Quem roubou nosso tempo de leitura?

Cena de Inglourious Basterds, de Quentin Tarantino, 2009
Cena de Inglourious Basterds, de Quentin Tarantino, 2009

O tempo para leitura parece cada vez mais comprimido e isto não é uma perda apenas para a literatura.

Um súbito interesse renovado por Tolstói, causado pelo filme sobre seus últimos dias, A Última Estação, fez-me lembrar que há um ano atrás eu tinha prometido a mim mesmo reler Guerra e Paz. Fazia algum tempo que eu não enfrentava um romance de grandes proporções ou, para ser mais exato, qualquer coisa publicada antes do século XX. A releitura de Guerra e Paz iria me tranquilizar: minha resistência física e disponibilidade estavam intactas. Fui até a estante e descobri a página em que deixei o marcador —  ele estava na página 55 e eu sequer podia utilizar a desculpa de ter crianças pequenas.

O fato em si não teria me assustado — afinal, é Guerra e Paz — se não fosse a existência de outros marcadores abandonados em outros livros. Eu não estava terminando nenhum deles? Como é que eu, que adorava ficção o suficiente para estudá-la, ensiná-la e escrever a repeito, me tornara tão distraído?

Cena de Persona, de Ingmar Bergman, 1966
Cena de Persona, de Ingmar Bergman, 1966

O mundo dos meus tempos de estudante era fundamentalmente diferente do atual. Foi apenas no final da minha graduação que um amigo me mostrou uma maravilha chamada internet (Ele: “Há sites sobre qualquer assunto, tudo pode ser encontrado!”. Eu: “O que é um site?”). Nos anos 90, havia somente quatro canais de televisão. Cada família tinha um telefone, cujo uso era consecutivo. Poucos tinham jogos eletrônicos. Então, era muito mais fácil retirar-se completamente do mundo para a grande arquitetura do romance. Agora, o leitor está sob o ataque de centenas de canais de televisão, cinema 3D, há um negócio de jogos de computador tão florescente que faz com que Hollywood os imite em seus filmes, há os iPhones, o Wifi, o YouTube, há notícias 24h, uma cultura tola da celebridade — verdadeiras ou falsas (vide BBB) — , acesso instantâneo a toda e qualquer música já registrada, temos o esporte onipresente, há caixas de DVDs com tudo o que gostamos. Os momentos de lazer que já eram preciosos foram engolidos pela lista anterior e também e-mails, torpedos, WhatsApp e Facebook. Quase todos as pessoas com quem eu falo dizem amar os livros, mas que simplesmente não encontram mais tempo para lê-los. Bem, eles CERTAMENTE têm tempo, só que não conseguem gastá-lo de forma diferente.

Isto tem consequências desastrosas para nossa inteligência coletiva. Estamos sitiados pela indústria de entretenimento, a qual nos estimula apenas em determinadas direções. O sedução é sonora, visual e tátil. A concentração na palavra impressa, na profundidade de um argumento ou de uma narrativa ficcional, exige uma postura que os dependentes dos meios visuais não têm condições de atender. Seus cérebros não se fixam na leitura ou, se leem, fazem-no rapidamente para voltar logo ao plin-plin. Ora, isso é um roubo de um espaço de pensamento que deveria ser recuperado.

Alphaville, de Godard, 1965
Alphaville, de Godard, 1965

Obviamente, os meios de comunicação como a Internet nos oferecem enormes benefícios (você não estaria lendo isto de outra forma), mas nos empurram facilmente para coisas bem superficiais que roubam nosso tempo. Você viu Avatar? Você viu o que eles podem fazer agora? Podem me chamar de melodramático, mas estou começando a me sentir como protagonista de alguma distopia (ou antiutopia) do gênero de 1984 ou Fahrenheit 451, tendo meus pensamentos apagados e, pior, gostando disso.

A Cultura mudou rapidamente nesta década. A leitura está sob ameaça como nunca antes. “Escrever e ler é uma forma de liberdade pessoal”, disse Don DeLillo em uma carta a Jonathan Franzen, que o questionara muito tempo antes da chegada da Internet. “A literatura nos liberta dos pensamentos comuns, de possuir a mesma identidade das pessoas que vemos em torno de nós. Nós, escritores, fundamentalmente, não escrevemos para sermos heróis de alguma subcultura, mas principalmente para nos salvar, para sobrevivermos como indivíduos.” Exatamente a mesma afirmação, penso eu, descreve a condição dos leitores sérios.

