Minha opinião? Uma presidente eleita democraticamente e que não tem contra si qualquer crime de responsabilidade não pode sofrer impeachment. Mas o que interessa são duas análises abaixo, publicadas sem título no perfil de seus autores:
Por Luís Eduardo Gomes, jornalista do Sul21
Cunhas ou não Cunha, o que importa agora é que são necessários 342 votos para que o impeachment de Dilma tenha andamento na Câmara, uma vez que a regra exige que dois terços do total de 513 cadeiras.
A pergunta que fica é: há tudo isso de votos para derrubar a Dilma? A princípio não, longe disso. Dilma tem, bem ou mal, aprovado projetos a seu favor (aprovou um hoje). Mas, como essa Câmara é uma sacola de gatos, nunca se sabe. Vamos aos números:
Atualmente, essa é a composição da Câmara:
Bloco PP, PTB, PSC, PHS – 84
Bloco PR, PSD, PROS – 75
Bloco PMDB, PEN – 68
PT – 60
PSDB – 53
PSB – 33
Bloco PRB, PTN, PMN, PTC, PTdoB – 27
DEM – 21
PMB – 20
PDT – 18
SD – 15
PCdoB – 12
PPS – 10
PV – 5
PSOL – 5
REDE – 5
S.PART. – 2
Pegando os partidos de oposição aberta e que já defenderam o impeachment, acho que teríamos 53 do PSDB, 21 do DEM, 15 do Solidariedade do Paulinho da Força, 10 do PPS. Totalizando 98, muito longe dos 342 necessários.
Do outro lado, que certamente votariam contra o impeachment, há o os 60 deputados do PT, obviamente, os 12 do PCdoB, os 5 do PSOL (mesmo sendo oposição duvido que votaria a favor) e imagino que os 5 da Rede, visto que o Molon, líder do partido, é recém saído do PT. Totalizando 82. Faltariam 90.
Agora que vem a parte interessante. Esses votos que eu digo certos, somam só 180. Só que, das outras 333, temos muito mais partidos que são da base e que precisariam romper com o governo. A popular trairagem.
Desses, 68 são do bloco PMDB, PEN, que teoricamente poderia virar de lado se sentisse o poder tão perto.
Agora, será que o bloco PR, PSD, PROS, com 75 deputados, e o bloco PP, PTB, PSC, PHS, com 84, mudariam de lado assim tão fácil. Acho muito improvável. Aí no meio tem partidos sólidos da base. Mas, nunca se sabe.
Prosseguindo. Tem dois partidos, um independente, PDT, com 18 deputados, e outro da oposição, PSB, com 33, que muito me surpreenderiam se votassem a favor do impeachment. Acho que estariam rasgando um pouco da trajetória deles e para entregar o poder para o PMDB e para direita – que certamente iria se abraçar num governo Temer -, o que eu não vejo como nenhuma vantagem para partidos que supostamente são de centro-esquerda.
Tem ainda uns partidos aleatórios, como esse bloco PRB, PTN, PMN, PTC, PTdoB, que eu desconheço como votam, e o novato PMB (o partido da mulher que só tem homens), que tem uma carinha de quem vota com os tucanos…
Dado esse quadro, seria precisa uma senhora traição da base e uma posição favorável praticamente inteira de partidos que pouco ou nada teriam a ganhar com o impeachment para que se chegasse aos 342 votos. Isso é, difícil.
Passada essa etapa, seria necessário mais dois terços do voto do Senado, em que, teoricamente, a base da Dilma é mais estável e menos volátil do que na Câmara. Aqui, seriam necessários 54 votos.
Vamos lá: PSDB (11), DEM (4), PPS (1) somam só 17 votos.
PT (13), PCdoB (1), REDE (1, duvido que o Randolfe Rodrigues vote pelo impeachment), somam 15.
A essa altura, se já passou na Câmara, imagino que os 19 senadores do PMDB já tenham se bandeado. Embora aqui, existam senadores como Roberto Requião que não devem votar a favor. Como votaria Marta Suplicy?
