Singelo post dedicado ao fotógrafo Ramiro Furquim,
que desconhecia a existência deste prédio
no passado de Porto Alegre.
Os mais jovens nem sabem que existiu, outros esqueceram. Uma das construções que deixavam a Porto Alegre de minha infância mais feliz e bonita era o Mata-borrão que ficava na esquina da Av. Borges de Medeiros com a rua Andrade Neves. Ele foi construído em 1958 para ser um local destinado a exposições e outros eventos, acabou servindo como central telefônica enquanto era construído o prédio da CRT do outro lado da rua e, por razões que desconheço, foi demolido no final dos anos 60. Em seu lugar foi construído o edifício perfeitamente comum da ex-Caixa Econômica Estadual (hoje “Tudo Fácil”).
Deve haver estudos sobre a debacle arquitetônica de nossa cidade, claro. Porém este não é um assunto muito comentado. Comenta-se mais a forma insistente como fazemos a autossabotagem de não olhar nunca para o Rio/Lagoa/Estuário Guaíba. Então, na minha humilde opinião, acho que deveríamos derrubar o Tudo Fácil para ali construir um enorme Monumento à Estupidez Porto-alegrense. Por quê? Ora, porque é a esquina mais representativa de nosso mau gosto e vou resumir meus motivos. Vamos a um trecho do Diário do arquiteto Fernando Corona (inédito em livro) que é revelado neste post:
Será curioso constatar o atraso intelectual na Seção de Obras da Prefeitura. Oscar Niemeyer fez um ante-projeto a sua maneira genial, pois uma vez estudado pela Prefeitura, não foi aprovado porque o Engenheiro Bozzano não achava o estilo próprio para a Av. Borges de Medeiros, alegando que iria desentonar das construções ao lado. Mais uma vez se constatou que a falta de um preparo apurado, os nossos engenheiros responsáveis pelas Obras Públicas, pouco entendem de arquitetura. Ora, se o projeto do Oscar fosse aprovado, mesmo que o nosso fosse o primeiro escolhido em concurso, eu me sentiria feliz por vez em nossa cidade um exemplar da arquitetura de Oscar Niemeyer.
Há coisas que não tem explicação. Gastam dinheiro em concursos, aprovam projetos, duvidam de seu valor, encomendam outros fora do concurso e tudo para nada. Até hoje em 1971, ao escrever estas minhas memórias, o terreno da Av. Borges de Medeiros se encontra vazio. Nenhum diretor do IPE se atreveu a construir seu Edifício Sede num terreno tão bom como esse”. Fl,s 375 e 376
Ou seja, em 1949, Oscar Niemeyer venceu um concurso para fazer um edifício naquela esquina, fato que não ocorreu porque iria destoar do restante da Borges de Medeiros… O edifício era este e seria a sede do IPE.
OK, se não era uma Brastemp, ao menos era mais aceitável do que aquela coisa que está lá hoje. Então, no lugar de Niemeyer, quase uma década depois, foi erguido o legendário Mata-Borrão com planta do arquiteto Marcos David Heckman.
O Mata-borrão — apelido que ganhou em função de seu formato, claro — era um prédio que me deixava feliz. Eu descia do ônibus na Salgado Filho ou do bonde na Riachuelo (residia na Av. João Pessoa, próximo ao Colégio Júlio de Castilhos) e passava na frente dele. Ficava olhando, fantasiando um dia morar ali. Tinha menos de 12 anos de idade…
E, além disso, ficava imaginando possiblidades de construções que nem os Jetsons conceberiam. Alguém saberia me dizer o motivo de sua demolição? Excesso de beleza? Era muito estranho? Pouca praticidade? Irritação dos militares com tanta originalidade? O que teria sido? Numa boa, nem quero pesquisar. Fico olhando as fotos e deixo assim.
O atual Tudo Fácil. É útil e feio. E destoa da vizinhança, apesar de ser igual a quase tudo. Que tal derrubar?
Não, não somos utilitaristas, apenas, constantemente, optamos pelo feio. Desde que seja novo, claro.
Belo post, Milton.