Deem-me o meu Tolstói. Agora é guerra.

Traduzido mui veloz e livremente por mim. O original de Alan Bissett está aqui.

Imagens retiradas — à exceção da última — do maravilhoso blog O Silêncio dos Livros

de-o-silencio-dos-livros-peter-turnley-monsieur-bernard-laine-1999

23 comments / Add your comment below

  1. No outro dia, incentivado por você, reli “Vontade de Dormir”, de Tchekhov. O conto é fantástico, tem um tempo muito rápido mas a história é penosamente lenta. A personagem é Varka, uma garota; mais não digo para não estragá-lo caso você não o tenha lido. Fiquei com curiosidade para saber se você o conhecia, já que eu nunca manuseei as coletâneas que você citou no outro post e não sei o que elas têm.

    Guerra e Paz é o Himalaia. Poderia começá-lo hoje e desistir já no primeiro acampamento, mas não. Preciso de mais alguns anos de preparação para poder escalá-lo, chegar até o cume e depois descer com vida. Abraços.

    1. Eu li Guerra e Paz lá pelos 20 anos. Achei Ana Karênina bem melhor…

      Sim,, sim, conheço “Vontade de Dormir”. Na tradução de Schnaiderman é “Olhos Pesados de sono”, não?

      Abraço.

  2. O tema deste seu post foi abordado por mim e alguns recentemente, em conversa de botequim. Há muita oferta de entretenimento e/ou “produtos culturais” (hoje, chamam de cultura qualquer show de axé ou palhaçada na tv).
    As ofertas se transformam em solicitações, pra não dizer em imperativos, o que nos tira a liberdade de escolha.
    – Como assim? Quanto mais oferta maior sua liberdade de escolha!
    – Engana-se, amigo, as chamadas ofertas são ‘produtos’ que, praticamente, definem quem os usa, situa-os no campo social e ‘dirigem’ o desejo.
    – Explique isso.
    – É que nos dão a sensação de ‘falta’, de urgência em ter tudo, sempre corremos em busca de mais uma novidade, mais um gadget, mais um assunto ‘da hora’. Somos, pois, compelidos ao consumo e à ‘nova’ maneira de nos divertir = tornamo-nos compulsivos.
    – E daí?
    – Daí, nosso desejo se torna o ‘desejo do Outro’, e o sujeito sucumbe. Então sofremos, sofremos do vazio de não nos realizarmos e ficamos como baratas tontas em busca de um bem que sempre nos escapará.
    – Triste sina…

  3. Li Guerra e Paz aos 15 anos, nas intermináveis viagens de ônibus da vila nova até o centro da cidade….. viajar de metrô diminuiu meu tempo de leitura.
    Eu e você somos de uma geração privilegiada pela danação: vimos nossos diplomas de datilografia virarem obsoletos e nos quedamos, maravilhados, tontos, embriagados com as possibilidades desta fantástica tecnologia que é a internet… e cá estamos nós, nos utilizando desta tecnologia para reclamar… dela mesma!
    Enfim, estamos na continuação do louco século vinte.
    (hei, acabei de descobrir um Tchekhov que não li ainda… vou atrás dele na estante virtual agora mesmo)
    Sorte e saúde pra todos!

    1. Eu e você somos de uma geração privilegiada pela danação: vimos nossos diplomas de datilografia virarem obsoletos e nos quedamos, maravilhados, tontos, embriagados com as possibilidades desta fantástica tecnologia que é a internet… e cá estamos nós, nos utilizando desta tecnologia para reclamar… dela mesma!

      Perfeito!

      :¬)))

  4. Se Alan Bissett disse “estou começando a me sentir como protagonista de alguma distopia (ou antiutopia) do gênero de 1984 ou Fahrenheit 451, tendo meus pensamentos apagados e, pior, gostando disso”, Neil Postmann disse que nosso mundo está mais para Admirável mundo novo. Aqui tem um cartum de Stuart McMillen, baseado no que escreveu Neil Postman (em inglês): http://www.recombinantrecords.net/docs/2009-05-Amusing-Ourselves-to-Death.html
    No meu blog coloquei os desenhos com a tradução.

