Foi num 16 de setembro que o tenente Bianchi reconheceu Víctor Jara

Uma morte de violência inaudita no Estádio Chile

Publicado em 16 de setembro de 2012 no Sul21

É muito difícil encontrar um adjetivo para qualificar a morte de Víctor Jara. Hedionda, aterradora, as palavras parecem fracas quando comparadas aos fatos. Sua morte foi de inverossímil maldade. Uma das formas de se descaracterizar um tópico é recorrer à hipérbole, que é a intensificação do mesmo até o inconcebível, até o paroxismo. Pois a morte de Jara confronta este conceito tão caro aos lógicos. O inconcebível exagero do fato não o descaracteriza, apenas o intensifica.

Na manhã de 12 de setembro de 1973, Jara foi detido, juntamente com milhares de chilenos. No dia 16 de setembro de 1973, cinco dias após o golpe militar, ele encontrava-se preso no Estádio Chile, atual Estádio Víctor Jara (não confundir com o Estádio Nacional do Chile, onde também havia presos). Trata-se de um ginásio multi-esportivo. Mas passemos a palavra ao jornalista brasileiro Paulo Cannabrava Filho, autor de No Olho do Furacão:

Aspecto exterior do atual Estádio Víctor Jara | Foto: Mono González

Em um dado momento, Víctor desceu para a plateia e se aproximou de uma das portas por onde entravam os detidos. Ali topou – cara a cara – com o comandante do campo de prisioneiros que o olhou fixamente e fez o gesto mímico de quem toca um violão. Víctor assentiu com a cabeça, sorrindo com tristeza e ingenuidade. O militar sorriu, contente com sua descoberta. Levaram Víctor até à mesa e ordenaram que pusesse suas mãos em cima dela. Rapidamente surgiu um facão. Com um só golpe, cortaram seus dedos da mão esquerda e, com outro, os da mão direita. Os dedos cairam no chão de madeira, enquanto o corpo de Víctor se movia pesadamente. Depois choveram sobre ele golpes, pontapés e os gritos: ‘canta agora… canta…’ (…) De improviso, Víctor se levantou trabalhosamente e, com o olhar perdido, dirigiu-se às galerias do estádio… fez-se um silêncio profundo. E então gritou:

— Vamos lá, companheiros, vamos fazer a vontade do senhor comandante.

Firmou-se por alguns instantes e depois, levantando suas mãos ensanguentadas, começou a cantar o hino da Unidade Popular (Coligação de partidos de esquerda que apoiavam o governo de Allende), a que todos fizeram coro. Aquele espetáculo era demasiado para os militares. Soou uma rajada e o corpo de Víctor começou a se dobrar para a frente, como se fizesse uma longa e lenta reverência a seus companheiros. Depois caiu de lado e ficou ali estendido.

 

O tenente Edwin Dimter Bianchi, também conhecido como “O Príncipe” | Foto: Grupo Funa

O responsável pela identificação e morte de Jara foi o tenente Edwin Dimter Bianchi. A exumação do corpo de Jara, realizada em junho de 2009, não confirmou o corte dos dedos — o texto de Cannabrava é anterior ao fato. Na verdade, ele provavelmente teve suas mãos esmagadas por coronhadas dos soldados. Havia múltiplas fraturas nos punhos e mãos, além do corpo perfurado por 44 balas. Múltiplos relatos confirmam a veracidade do restante dos acontecimentos. Ele, de forma desafiadora, efetivamente cantou parte do hino da Unidade Popular até o momento dos tiros. Só em 1990, o Estado chileno, através da Comissão da Verdade e da Reconciliação, reconheceu que Víctor Jara foi assassinado a tiros no dia 16 de setembro de 1973 no Estádio Chile e depois teve seu corpo lançado num matagal. Identificado pela esposa. Seus restos foram enterrados no Cemitério Geral de Santiago do Chile.

O homem

Víctor Jara era cantor popular, compositor, educador, diretor de teatro, poeta e ativista político. Ele fazia parte do movimento Nueva Canción Chilena que tinha em Jara e Violeta Parra (1917-1967) seus principais intérpretes. A Nueva Canción ganhou enorme popularidade durante o governo da Unidade Popular — governo de Salvador Allende — , que foi ativamente apoiado por Jara.

Jara em foto tirada para a contracapa de um de seus discos | Foto: Divulgação

Víctor nasceu em 1932 e foi o primeiro filho dos camponeses Manuel Jara e Amanda Martínez. O pai era analfabeto e não queria que seus filhos estudassem. Alcoólatra, acabou por abandonar a família. Amanda criou Víctor e seus quatro irmãos sozinha, insistindo que todos eles estudassem. Amanda — uma mestiça com raízes mapuche, vinda do sul do país — não era analfabeta. Era uma autodidata em música, tocava violão, piano e cantava em casamentos e funerais. Ela conseguiu progredir da economicamente, de modo a manter a família com dignidade, mas como não ficava muito tempo em casa, deixava o violão disponível para o pequeno Víctor e seu amigo e parceiro Omar Pulgar. Em 1950, Amanda mãe morreu repentinamente. Ato contínuo, Víctor Jara entrou para um seminário.

Foi uma decisão muito importante entrar para o seminário. Quando penso agora, acho que fiz aquilo por razões íntimas e emocionais, pela solidão e o desespero com um mundo que até aquele momento tinha sido sólido, simbolizado por um lar e o amor da minha mãe. Eu já estava envolvido com a Igreja, e, naquela altura, procurei refúgio nela. Então pensava que esse refúgio iria guiar-me até outros valores e ajudar-me a encontrar um amor diferente e mais profundo, que porventura compensasse a ausência do amor humano. Julgava que talvez achasse esse amor na religião, dedicando-me ao sacerdócio.

