Vargas Llosa recebe o Nobel 2010

Publicado no Sul21

O prêmio Nobel de Literatura de 2010, divulgado nesta quinta-feira (7) às 8h, foi para o escritor peruano Mario Vargas Llosa, pela “cartografia das estruturas do poder e suas afiadas imagens da resistência, rebelião e derrota.”

Após premiar um amigo de Fidel, Gabriel García Márquez, e os comunistas Pablo Neruda e José Saramago, todos escritores próximos ao Brasil, chegou a vez do liberal. Vargas Llosa, 74 anos, também guarda relações próximas ao Brasil, tanto que escreveu a notável narrativa épica A Guerra do Fim do Mundo sobre Canudos, inspirado pela obra de Euclides da Cunha.

O Nobel de Literatura é escolhido pelos membros da academia sueca e dá um prêmio de aproximadamente R$ 3 milhões, entregue em dezembro. Durante o processo de escolha, os membros da academia enviam questionamentos a centenas de autores, críticos e professores, com a finalidade de chegar aos candidatos. De uma lista inicial de 250 nomes, em cortes sucessivos, se chega a um segundo grupo, com 15 a 20 e, num terceiro, a cinco nomes. Os membros da academia leem as obras dos candidatos e discutem sobre quem deve ser o vencedor. Um pouco antes do anúncio, os membros da academia avisam o vencedor através de um prosaico telefonema. A premiação do Nobel de Literatura costumava prestar-se a homenagens e distorções geopolíticas. Nos últimos anos, esta prática foi abandonada.

Não obstante o sucesso e os indiscutíveis méritos literários de livros como Batismo de Fogo (1963), Conversa na Catedral (1969) — considerada sua maior obra –, Pantaleão e as visitadoras (1973), Tia Júlia e o escrevinhador (1977), do citado A Guerra do Fim do Mundo (1981), Historia de Mayta (1984) e Quem matou Palomino Molero? (1986), Vargas Llosa enveredou pela política e pelo jornalismo nos anos 90. Casualmente ou não, sua ficção começou a perder força e seus últimos livros não receberam a acolhida dos primeiros.

Na política, o escritor tentou inverter a ordem natural das coisas e começou pelo fim: em 1990 concorreu logo à presidência do Peru pela Frente Democrata (FREDEMO), partido de centro-direita, mas perdeu a eleição para Alberto Fujimori. Naqueles anos, perdeu também a originalidade de sua literatura.

Fascinado pelo estilo clássico de Flaubert — a quem dedicou um ensaio e inúmeros artigos e referências — , após os anos 80 Vargas Llosa continuou escrevendo bons livros, mas a centelha ficou perdida em algum lugar. De sua produção mais recente, o principal é o respeitável grupo de ensaios literários, afora, é claro, suas célebres e virulentas polêmicas com García Márquez.

18 comments / Add your comment below

  1. Tia Júlia e o Escrevinhador tem um dos trechos mais asfixiantemente hilariantes de todos os tempos (a queda de Cristo). Eu levei uns 2 meses para parar de ter ataques incontroláveis de riso só de reler o trecho.

  2. Grande e merecido prêmio. Antes tarde do que nunca. Um dos livros mais sensíveis que li (quando eu era gauche na vida e ele Llosa também era) foi Conversa na Catedral (não é uma igreja, mas um bar bem espelunca), sobre a vida política e social de Arequipa e do Peru.

  3. O Nobel, quando não encerra a carreira de escritores (que, depois de recebido o prêmio, começam a escrever irrelevâncias presunçosas), concede seus dólares àquele gênero de autores semelhantes a ex-jogadores de futebol que continuam em atividade. Lllosa é um deles; não me lembro qual foi seu último livro minimamente relevante, mas sua obra prima ficou décadas atrás, Conversas no Catedral, e seu livro mais divertido também, Tia Julia e o escrevinhador.