De novo, PDT e PSB me soam como incónitas e somam 6 e 7 senadores, respectivamente. Como vota Romário? Cristovam Buarque? Lasier Martins? Acho muito improvável 13 votos aqui. Talvez liberem as bancadas, mas votar ambas totalmente contra é difícil.
Restam os partidos da base e outros bancadas pequenas. O problema, para quem quer o impeachment, é que a Dilma só precisaria de mais 12, isso considerando que PMDB, PSB e PDT votaram inteiros contra a Dilma, o que é difícil. E, de novo, a maioria desses seriam de partidos da base. PP (6), PR (4), PTB (3), PSD (4), PROS (1), PRB (1), PSC (1) somam outros 20.
Considerando isso tudo e só analisando a questão do ponto de vista matemático, é muito, muito improvável que o impeachment passe pela Câmara e menos ainda pelo Senado.
P.S: Que sacola de gatos confusa que elegemos, hein…
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Por Idelber Avelar, professor de literatura latino-americana e ensaísta
Levaram o cinismo da Realpolitik até limites nunca antes imaginados. Abriram mão de todos os princípios. Aliaram-se aos piores bandidos da República. Cultivaram uma militância entorpecida, lobotomizada, especializada em negar hoje o que dizia ontem e em tentar justificar o injustificável. Humilharam repetidamente a sua base social, obrigando-a a sustentar um governo que trata a pão-de-ló os inimigos dessa base e a chicote os seus próprios membros. Foram perdendo os aliados genuínos, um por um, até ficar só com os chantagistas. Criaram um exército de capangas e ex-jornalistas em atividade para distorcer fatos e difamar opositores. Ajoelharam-se ante um pilantra de quinta categoria, cujo único projeto na vida era ser mais um bandido do PMDB carioca. Até o soar do gongo, imploraram por um acordo. Ofereceram tudo e conseguiram o pior dos mundos possíveis: nem fizeram política direito e nem se pautaram pela ética.
O resultado está aí: um criminoso comum, de quem já se sabe que roubou milhões do erário público, abre um processo de impeachment contra uma Presidente incompetente, mas que foi legitimamente eleita e de quem se sabe que nunca roubou um alfinete.
Parabéns a todos os que cultivam esse cinismo sem princípios. Agora, que lidem com o monstro.
A única coisa que eu realmente sei a respeito desse assunto é que a maioria que opina sobre ele nunca abriu um livro Direito Constitucional. Tudo que sabem foi acumulado em pesquisas rápidas no Google, artigos de jornalistas ou memes do Facebook. Eu, que sou advogado (embora minha especialidade seja outra área), não me sinto nem um pouco autorizado a desfilar minha opinião pelo mundo sobre um teme altamente complexo. Por outro lado, o que eu vejo de sujeitinhos por aí (defensores e acusadores) que nunca abriram um livro de Direito Constitucional na vida, mas nem por isso se envergonham de escrever como se fossem o Alexy, é uma coisa impressionante.
Justiça seja feita, esse texto do Idelber é excepcional.
Tem esse aqui, fundamental, do Nelson Moraes:
“Cunha é obra do PT. A lambança de barganha de cargos nos primeiros escalões é obra do PT. O aporte de fundamentalistas na liderança de boa parte das comissões parlamentares é obra do PT. O oxigênio que o PMDB ganhou, depois de uma ameaça de declínio que parecia irreversível, é obra do PT.
Depois vocês vêm falar que o Governo Dilma não realizou obras. ”
Quanto a mim, eu já prognosticava isso tudo nos debates de alguns sites progressistas antes da reeleição da Dilma. Esses dias estava relendo tais debates no blog do NPTO, e me espantei não pela minha lucidez, que era coisa adquirida olhando sem reservas o óbvio, mas pela desmedida obtusidade cheia de pose erudita do autor do blog (um economista, que ostenta sua medalha ou diploma de Oxford, e do qual nunca me lembro o nome). Pelo menos eles tem a ombridade de não apagarem os post.
