Vi o filme de Walter Salles no último domingo. Foi um dia chuvoso que acabou lindo, ensolarado. Fui ao cinema com meu filho Bernardo, de 13 anos, e acabei encontrando lá, por coincidência, minha irmã acompanhada de minha mãe. O Bernardo é um novíssimo apreciador de cinema que já me confidenciou mudanças radicais em sua forma de ver filmes. A maior prova disto foi a surpreendente declaração de que, hoje, vê mais méritos em Cidade de Deus que em O Senhor dos Anéis. (Nas entrelinhas, vocês devem ler minha baba.)
Para quem não sabe do que se trata, o longa-metragem mostra a viagem de motocicleta realizada em 1952 pelo jovem estudante de medicina Ernesto “Che” Guevara de la Serna (Gael García Bernal), de 23 anos, junto com o amigo bioquímico Alberto Granados (Rodrigo de la Serna), de 29. O roteiro é baseado nos livros escritos respectivamente pelos dois: De Moto pela América do Sul e Con el Che por Sudamérica.
Gostei muito do filme. É um road-movie muito bem dirigido, com imagens belíssimas e atores em desempenhos impecáveis. Roberto Maxwell escreveu em seu blog que Walter Salles revela-se um humanista. Concordo inteiramente. O olhar interessado que Salles lança sobre todos os seus personagens dá ao filme surpreendente grandiosidade. É um diretor sensível e raro. Raro ao impor-se a dificuldade de fazer um “filme de formação”, isto é, de documentar artisticamente a tomada de consciência e o crescimento das convicções dos personagens principais. A forma mais simples seria a de partir para as pedradas panfletárias, mas WS é muito inteligente e esteta para cair nesta tentação. Quando o filme começou, até temi que viessem diálogos que parecessem saídos de alguma antologia de aforismos socialistas. Mas isto não ocorreu; Ken Loach estava longe daqui. A atuação e o entendimento da dupla Gael García Bernal e Rodrigo de la Serna é perfeita. Em cena, eles sempre se mostram dignos de seus personagens, adotando a esperada postura de jovens idealistas e inteligentes, acrescidos daquela acidez de humor tão comum entre nossos amigos argentinos e uruguaios.
Em minha opinião, o melhor filme de Walter Salles ainda é o pouco visto O Primeiro Dia, realizado logo após o super visto Central do Brasil, mas agora Diários de Motocicleta vai para o segundo lugar. No final do filme, minha irmã estava muito emocionada, com os olhos meio marejados. Eu também. O final do filme é para isto mesmo, mas meu motivo era o de ver 3 gerações de nossa família saindo calma e casualmente do cinema, ouvindo o Bernardo dizer que queria aprender espanhol. E o motivo dela, qual seria?