entre parênteses

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hoje, quando caminho pela rua distraído, quando divago esperando o sono chegar ou quando dirijo meu carro, carrego comigo fatias das histórias e dos textos daquelas pessoas que conheci através do blog. não sei quantos conheci; é muita gente. o que importa é que são pessoas afins e quem tem afinidade conosco é sempre alguém maravilhoso, não? peraí, esta frase foi um indisfarçado autoelogio, então deixem-me aumentar a dose de hipocrisia — de forma a não ofender ninguém — dizendo que é sempre maravilhoso encontrar alguém que guarde afinidade conosco, alguém que tenha a potencialidade de conversar de chinelos conosco, sentado em nossa cozinha com tudo por lavar ou em torno de uma mesa de bar, discutindo sobre absolutamente qualquer assunto. mas ainda não está bom; talvez fosse melhor dizer que o maravilhoso do blog é conhecer pessoas que abordam a vida de forma semelhante à nossa e sentir que ainda assim podemos admirá-las. há em todas estas tentativas de frase um forte componente narcisista, mas estamos livres disto em nossa reunião? e… onde estaríamos livres de nosso narcisismo se até na forma com que passamos a faca na manteiga há paixão, estilo e, portanto, narcisismo?

mesmo com pouco tempo disponível, não pretendo parar tão cedo. minha média diária de visitas anda muito alta para alguém com tão diminuta vocação sinfônica. ainda acho que o melhor do blog é acompanhar com atenção as fatias de vida que nos são expostas e ficar montando as pessoas. algumas já estão bem montadas, outras são vistas ainda como um quebra-cabeças espalhado pelo chão. sigamos, pois.

ah, há mais. hoje escrevo tudo durante o dia. caço assuntos, recolho impressões, penso e encontro bobagens, formo opiniões que, na verdade, só têm importância dentro da caixa de minha cabeça e que vão se transformar em outra coisa ao serem passadas para o papel e em outra ainda quando lidas. sei lá.

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4 comments / Add your comment below

  1. Cadê meu inimigo?

    O portão da garagem abre bem devagar, mas Jorge hesita em dar partida ao veículo. Será o mesmo de ontem? Não, não pode ser. Se ao menos tivesse colocado as coisas em pratos limpos, estaria tranqüilo, mas, depois de rechaçar a abordagem através dúzias de palavrões e brusca aceleração do carro, não sei. Ele estará esperando mais uma vez.

    Como esse infeliz descobriu meu endereço? Ah, me lembro: enviei para ele uma revista pela correio, e nem cogitei colocar dados falsos no verso do envelope. Essas distrações sempre acontecem comigo e causam aborrecimentos. Inferno.

    Dez minutos depois de muito refletir, Jorge parte de casa bem vagarosamente, com medo de atropelar seu opoente, Maurício. Mas ele não apareceu.

    No trabalho, a mesma coisa. De repente ele aparece por aqui. Já deve ter descoberto onde trabalho. Sim, deve ter me seguido até aqui, mesmo antes de ontem. Primeiro, todas as informações, depois, a perseguição.

    Irrequieto, sua produção foi bastante ruim na parte da manhã. Não desceu para almoçar; ficou visando a porta, aguardando a qualquer momento por Maurício. Mas ele não veio e, no final do dia, Jorge estava quase a morrer de fome; mesmo assim, temia sair do escritório.

    No dia seguinte, a mesma coisa, ou bastante semelhante, e novamente Maurício não deu as caras. Preocupado, Jorge parou o carro diante do endereço para onde enviara, há tempos, a maldita revista. Era uma loja de roupas. Femininas. Resolveu entrar.

    “Por favor, o senhor Maurício?”
    “Não há nenhum Maurício conosco, senhor. Somos apenas mulheres aqui, ou melhor, aqui só trabalham mulheres”
    “Talvez o dono do negócio…”
    “Mulher também”
    “Marido de alguma sócia, funcionária…”
    “Mesmo assim não, senhor, nenhum Maurício entre os maridos e namorados. Amantes, não sei…” – ela respondeu, rindo.

    Hoje completa um ano da única aparição de Maurício. Jorge mudou de endereço, de cidade, de estado, só ficou no mesmo país. Nesse dia, ele lê na revista que enviara ao opoente o artigo em que criticara duramente suas idéias. Mas será que as idéias eram dele mesmo?

  2. usastes tão bem os parênteses que vão dizer que eu te imitei mal.

    fiquei pensando. talvez essas amizades que o blog permite tenham toda essa intimidade e sucesso porque o narcisismo já é um componente adicionado à relação, afinal, é inevitável num blog? talvez dispa exatamente da hipocrisia e sossegue os egos, porque, como amizade originada intelectualmente, pressupõe um “respeita meu narcisismo que respeito o teu” — algo bem mais difícil de lidar com alguém que se conhece na escola ou no supermercado.

    talvez? 🙂

  3. Bah… que susto!!
    Pelo começo do texto achei que era uma despedida do Blog.
    Senhor Milton não me invente uma coisa dessas.
    Tua generosidade intelectual em permitir esse clima de mesa de bar é fecunda e é ela que propicia esses encontros.

    Fiquei bem orgulhoso de teres gostado do meu texto no post anterior.

  4. Esquece essas bobagens freudianas de narcisismo – conhecer pessoas interessantes é ótimo e ponto final. É um dos melhores efeitos colaterais de se ter um blog.

    Eu acho que já tenho um quebra-cabeças bem montado a teu respeito. E estou com os dos outros cinco leitores apenas iniciado.

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