Te recuerdo Amanda, canção de Víctor Jara dedicada a seus pais:

Dois anos mais tarde, em 1952, abandonaria o seminário, mas lembraria positivamente do canto gregoriano e da liturgia. Ingressou na universidade, onde estudou atuação e direção de teatro. Sua biografia indica hesitações entre a música e o teatro até 1957. Ele pensava que tinha que optar por uma das carreiras, quando Violeta Parra o convenceu a manter paralelamente ambas as carreiras. Pelas excursões e tempo das temporadas, pode-se dizer que as peças de teatro que dirigia não eram nada insatisfatórias. Em 1959, excursionou pela América espanhola com Parecido a la Felicidad de Alejandro Sieveking. No mesmo ano, gravou seu primeiro disco de música folclórica, Dos Villancicos. E seguiu as duas carreiras, apesar de que a música foi pouco a pouco tomando mais seu tempo, assim como a política. Até a vitória da Unidade Popular, em 1970, foram cinco LPs e, até 1973, mais três. Depois disso foram muitos os discos ao vivo e as edições póstumas.

Victor Jara: música e poesia revolucionária latino-americana. Herói da resistência à ditadura militar no Chile

Sua atuação política durante o governo Allende teria justificado o ódio do tenente Bianchi. Era uma época em que poucos artistas eram indiferentes à política. Thomas Mann dizia que “Só a indiferença é livre. O que tem caráter distintivo nunca é livre; traz a marca do próprio selo; é condicionado e comprometido”. No início dos anos 70, ser “indiferente” ou “alienado” era falha grave. Jara nunca chegou perto de ser um apolítico. Foi nomeado embaixador cultural do Governo da Unidade Popular, viajou à Cuba e à União Soviética, participou de muitos atos durante as eleições de 1973, dirigiu a homenagem a Pablo Neruda — membro do Partido Comunista Chileno — quando da obtenção do Prêmio Nobel. Ou seja, naquele 16 de setembro, Bianchi viu um artista perfeitamente identificado com o governo que caíra.

Primeiro volume de uma coleção da Caratula Discos dedicada a Nueva Canción Chilena

A Nova Canção Chilena

A Nova Canção Chilena foi um movimento mais amplo do que seu nome sugere, pois não se tratava apenas de uma questão de abrangência musical. A intenção era a de recuperar e traduzir as raízes culturais do Chile e dos povos originários da América Latina. Apesar de ter a música folclórica como carro-chefe, a Nueva Canción abarcava também o teatro, a dança, as artes plásticas e tudo o que fosse cultura.

Grupos universitários passaram a estudar as manifestações da cultura popular chilena e andina. Como consequência, sugiram grupos como o Quilapayun, do qual Jara foi diretor artístico, e o Inti-Illimani. Víctor Jara divulgava o canto mapuche, o canto quéchua, o canto aymará,  e a fronteira entra a política e as artes foram extintas, tanto que a Juventude Comunista financiava gravações de discos e espetáculos dos artistas do movimento. A Nova Canção Chilena, que começou com os artistas e cresceu nas universidades, foi a trilha sonora da revolução, sendo adotada pelos trabalhadores.

Desde o início do século XX, os artistas chilenos imiscuíram-se na política, é uma tradição do país exprimir o político através da cultura. Dentro desta tradição, o trabalho de Víctor Jara foi exemplar: sua obra sempre emergiu da própria vida, fator que a faz universal e que, neste caso específico, uma das maiores representantes das vítimas da ditadura.

El Cigarrito, de Víctor Jara:

Edwin Bianchi durante a Funa | Foto: Grupo Funa

A funa

Funa (do mapudungun Funa, que significa podre, ou Funan, podridão) é o nome dado no Chile a uma manifestação de repúdio público contra uma pessoa ou grupo. Normalmente é utilizado em protestos contra os participantes de atos de violações dos direitos humanos durante o regime militar, e geralmente ocorre na casa ou no local de trabalho dos autores. É nosso “esculacho”, talvez se pudesse dizer.

Edwin Dimter Bianchi, também conhecido como “El Príncipe”, tenente do exército chileno em 1973, trabalhava impune e tranquilamente no Ministério do Trabalho do Chile em 2007, no governo de Bachelet. La Funa foi até lá e o surpreendeu. Ele foi demitido e hoje responde a processo. Vale a pena assistir o pequeno filme abaixo. Inicia comicamente contrastando James Bond e a manifestação lá fora mas, a partir dos 3min20, fica muito sério.

Passagens: não se enganem, a maioria e a razão estão com os manifestantes

Hoje pela manhã, fiz uma pequena enquete na parada de ônibus. Além de mim, havia cinco pessoas esperando o Jardim das Palmeiras. Perguntei o que eles acharam da “baderna” — utilizei o termo preferido dos milicos e do PIG — de ontem. Duas senhoras que não pagam passagem e três trabalhadores e/ou estudantes foram unânimes: tinham que ter quebrado tudo. Mas e a confusão no trânsito? Dona J., podóloga sexagenária que não paga passagem pela idade e por ter comprovado sua baixa renda, respondeu que chegou em casa com duas horas de atraso, mas que deu seu apoio “pra gurizada” da janela do ônibus onde se encontrava. Ela dava risada: “Ontem foi um sufoco sair do centro”. Aqui, com excelentes fotos, a melhor reportagem sobre a noite de ontem.

Em hipótese alguma incito à violência (até porque meus dois filhos participam das manifestações), mas acho naturalíssimas a agressividade verbal das pessoas — “tinham que ter quebrado tudo” — e ainda mais a busca nas ruas daquilo que lhes foi negado nos gabinetes. A democracia é assim, Sr. Cézar Busatto. O secretário  chamou os manifestantes de antidemocráticos quando é exatamente o contrário. Mesmo depois do TCE ter sugerido revisão do cálculo; mesmo depois que o Dieese deixou claro que a tarifa de ônibus em Porto Alegre subiu 670% entre 1994 e 2012 quando a inflação foi de 310%; a prefeitura e seus pares, os transportadores, decidiram manter a sacrossanta e crescente margem de lucro e seus cálculos muito particulares. Queriam o quê?