Milton, que insanidade destruir uma edificação tão bela como o Mata-borrão. O que me impressionou foi a incrível semelhança que ele tinha com o Museu Oscar Niemeyer (veja este link: http://bit.ly/kDOrKh) em Curitiba. Aliás, até acho que a ideia foi copiada.
Puta que o pariu. É verdade, Ery!
Vim aqui pra falar a mesma coisa…
Claro que o Oscar copiou !
Ele deve ter vindo à Porto Alegre ver o prédio que superou seu projeto vencedor e pensado: “o dia que eu projetar um museu com o meu nome vai ser assim”.
PS: Tu que andas pelo centro, sabes se aquele relógio quadrado (ou cubo, não sei) da IBM que ficava no topo de um prédio na Andradas ainda existe ?
Se Niemeyer copiou, copiou ele mesmo. Em 1954 ele já tinha feito esboço de um projeto semelhante para o Liceu Belo Horizonte, em MG. O primeiro “mata-borrão” ou “olho” do Niemeyer era assentado diretamente no solo. O de Curitiba está sobre uma torre de 21 metros de altura, que é interligada com o prédio principal por uma passagem subterrânea.
vejo amanhã. Vou tentar lembrar…
Minha mãe me levou para conhecer o Mata-borrão quando eu era pequena, acho que tinha uns 6 anos, como sou de 56, deve ter sido por volta de 62, talvez. Mas NÃO lembrava onde ele ficava!!! Lembrava da visita, da exposição, do local mas não conseguia saber onde era. Durante anos da minha vida isso foi um ponto de interrogação. Falei com várias pessoas mas ninguém sabia. Como minha mãe já faleceu há muito tempo, continuava essa lacuna…. Hoje reolvi pesquisar sobre o “mata-borrão” e fiquei emocionada com o teu post, Milton.
Obrigada pelas recordações.
Primeira coisa q pensei ao ver o mata-borrão foi: Niemeyer copiou em Curitiba.
A arquitetura tem dificuldade de unir beleza e funcionalidade. O prédio projeto pelo Niemeyer seria feio, e quase com toda certeza não funcional; o mata-borrão tem beleza discutível, e ignoro se serviu tanto às pretensões originais (exposição) ou à companhia telefônica. O último é feio e quase certamente funcional. É raro, raríssimo unir uma coisa a outra. Uma sugestão é fazer um concurso para que as pessoas escolham entre alguns exemplos bonitos (e de reconhecida funcionalidade) seus favoritos.
Quanto aos milicos, eles demoliram o Palácio Monroe, na Cinelândia, no Rio de Janeiro, para… nada. O prédio fora sede do Senado enquanto o Rio foi capital do… país. Depois da demolição, o terreno ficou ali, à toa; virou praça, hoje tem um chafariz. Não é necessário perguntam o que havia (ou há) na cabeça dos milicos.
Não havia muita coisa lá mesmo (na cabeça deles).
Bonito, muito bonito! É linda a foto noturna, Milton!
Não sabia desse Mata-Borrão de Porto Alegre. Nem do Museu Niemeyer de Curitiba, mas estudei no Colégio Estadual de Belo Horizonte. Na época era assim mesmo que a escola se chamava. Hoje é a Escola Estadual Governador Milton Campos.
Vários comentaristas especularam aqui sobre um plágio – possível ou óbvio. Então aqui vai uma contribuição mineira para a discussão:
O projeto do Colégio Estadual é de Niemeyer e foi feito a convite de Juscelino Kubitschek, na época governador do estado. Ou seja, o projeto deve ser de 1954 (acho que é isso mesmo). Com certeza, é de bem antes do fim dos anos 50.
No Google há muitas fotos do Colégio. Façam uma busca, por exemplo, do “Colégio Estadual Central Belo Horizonte”. Vejam o auditório do Colégio. Para todos nós, era o “Mata-Borrão”.
Outras fotos na galeria do sítio do próprio Colégio:
http://www.colegioestadualcentral.com.br/pagina4130.htm
Abç.