  5. Se Alan Bissett disse “estou começando a me sentir como protagonista de alguma distopia (ou antiutopia) do gênero de 1984 ou Fahrenheit 451, tendo meus pensamentos apagados e, pior, gostando disso”, Neil Postmann disse que nosso mundo está mais para Admirável mundo novo. Em um de cartum de Stuart McMillen, baseado no que escreveu Neil Postman, há uma comparação entre Huxley e Orwell. No meu blog postei o cartum com a tradução.

  6. Milton, sou preguiçoso, e , no caso de Guerra e Paz, contentei me com a(s)versão(ões) cinematográficas;dos grandes romances russos, fui até o fim nos Irmãos Karamazóv e até hoje (aos 44) não consegui repetir a leitura… hoje tenho uma predileção bem maior pelos contistas, sejam eles Tchekov ou Maupassant.

  7. Há dez anos eu tinha uma ignorância temerária em relação à net, e desconhecia celulares. Tinha vivido então 26 anos de saúde e normalidade gratificante. Hoje, a net nem tanto, que ainda recorro à enciclopédia britânica e ao Houaiss, mas o celular se tornou indispensável. Diante a um download sempre me passa o medo do computador, num ato de paganismo virtual, aparecer com a mensagem: “para completar essa transação, necessita-se o sacrifício ritual de um leitãozinho”, ou, para casos de discografias extensas como a do Jethro Tull e do Frank Zappa, um cabrito gordinho de uns trinta quilos. A sorte é que a mente por detrás destes modismos assimiladores carece de humor; caso contrário, se fosse um sacana com transtorno bipolar, poderia instituir que o novo quesito da indispensabilidade moderna é um vibrador que dá descargas de avisos horários e envia mensagens concisas com gosto. Quando a pessoa sentisse uma suave sensação de morango selvagem, era por sua esposa estar esperando o retorno, por exemplo. E daqui há dez anos, não conseguiríamos imaginar a época primitiva em que não tínhamos atolado no reto um aparelho de primordial necessidade.

  8. Milton,

    Por um lado, hei de concordar com o Cláudio Costa, com o autor do texto que tu traduziste neste post e – muito provavelmente – contigo também, pois me parece que essa também é a tua opinião.

    Porém, há um outro lado dessa história, que não pode se restringir nem tampouco centralizar discussão sobre a diminuição do tempo, do interesse, do envolvimento e da continuidade da leitura tão-somente no consumismo, na indústria cultural ou na exacerbação dos produtos do veículo televisão: falo do conservadorismo, da falta de investimento, do despreparo e da ignorância da esmagadora maioria dos professores nas escolas de um modo geral (públicas, privadas, ensino fundamental, médio, pobres, ricos, do Moinhos de Vento ou da zona rural de Ji-Paraná/RO).

    Ler é algo muito chato quando não se sabe ler direito. Segundo o IBGE, mesmo entre pessoas com nível superior completo (inclusive muitos formados em universidades federais), o analfabetismo funcional chega à assombrosa cifra de 72% da população brasileira.

    A leitura também é uma atividade muito chata quando, além de já não saber ler direito, a criatura não é ensinada a contextualizar nenhuma obra (seja ela de ficção ou não) ao momento histórico ou do qual o autor pretende tratar, ou do momento contemporâneo à sua criação e publicação.

    A escola é muito chata quando o professor se posta em pé diante de todos e fala sem parar ou fica a escrever na lousa, como diriam nossos amigos d’além-mar.

    Se compete pela atenção dos estudantes com a dinâmica imposta pela velocidade da edição dos thrillers de ação, dos videoclipes e de um telejornalismo que não ultrapassa um minuto e meio nas informações mais extensas. Até mesmo seriados e pequenos documentários que, antigamente, eram feitos para preencher uma grade de 1h por 15 min. de intervalo, agora preenchem 30 min. por 8 de intervalo.

    A rotina é corrida; a leitura, por sua vez, é parada: o tempo para ler existe. Contudo, a consciência acerca da importância da leitura se esvai quando não existe competência pedagógica para associar a cultura imagética contemporânea a um caminho mais complexo e enriquecedor que somente a leitura pode proporcionar ao indivíduo.

