Surpreendente livro de 1961. Uma extraordinária novela sobre erotismo e morte, velhice e sensualidade. Mas acho melhor colocar logo um verbo nesta resenha… Esta clássica e notável obra do Prêmio Nobel de Literatura de 1968, Yasunari Kawabata (1899-1972) adentra, com grande sensibilidade e delicadeza, o complicado e praticamente ignorado tema do erotismo na idade da impotência ou, para sermos elegantes, da busca pela felicidade após a juventude. Esta obra serviu de inspiração a Gabriel García Márquez para o seu Memória de Minhas Putas Tristes (2004), bem como para a peça de 1983 The House of Sleeping Beauties, de David Henry Hwang. Kawabata criou um estranho estabelecimento. Uma espécie de puteiro onde homens de idade avançada podem passar as noites com jovens mulheres despidas, adormecidas. Sob forte medicação, elas jamais acordam e eles podem examinar cada detalhe de seus corpos, passar-lhes a mão, apalpar seus seios, beijar seus corpos, observar seus dentes, seus ressonares, hálitos e sonhar, relembrando seus passados com mulheres. São mulheres anônimas, escolhidas pela dona da casa e os velhos nunca concretizam o ato sexual, até devido à falta de vigor físico. Eram tempos pré-Viagra e a relação quase contemplativa permite ao autor elaborar densas e poéticas metáforas a respeito da finitude e do caminhar pra a morte. Afinal, a beleza e a juventude não obtêm serem roubadas pelo velho Eguchi, protagonista da novela, mas o contato com elas é consolador e sugestivo, apesar das vontades do velho. Eguchi vai à casa em cinco noites não consecutivas e o que lhe passa pela cabeça é esplêndida e poeticamente descrito por Kawabata, assim como cada gesto e movimento das moças durante seus sonos. Um livro curioso e pervertido, de doce e indecente poesia. Tudo na medida certa, com perfeito bom gosto. Recomendo muito.
Livro comprado na Ladeira Livros.
Ai, tentei ler Kawabata e não curti. No País das Neves, os personagens ficavam envolvidos e se ofendiam com coisas tão sutis, tão distantes da minha compreensão, que geravam um efeito cômico – eu ria de mim mesma e minha ignorância. Como não era um livro de humor…
Esse livro é uma maravilha. Impressionou tanto o GGM que antes do Putas Tristes ele escrevera uma crônica e um conto nele baseados, e foi lendo esses dois últimos que me interessei por ele. Tem essa perfeição artesanal única da literatura nipônica, tão propícia à expressão poderosa dos assuntos capitais da alma. Realmente uma excelente lembrança.
De algo recente,
que publiquei por aqui,
cheguei a isso… Talvez
tenha a ver com velhos…
(кто знает?).
*
*
QUANDO SE ESQUECE
by Ramiro Conceição
*
*
Com vagar, esquecer-me-ei
de quando meu filho riscou
na clara partitura da sala
seu andamento primeiro…
Sim, suavemente esquecer-me-ei
de quando decifrei aquela equação
de Einstein; e aos poucos também
das vezes que ouvi aquelas vozes
de Bach.
Evoé! Parece que nasci pra
sentir a passagem do vento…
Como disse certa vez o poeta.
Evoé!
Lentamente esquecerei até quando
d e f i n i t i v a m e n t e se esquece.
Gosto desse livro. O livro do García Márquez inspirado nele, contudo, é um equívoco tão grande de forma e conteúdo. Acho que porque o GGM, preso a sua mentalidade de “macho latino”, não teve a coragem de fazer de seu velho um sujeito realmente frágil e abatido pela falência do desejo – o personagem tem 90 anos mas se gaba de que, ao contrário de seus colegas frequentadores do puteiro, não tem “problemas hidráulicos”.
O livro do Kawabata foi adaptado para o cinema num filme alemão. Mas tem um outro, acho que inglês ou americano, que pega a mesma ideia, praticamente, bota num contexto muito parecido mas não assume a inspiração:
http://www.imdb.com/title/tt1588398/?ref_=nm_flmg_dr_1
Assino embaixo e por todos os lados, Carlos. Putas Tristes é um livro MUITO MENOR de GGM.