Gosto tanto das personagens femininas dos filmes de Bergman, que costumo extasiar-me com suas atrizes. Adoro-as todas, as bonitas e as nem tanto. Este post é feito de registros de alguns filmes do mestre.
Sem mostrar o rosto, temos acima Harriet Andersson em Mônica e o Desejo (1953).
A extraordinária e engraçada Eva Dahlbeck vê seus amantes discutirem em Sorrisos de uma Noite de Verão (1955).
E faz pose de contrariada em Para não falar de todas as mulheres (1964).
Acima, uma Bibi Andersson saltimbanco conversa com o marido em O Sétimo Selo (1957).
E vira caroneira em Morangos Silvestres (1957).
Até foi uma das 5 mulheres com as quais Bergman casou.
Acaba numa universidade levada por …
… Ingrid Thulin, …
… que aparece lindíssima neste filme…
… e ainda mais bonita no ano seguinte, em O Rosto (1958).
Gunnel Lindblom participou de vários filmes, mas só em O Silêncio (1963) — vocês já a viram ao fundo na foto de Bibi Andersson caroneira, lembram? — , ocupou um dos papéis principais.
A maior das atrizes bergmanianas, Liv Ullmann, começa a tomar o poder em Persona (1966).
Bergman une os rostos de Bibi Andersson e Liv Ullmann no mesmo e esplêndido filme.
Uma foto das três irmãs e da criada no filme que talvez mais vezes tenha visto, Gritos e Sussurros (1972), um Tchékhov transformado em Bergman. A foto é de Liv, Thulin, Harriet e Kari Sylwan, no papel de criada.
Não é nada disso que vocês estão pensando… Erland Josephson está ofendendo Liv Ullmann. Descreve o que o tempo fez com o rosto de Liv de um ponto de vista, digamos, moral.
Ingrid Bergman, a mais bela mulher do cinema, faz sua despedida das telas no embate entre mãe e filha de Sonata de Outono (1978).
Christine Buchegger sumiu no horizonte, mas seu rosto ficou imortalizado no estranho Da vida das marionetes (1980).
Fato semelhante ocorreu com a maravilhosa Ewa Fröling, a inesquecível mãe de Fanny e Alexander (1982). Bergman queria que seus atores olhassem para ela como se quisessem comê-la, mordê-la… Não devia ser difícil.
Lena Olin nem pensava na insustentável leveza, nem em gregos ou chocolates quando fez Depois do Ensaio (1984).
E a despedida no mestre deu-se com a musa Liv Ullmann já sessentona, em Sarabanda (2003).
Os filmes de Bergman, com suas mulheres instigantes, quase sempre são excelentes. Um bela postagem, meu caro.
Lindo Milton! Belíssimo post. (vamos ver como reagem os peitólatras)
Mas que coisa essa Liv Ullmann! Que coisa…
E não se trata só de beleza, né?
Que coisa…
(sessentona não, Milton, sessentíssima!)
memorável poste Bergmaniano!
abç
Não sei se gostei mais das belas e espetaculares atrizes ou da oportunidade de me relembrar de alguns dos filmes de Bergman. Comecei a assistí-los ao final da adolescência e já perdi noites de sono para elaborar suas teses, recompor-me dos terremotos internos proporcionados pelas histórias que falavam ao inconsciente através das sombras projetadas na tela grande… Valeu!
A primeira foto com Harriet Andersson me deixa com vontade de tomar banho de sol.
Você me fez lembra que comprei o DVD do filme O Sétimo Selo e que ainda não assisti.
Ótimo Porque hoje é Sábado.
Abraços
Milton do céu!
Adoro o Bergman e suas mulheres, mas hoje o sábado deveria ser dedicado à dona Yeda…
Sei que ofende teus padrões estéticos – e os dos leitores -, sei que falta carisma e estampa, sei que vai ser difícil achar um retratinho dela com pouca roupa.
Mas tem uma da lamentável governadora dançando com o Busato. Poderias construir a galeria do completo fracasso.
Abraços.
É verdade, Franz. Só que eu gosto do meu Pq Hj é Sáb… Me divirto com ele. Mesmo quando “saudei” o piloto do Enola Gay foi divertido. Agora, a Yeda… Vou pensar.
