Um leigo lendo sobre assédio moral

Um leigo lendo sobre assédio moral

Por pura curiosidade (ou necessidade interna), eu, que gosto de ler só ficção ou ensaios sobre ficção, comecei a ler livros e publicações sobre dois outros assuntos: psicopatia e assédio moral. Procurei tanto livros quanto publicações esparsas na internet. Bem, psicopatia é uma coisa e assédio moral é outra. As duas coisas normalmente não estão misturadas e não sou vítima em nenhum dos casos, apenas observo coisas. É claro que eu li textos para não especialistas, mas escritos por gente que trabalha com isso. A coisa virou mania e eu pensava a cada manhã: hoje é assédio ou psicopatia?

Hoje vou de assédio.

Assedio Moral

A discussão sobre assédio moral está chegando com força no âmbito do serviço público e há de se espraiar. O assédio moral é uma coisa que se naturaliza e permanece. É uma forma de violência continuada que consiste na exposição da pessoa a situações constrangedoras e humilhantes, praticadas por uma ou mais pessoas. O comportamento do assediador tem o objetivo de deixar rente ao chão a auto-estima da vítima. Pouco ou nada do que ela faz presta. Ela é ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada, amedrontada, punida, ofendida ou desestabilizada emocionalmente. Sua saúde física e psicológica é colocada em risco, além de ver afetado, é claro, seu desempenho. Por iniciativa do chefe ou de um grupo, normalmente o ambiente se torna um “todos contra um” e o empregador ou seu representante costuma reforçar a pressão com uma bela lógica: Veja bem, se todos estão contra ti, quem está errado?

Obviamente, a vítima fica na dúvida se o problema não será ela. Será que eu atraio este tipo de coisa? Ou será que tudo não é paranoia minha e o que está acontecendo é normal?

O assédio por parte da chefia pode assumir a forma de gritos e humilhações públicas, enquanto que o do grupo aposta mais na propagação de boatos, isolamento, recusa de comunicações, fofocas e exclusão social. O processo é repetitivo e prolongado, minando resistências.

O objetivo é o de pressionar tanto que o assediado acaba por pedir demissão. Muitas vezes o coitado acaba por ser transferido. Porém, no serviço público, do qual não vai se demitir por ter estabilidade e uma melhor aposentadoria, a vítima costuma cair na passividade, ilhada em condições de humilhação e constrangimento. E sofre psicologicamente, muitas vezes deprimindo-se e adoecendo. Então, seus atestados médicos geram desconfiança e… maior assédio.

Às vezes, a própria organização incentiva ou tolera tais ocorrências por achar que vão aumentar a competitividade e produtividade, sendo sinal do tesão do grupo. Em organizações mais avançadas, são motivo de demissão por justa causa.

O assédio nem sempre é intencional. As práticas podem ocorrem com os agressores ignorando que os abusos são uma forma de violência psicológica. Isso não retira a gravidade do assédio moral e dos danos causados às pessoas, que devem procurar ajuda psicológica e/ou jurídica para fazer cessar o problema.

As vítimas de assédio moral não são necessariamente pessoas frágeis ou que apresentem qualquer transtorno. Muitas vezes elas têm características percebidas pelo agressor como ameaçadoras. Uma melhor formação causa inveja. A capacidade crítica também é ameaça — caso tipico: suas sugestões para melhorias no trabalho são primeiro rejeitadas como piadas e depois adotadas como ideias de outrem ou do grupo. As mulheres mais criativas estão dentre os alvos preferidos. Se forem negras ou estrangeiras, pior. Claro, as vítimas habitualmente são de grupos já discriminados na rua: mulheres, homossexuais, pessoas com deficiências, idosos, minorias étnicas.

Mas, como desgraça pouca é bobagem, criatividade e informação costumam estar presentes no perfil da pessoa que reage ao autoritarismo. E o grupo costuma tratar disso.

assedio moral pesadelo

Abaixo, deixo pra vocês a definição de assédio moral retirada de uma cartilha preparada pela ANDES/UFRGS. “Segundo constatação dos estudiosos do tema, há um perfil das vítimas muito marcante: são pessoas que resistem às investidas dos chefes, trabalham mesmo doentes, são capazes e criativas, e em sua maioria mulheres”:

“Caracteriza-se pela degradação deliberada das condições de trabalho em que prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação a seus subordinados, constituindo uma experiência subjetiva que acarreta prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador e a organização. A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos pares. Estes, por medo do desemprego e a vergonha de serem também humilhados associado ao estímulo constante à competitividade, rompem os laços afetivos com a vítima e, frequentemente, reproduzem e reatualizam ações e atos do agressor no ambiente de trabalho, instaurando o ‘pacto da tolerância e do silêncio’ no coletivo, enquanto a vítima vai gradativamente se desestabilizando e fragilizando, ‘perdendo’ sua autoestima”.

O documentário abaixo, A dor (in)visível – Assédio Moral no Trabalho, é uma produção do Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) – Procuradoria do Trabalho no Município (PTM) de Caxias do Sul; do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) – Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) em Caxias do Sul; e do Governo Federal.

E é muito ilustrativo.

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