    Já assisti a duas palestras do prof. Adriano Duarte Rodrigues da Universidade Nova de Lisboa. Ele defende a tese de que a cultura midiática de um dado momento é resultado da experiência inata. Embora nem a Psicologia e nem a Engenharia Genética tenham ainda podido comprovar essa tese, o fato de lembrarmos da nossa infância; de como nossos pais e avós se referiam às suas respectivas infâncias e de como observamos as de nossos filhos, sobrinhos e, em alguns casos, até mesmo netos, sempre se nota que cada geração tem vindo ao mundo dotada de uma inteligência normalmente bastante superior à de seus antecessores.

    Em relação à mídia, Duarte Rodrigues cita alguns exemplos bastante interessantes, que eu adapto ao meu entendimento pra simplificar:

    – Minha mãe tem 76 anos. Parou de trabalhar aos 20, para casar-se com meu pai. Ela estudou até a quarta série do então primário. Foi criada por uma tia analfabeta e por um tio que só estudara até o ginásio. A cultura oral da era do rádio era muito mais forte do que a tradição escrita.

    Até hoje, mesmo tendo acompanhado a televisão desde o seu início, ela não compreende as “deixas” simbólicas de quando começa, quando termina e quando um programa tem seu intervalo. Meu pai, que era três anos mais velho e era engenheiro de Minas e Metalurgia, também não compreendia essas deixas, por mais tempo que passasse na frente da TV após sua aposentadoria.

    Minha irmã de 53, meu irmão de 51, minha irmã de 49 e eu, de 36 anos, todos somos da era da televisão. Todos nascemos com televisão em casa. Rádio, só pra música (basicamente na adolescência) e para futebol (eu) e notícias (meu irmão). Segundo Duarte Rodrigues e segundo minhas lembranças, não foi necessário nenhum manual de instruções para que a nossa geração (embora eu seja de outra) aprendesse a ligar a TV, aumentar e diminuir o volume, mudar de canal ou entender rapidamente quando um programa começa, quando termina, quando entra o intervalo e que seção de um programa começa ou termina quando entra ou sai de cena um determinado comunicador.

    Pois hoje temos os nativos digitais. A internet comercial existe desde 1994/1995. Quem nasceu a partir de 1987 pode ser considerado nativo digital: seja rico ou seja pobre; tenha tido seu pai um computador antes de nascer ou passando a conviver com o hipertexto, com o correio eletrônico, com as salas de bate-papo e com veículos mais complexos como blogs, Twitter, etc. somente após começar a frequentar LAN houses, as deixas simbólicas da internet e o ritmo de mudança de um site para outro (ou de uma ferramenta de interação para outra) estão completamente dominadas. Eles não precisam de curso nem de manual de instruções para interagir!

    Hoje, a comunicação não é mais matemática. O esquema emissor-receptor-mensagem dos engenheiros da marinha dos EUA Shannon e Weaver está superado. Outro modelo de teoria da Comunicação superado é o da ala marxista da Escola de Frankfurt: ao contrário do que diziam, por mais que tente, a mídia de massa não é o quarto poder, não influencia a todos e não consegue manipular corações e mentes.

    Hoje, todos somos INTERAGENTES. O pensamento de um é fruto do pensamento de todos os que ele segue de exemplo e lê ou leu; os caminhos da busca de conhecimento de um jamais são iguais aos de outro, mesmo que tenha a mesma educação, a mesma idade, viva nos mesmos lugares e assim por diante.

    Ser interagente significa também dominar rapidamente as técnicas e as ferramentas de produção, edição e publicação de conteúdo. É saber divulgar o seu próprio conteúdo. É ser a mídia de si mesmo para tornar-se mídia dos outros.

    A cultura de nicho e a incessante mistura das funções de produtor e de usuário da informação na mesma pessoa e ao mesmo tempo fazem com que seja necessário concentrar esforços na compreensão da ubiquidade, isto é, de que estar em um lugar é estar em todos os lugares ao mesmo tempo.

    A TV, o rádio, o jornal, a revista e o livro não são ubíquos, pois dependem de espaços físicos, de grades de programação, de segmentação de público e de um discurso massivo. Porém, quando circulam em um meio digital, podem ser alterados e consumidos por qualquer um a qualquer momento. Ninguém mais quer obedecer a padrões engessados que limitam o acesso e o consumo da informação. O que importa é ter acesso à informação aonde, como e quando o interagente quiser.