A Yeda merece o impeachment. Nunca pensei que houvesse MESMO essa possibilidade, mas há e ela é digna exatamente disto.
E viva os blogs e a democracia! O trabalho do RS Urgente, do Diário Gauche, do Dialógico e de outros foram perfeitos e deslocaram alguns grandes jornais do centro das atenções.
Abraço.
O post não poderia ser mais convidativo!
Liv Ullmann fascina-me!
Lindo post
Muito bom gosto
Bom final de semana para todos!
Embora MUITO atrasado ( férias são para isso…) não poderia perder um sábado destes!
Forte abraço,
Por vezes a boa prosa estética e a esmerada selecta quase permitem perdoar a ausência de nudez ou devassidão.
Se é Bergman, seja direta ou indiretamente, não tem erro! Excelente e belíssimo post.
Contrariando o ateísmo deste blog e aproveitando o espírito pascoal, desejo muito que exista a reencarnação pra eu voltar como diretor de cinema.
Querido Milton,
porque hoje é sábado de Aleluia, porque lhe respeito muito, vou abusar, me lambuzar em seu blog.
Fundamentalmente, me perdoe. Mais que isso: me compreenda…
JUDAS-AHSVERUS
by Euclides da Cunha
No sábado de Aleluia os seringueiros do Alto Purus desforram-se de seus dias tristes. É um desafogo. Ante a concepção rudimentar da vida santificam-se-lhes, nesse dia, todas as maldades. Acreditam numa sanção litúrgica aos máximos deslizes.Nas alturas, o Homem-Deus, sob o encanto da vinda do filho ressurreto e despeado das ínsidias humanas, sorri, complacentemente, à alegria feroz que arrebenta cá em baixo. E os seringueiros vingam-se, ruidosamente, dos seus dias tristes.
Não tiveram missas solenes, nem procissões luxuosas, nem lavapés tocantes, nem prédicas comovidas. Toda a Semana Santa correu-lhes na mesmice torturante daquela existência imóvel, feita de idênticos dias de penúrias, de meios-jejuns permanentes, de tristezas e de pesares, que lhes parecem uma interminável sexta-feira da Paixão, a estirar-se, angustiosamente, indefinida, pelo ano todo afora.
Alguns recordam que nas paragens nativas, durante aquela quadra fúnebre, se retraem todas as atividades – despovoando-se as ruas, paralizando-se os negócios, ermanando-se os caminhos – e que as luzes agonizam nos círios bruxolentes, e as vozes se amortecem nas rezas e nos retiros, caindo um grande silêncio misterioso sobre as cidades, as vilas e os sertões profundos onde as gentes entristecidas se associam à mágoa prodigiosa de Deus. E consideram, absortos, que esses sete dias excepcionais, passageiros em toda a parte e em toda a parte adrede estabelecidos a maior realce dos outros dias mais numerosos, de felicidade – lhes são, ali, a existência inteira, monótona, obscura, doloríssima e anônima, a girar acabrunhadamente na vida dolorosa e inalterável, sem princípio e sem fim, do círculo fechado das “estradas”. Então pelas almas simples entra-lhes, obscurecendo as miragens mais deslumbrantes da fé, a sombra espessa de um conceito singularmente pessimista da vida: certo, o redentor universal não os redimiu; esqueceu-os para sempre, ou não os viu talvez, tão relegados se acham à borda do rio solitário, que no próprio volver das suas águas é o primeiro a fugir, eternamente, àqueles tristes e desfreqüentados rincões.
Mas não se rebelam, ou blasfemam. O seringueiro rude, ao revés do italiano artista, não abusa da bondade de seu deus desmanchando-se em convícios. É mais forte; é mais digno. Resignou-se à desdita. Não murmura. Não reza. As preces ansiosas sobem por vezes ao céu, levando disfarçadamente o travo de um ressentimento contra a divindade; e ele não se queixa. Tem a noção prática, tangível, sem raciocínios, sem diluições metafísicas, maiça e inexorável – um grande peso a esmagar-lhe inteiramente a vida – da fatalidade; e submete-se a ela sem subterfugir na covardia de um pedido, com os joelhos dobrados. Seria um esforço inútil. Domina-lhe o critério rudimentar uma convicção talvez demasiado objetiva, ou ingênua, mas irredutível, a entra-lhe a todo o instante pelos olhos adentro, assombrando-o: é um excomungado pela própria distância que o afasta dos homens; e os grandes olhos de Deus não podem descer até aqueles brejais, manchando-se. Não lhe vale a pena penitenciar-se, o que é um meio cauteloso de rebelar-se, reclamando uma promoção na escala indefinida de bem-aventurança. Há concorrentes mais felizes, mais bem protegidos, mais numerosos, e, o que se lhes figura mais eficaz, mais vistos, nas capelas, nas igrejas, nas catedrais, e nas cidades ricas onde se estadeia o fausto do sofrimento uniformizado de preto, ou fugindo na irradiação de lágrimas, e galhardeando tristezas…
Ali, – é seguir, impassível – e mudo, estoicamente, no grande isolamento da sua desventura.
