Neste texto, escrevi sobre a necessidade de roubar livros em determinadas situações e idades. O grande escritor chileno Roberto Bolaño — 2666, Os Detetives Selvagens, Noturno do Chile, etc. — fala muito a respeito disso em seus livros. E fala sempre divertidamente, de uma forma muito viva e, bem, experiente. Sei que meus amigos livreiros detestam esse assunto, mas outros, não livreiros, insistem nele. Um deles me enviou o vídeo abaixo. Para mim, afora o tema, é um enorme prazer ver Bolaño (1953-2003) falando alegremente, ainda com boa saúde.
Eu fui um voraz ladrão de livros. Sinto vergonha de dizer isso?…hummm, não! Meu senso moral fica ressoando, minha consciência crítica da alteridade sobre o desfalque nas contas de pessoas que vivem desse comércio pesa, mas eu não sinto vergonha. Apesar de voraz, eu era seletivo: roubava apenas o que eu realmente não conseguia comprar, o que eu não conseguia ler pela força das economias nos lanches escolares. Mesmo naquela época de penúria eu tentava minorar meu erro: lembro de ter doado 2 livros caros que eu tinha para suplantar o prejuízo; uma vez (eu juro!) deixei toda a coleção de bolso preta que eu tinha do Sherlock Holmes em cima do balcão, sem que me vissem, do sebo em que tantas vezes eu vinha enfiando sorrateiramente livros em minha mochila. Hoje eu compro todos os livros que eu quero, e jamais tornaria a repetir esse crime, o que demonstra que eu nunca o fazia por prazer, mas por necessidade. Mas sempre vai haver uma nobreza neste ato de roubar livros, por mais que apitem os sistemas de condenação no cérebro das pessoas. Só gente espiritualmente sedenta rouba livros, e os espiritualmente sedentos são as únicas pessoas de motivação pura que existem.