    O suporte da informação é mais importante do que a informação em si não por causa do consumismo e da tecnofilia mas, sim, por uma questão de acessibilidade: o livro pós-moderno é um arquivo em PDF que permite anotações com a inclusão de áudio, vídeo e links para web sites com informação complementar, acessados pelo leitor ou pelo estudante na hora em que ele quiser e na ordem em que desejar.

    Aqui mesmo, no Brasil, há escolas no meio do sertão onde os professores reforçam o conteúdo e o compromisso dos alunos blogando desafios e informações complementares. O estímulo à blogagem faz com que as crianças finalmente voltem a sentir-se estimuladas a ler e a escrever bem. Como cada um visita o blog do outro, emite comentários, acrescenta, corrige e traz novas informações. Como o professor também participa desse processo, ele não é visto como um conhecedor plenipotenciário. Assim, a empatia junto ao mestre aumenta e a turma se integra ainda mais.

    Aulas dadas com o auxílio de Wikis, MSN, comunidades no Orkut, etc. tem aumentado o interesse dos alunos pelas matérias e, consequentemente, melhorado o seu desempenho. Lembretes de tarefas ou de novos posts no blog do professor via torpedos SMS e a permanência de todo o conteúdo de aula na web não apenas estimulam o senso de responsabilidade e atenção do aluno como também oferecem a possibilidade de os pais se engajarem no processo de aprendizagem.

    Aqui no Brasil, há o mestrado e o doutorado em Informática na Educação da UFRGS, que pesquisa sobre novos métodos pedagógicos com as TICs (Tecnologias da Informação e da Comunicação). A USP também tem um pós semelhante. Aqui, a coisa anda bem atrasada, pelas informações que tenho sobre o comportamento arredio da maioria de nossos pobres professores conservadores e semianalfabetos. Mas em São Paulo, há projetos como o Educarede financiado pela Telefonica e coordenado por uma pessoa incrível, a profª Sônia Bertocchi. O Instituto Claro também investe muito nisso. Mas lá. E o que mais chama a atenção é a iniciativa isolada de milhares de professores espalhados pelo Nordeste.

    Imagina este país com banda (verdadeiramente) larga gratuita e estável para todos!

    Pra terminar: o estímulo à leitura para os nativos digitais pode passar pelo mesmo que ocorre comigo…

    – Por não ser nenhum devorador de romances ou de poesias, por mais que leia, sempre gostei de reportagens, de depoimentos, de biografias e de livros sobre Ciências Humanas em geral. Sabes como me interessei por ler Drácula (Bram Stocker), O Retrato de Dorian Gray, 20.000 Léguas Submarinas, Alan Quatermain, Tom Sawyer e O Médico e o Monstro?

    Após assistir ao filme LIGA EXTRAORDINÁRIA. Entrei no site oficial, catei informações sobre as personagens e baixei os livros (todos antigos, de domínio público) para ler.

    Isso é o que os estadunidenses Bolter e Grusin chamam de REMEDIATION (remidiação) e que alguns autores latinoamericanos chamam de MIDIATIZAÇÃO: o discurso, o espaço público, as “bibliotecas” e a criação de tudo passa por uma combinação de mídias. A produção e o consumo de todas as mídias estão conectados. A troca é solidária e contínua. As transformações são bem-vindas e o acesso é total. Não existe o “pai da criança”, pois todos acrescentam informação.

    O pensamento hierárquico e autoral não tem mais vez nesta sociedade. Quem age assim, tem menos condições de preparar seus filhos para o futuro e de se inserir devidamente nesta sociedade.

    []’s,
    Hélio

  9. Hélio:

    “Outro modelo de teoria da Comunicação superado é o da ala marxista da Escola de Frankfurt: ao contrário do que diziam, por mais que tente, a mídia de massa não é o quarto poder, não influencia a todos e não consegue manipular corações e mentes.”

    IMENSOS PONTOS DE EXCLAMAÇÃO.

  10. Charlles,

    Não se pode enganar a todos ao mesmo tempo. Além disso, todos têm escolha. Bem dizendo, se a esquerda tiver à sua disposição a mesma estrutura da Globo, irá supervalorizar, minimizar, omitir ou distorcer tanto quando a direita assim o faz.