    Portanto, não merece. A não ser que especifiquem: “Olha, estamos oferecendo esse prêmio ao passado mais longínquo, não ao próximo e muitom menos ao presente; ademais, não acreditamos no futuro desse autor. Não pensem que se trata de uma premiação política por tratar-se o autor de um liberal “admirado” pelos cultores da democracia sem povo, pois a defesa do Estado mínimo já deu o que tinha que dar, e Llosa transformou-se em um reacionário dos mais abjetos, que aceita até argumentos racistas”.

    Quer dizer, não merece mesmo.

    Se é o caso de premiar a América Latina, deem um prêmio póstumo a Roberto Bolaño. A família dele agradeceria mais uma vez o empenho dele em deixar uma obra que a ajudasse financeiramente.

    1. Pois é. Na minha opinião, ele merece pelo passado. Ponto final.

      Literariamente, é uma espécie de prêmio póstumo, como seria também um prÊMIO PARA sÁBATO.

      Mas o Nobel não é um prêmio pelo conjunto da obra?

      Agora, eu preferia um prêmio para alguém menos direitoso…

      1. Se ele fosse de direita e ainda escrevesse bons livros, vá lá, só que não é o caso.

        Aliás, por uma coincidência talvez nem tão estranha assim, a literatura dele foi piorando à medida em que ele adernava para a direita.

        Já Gabriel Garcia Marquez é ruim desde sempre com sua coerência arrivista, supostamente esquerdista. Tá bom, dizem que ele é tão grande quanto Guimarães Rosa; coincidentemente, não suporto nenhum dos dois. Deve haver alguma “coerência” nisso.

        Sábato deve estar com uns 100 anos, né? Há quanto tempo ele não escreve?

        Por falar nisso, Borges era de direita. Embora eu não seja lá tanto fã dele assim, inegável é que se trata de um cara que conhecia seu ofício. Ofício por assim dizer, é claro, uma vez que ele não era de escrever tanto assim. Mas eu, como todo cara inteligente de direita, já li todos os romances dele.

  4. Vargas Llosa era o autor hispanoamericano preferido do Bolaño, vale lembrar. Eu estava apostando nesse ano no excelente autor espanhol Javier Marías (também por recomendação de Bolaño, que o considerava o maior escritor em espanhol vivo), que estou lendo dele Coração Tão Branco e gostando muito _ o cara tem algo de Saramago em suas extensas reflexões. Mas o Nobel sempre foi imprevisível. Nunca imaginava que Llosa fosse ganha-lo. Só li dele o Tia Júlia, que achei demais, e nunca me dispus a mais porque ele ia na contramão dos escritores hispanoamericanos: suas influências eram os franceses (gostava de Faulkner, mas foi bem menos assimilável que os outros), sobretudo o Sartre, que a mim sempre foi abominável e chatíssimo.

    Mas para quem gosta de ufanismos patrióticos ou regionais, vale lembrar que desde Octávio Paz que não “ganhamos” o Nobel por estas searas.

  5. Véio,que aporrinhação este papo de esquerda-direita.
    È claro que o Lhosa merece o premio assim como tantos outros escritores e poetas como Ferreira Gullar (lá vem pedrada da direita…).
    Para alguns (é sério!)teríamos um prêmio Nobel da Paz da direita e outro da esquerda.(pelo amor de God ,não fui eu que dei esta idéia preconceituosa e provinciana)
    Em tempo, Figueiredo já não está mais no poder (ah! Que tempo bom não?)e, infelizmente também, o muro de Berlim desmoronou-se forever

    1. E as novas gerações persistem na batalha ideológica. Dia desses vi dois guris conversando na frente do colégio da minha rua, um deles explicando para o outro que se mastubar com a mão esquerda dá uma sensação diferente, pois parece que é a mão de outra pessoa.

        1. Ahahaha. Lembre-se que essa mão, no cabeçalho do blog, está do lado de uma mão feminina. Aliás ali está todo mundo com a outra mão em algum lugar. É praticamante uma suruba de zumbis.

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