Meu casaco verde (ou bege)

Eu tenho um velho casaco de inverno. Tenho mais de um, mas agora refiro-me àquele que é verde ou bege — pois sou daltônico e não sei bem a cor dele. Deve ter uns 30 anos ou mais e sempre foi meu. Já está um pouco puído, claro, mas o que posso fazer se uso minhas coisas por anos sem estragá-las? Por exemplo, meu toca-discos é de 1982 e nunca foi parar no conserto.

No ano passado achei que o casaco estava sujo demais e o levei numa lavanderia próxima da livraria, na Venâncio Aires. Os punhos estavam encardidos e ele tinha umas manchas que provavelmente vinham de algum encarquilhado almoço de inverno, talvez no Tuim.

Quando fui buscar meu casaco limpo, o velho senhor dono da lavanderia olhou o resultado e não gostou, porque as manchas ainda estavam ali. Eu disse que queria meu casaco daquele jeito mesmo, mas ele respondeu que de modo algum — ele o lavaria novamente.

Voltei uma semana depois. O dono examinou o casaco e novamente não gostou. As manchas tinham diminuído, mas não totalmente. Insistiam em aparecer.

Ele me pediu desculpas e repetiu que não me entregaria a roupa naquele estado. Eu sorri e combinei de voltar na outra semana.

Quando voltei, ele estava feliz. Tinha conseguido um belo resultado. Ele me mostrou o casaco e realmente estava muito bom, perfeito não fosse o uso.

Três dias depois, voltei com outras roupas para serem lavadas. Não eram tão lendárias quanto o casaco verde (ou bege), só que eu queria pagar mais alguma coisa para aquele senhor tão cuidadoso.

A porta estava fechada. A lavanderia tinha um papel afixado na porta. Eles tinham fechado para sempre.

Falei com os vizinhos e soube que foi por causa da pandemia. O velho senhor não conseguira manter a empresa.

Voltei pra casa com as roupas na sacola.

Eu com o tal casaco | Foto de Bárbara Jardim Ribeiro

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