Às vezes, Erico Verissimo (1905-1975) aparece com um livro novo. Dia desses, vi o pequeno volume Do Diário de Sílvia, um lançamento relativamente recente dos fantasmas do escritor. Fiquei feliz, pois sabia tratar-se de um dos trechos que mais gostei da trilogia O Tempo e o Vento, mais exatamente do terceiro volume da terceira parte do raramente lido O Arquipélago. Explico: hoje, O Tempo e o Vento é vendido em sete volumes: dois de O Continente, dois de O Retrato e três de O Arquipélago. O diário de Sílvia está lá no final, no terceiro volume d`O Arquipélago. Em 1974, a grande professora de literatura e português Sara, a Sarinha do Colégio Júlio de Castilhos, fez com que lêssemos toda a trilogia. Eu tinha 16 para 17 anos e acabei me apaixonando perdidamente pela personagem Sílvia, com a qual fantasiava e convivia diariamente e que me aparecia com o rosto de Julie Christie jovem…
Para quem não leu o imenso romance, explico que há nele um jogo de ir e vir no tempo entre os anos de 1745 e 1945. A cada capítulo, Erico nos leva a um período diferente e vamos entendendo a estrutura e a história de família Terra Cambará. A Editora Globo foi a primeira a dar-se conta de que os capítulos que formam a história de Ana Terra poderiam ser juntados e arrancados de O Tempo e o Vento — mais exatamente do primeiro volume da trilogia, O Continente — para tornar-se uma novelinha. O mesmo foi feito depois com a narrativa dos feitos do Capitão Rodrigo Cambará, que transformou-se em Um Certo Capitão Rodrigo. Acho que isto foi feito ainda em vida de Erico e, presumivelmente, com sua autorização. Agora, a Cia. das Letras inteligentemente extrai outro trecho do livro e transforma-o num pequeno volume de menos de 100 páginas.
Não resisti e comprei o livro. Sou dos poucos que considera a terceira parte — O Arquipélago — a melhor das três. Esta avaliação não é nada literária, é baseada simplesmente no fato de que Sílvia está lá. Buscava-a em todas as mulheres. Não era uma fixação baseada em erotismo, era algo mais ligado à afinidade, a uma convivência agradável. Ontem, quando comecei a reler o Diário, ia atrás do que sobrara do Milton adolescente e tentava descobrir se ele não era um idiota completo. Surpreendi-me com três coisas: a primeira é de que ela ainda é fascinante para mim; a segunda foi o alto número de referências políticas que Sílvia faz em seu Diário, escrito entre os anos de 1941 e 1943; a terceira é o grau de franqueza (quase crueza) que ela utiliza para caracterizar o fracasso de seu casamento e o amor irrealizado pelo cunhado Floriano.
Descobri então que minha memória dourou a musa, deixou-a um pouco mais etérea, enquanto ela, aos 25 anos, agora pulsando frente a meus olhos de cinquenta e tantos, trata de tocar modernamente sua realidade na imaginária Santa Fé. Voltei a sonhar um pouco, lembrei bastante dos anos jovens de colegial e, ontem, para lembrar os velhos tempos, fantasiei beber uma champanhe com ela na calçada da Av. João Pessoa, tal como ela (Julie Christie) fez com Truffaut.
Rapaz, e com isso você cita mais uma obra que está na minha lista de “livros que um dia lerei quando estiver passando férias n’alguma ilha paradisíaca”. Do Érico, vergonhosamente, só li até hoje o belo “Olhai os Lírios do Campo”.
Ah! que lindo texto!
Descobri outra coincidência, então: tb li a trilogia inteirinha aos 17 anos! E amei. Não lembro do fascinio especial por nenhum personagem (a não ser aquela dos olhos de teiniaguá, o nome não lembro. Já devia ser meu lado bruxa!). Um ano antes portanto de outra aventura em que coincidimos a idade na estréia, segundo descobri lendo-te noutros blogs…
bj, f
Concordo com você sobre EV e adorei o texto do Idelber sobre o livro de Tezza, justíssimo, prêmios todos merecidos.
Agora um reparito: não sou psicóloga não, viu meu bichinho? Sou psicanalista, que nem a Stella tua amiga.
Beijins cá do glorioso nordeste dos verdes mares.
Milton, quando eu fiz vestibular, em 1999, O Continente era leitura obrigatória. No entanto, gostei muito do que li e quando percebi, já tinha lido toda a trilogia. Acredito que a minha admiração por “O Tempo e O Vento” ocorreu porque o Erico conseguiu ser regional sem ser bairrista e/ou xenófobo, ao contrário do atual MTG e de grande parte da imprensa da província. Também fiquei encantado com a Silvia, aos 17 anos procurei-a entre as minha colegas e amigas, mas não tive sorte nessa busca, rsrsrs.
o Tempo e o Vento é meu livro – ou melhor, obra – favorito.
Floriano era o alter-ego do Luis Fernando Verissimo – um menino timido, de pouco falar, intelectual e de dificil relação com o pai Érico(Rodrigo Terra Cambará)???
uma personagem interessantissima tbem é Luzia, a Teiniaguá.
A magia do grande escritor está em tecer histórias e personagens com que nos identificamos. Não falo aqui da ‘identificação’ espelhada, que esta não leva a nada, mas de uma identificação inconsciente, da qual não nos damos conta, e que se ancora em sutilíssimos detalhes, muito mais do que em explícitos caracteres. Que vc tenha se ‘apaixonado’ já aos 15 anos e ainda queira tomar uma champagne com sua musa, isso atesta sua juventude aos cinquenta. Bom prognóstico.
Então!!!
Descobri Érico Veríssimo, mais ou menos com 17 ou 18 não lembro bem, mas sei que sou apaixonada pela forma como escreve.O Tempo e O Vento é minha paixao.Já li e reli milhões de vezes.Gosto tanto que mu projeto mográfico vai ser sobre o livro.
olá Milton
li o seu texto e achei bem interessante, simplesmente porque
estou analisando O Tempo e o Vento no meu projeto de mestrado, e mais
especificamente, a parte intimista que é o Diario de Sílvia
gostaria de trocar ideias com vc se possível sobre essa maravilhosa obra ….abraços
Olá, Milton!
embora já tenhamos cruzado nossos caminhos diversas vezes aqui no Bom Fim, nós não nos conhecemos. Como nossa idade é próxima, suponho que também fomos colegas na FABICO, embora eu não me lembre disso. Sou um leitor assíduo de alguns bons blogs, dentre os quais o teu, mas não sou muito chegado em postar comentários pois a única coisa que eu entendo um pouco é de literatura e teus gostos são bem parecidos com os meus o que tornaria meio redundante aquilo que escreveria. Além gostar de literatura, também sou colorado doente! Mas agora resolvi te escrever por um importante motivo! Aceito cruzar contigo eventualmente, aceito que possamos ter estudado juntos e que nossos gostos literários são parecidos. Até me agrada que tu também seja colorado, pois a solidariedade num momento como o atual do nosso time é um bom consolo. MAS NÃO ACEITO DE MODO NENHUM DIVIDIR A JULIE CHRISTIE COM NINGUÉM!
Olha, Artur. Ela sempre foi minha desde a adolescência. Eu realmente duvido que tu tenhas fantasiado mais com ela do que eu. Deste modo, peço que tu recues para a posição de segunda escolha. Ela é exclusivamente (ou mais) minha. Ponto. 🙂