Além disto, só lhe é lícito punir-se da ambição maldita que o conduziu àqueles lugares para entregá-lo, manietado e escravo, aos traficantes impunes que o iludem, e esse pecado é o seu próprio castigo, transmudando-lhe a vida numa interminável penitência. O que lhes resta a fazer é desvendá-la e arrancá-la da penumbra das matas, mostrando-a, nuamente, na sua forma apavorante, à humanidade longínqua…
***
Ora, para isso, a igreja dá-lhe um emissário sinistro: Judas; e um único dia feliz: o sábado prefixo aos mais santos atentados, às balbúrdias confessáveis, à turbulência mística dos eleitos e à divinização da vingança.
Mas o monstrengo de palha, trivialíssimo, de todos os lugares e de todos os tempos, não lhes basta à missão complexa e grave. Vem batido de mais pelos séculos e fora tão pisoado, tão decaído e tão apedrejado que se tornou vulgar na sua infinita miséria, monopolizando o ódio universal e apequeando-se, mais e mais, diante de tantos que o malquerem.
Faz-se-lhe mister, ao menos acentuar-lhe as linhas mais vivas e cruéis; e mascarar-lhe no rosto de pano, e laivos de carvão, uma tortura tão trágica, e em tanta maneira próxima da realidade, que o eterno condenado pareça ressuscitar ao mesmo tempo que a sua divina vítima, de modo a desafiar uma repulsa mais espontânea e um mais compreensível revide, satisfazendo à saciedade as almas ressentidas dos crentes, com a imagem tanto quanto possível perfeita da sua miséria e das suas agonias terríveis.
E o seringueiro abalança-se a esse prodígio de estatuaria, auxiliado pelos filhos pequeninos, que deliram, ruidosos, em risadas, a correrem por toda a banda, em busca das palhas esparsas e da farragem repulsiva de velhas roupas imprestáveis, encantados com a tarefa funambulesca, que lhe quebra tão de golpe a monotonia tristonha de uma existência invariável e quieta.
O judas faz-se como se fez sempre: um par de calças e uma camisa velha, grosseiramente cozidos, cheios de palhiças e mulambos; braços horizontais, abertos, e pernas em ângulo, sem juntas, sem relevos, sem dobras, aprumando-se, espantadamente, empalado, no centro do terreiro. Por cima uma bola desgraciosa representando a cabeça. É o manequim vulgar, que surge em toda a parte e satisfaz à maioria das gentes. Não basta ao seringueiro. É-lhe apenas o bloco de onde vai tirar a estátua, que, é a sua obra prima, a criação espantosa do seu gênio longamente espalhado de revezes, onde outros talvez distinguam traços admiráveis de uma ironia subutilíssima, mas que é para ele apenas a expressão concreta de uma realidade dolorosa.
E principia, às voltas com a figura disforme: salienta-lhe e afeiçoa-lhe o nariz; reprofunda-lhe as órbitas; esbate-lhe a fronte; acentua-lhe os zigomas; e aguça-se o queixo, numa massagem cuidadosa e lenta; pinta-lhe as sombrancelhas, e abre-lhe com dois riscos demorados, pacientemente, os olhos, em geral tristes e cheios de um olhar misterioso; desenha-lhe a boca, sombreada de um bigode ralo, de guias decaídas aos cantos. Veste-lhe depois, umas calças e uma camisa de algodão, ainda servíveis; calça-lhe umas botas velhas, cambadas…
Recua meia dúzia de passos. Contempla-a durante alguns minutos. Estuda-a.