    O modelo de financiamento e de concentração de veículos nas mãos das mesmas corporações é muito mais nocivo à sociedade do que como e o que eles comunicam ou deixam de comunicar. Afinal de contas, a esmagadora maioria da audiência e de seus patrocinadores é extremamente conservadora.

    Outro detalhe: à medida que a internet cresce, a mídia de massa acaba perdendo terreno para a mídia social representada pela apropriação das TICs (Tecnologias da Informação e da Comunicação).

    Tudo se resume a aprendermos a pensar e a agir em rede ao invés de pensarmos em massa e povo: a rede reúne uma multidão a partir de pequenos interesses que – somados – desconstroem o pensamento único.

    Salvo se houver censura ou se um governo qualquer fizer valer o fato de que as ondas de radiodifusão pertencem ao Estado e que quem as utiliza para transmitir informação não passam de meros concessionários, a mídia particular e impressa pode dizer sempre o que quiser e como quiser, desde que não infrinja as leis de calúnia, difamação ou injúria.

    Nosso judiciário e nossa classe política é que mantêm essa relação oligopolista e cartelizada.

    []’s,
    Hélio

  11. Sim, falta de tempo para leitura é um mal do nosso tempo que está virando crônico. Tenho o hábito de ler mais de um livro por vez – atualmente estou lendo 8, mas um comecei ontem e vou terminar hoje, enquanto há um outro que estou “lendo” há um ano.

    Tenho duas filhas, de 15 e 17 anos. A de 14 lê pouco mais que o que a escola recomenda; a de 17 lê, em média, 4 livros por semana. E não deixa de consumir tudo o que nos atrapalha a leitura, é redatora e editora gráfica do jornal da escola, estuda teatro, faz atletismo, toca violão, é catequista (mas já avisou que vai deixar em julho, depois de cinco anos)… Acho que é por isso que ainda não arranjou tempo para encontrar um namorado.

    …Mas, ler blog de qualidade não conta? 🙂

    abs

  12. Queridíssimo Milton,

    Eu ainda outro dia pensava nisso. Amo tanto os livros, todos eles… Eles são o que tenho de melhor aqui em casa, me orgulho tanto de ter uma biblioteca pessoal de respeito, com títulos clássicos e contemporâneos ( e você está lá, entre eles, no “Blog de Papel”). Leio para meus alunos meia hora todos os santos dias, e fiz de uma biblioteca comunitária um dos meus projetos mais preciosos, incentivando pessoas a voltarem ao primeiro amor do livro. Mas, me pergunta, que horas tenho tempo de ler? Não tenho me rendido ao prazer de ter um livro nas mãos, e isso, com certeza, me deixa mais triste e mais limitada.

    AMEI o texto, vou indicar pra todo mundo e estou morrendo de vontade de escrever uma declaração de amor aos meus livros queridos, para que eles não achem que foram abandonados… Não ainda. E hoje à noite, antes de dormir, em vez de ficar aqui me dividindo entre o computador, a TV e o MP4, vou abrir um dos livros que estão no criado-mudo na página marcada e saboreá-lo, bem devagar.

    Beijo enorme!

  13. Eu li o texto do post e lembrei do livro do Pennac “Como um Romance”.
    Ele ataca lá justamente esse tipo de pensamento comodista de que a tv, o walkman (isso porque é um livro de 92, acho) é que fazem nossos jovens não lerem tantos livros. Veja só, nessa época nem existia a internet como existe hoje!
    A gente tem essa noção – que eu não sei como ainda perdura, com tanta informação! – de que “o mundo não é mais como era antigamente” e que tudo está piorando. Acho interessante pra ilustrar isso o livro Em Nome da Rosa do Umberto Ecco. Na Idade Média o mundo já estava se perdendo… gente, essa ideia de que antigamente era melhor é velha, hem? Esse antigamente devia ser o próprio Jardim do Édem!
    Mas, enfim, digo isso porque eu não acho que hoje se leia menos do que antes. Muito pelo contrário.
    Eu acho que o Hélio disse tudo o que precisava ser dito e muito melhor do que eu sobre esse assunto. Só estou enfatizando. Lendo o que ele mesmo disse a impressão que tenho é que hoje se lê é muito mais!
    Isso porque, voltando ao Pennac, não devemos também tornar o livro esse objeto sagrado, que nada substitui. É uma forma de arte, na minha opinião. E como as artes em geral, nem todo mundo domina.
    E existe informação, programas televisivos, peças, filmes, quadros ruins como livros. E hoje, ainda bem, muitos de nós podemos pelo menos escolher o que ver, ler, assistir.
    Se algo falta, talvez, é as pessoas terem acesso e capacidade crítica.
    E, por fim, o que faz a gente ler menos livros pode até ser porque a gente tem acesso a muitas outras fontes de obter prazer e informação. Mas os livros mantém sua maneira de entreter e informar e quem gosta e domina a leitura lê, não importa que existam outras coisas. É só não encarar os livros como obrigação mais importante. Essa é a raiz do problema: a gente endeusa os livros e encara eles como obrigação. Aí o que você prefere? Fazer algo obrigado ou se divertir? A procrastinação!
    A gente tem que lembrar é que livros também são muito gostosos de se ler.