Luiz Otávio
Perfeito Luiz Otávio,
Sou paulista, mas visitei esse colégio estadual do Oscar Niemeyer em uma visita de estudo da minha faculdade. O projeto, claramente, é anterior ao projeto de Porto Alegre de Marcos Heickman. Acho triste quando as pessoas ficam tentando minimizar a genialidade de Oscar Niemeyer, diante de toda a consistência de sua obra, reconhecida internacionalmente. Isso é meio complexo de vira-lata.
E acho essa discussão de quem veio antes ou depois muito pequena, porque nada se cria, tudo se transforma. A meu ver, todas as obras citadas tem seu valor histórico.
Segue um link do Archdaily sobre a escola de Niemeyer em BH:
https://www.archdaily.com.br/br/755023/classicos-da-arquitetura-escola-estadual-milton-campos-oscar-niemeyer
Finalmente encontrei pessoas que como eu,lembram de coisas boas de Porto Alegre.Ando a procura de fotos da travessia do Ed Uniao ate o Sulacap em um cabo de aço, montados em uma bicicleta, de umas pessoas que nao lembro o nome
Oi Marco. Eu desconhecia essas travessias mas a curiosidade aguçada pelo teu comentário me fez pesquisar sobre o tema e me deparei com esse material que segue. O grupo é Zugspitz Artisten. No último link uma curiosidade. Abraço.
http://almanaquenilomoraes.blogspot.com.br/2014/05/zugspitz-artiesten.html
http://wp.clicrbs.com.br/santana/2013/11/21/os-zugspitzen-artisten/?topo=13,1,1,,,13
http://www.espacovital.com.br/publicacao-26670-equilibrista-e-os-trouxas-solidarios
Morava na Riachuelo, muito eu curti o Mata Borrão. Lembro-me de um trabalho sobre conservção de documentos, como eles transformavam documentos todos rasgados em documentos novos.Entre outras vizitações. A respeito ao andador de bicicleta no cabo de aço, meua pais me levava para ver. As vezes ele me colocava em seu ombro. Maravilhoso. Nunca vi alguém de minha familha tirar fotos. Era denoite e muito distante. Os recursos eram poucos.
Meus Deus! Ainda eta semana estava me lembrando este predio. Quando meu pai faleceu em 1958, No Natal daquele ano fizeram um presepio vivo dentro do predio. Nós eramos muito pobres, mas minha mãe arrumou um jeito de irmos e apreciarmos aquele espetaculo, e o predio em si era tao imponente quanto o espet5aculo. Foi o natal mais bonito que eu tive e sempre me lembro dele, em todos os natais da minha vida!
Não era imponente. Muito pelo contrário.
Se nao me engano … era muito pequeno..os primeiros testes da tv colorida foi feito ai…
O mata-borrão é um projeto do arquiteto Marcus Heckmann ( [email protected]) , um brilhante professor da UFGRS, que além deste, projetou o Jardim Zoológico do RGS, com premiação no exterior; ele vai adorar receber seus comentários!
COMPARTILHEI ESSA MATÉRIA MUITO ESCLARECEDORA COM O SEGUINTE TÍTULO: “DE COMO OS GAUCHOS PORTOALEGRENSES DEIXARAM ESCAPAR UM UM EXEMPLAR ARQUITETÔNICO ASSINADO POR NINGUEM MENOS QUE OSCAR NIEMEYER…”
Não é projeto de Niemeyer.
Muito bom.
Gente!!!! Fico chocada de ver que os porto-alegrenses que são daquela época não fazem a menor ideia do que se passou com o mata-borrão! E já tiraram conclusões de julgamento precipitado sobre a destruição! Eu frequentei o local, e vi, testemunhei o que se passou numa tarde em torno do ano de 1966 ou 67. O mata-borrão não foi demolido simplesmente. Ele pegou fogo. Houve um incêndio. Era tudo de madeira e vidro. Pegou fogo numa tarde de dia se semana. Eu estava lá olhando com minha avó e minha tia. Não sobrou quase nada. Eu tinha uns 6 ou 7 anos e foi o primeiro incêndio que vi na vida. Abraços.
Exatamente. Eu lembro bem do incêndio, mas não consigo encontrar nenhuma referência, a não ser o teu comentário. obrigado por confirmar que não estou ficando louco!