Em torno a filharada, silenciosa agora, queda-se espectante, assistindo ao desdobrar da concepção, que a maravilha.
Volve ao seu homúnculo: retoca-lhe uma pálpebra; aviva um ritus expressivo na arqueadura do lábio; sombreia-lhe um pouco mais o rosto, cavando-o; ajeita-lhe melhor a cabeça; arqueia-lhe os braços; repuxa e retifica-lhe as vestes…
Novo recuo, compassado, lento, remirando-o, para apanhar de um lance, numa vista de conjunto, a impressão exata, a síntese de todas aquelas linhas; a renovar a faina com uma pertinácia e uma tortura de artista incontentável. Novos retoques, mais delicados, mais cuidadosos, mais sérios: um tenuíssimo esbatido de sombra, um traço quase imperceptível na boca refegada, uma torção insignificante no pescoço engravatado de trapos…
E o mostro, lento e lento, num transfigurar-se insensível, vai-se tornando em homem. Pelo menos a ilusão é empolgante…
Repentinamente o bronco estatuário tem um gesto mais comovedor do que o Parla ansiosíssimo, de Miguel Ângelo; arranca o seu próprio sombreiro; atira-o à cabeça de Judas; e os filhinhos todos recuam, num grito, vendo retratar-se na figura desengonçada e sinistra o vulto do seu próprio pai.
É um doloroso triunfo. O sertanejo esculpiu o maldito à sua imagem. Vinga-se de si mesmo: pune-se afinal, da ambição maldita que o levou àquela terra; e defronta-se da fraqueza moral que lhe parte os ímpetos da rebeldia recalcando-o cada vez mais do plano inferior da vida decaída onde a credulidade infantil o jungiu, escravo, à gleba empantanada dos traficantes, que o iludiram.
Isto, porém, não lhe satisfaz. A imagem material da sua desdita não deve permanecer inútil num exíguo terreiro de barraca, afogada na espessura impenetrável, que furta o quadro de suas mágoas, perpetuamente anônimas, aos próprios olhos de Deus. O rio que lhe passa à porta é uma estrada para toda a terra. Que a terra toda contempla o seu infortúnio, o seu exaspero cruciante, a sua desvalia, o seu aniquilamento iníquo, esteriorizados, golpeantemente, e propalados por um estranho e mudo pregoeiro…
Em baixo, a rede construída, desde a véspera, vê-se uma jangada de quatro paus boiantes, rijamente travejados. Aguarda o viajante macabro. Condu-lo, prestes, para lá, arrastando-o em descida, pelo viés dos barrancos avergoados de enxurros.
A breve tracho a figura demoníaca apruma-se, especada, à popa da embarcação ligeira.
Faz-lhe os últimos reparos: arranja-lhe ainda uma vez as vestes; arruma-lhes às costas um saco cheio de ciscalho e pedras; mete-lhe à cintura alguma inútil pistola enferrujada, sem fechos, ou um caxenrenguengue gasto; e fazendo-lhes curiosas recomendações, ou dando-lhe os mais singulares conselhos, impele, ao cabo, a jangada fantástica para o fio da corrente.
E judas feito Ahsverus vai avançando vagarosamente para o meio do rio. Então os vizinhos mais próximos, que se adensam, curiosos, no alto das barrancas, intervêm ruidosamente, saudando com repetidas descargas de rifles, aquele botafora. As balas chofram a superfície líquida, erriçando-a; cravam-se na embarcação, lascando-a; atingem o tripulante espantoso; trespassam-no. Ele vacila um momento no seu pedestal flutuante, fustigado a tiros, indeciso, como a esmar um rumo, durante alguns minutos, até se reaviar no sentido geral da correnteza. E a figura desgraciosa, trágica, arrepiadoramente burlesca, com os seus gestos desmanchados, de demônio e truão, desafiando maldições e risadas, lá se vai na lúgubre viagem sem destino e sem fim, a descer, a descer sempre, desequilibradamente, aos rodopios, tonteando em todas as voltas, à mercê das correntezas, “bubuia” sobre as grandes águas.