Eu sou contra a deposição da Dilma. Por uma série de motivos: salvar um resquício de sanidade e normalidade política, o que refrearia um pouco o caos multitudinário que nos aguarda; não há outra opção; o intervalo que vai se seguir a partir de ontem até a resolução dessa tramoia é um nível estacionário imenso em que todo o país está lançado, e o qual não temos o luxo de suportarmos; a país retornando oficialmente ao PMDB, isso é bem mais que nossos estômagos acostumados com o surrealismo grotesco pode digerir, é um retrocesso não só espiritual, mas físico (chego a pensar que, assim que efetivado, até as fachadas dos prédios de toda a nação retornarão imediatamente ao tom sépia das fotos antigas, o que combinará com os fuscas e brasílias a variants que tomarão as ruas).
Mas a situação é de um descalabro tão gigantesco, que cogito que o que nos sobra, o que de melhor pode nos acontecer, é justamente o caos total. Mais três anos de imobilidade e incompetência pode ser apenas o que parece: o retrato de nosso medo covarde de sempre. Talvez o que pode ser mais saudável para dar um respiro de dignidade a um povo amaldiçoado como nós é a crise absoluta, argentina, que abaixe a temperatura confortável desses únicos 8 anos de falsa prosperidade em toda nossa história através do vazio da gôndolas de supermercado. O pacto com o diabo e a falta total de inteligência e caráter do PT nos trouxe de volta aos tempos do Sarney.
Combina bem com o momento a minha releitura de Doutor Fausto, do Thomas Mann. A derrocada para a catástrofe que o narrador descreve é similar ao clima atual de nosso país. E, não sei se reparastes, Milton, (eu só fui ver, assombrado, nessa minha terceira leitura, o que me fez dar um pulo na cadeira assim como no final do Sexto Sentido), mas quem faz o pacto com o diabo não é Adrian Leverkuhn, mas o narrador. Essa genialidade de Mann me prostrou de admiração e fascínio: quem está paulatinamente se afundando de corrupção no inferno, à busca de recompensas ególatra, é Serenus Zeitblom. Adrian se conserva íntegro, apartado de coaptação, fiel a si mesmo, humanista e resignado, em profundo e comovente estoicismo. Ah se tivesse sido concebido essa sabedoria a nós. O criminoso no Brasil sempre é muito burro, isso é nossa drástica derrota.
Exato e exato.
Perdão, mas não, Cunha não é obra do PT.
Cunha e esse congresso fisiologico (um PMDB expandido) foram eleitos e foi com eles q nossa sociedade decidiu que a Dilma deveria governar.
Se tivessemos uma sociedade melhor esclarecida, com uma imprensa minimamente decente não teriamos tantos Cunhas, Paulinhos e PMDBs, desde sempre.
O q acho incrivel é colarem essa responsabilidade unicamente ao PT.
“Fernando Henrique Cardoso inicia nesta semana o segundo mês de seu segundo mandato. A julgar pelo que ocorreu em janeiro, FHC deve mesmo estar apreensivo com o que vem pela frente. Da moratória de Itamar à disparada do dólar, nada deu certo para o presidente.
A impressão que se tem hoje é que FHC não encontrou uma fórmula para enfrentar as múltiplas crises que emergiram nas últimas semanas. A equipe do presidente teve, desde a eclosão da crise econômica, uma atuação pífia, para não dizer constrangedora. Mesmo analistas simpáticos ao governo têm reconhecido este fato.
O presidente e sua equipe parecem desorientados.
(…)
A mudança no comportamento da Folha é emblemática. Significa que Fernando Henrique começa a enfrentar problemas onde nunca os encontrou: na mídia. Mais ainda, é importante notar que a Folha é conhecida pelo faro que tem para detectar mudanças no cenário político.