Após informar o novo e espetacular valor de R$ 3,05 (de forma pusilânime, o prefeito deixou a ingrata tarefa a cargo de seu vice), a prefeitura tratou de ficar o mais quieta possível. O valor, difícil de engolir e de dar troco, é desavergonhado. Aqueles complicados R$ 0,05 no final revelam a segurança e despreocupação com que age o grupo formado por prefeitura e transportadores, essa porcaria público-privada que manda nos preços. Apenas alguns secretários largaram muxoxos contra as manifestações contrárias. Só que agora os manifestantes — um grupo heterogêneo, em boa parte inexperiente nas ruas e que poderá sim cometer ações tresloucadas — acabaram encontrando uma causa comum e vão pressionar.

E, por favor, não é só o preço. Ando diariamente de ônibus e o serviço é péssimo. Horários desencontrados, ônibus explodindo para maximizar os lucros e um calor insuportável dentro deles nos dias quentes é a regra. Ou seja, temos um leque de reclamações. O transporte público de Porto Alegre é um convite ao carro, induz ao retrocesso. Como disse o ex-prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa no Fronteiras do Pensamento, Uma boa cidade não é aquela em que até os pobres andam de carro, mas aquela em que até os ricos usam transporte público. A qualidade de nosso transporte público faz com que muitas vezes eu — um assalariado apologista do transporte público — sonhe em estar lá fora, dentro de um carrinho com ar condicionado.

A correlação de forças no Conselho Municipal de Transporte Urbano (COMTU) favorece inteiramente os empresários e eles fazem o que querem há anos. Chegou a hora de ouvirem a resposta da população. Espero que a revolta cresça de forma não violenta. Há sim que parar o trânsito e se tornar notório. E há que rir daqueles que só falam nos pobrezinhos que ficam presos no trânsito. E desculpem, meus caros Fortunati, Busatto e Nagelstalin, antidemocrático é o sistema que decide o preço deste mau serviço que vocês defendem.

¡Hasta la victoria!

Foto: Ramiro Furquim / Sul21

Ospa, Beethoven e, depois, mais um quilo

Enrique Ricci, competência e partituras pocket | Foto:  Antonieta Pinheiro

Ontem, a ponte levadiça do Theatro São Pedro foi baixada e a Ospa cruzou o fosso a fim de penetrar nos domínios de Eva Sopher. Ali, por trás das muralhas da velha casa, tivemos o primeiro dos chamados Concertos Oficiais da Ospa. O comando esteve a cargo do excelente maestro argentino Enrique Ricci, que costuma reger a partir de partituras pocket muito bonitinhas, mas que causam certa apreensão no espectador que se pergunta: será que ele vai conseguir virar direito as páginas daquela coisinha? Incrível, ele sempre consegue.

A pouco executada Abertura Leonora nº 3, Op. 72b, foi um bonito e coerente início para o conteúdo algo aventuresco da noite. Menos feliz foi a execução do Concerto para piano nº 4. Op. 58. Creio que o jovem pianista Aleyson Scopel não estava num bom dia — soube que ele fizera um ensaio maravilhoso no dia anterior — e a orquestra também não colaborou muito. É claro que a interpretação da obra, que é belíssima e meu concerto para piano preferido de Beethoven, não foi um fracasso, mas ficou abaixo do esperado. Gostaria de acrescentar que a orquestra está passando por período muito agitado por conta da perda de sua sala de ensaios e que, se a crítica vem, há que se dar generoso desconto. Não é fácil fazer arte embrulhado numa ordem de despejo.

O ponto alto foi a Sinfonia nº 3 – “Eroica”, Op. 55. Foi uma execução entusiasmada, de muita musicalidade e dinâmica como deve ser. Grande destaque para a dupla formada pela oboísta Viktoria Tatour e o flautista Artur Elias com Leonardo Winter a seu lado. Na fila de trás, os clarinetistas Augusto Maurer e Marcelo Piraíno, mais o fagotista Adolfo Almeira Jr. também levaram a orquestra pelo bom caminho. Em dia de observar detalhes, ri de Piraino – o homem que conta os compassos dançando –, admirei a atenção de Tatour que, na Eroica, jogou o cabelo para trás da orelha, fez cara de preocupação e logo tratou de desmontar o oboé com um olho enquanto seguia a partitura com o outro — quando terminou a cirurgia, bebeu água (pronto, entreguei a moça!) –, e de Israel Oliveira, que tentava escapar dos cabelos da violinista Elena Romanov a fim de enxergar o maestro. Enfim, coisas.

Beethoven tem a capacidade de deixar todo mundo aceso e feliz. A conversalhada nas coxias e na porta do teatro grassava e, para manter o espírito, é inevitável que se saia depois para jantar. Acrescentemos que o mestre de Bonn torna também incontornável a bebida. O resultado foi que, pela manhã, apareceu quase 1 Kg a mais na balança. Conclusão: Beethoven engorda.

Curitiba, Praça Tiradentes, 1937

Um tanto irresponsavelmente, fiz algumas pesquisas no Google que envolviam Curitiba. Procurei um texto de um morador arejado que descrevesse a cidade. Abrindo o texto, procurei a palavra “conservador”. Havia (há) 7 ocorrências da palavra. O Cristóvão Tezza insiste e insiste na palavra. Talvez fosse casual.

Outro teste. Por associação, achei natural que houvesse grandes manifestações integralistas realizadas pelo avós dos atuais curitibanos. Procurei fotos em Porto Alegre e Curitiba. A superioridade de registros fotográficos deste gênero tupiniquim de extrema-direita na capital paranaense era flagrante sobre Porto Alegre. Fui ver se Plínio Salgado não tinha nascido na cidade. Não, ele era paulista. Até, certa vez, elegeu-se deputado federal pelo Paraná porque seria mais fácil…

Segui navegando e encontrei este registro integralista de 2011 em Curitiba. Nada em Porto Alegre.

Agora, vejam esta foto de 1937:

É muita gente, meus sete leitores. Não encontrei nada deste tamanho em outra cidade brasileira.

E, para completar, encontrei este recentíssimo registro no Facebook, escrito pelo curitibano André Feiges e que ornamenta e completa de forma muito coerente a mesma foto acima.