Não para mais. A medida que avança, o espantalho errante vai espalhando em roda a desolação e o terror; as aves, retranzidas de medo, acolhem-se, mudas, ao recesso das frondes; os pesados anfíbios mergulham, cautos, nas profunduras, espavoridos por aquela sombra que ao cair das tardes e ao subir das manhãs se desata estirando-se, lutuosamente, pela superfície do rio; os homens correm às armas e numa fúria recortada de espantos, fazendo o “pelo sinal” e apertando os gatilhos, alvejam-no desapiedadamente.
Não defronta a mais pobre barraca sem receber uma descarga rolante e um apedrejamento.
As balas esfuziam-lhe em torno; varam-no; as águas, zimbradas pelas pedras, encrespam-se em círculos ondeantes; a jangada balança; e, acompanhando-lhe os movimentos, agitam-se-lhe os braços e ele parece agradecer em nanhestras mesuras as manifestações rancorosas em que tempesteiam tiros, e gritos, sarcasmos pungentes e esconjuros e sobretudo maldições que revivem, na palavra descansada dos matutos, este eco de um anátema vibrado há vinte séculos.
– Caminha, desgraçado!
Caminha. Não pára. Afasta-se no volver das águas. Livra-se dos perseguidores. Desliza, em silêncio, por um estirão retilíneo e longo; contorneia a arqueadura suavíssima de uma praia deserta. De súbito, no vencer uma volta, outra habitação; mulheres e crianças, que ele surpreende à beira rio, a subirem, desabaladamente, pela barranca acima, desandando em prantos e clamor. E logo depois, do alto, o espingardeamento, as pedradas, os convícios, os remoques.
Dois ou três minutos de alaridos e tumulto, até que o judeu errante se forre ao alcance máximo da trajetória dos rifles, descendo…
E vai descendo, descendo… Por fim não segue mais isolado. Aliam-se-lhe na estrada dolorosa outros sócios do infortúnio; outros aleijões apavorantes sobre as mesmas jangadas diminutas entregues ao acaso das correntes, surgindo de todos os lados, vários no aspecto e nos gestos; ora muito rijos, amarrados aos postes que os sustentam, ora em desengonços, desequilibrando-se aos menores balanços, atrapalhadamente, como ébrios; ou fatídicos, braços alçados, ameaçadores, amaldiçoando; outros humílissimos, acurvados num acabrunhamento profundo; e por vezes, mais deploráveis, os que se diviam à ponta de uma corda amarrada no extremo do mastro esguio e recurvo, a balouçarem, enforcados…
Passam todos aos pares, ou em filas, descendo, descendo vagarosamente…
Às vezes o rio alarga-se num imenso círculo; remansa-se; a sua corrente torce-se e vai em giros muito lentos perlogando as margens, traçando a espiral amplíssima de um redemoinho imperceptível e traiçoeiro. Os fantasmas vagabundos penetram nestes amplos recintos de águas mortas, rebalsadas; e estacam por momentos. Ajuntam-se. Rodeiam-se em lentas e silenciosas revistas. Misturam-se. Cruzam então pela primeira vez os olhares imóveis e falsos de seus olhos fingidos; e baralham-se-lhes numa agitação revolta os gestos paralisados e as estátuas rígidas. Há a ilusão de um estupendo tumulto sem ruídos e de um estranho conliábulo, agitadíssimo, travando-se em segredos, num abafamento de vozes inaudíveis.
Depois, a pouco e pouco, debandam. Afastam-se; dispersam-se. E acompanhando a correnteza, que se retifica na última espiral dos remansos – lá se vão, em filas, um a um, vagarosamente, processionalmente, rio abaixo, descendo…
Fantástico post! Dizem que Almodóvar é um cineasta que entende as mulheres. Não quero contestá-lo, uma vez que eu próprio não as entendo, mas acredito que Bergman vai muito além: ele realmente AMA as mulheres, incluindo suas idiossincrasias. E eu também, e é por isso que gosto tanto de Bergman (e provavelmente é por isso que não gosto nada de Almodóvar). Mas, Milton, só senti falta de uma atriz: a maravilhosa Maj-Britt Nilsson, talvez a primeira musa constante do cineasta, presente nos seus melhores filmes da primeira fase. Uma foto dela, acho que em ‘Juventude’: http://3.bp.blogspot.com/-XzmJVqDiQdI/Thbn1wLk3XI/AAAAAAAATT4/wYxyt0ChCKw/s1600/PDVD_047.JPG