Quem não tem muita vivência na área da música de concerto talvez torça o nariz para o programa da Ospa desta quinta-feira (20), às 20h, na Casa da Música da Ospa, mas garanto que ele é de extraordinária qualidade.
O programa é o seguinte:
Johann N. Hummel | Concerto para Trompete em Mi Bemol Maior
I. Allegro con spirito
II. Andante
III. Rondó: Allegro
Franz Berwald | Sinfonia n° 3 em Dó Maior, ‘Singular’
I. Allegro fuocoso
II. Adagio – Scherzo – Adagio
III. Finale: Presto
Regência: Mateus Araujo
Solista: Diogo Gomes, trompete
Primeiramente, vamos pedir a ajuda de Adriano Brandão a fim de tentar descrever o que é Sinfonia Nº 3 de Franz Berwald, a “Sinfonia Singular”. O primeiro parágrafo é meu. Os outros são dele. O Adriano destaca os dois movimentos finais da sinfonia, mas, para mim, a grande surpresa e alegria é o primeiro movimento, apesar de eu achar toda a sinfonia linda.
Um dia, estava dirigindo para o trabalho e a Sinfonia Singular começou a tocar na rádio da UFRGS. Cheguei a meu destino ao final do primeiro movimento e não consegui sair de dentro do carro até o final. Eu simplesmente TINHA que saber o que era aquilo. Era 1989. Então, o locutor anunciou Franz Berwald? Berwald? Who the fuck is Berwald? Logo importei um vinil alemão e pude comprovar meu amor pela Sinfonia. Berwald é uma raridade. Você conhece outro compositor sueco? Dentre os escandinavos, você certamente conhece o norueguês Grieg, o finlandês Sibelius e o dinamarquês Nielsen. Eles são raros, né? E a Suécia não gerou grandes nomes. Franz Adolf Berwald foi praticamente ignorado enquanto era vivo. Por isso, teve que procurar uma outra ocupação. Berwald trabalhou como cirurgião ortopédico, e posteriormente administrou uma serraria e uma fundição de vidro. Hoje, ele é considerado o compositor sueco mais importante de seu século. Em 1976, a nova sala de concertos da Sveriges Radio recebeu o nome de Berwaldhallen. Berwald morreu em Estocolmo em 1868 de pneumonia.
Não são raros os casos de artistas totalmente esquecidos durante suas vidas e que alcançam certo status “cult” décadas ou mesmo séculos depois.
Apresento-lhes o sueco Franz Berwald. Personalidade curiosíssima, sobreviveu tanto a Schubert quanto a Mendelssohn e Schumann, seus contemporâneos, sem nunca ser plenamente bem-sucedido em viver de sua música. Aliás, várias vezes ele teve de empreender em áreas bem distantes, com sucesso bem maior: ortopedia, fisioterapia, vidraçaria…
Compôs quatro sinfonias, todas com subtítulos em francês. Apenas a Primeira, dita “Sérieuse”, foi executada em sua vida. Nunca ouviu as demais. Quando já estava bem velhinho, obteve o primeiro sucesso: sua ópera “Estrella de Soria” foi montada e bem recebida. O governo sueco reconheceu seus esforços, deu-lhe uma medalha, o indicou para o Conservatório de Estocolmo e… Berwald morreu. :-/
A posteridade foi-lhe muito mais receptiva. No século 20, principalmente, suas inusitadas e originais sinfonias foram redescobertas e enfim executadas, gravadas e aplaudidas. Hoje Berwald é reconhecido como o principal compositor sueco.
Pense em um Mendelssohn cheio de arestas: bizarrices, repetições esquisitas, trechos semi-estáticos, melodias estranhas, harmonias pontiagudas… Esse é o estilo de Berwald. Sua sinfonia mais representativa é a Terceira, a “Singulière”. O mais bacana dessa obra, de 1845, é o “encapsulamento” do scherzo DENTRO do movimento lento. Fora o finale de um vigor realmente impressionante, que chega até a lembrar Brahms ou Bruckner.
Vale conhecer. É divertido pacas. Nosso amigo ortopedista, fisioterapeuta e vidraceiro sabia compor sinfonias interessantes 🙂
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O Concerto para Trompete (Concerto a Trombe Principale) de Johann Nepomuk Hummel e ficou famoso lá por 1983, quando Wynton Marsalis lançou seu LP de estreia na música erudita. Lá estava — em extraordinária interpretação — o Concerto, ao lado do de Haydn e de uma peça de Leopold Mozart. Foi ali que o conheci e jamais esqueci dele.
Hummel escreveu o Concerto para o virtuoso vienense e inventor do trompete de teclas Anton Weidinger (assim como Haydn tinha feito antes). Ele foi escrito em dezembro de 1803 e executado no dia de Ano Novo de 1804 para marcar a entrada de Hummel na orquestra da corte de Nikolaus II, Príncipe Esterházy, como sucessor de Haydn. Há lugares, principalmente no segundo movimento, onde se acredita que Weidinger alterou a música para adequá-la melhor ao instrumento. Não se sabe se falou antes com Hummel.
Originalmente esta peça foi escrita em mi maior. A peça é frequentemente executada em mi bemol maior, o que torna o dedilhado menos difícil nos trompetes modernos em mi bemol e si bemol.
O Concerto é muito bonito. Tem um Andante belíssimo, assim como o Rondó final.
Ou seja, não perca!