Não é à toa que somos como somos, vejam nosso passado (quase) recente… a quantidade de simpatizantes fascistas em Curitiba é absurda. A foto é duma demonstração integralista, realizando saudação nazista na Praça Tiradentes em 1937.

— Comentário: Muita gente interpretou mal a descrição que coloquei na foto, pois bem, cabe-me explicar. Não se trata de legitimar nenhum movimento repressor e totalitário, pelo contrário, acredito é preciso compreender nosso passado para lidar com um problema presente, que é a existência de grupos neonazistas. Quando coloco “nós”, quero dizer “nós curitibanos”, e portanto trato de algo inegável, pois “entre nós curitibanos” há diversos simpatizantes fascistas, e sabemos todos disto.

Há exatamente uma semana atrás um destes grupos perseguiu e assassinou um jovem a facadas na região do Centro Histórico de Curitiba. Não foi um fato isolado, estes grupos há poucos meses assassinaram outro rapaz, por motivação homofóbica. E anteriormente já o fizeram por motivações racistas e xenofóbicas.

Reconhecer a existência de fascistas, nazistas, racistas, homofóbicos entre nós é uma necessidade para dimensionarmos o tamanho do problema e elaborar estratégias de enfrentamento.

Negar os fatos é impedir sua mudança.

Apesar do gestual, os integralistas costumam negar suas relações com o fascismo.  OK, Anauê!

O Mário Marcos tem razão: a Seleção perdeu até a capacidade de decepcionar

É normal o Mário Marcos de Souza ter razão. No último sábado, ele novamente produziu uma manchete cuja clareza e verdade são absolutas. O tema era a Seleção Brasileira: “A Seleção que perdeu até a capacidade de decepcionar”. Ele cita vários problemas pontuais da seleção brasileira. Eu gostaria de me afastar um pouco deles e observar o fenômeno de uma forma mais geral. E há vários pontos a considerar.

Creio que grande parte do desencanto das pessoas com a seleção nasce no absoluto anacronismo de uma instituição que é administrada da mesma forma com que era durante a ditadura. Pior: hoje, a CBF presidida por um dos mais destacados membros da ex-Arena, o moralmente discutível José Maria Marin. Imaginem que, no dia 1.º de abril, a CBF receberá uma petição que cobra a saída de José Maria Marin da presidência da entidade em razão causa de seu envolvimento com a ditadura militar.

Ontem, a petição online ultrapassou a marca de 50 mil assinaturas de apoio. O organizador da petição, Ivo Herzog, é presidente do Instituto Vladimir Herzog e filho do jornalista assassinado em 1975, quando se encontrava detido nas dependências do Departamento de Operações e Informações (DOI), controlado pelo Exército, em São Paulo. Marin discursou várias vezes contra Herzog e sua atuação na TV Cultura de São Paulo.

Mas você me dirá que os clubes também são administrados como eram na ditadura e que sua sedução não diminuiu. Então, eu contraponho o fato de que há outros desencantos: o povo brasileiro nunca foi muito ufanista e, agora, com os jogadores atuando em sua maioria fora do país, quebrou-se o elo entre eles e a seleção.

Nos últimos anos, a população brasileira apenas se preocupa com os rumos do time brasileiro durante as Copas do Mundo. Fora delas, o que ela vê é um time formado por jogadores cujas biografias não são acompanhadas por aqui. Não são mais ídolos nacionais. Ninguém está morrendo de preocupação com as lesões de Kaká no Real Madrid ou se Hernanes é ou não o dono da Lazio. Pior: estes jogadores têm visivelmente uma preocupação periférica pela Seleção e isto fica claro em cada entrevista. E, não havendo tesão do lado deles, a gente brocha por aqui.

De minha parte, posso acrescentar que o fato da Rede Globo ser a principal divulgadora da Seleção faz com que meu interesse nela passe a ser quase negativo, ainda mais  quando há amistosos como o de hoje. Hoje, possivelmente, a Seleção, no jogo contra a Rússia, em Londres, nos chegará companhada da voz de Galvão Bueno. A voz de Galvão é-me nauseante. Deve ser o mesmo para muita gente. Pior: a Seleção joga normalmente fora do país, durante a semana e à tarde, quando estamos trabalhando. Poucos a veem e só prestamos atenção vagamente aos gols e ao resultado e olhe lá. Ou seja, ela não decepciona e nem entusiasmaria a ninguém, pois é pouco vista

É claro que, em 2014, seremos engolfados pela Copa e estaremos na maior expectativa. Estabeleceremos com a Seleção aquela relação paradoxal que temos com nossos atletas olímpicos. Ou seja, após passar quatro anos nos lixando para eles, faremos a cobrança por vitória como se o time de Felipão carregasse uma procuração nossa. Aí, talvez outro jogador faça o mesmo que fez o lateral Rafael na decisão das Olimpíadas de 2012: vaiado e perdendo o jogo por 2 x 0 para o México — após ter sido o responsável direto pelo primeiro gol mexicano –, o lateral do Manchester United, deu um toque de letra no melhor estilo tô-nem-aí.

Tolstói: o genial escritor que fugiu de casa aos oitenta e dois anos

Tolstói em seu escritório (Clique para ampliar)

Publicado no Sul21 em 8 de setembro de 2012 

Liev Tolstói foi o primeiro grande injustiçado pelo Prêmio Nobel. Nascido em 9 de setembro de 1828, o escritor russo viveu até 1910 — o prêmio começou a ser entregue em 1901 — e, em seus últimos anos de vida, já era uma figura incontornável não apenas da literatura russa, mas da mundial. Ele foi um dos primeiros a entrar numa importante lista de não ganhadores que depois ganharia outros nomes notáveis como Marcel Proust, James Joyce, Vladimir Nabokov, Franz Kafka, Jorge Luis Borges, Machado de Assis, Émile Zola, Henrik Ibsen e Paul Valéry, para citar alguns. Obviamente, alguns destes nomes apenas tornaram-se importantes post mortem ou, como Machado de Assis, escreviam em línguas menos traduzidas, mas o caso de Tolstói foi bastante estranho, pois, como dissemos, o escritor viveu grande parte de sua vida como uma indiscutível celebridade. Nada mais merecido.

