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