Publicado em 19 de abril de 2004
Desta vez, nada de música, cinema ou literatura; quero comemorar a mudança do tempo. Toda vez que entro no carro, faço Elis e Tom me avisarem que são as águas de março fechando o verão. Meu sangue erra de veia e se perde ao notar que a dupla está novamente adiantada. Caro Tom, nossos verões só deixam entrar o outono em meados de abril. Você talvez tenha feito a maior de nossas canções, mas errou na metereologia. Uma pena. Choveu ontem e hoje, a temperatura finalmente desabou. A longa estiagem fez com que aflorasse uma pequena parte de nossa má educação. Os jornais se encheram de fotos do Guaíba metros abaixo de seu nível. Nas margens, via-se a areia cheia de garrafas, sacos plásticos e lixo de todo gênero. Descobrimos assim que nosso belo rio serve também para esconder-nos.
Minha filha dorme a meu lado. Estava conversando e subitamente calou-se. Coisa de criança. Cubro-a com um lençol e ela geme e se encolhe, enquanto uma enorme ternura me invade. Não pediu janela aberta, ventilador, ar condicionado, nada; apenas dormiu após um domingo especialmente aventuresco. Durante o dia, não prendeu os cabelos. É a época em que sumirão as coxas e os braços das mulheres, os decotes fechar-se-ão e as roupas ficarão tão escurecidas que sentiremos falta do calor. O consolo virá com o vinho, os fondues e as sopas e, sempre que quisermos algo mais, enfrentaremos intermináveis botões, zíperes e camisetas. Também é consoladora a luz do outono – a mais bela de todas nesta latitude. Tudo isto não deixa de ser uma promessa de vida em meu coração…
Não quero fazer com que meus 7 leitores salivem olhando para o monitor, mas digo-lhes que já fizemos o primeiro fondue de chocolate do ano. Sim, a Claudia é muito oportunista e nos deu esta sobremesa no almoço de domingo. Era para comer de joelhos. Não, eu não a empresto. A falta de prática nos fez perder muitas frutas dentro do chocolate e, como naquele episódio do Asterix, houve ameaças de punições e chibatadas aos faltosos.
Chega de conversa ribeira por hoje. Afinal, É a chuva chovendo, é conversa ribeira / Das águas de março, é o fim da canseira.