Anton Tchékhov e Tolstói em Iasnaia Poliana

Caso semelhante ao de Dostoiévski, Tolstói foi por anos lido no Brasil em traduções de segunda mão. Isto é, como não havia no país tradutores de russo, ambos eram traduzidos do francês… Apenas nos últimos 30 anos, começaram a aparecer as traduções diretas do russo, as quais revelaram o descuido e o desrespeito com que eram tratados estes autores, além de muitos outros. O elogio mais comum feito a Tolstói era o de que se tratava de um estilista absolutamente impecável. O tradutor Rubens Figueiredo, que recentemente traduziu para a Cosac & Naify seus três principais romances — Anna Kariênina, Guerra e Paz e Ressurreição — obrigou-se a escrever uma série de explicações a respeito de certas estranhezas em seu texto. Ocorre que no original há repetições de palavras bem próximas umas das outras, procedimento que Figueiredo criteriosamente manteve, mas que os antigos tradutores não admitiam. Por exemplo, nas páginas 241-242 de Anna Kariênina (Cosac & Naify) há um parágrafo de quase uma página onde a palavra “camponeses” aparece 15 vezes. Tais repetições não devem ser confundidas com descaso.  “Gosto daquilo que chamam de incorreção. Ou seja, daquilo que é característico”, dizia Tolstói.  Também o uso de parênteses eram corrigidos pelos tradutores do passado, assim como as frases, muitas vezes longuíssimas, acabavam particionadas.

A famosa edição da Livraria do Globo, em dois volumes (Clique para ampliar)

Desta forma, um dos caminhos para estarmos mais próximos do autor russo é o de procurar as traduções feitas diretamente do original e ignorar as antigas traduções da Editora Globo para Guerra e Paz e Kariênina, por exemplo, as quais traziam um autor distorcido, com maior elegância e polimento do que o original. Pois para expressar o pensamento mais simples de alguns mujiques — os camponeses russos — , Tolstói se utilizava de pouco requinte e de um vernáculo mais limitado. O escritor russo também pensava que, em alguns casos, as repetições davam mais coesão e clareza a certos trechos.

Nestes dois grandes romances, Tolstói demonstra sua arte de forma inequívoca. Ele foi um perfeito contador de histórias polifônicas. Trabalhava com muitos personagens, as interações entre eles, suas ações e pensamentos nunca são artificiais e, de forma profundamente humana, até as paisagens descritas passam pelo filtro do estado de espírito de quem as observa. Guerra e Paz e Anna Kariênina são belíssimas sinfonias para muitas vozes.  Chama atenção o caminhão de realismo despejado pelo autor sobre seus personagens. Anna, por exemplo, está a léguas de poder aspirar a uma condição de boa pessoa do século XIX ou de qualquer tempo. Na época, ser virtuoso era o que mais contava e ela, passando por cima de Kitty e largando seu marido por pura concupiscência, renegando a filha ainda bebê e sendo suscetível a atitudes muito impulsivas, está longe do ideal virtuoso. Para completar, encontra justificativas para quase todos os seus atos, porém Tolstói não esboça o menor gesto de justificá-la assim ou assado.

Tolstói e Gorki também em Iasnaia Poliana. Foto de 1910. (Clique para ampliar).

Já as novelas Sonata a Kreutzer e A Morte de Ivan Ilitch são o extremo contrário. Focadas, com poucos personagens e devastadora análise psicológica, a primeira fala sobre o casamento, a infidelidade e a hipocrisia social e a segunda sobre a morte. Em agosto de 1883, duas semanas antes de falecer, o escritor russo Ivan Turguêniev escreveu a Tolstói: “Faz muito tempo que não lhe escrevo porque tenho estado e estou, literalmente, em meu leito de morte. Na realidade, escrevo apenas para lhe dizer que me sinto muito feliz por ter sido seu contemporâneo, e também para expressar-lhe minha última e mais sincera súplica. Meu amigo, volte à literatura”. Tolstói era efetivamente dado a passar longos períodos sem escrever e, diante do pedido do amigo, respondeu com a angustiada consciência do irrepreensível juiz Ivan Ilitch em breves 85 páginas. No texto, é mostrado um rigoroso acerto de contas interno, revelando a inutilidade da vida de Ivan. Preso ao leito, frente à morte certa, Ivan Ilitch vê como a rotina, nosso mais pesado algoz, e a vida burguesa impediram-no de apenas… pensar.

Se considerarmos sua obra como ficcionista, chegaremos à conclusão de que quase tudo aquilo que criou ainda é lido. Os três romances citados, mais as novelas A felicidade conjugalSonata a Kreutzer e A morte de Ivan Ilitch, além de relatos autobiográficos e de contos populares são a parte principal de sua obra. Tolstói foi romancista, novelista, contista, ensaísta e dramaturgo. Mas também foi o filósofo criador do tolstoísmo, uma forma de vida pastoral e pacifista que hoje nos parece bastante aparentada da forma de vida dos hippies dos anos 60 do século XX.

Imagem do excelente A Última Estação, com Christopher Plummer (Tolstói) e Helen Mirren (Sônia) | Foto: Divulgação

Atualmente, o lado filósofico e a vida pessoal de Tolstói fazem a festa de outros autores, de filmes e séries de TV. Só para citar os casos mais conhecidos: em Diário de uma Ilusão, de Philip Roth (cujo título original é The Ghost Writer, o que nos faz pensar nos critérios dos antigos tradutores de nosso retratado), há um capítulo intitulado Casado com Tolstói, que se refere ao contumaz sumiço de um dos cônjuges.  Também houve o bom filme A última estação, onde vemos as causas de uma das tais fugas. É que, para além de ser um gênio, o escritor russo era um puro. Tão puro que gerava suspeitas. Em 1856, ele, que fazia parte da nobreza russa, libertou todos os seus servos e doou-lhes as terras onde trabalhavam. Estes, porém, desconfiados, devolveram as propriedades ao ex-dono. Ele tinha, aliás, uma recorrente inclinação de desfazer-se de seus bens materiais, inclinação que não estava de acordo com a opinião de sua esposa Sônia.

