O astrólogo da Corte calculou o dia exato. O Imperador Carlos IV deveria colocar a primeira pedra ao pôr-do-sol no nono dia do sétimo mês de 1357, exatamente às 17h31. A obra só terminou no século XVI, duzentos anos depois. Provavelmente, a construção sofreu interrupções, pois não é muito grande. Mas o astrólogo tinha razão, desta vez ela não caiu, justificando todo o cuidado.
Kafka tinha com Praga um caso semelhante a Machado de Assis com seu bairro de Cosme Velho, na zona sul do Rio de Janeiro: o checo nunca abandonou a cidade e circulava em um perímetro pequeno dela, que já não é muito grande. No Museu Kafka, descobri uma coisa que não sabia — minha filha Bárbara chamou minha atenção para o fato: Kafka era um contumaz namorador, teve inúmeros casos. As tchecas são muito bonitas e também são assim as namoradas do escritor. A menos bela era a preferida da família, Felice; a mais bela era a preferida do escritor, Julie ou Julia, não lembro bem. Seu pai Hermann fez tudo para separar o casal, pois a moça não era judia. Conseguiu. Mas tergiverso.
(Tergiversando um pouco mais: a música de Praga é o jazz. Há grupos de jazz tanto sobre a Ponte quanto nos bares e teatros. Acho incrível).
Estou lendo um livro sobre a Praga de Franz Kafka que comprei naquela cidade — calma, o livro é em espanhol — e descubro que o autor passava mais de uma vez por dia pela Karlův most, ou a Ponte Carlos. Mais: descubro que, antes de completar 20 anos, rabiscou para si mesmo o poema abaixo, sem título, mas em honra a um dos lugares mais belos que conheço.
Homens, que cruzam pontes escuras
passando junto a Santos
ornamentados por débeis luzes.
Nuvens, que correm pelo céu cinzento
passando junto a igrejas
com mil torres que condenam.
E alguém, apoiado no parapeito de alvenaria,
que olha na água da noite,
suas mãos sobre velhas pedras.
(tentativa de tradução por Milton Ribeiro)
Milton, ficou gozada a frase: “Kafka é um caso semelhante a Machado de Assis: nunca abandonou Praga e circulava em um perímetro pequeno da cidade, que não é muito grande”. Por ela pensamos que Machado também nunca abandonou Praga.
hahahahaha
Coisas não revisadas… Obrigado, vou dar um jeito.
“Paralaxe paradoxo”
Um mundo imenso contido em um
labirinto pequeno, ademais
cheio de saídas, desvios, inclusive
rotas para o exterior.
O reflexo não visto da Baía de Guanabara
encontra o irmão mais novo nas águas
do rio Moldava, enquanto a humanidade segue
debruçando-se mais sobre um, menos
sobre outro, diferentes e iguais.
Gostei da discreta associação. O dois foram mais ou menos contemporâneos, mais ou menos isolados intelectualmente, pareciam não se interessar por viagens e foram absolutamente geniais. Moldávia e Baía de Guanabara.
E o título, desculpa, é “Paralaxe paradoxo”. Olha que o R nem fica perto do L.
Eu li corretamente, só agora vi o erro.