  14. Muito obrigado pela lembrança do DeLillo, autor de um dos últimos (e melhores !) romanções que lembro de ter lidoo – Ruído Branco – e de cuja literatura mais recente acabo de ter notícia indo à wikipedia movido por teu ótimo post. Oxalá tenha tempo de ler também o incensado comentário do Hélio Paz antes de, quem sabe, me atrever a também opinar sobre o tempo roubado (?) à leitura (de que ?).

  15. Em primeiro lugar, agradeço a honra e o interesse de quem achou interessante refletir sobre a questão também a partir da abordagem que eu levantei no comentário anterior! 😉

    Aos poucos, os aparatos tecnológicos que facilitam a leitura tendem a tornar-se mais acessíveis. Infelizmente, no início, o capitalismo neoliberal faz com que os fabricantes cobrem caro de uma elite para, assim que o processo de pesquisa e desenvolvimento do produto estiverem pagos, baixe-se o seu preço e expanda-se o seu canal de distribuição.

    Hoje, MP3 é baratinho: qualquer guri de periferia no ensino médio que trabalhe como boy já tem o seu. Não importa a marca nem o preço: o que importa é poder salvar áudio em sua memória e reproduzi-lo aonde quiser.

    Os mais interessados gravam as aulas do colégio e as ouvem no ônibus, no metrô ou andando de bicicleta. Depois, fazem perguntas em Wikis, que são sites de construção coletiva de conhecimento e esclarecimento de dúvidas que suplanta a autoridade do seu professor e dos seus colegas: troca-se ideias com professores e colegas espalhados pelo mundo (desde que no mesmo idioma, claro). Isso é muito mais prático e fixa a matéria melhor do que ter quatro irmãos pequenos quebrando a casa em um quarto pequeno e sem privacidade.

    Além de gravar as aulas, há ainda os audiobooks, que nada mais são do que livros INTEIROS gravados, sem mudar uma vírgula sequer. No Brasil, infelizmente, ainda há poucos audiobooks. Nos EUA, os alunos de muitas universidades recebem os audiobooks das disciplinas do semestre embutidas no valor da mensalidade junto com um descontão p/adquirir um notebook da Apple (MacBook) e, de “brinde”, um iPod Touch pra baixar e ouvir as aulas gravadas pelos próprios professores com conteúdo extra na iTunes U, que é um canal da Apple em parceria com as universidades, no qual disponibiliza espaço organizado por nome, programa, disciplina, data e professor em um layout atrativo para os alunos baixarem e ouvirem.

    No iTunes U, há muitos podcasts, que são programas editados com vinhetas e com a dinâmica do rádio, para ser baixados e ouvidos no mesmo sistema das aulas gravadas e dos audiobooks, porém com uma apresentação muito mais atraente.

    Aqui no Brasil, a Bia Kunzler, mais conhecida como Garota Sem Fio, passou a faculdade de Odontologia na UFPR inteira gravando as aulas e ouvindo-as no ônibus. Além de ser uma competente dentista que leva seu equipamento portátil para atender pacientes a domicílio, ela é consultora de tecnologia wireless (sem fio) em celulares, dá palestras, cursos, consultorias e escreve em revistas especializadas.

    A Bia tem um blog e um podcast. Procurem por GAROTA SEM FIO no Google e confiram! 🙂

    Como se vê, as possibilidades de expansão do interesse pela leitura são enormes!

    []’s,
    Hélio

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