O escritor em 1848

No final da década de 1850, preocupado com a péssima qualidade da educação no meio rural, Tolstói criou uma escola para filhos de camponeses na aldeia onde nasceu e viveu, a célebre Iasnaia Poliana. O escritor mesmo escreveu grande parte do material didático e, ao contrário da pedagogia da época, deixava os alunos estudarem quando quisessem, sem regras excessivas e, estranhamente, sem punições físicas. Educar para libertar. Esse era seu norte pedagógico. Recentemente, parte do material criado para a escola por seu fundador foi traduzido do russo.  Contos da Nova Cartilha é o resultado desta incursão. A obra é uma coletânea de textos extraídos das duas cartilhas elaboradas por Tolstói. São fábulas, histórias reais, contos folclóricos, descrições de paisagens naturais e adivinhações. O estilo é conciso, aproximando-se do ritmo da linguagem oral.

Tolstói e uma de suas filhas (Clique para ampliar)

Em 1862, casou-se com Sônia Andreievna Bers, com quem teve 13 filhos. A qualidade do casamento seria melhor aferida por um sismógrafo. Foi neste ambiente que Tolstoi produziu seus principais romances. Guerra e Paz consumiu sete anos de trabalho e é a prova de que um mau casamento pode produzir bons frutos. O autor atormentava-se mais do que habitual em seres humanos com questões sobre o sentido da vida e, após desistir de encontrar respostas na filosofia, na religião e na ciência, deixou seduzir-se pelo estilo de vida dos camponeses. Foi o que ele chamou de sua “conversão”. Após a “conversão”, Tolstói deixou de beber e fumar, tornou-se vegetariano e passou a vestir-se como camponês. Convencido de que ninguém deveria depender do trabalho alheio para viver, passou a limpar seu quarto, a plantar a comida da qual se alimentava e a produzir as próprias roupas e botas. Suas ideias atraíram um séquito de seguidores, que se denominavam “tolstoianos”. Como resultado, Tolstói passou a ser vigiado pela polícia do czar.

Liev Tolstói e sua esposa Sônia em 1910, ano da morte do escritor

Porém, Sônia não o deixava alcançar a simplicidade. Ela lhe cobrava os luxos aos quais estava acostumada. Os filhos davam razão à mãe, que ameaçava matar-se quando o escritor dizia que fugiria de casa. A partir de 1883, houve uma disputa entre sua esposa e Tchértkov, um militar que gozava da confiança do autor e que se tornou um paladino de suas ideias na Rússia. Sônia foi nomeada controladora de seu patrimônio, combatendo o marido, que acreditava nos feitos purificadores da caridade. Obviamente, a bondade de Tolstói levou-o a afastar-se do governo, da justiça e da Igreja Ortodoxa russa; acabou excomungado.

Problemas em casa

No período final de sua vida, acentuou-se a briga entre Sônia e Tchértkov. Agora o motivo eram os direitos autoriais de seus livros. Em 1908, Tchértkov escreveu um testamento em nome de Tolstói, onde outorgava a si mesmo o direito sobre os livros após a morte do autor. O militar foi para história como um mal intencionado que se aproveitava da credulidade do autor de Guerra e Paz. Provavelmente mereceu tal má fama póstuma. O fato é que os anos próximos à morte do escritor foram um inferno familiar. O conflito com Sônia era tal que Tolstói fez o que já fizera em oportunidades anteriores: fugiu de casa. Sônia não se matou, na verdade foi mais uma vez atrás do marido fugitivo. Só que desta vez ele morreu em meio à fuga. Faleceu na aldeia de Astápovo, em 7 de novembro de 1910. Anos depois, Sônia recuperou para a família os direitos sobre a obra de seu marido.

Tolstói em seu leito de morte

Poema da gare de Astapovo, de Mario Quintana

O velho Leon Tolstói fugiu de casa aos oitenta anos
E foi morrer na gare de Astapovo!
Com certeza sentou-se a um velho banco,
Um desses velhos bancos lustrosos pelo uso
Que existem em todas as estaçõezinhas pobres do mundo
Contra uma parede nua…
Sentou-se …e sorriu amargamente
Pensando que
Em toda a sua vida
Apenas restava de seu a Glória,
Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas
Coloridas
Nas mãos esclerosadas de um caduco!
E entao a Morte,
Ao vê-lo tão sozinho aquela hora
Na estação deserta,
Julgou que ele estivesse ali a sua espera,
Quando apenas sentara para descansar um pouco!
A morte chegou na sua antiga locomotiva
(Ela sempre chega pontualmente na hora incerta…)
Mas talvez não pensou em nada disso, o grande Velho,
E quem sabe se ate não morreu feliz: ele fugiu…
Ele fugiu de casa…
Ele fugiu de casa aos oitenta anos de idade…
Não são todos que realizam os velhos sonhos da infância!

Ospa em concerto curto, leve e certeiro

Foto: Pedro Belo Garcia

Cheguei às 19h55 no Salão Negrinho do Pastoreio do Palácio Piratini e ele já estava lotado. Isto é, 35 minutos antes do concerto a sala já estava totalmente lotada. Assisti em pé a um concerto nada pretensioso, nada vulgar e bom, muito bom.

A primeira peça foi a que menos gostei: a Abertura da ópera L’italiana in Algeri, de Gioacchino Rossini. Uma peça bem humorada, simpática e não muito mais do que isso, mas que cumpriu seu papel de abertura para a curiosa obra de Ottorino Respighi, Gli uccelli (em italiano, As Aves, jamais Os Pássaros; afinal, galinhas não são pássaros), que tem um Prelúdio conhecidíssimo dos ouvintes da Rádio da Universidade por ser cortina de um de seus programas. Depois, tivemos a Sinfonia nº 4, em Lá Maior, Op. 90, Italiana, de Felix Mendelssohn.