Os ataques ao governo FHC, entretanto, não param por aí. Dentro da própria base aliada começam a surgir propostas inimagináveis há dois ou três anos. Sem que se soubesse ao certo quem e como, começaram a aparecer notas na imprensa dando conta de que parlamentares tucanos estavam avaliavando a possibilidade de rediscutir o próprio sistema de governo.
(…)
Na terça-feira saiu publicado (não por acaso na Folha de S. Paulo), um artigo de autoria do ex-prefeito de Porto Alegre Tarso Genro, político que vem sendo cotado para a disputar a presidência do PT. Depois de analisar a crise econômica e diagnosticar uma crise de credibilidade do governo FHC, Genro levantou uma proposta polêmica: a renúncia de Fernando Henrique, com a ressalva de que o presidente deveria encaminhar ao Congresso uma emenda constitucional convocando eleições para a presidência em outubro.
(…)
O deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), por exemplo, acredita que o ex-prefeito foi direto ao ponto: “é preciso entender que a proposta de Tarso possui um grande mérito, qual seja o de apresentar uma solução democrática para a crise. Frente o diagnóstico ingovernabilidade do país, seria muito justo que a população pudesse optar, logo, por alternativas para sair desta crise.”
Para o deputado do PCdoB, a situação do país é muito grave e o governo FHC não pode se arrastar por quatro anos sem que algo seja feito. “Quando uma situação semelhante ocorreu no final do governo Sarney, havia pelo menos a esperança de que as eleições que se aproximavam resolveriam os problemas. Agora, as próximas eleições estão marcadas pra 2002. É muito tempo.””
http://www.correiocidadania.com.br/antigo/ed127/politica.htm
Em minha opinião, a melhor análise sobre a atual conjuntura brasileira está aqui:
http://tijolaco.com.br/blog/a-logica-demolidora-de-santayana-fatia-a-ideia-do-todo-poder-ao-moro/
P.S.: a caça de bodes expiatórios é bem típica dos cronistas esportivos: o gol marcado nunca é mérito do time adversário, mas culpa de alguém que “falhou”… Assim, a crônica esportiva cria a política de um time repleto de vira-latas.
Na Copa de 70, quando a Checoslováquia fez o primeiro gol, Rui Porto, imortal cronista, declarou SEGUNDOS após o ocorrido: “Calma, Calma!… Esse gol foi apenas um acidente. Nós somos infinitamente melhores…”
Resultado final: 4×1 para o Brasil. É… Não faz mais cronistas como antigamente…
errata: ,,, Não SE faz…
Cara
Otimo texto. Acho uma leitura bem fiel da relaidade brasileira.
Nao acredito em ruptura, acho que as coisas vao continuar como estao, para o bem ou para o mal, o poder pode ate trocar de maos mas a merda vai continuar a feder por quilometros de distancia.
E pra ser sincero, acho que o Brasil tem o que merece, o brasileiro no geral é um ser bem egoista e cheio de preconceitos (caracteristicas que se aplicam a todas as classes sociais inclusive).
Em Brasília, líderes oposicionistas procuraram ontem deixar claro sua versão de que o slogan “Basta de FHC” não é golpista, como acusam aliados do governo e ministros de Estado.
O partido espera a votação pela Câmara do recurso contra a decisão do presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), de não aceitar o pedido de abertura de processo contra FHC no caso das teles, primeiro passo para um pedido de impeachment.
“Qualquer deputado pode pedir à Mesa da Câmara a abertura de processo contra o presidente da República. Dizer que isso é golpe é falta de assunto”, disse o presidente do PT, José Dirceu.
“A possibilidade de impeachment está na marcha. O PT não prega a renúncia do presidente, mas onde está escrito que as pessoas não podem gritar renúncia? O presidente vai baixar uma medida provisória dizendo as palavras de ordem que podem ser ditas em manifestações públicas?”, disse o líder do PT na Câmara, José Genoino (SP).
São Paulo, Quarta-feira, 25 de Agosto de 1999 São Paulo, Quarta-feira, 25 de Agosto de 1999
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc25089902.htm