O destaque do programa foi evidentemente a excelente Sinfonia Italiana, uma daquelas peças que não tem nenhum movimento que não seja melodioso, fluido e agradável. Sob a compreensiva regência de Manfredo Schmiedt, todo o espírito de vivacidade e gentileza da sinfonia esteve presente no Palácio Piratini, mesmo que a acústica da sala tenha prejudicado a quem, como eu, estava encostado na janela externa da sala. Eu simplesmente não ouvia os contrabaixos e violoncelos. Com minhas parcas noções de acústica, diria que aquela porta aberta bem na frente dos baixos, na diagonal da orquestra, era o sumidouro daquilo que eu adoraria ouvir.

Destaque para as madeiras e metais, absolutamente impecáveis e eufônicos no terceiro movimento (Con moto moderato) e para o Saltarello final da Italiana, que me deu vontade de dançar pela sala. Mas tinha muita gente… E, alíás, estava muito quente lá dentro, parecia Manaus. Não sei que seria de nós se estivéssemos num março canicular, sem a camaradagem deste de 2013.

Buscando contato com o travesseiro de Dilma Rousseff

No dia 8, Dilma Rousseff brindou-nos com um belo discurso no Dia Internacional da Mulher. Foi um discurso feminista e interessante sob todos os aspectos. E, falemos sério, era autêntico. Hoje ela está em Roma a fim de depositar seu ósculo na mão do novo Papa. Acho lamentável que ela se submeta a um Papa tão conservador e que já deu sinais bastante antifeministas, mas o travesseiro de Dilma deve ter-lhe dito coisas terríveis nos últimos dias… Há um grande eleitorado que se diz católico, Dilminha… O Papa é populista e será pop… Ele fala em opção pelos pobres, tu também… É um hermanito e, indo lá, tu fazes alguns pontos com eles… A mídia virá de graça até no Jornal Nacional — que vai te dar 4 preciosos segundos…

Maldito travesseiro! Resultado, ela foi, está lá, já beijou e tirou as tais fotografias.

Chico, Dilma e, de vermelho, o bonitão de Bento XVI | Foto: Roberto Stuckert Filho

Hoje, a Agência Brasil diz que, antes de falar com o Bergoglio, ela elogiou a iniciativa do papa de dar atenção aos pobres. “É claro que o mundo pede hoje, além disso [da preocupação com os pobres], que as pessoas sejam compreendidas e que as opções diferenciadas das pessoas sejam respeitadas”, acrescentou. Será que ela vai dizer isto a ele? Se disser, sobe no meu conceito. Mas nem teve tempo, claro, foi um encontro em pé, rapidinho, ao lado do padre-sexy Georg Gänswein. Só espero que ela não diga que, dã, “Nunca um papa tinha me beijado”, como disse Cristina Kirchner tentando embarcar na onda do papa pop. (Me deu um enjoo agora, sei lá).

Porque a Dilma morre de medo da migração dos votos dos religiosos, dos evangélicos e também da grande imprensa — financiada pelo governo para bater no governo. Tanto que 70% da verba federal para a publicidade vai para os dez maiores veículos de informação, justamente os mais conservadores e direitistas, que consideram satanistas quem olha os indicadores e aprova o governo do ex-presidente Lula e o da atual presidente.

Mas acordei mal humorado. Sei que desde sempre a política foi e seguirá sendo algo tortuoso e não devo esperar que um governante siga meu ideário sem fazer pit stops em prostíbulos. OK, Dilma, beije a mão do homem, mas, já que estás na Europa, dê uma olhada nos jornais. Alô, travesseiro da Dilma?, aconselhe-a a dar uma olhada na mídia. Aí, do ladinho, existem opções à direita e à esquerda. Os canhotos também recebem publicidade pública (e privada) que lhes permitem manter uma boa qualidade, competindo com os PIGs deles. Pergunta aí na Itália, Dilma, como vai la stampa suini. Verás que ela não é tão hegemônica quanto é aqui. Pergunta se a Miei cari amici daí demitiu seus jornalistas, pergunta!

E mais não digo porque o trabalho me aguarda.

Playboy é condenada a pagar R$ 40 mil a Ísis Valverde

Que amadorismo, hein, Playboy? Explico: a Justiça condenou a revista Playboy a pagar R$ 40 mil de indenização, mais juros e correção, à atriz Ísis Valverde, por publicar sem autorização uma foto onde ela aparece com os seios à mostra. A atriz entrou com a ação alegando que foi fotografada sem autorização, e que a revista usou a imagem com fins comerciais. A Playboy se defendeu afirmando que a imagem era de caráter informativo e que não havia exploração comercial. Vamos lá: um, dois, três iiii… Já! Um coro de risadas para a Playboy!

No dia de hoje, a atriz teria confidenciado a amigos:

— Ainda se tivesse aparecido nua no Porque hoje é sábado, tudo bem, mas na Playboy? Imagine se o Milton Ribeiro usaria a legenda bagaceira Isis Valverde, no Rio, dá adeusinho e deixa escapar o cartão de boas-vindas

Realmente, Ísis, tens razão. Nunca escreveríamos algo tão levinho e idiota. A propósito, leste o futuro do pretérito, né? Bem, de qualquer maneira, não tenho R$ 40 mil.

O PHES suspira por Ísis Valverde.

Atea denuncia Colégio Estadual gaúcho que teria tornado obrigatório o ensino religioso

Foto: Divulgação

(Atualização das 19h25 de 19/03: a desmatrícula de Ensino Religioso foi finalmente autorizada, mas a diretora está ameaçando levar o garoto ao juiz para processá-lo, civil e criminalmente, por causa de uma gravação que ele teria feito. Não a ouvi, não procurei, nem quero que me mostrem).

A Associação de Ateus e Agnósticos do Brasil (Atea) enviou ofício ao Colégio Estadual Augusto Meyer, de Esteio (RS). A atitude deve-se ao fato de um aluno afirmar que o Ensino Religioso tornou-se disciplina obrigatória do currículo do Colégio. A denúncia partiu deste mesmo aluno do 1° grau, ateu, que informou que tanto a professora de Ensino Religioso, como a diretora e vice-diretora do Augusto Meyer, defenderam a obrigatoriedade da matéria.

A alegada obrigatoriedade do ensino religioso deu origem a incidente em uma dessas aulas, em que o aluno afirma que a professora riu dele por sua descrença, assim como os demais colegas, com a anuência dela, o que constituiria um caso de bullying.

A Constituição Federal tem como cláusula pétrea o Art. 5º, que estabelece que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

De acordo com o artigo 210 da Constituição Federal e a lei de Diretrizes e Bases da educação, o Ensino Religioso não é obrigatório, mas de matrícula facultativa.

O documento abaixo foi entregue na secretaria da Escola pelo aluno. Curiosamente, a secretaria recusou-se a dar o visto de “Entregue” na cópia que ficou com o menino.

OFÍCIO n.002 – 2013

A Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos, entidade sem fins lucrativos sediada na cidade de São Paulo (SP) e registrada na Receita Federal (CNPJ) sob o número 10.480.171/0001-19, vem respeitosamente oficiar a sra. Nara Machado, diretora do Colégio Estadual Augusto Meyer, situado à R Rio Pardo, 1187, em Esteio (RS), tendo em vista o seguinte:

1. DOS FATOS

Informa-nos o adolescente X., ateu, regularmente matriculado na turma 104 do 1º ano do ensino médio do turno vespertino do dito estabelecimento desde o dia 07/03/2013, que a sua professora de Ensino Religioso, assim como a diretora e vice-diretora, alegam que o Ensino Religioso é disciplina obrigatória do currículo escolar que assim o obrigam a frequentar as aulas dessa disciplina

2. DO DIREITO

a) A Constituição Federal tem como cláusula pétrea o Art. 5º, que estabelece que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
b) O art. 3 da CF afirma que “constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil… IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
c) Em consonância com esse dispositivo, o ensino religioso estabelecido no § 1º do art. 210 da Constituição Federal se estabelece da seguinte maneira:
O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.
d) A lei de Diretrizes e Bases da educação (Lei Nº 9.394, de 20/12/1996) repete e reforça a CF, lendo-se
“O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão”

e) um dos reflexos do princípio constitucional da igualdade é o princípio da impessoalidade da administração pública, expresso no art. 37 da Constituição Federal, que assegura que a neutralidade tem que prevalecer em todos os comportamentos da administração pública e veda a adoção de comportamento administrativo motivado pelo partidarismo. Custeada com dinheiro público, a atividade da Administração Pública jamais poderá ser apropriada, para quaisquer fins, por aquele que, em decorrência do exercício funcional, se viu na condição de executá-la. Cabe aos servidores públicos, portanto, informar a população de maneira correta a respeito da legislação vigente, sob pena de incorrerem em falta administrativa grave, além de violarem direitos fundamentais dos alunos e de seus pais.

f) Ainda que a maioria dos pais, alunos e/ou professores se identifique e esteja de acordo com a obrigatoriedade do ensino religioso, a lei não lhes faculta criar uma obrigação como se da lei viesse. Os direitos fundamentais são indisponíveis e portanto não estão sujeitos a voto.

3. DO PEDIDO

a) A alegada obrigatoriedade do ensino religioso deu origem a incidente que reputamos grave durante uma dessas aulas, em que o citado aluno alega que a professora riu dele por sua descrença, assim como os demais colegas, com anuência dela – o que constitui claro caso de bullying, envolvendo comportamentos extremamente inapropriados de alunos e de uma professora, o que em tese pode até configurar ilícito penal. A cessação da alegação de obrigatoriedade fará com que eventos desse tipo não mais se repitam com os alunos atuais ou futuros.
b) Caso a diretoria continue impedindo a desmatrícula do citado aluno, ou de qualquer outro, da disciplina de ensino religioso ao fim do prazo de 5 dias úteis a partir do recebimento desta, isso implicará nas medidas administrativas e judiciais cabíveis junto à Secretaria de Educação, ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público Estadual para garantir os direitos constitucionais dos alunos da instituição.
c) Para atestar a conformidade da instituição com a lei e informar corretamente os cidadãos, o colégio deve entregar uma circular a cada um dos alunos regularmente matriculados, e afixar uma cópia dela nos murais de cada uma das salas de aula, em que conste claramente que, segundo o art. 210 da Constituição Federal e a lei de Diretrizes e Bases da educação (Lei Nº 9.394, de 20/12/1996), o Ensino Religioso não é obrigatório, mas de matrícula facultativa, e que portanto a diretoria receberá e prontamente aprovará todos os pedidos de desmatrícula de Ensino Religioso dos interessados, nos termos da lei.
d) E para que fique plenamente documentada a posição da instituição, o colégio deve enviar uma cópia da circular e fotos dos avisos afixados nos murais do colégio através do email da Atea ([email protected]).

São Paulo, 18 de março de 2013

Daniel Sottomaior
Presidente
Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos

Porque hoje é sábado, Ashley Smith

Tem uma coisa que eu achei irresistível na modelo Ashley Smith:

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… o ar de tô nem aí. Talvez seja uma postura estudada, mas me encanta que…

… ela tire fotos fumando, …

… que mostre um enorme espaço entre os dentes, …

… que apareça bebendo, …

… que tire sarro da igreja, …

… eu disse da igreja, não?

E que mantenha — mais importante do que tudo — …

… um ar zombeteiro.

Porque se há algo que está em falta no mercado, …

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… é humor, acidez e cinismo, …

… essas coisas tão frutíferas, humanas e inteligentes, …

… que foram riscadas do mapa pela mais perigosa das doenças auto-imunes: …

… o politicamente correto.

Ela é uma modelo que ganha muito dinheiro?

Provavelmente, certamente.

Mas suas fotos anulam boa parte de suas possibilidades …

… dentro de esquemas que privilegie o senso comum.

O detestável senso e humor comuns. Ela se estigmatiza como do contra.

Ashley, eu odeio o cheiro de cigarro, …

… porém, em honra ao incorreto, …

dividiria um (ou vários) contigo. Um beijo.

Mas, claro, tudo deve ser imaginação minha e a deusa tem a coleção completa de André Rieu que vê e ouve todo santo dia. Eca.