Thomaz Santos (*)
Sempre fui fã de jogadores elegantes, daqueles que pareciam dominar uma bola sem esforço e seguiam a jogada com olhos abertos e cabeça erguida. Caras como Dennis Bergkamp e Juan Román Riquelme, por exemplo, sempre me encantaram, pelo ar de simplicidade que davam a uma jogada que eu jamais conseguiria realizar ao vivo (talvez nem no videogame). Em suma, sempre admirei os jogadores elegantes por ser eu próprio uma mistura de um troll e de um visigodo com a bola nos pés, dono de um jogo tão elegante quanto uma briga de rua entre bêbados.
Mas, de todos os jogadores considerados elegantes no futebol (e são muitos), nenhum me encantou tanto quanto Zinedine Yazid Zidane, a quem um dia nunca chamarei pessoalmente de Zizou, embora quisesse. Depois de vê-lo destroçar a Seleção Brasileira na final da Copa de 1998 juntamente com seus companheiros franceses, passei a acompanhar mais de perto a carreira dele, sobretudo a partir da sua ida para o Real Madrid. Embora nutrisse uma paixão já um tanto antiga pelo FC Barcelona (desde meados dos anos 1990, graças a Romário e Ronaldo, entre outros, e a minha mãe, que frequentemente viajava para um congresso internacional de hepatologia em Barcelona e me trazia lembranças blaugranas), passei a torcer pelo time merengue, mas apenas e tão-somente quando Zizou estivesse em campo.
Com o tempo, obter uma camisa do craque francês tornou-se um desejo, quase uma obsessão. Percebendo isso, minha (então) namorada (e hoje esposa), viu que eu havia me encantado com uma camisa branca do Real Madrid que havia encontrado em uma loja de material esportivo de Porto Alegre, pois ela estava estampada com o nome “Zidane” sobre o número 5 às suas costas. Era a camisa da temporada 2005-2006, que seria a última dele como jogador profissional. Ou seja, uma camisa já histórica.
Pois bem, no meu aniversário de 25 anos, fiquei feliz ao ver que o pacote era da loja em questão e que seu conteúdo era uma camisa. Ao abrir o pacote, esbocei um enorme sorriso, que ficou só no esboço quando vi que no verso da camisa não constava qualquer estampa. Ante a chocante descoberta, minha companheira disse que havia algo errado, pois ela mesma tinha pego a camisa do varal e levado para o caixa. Quando fomos à loja para trocar o item, descobrimos que o vendedor havia passado a camisa errada a ela, inclusive mais barata que a originalmente escolhida (na hora a atendente do caixa deve ter dado a entender a minha amada que o preço menor que o original seria devido a um desconto pelo pagamento à vista), e que a minha tão sonhada camiseta do Zidane já sido vendida.
Vendo minha tristeza quase infantil, com beiço e tudo, minha querida companheira perguntou se não havia outra camisa com nome e número de jogador dos Merengues para me dar. Não tinha a 7, do Raúl, capitão e ídolo maior daquela geração dos Galácticos? Talvez a 10, que já fora do Figo mas que àquela altura devia ser do Robinho? Quem sabe a 9, do Ronaldo, que também jogaria sua última temporada em Madri? Nenhuma dessas: a única que a loja tinha disponível era a de David Beckham, com o anódino número 23 às costas. Pensei que podia ser pior, podia ser a do Helguera ou, ainda mais triste, a do Gravesen.
Enfim, admirado que estava com o esforço da minha digníssima, aceitei a camisa do craque (?) inglês, que tenho até hoje, embora o branco original do seu tecido esteja hoje mais perto de um cinza, em parte devido à inadvertida e frequente decisão de lavar roupas brancas e pretas ao mesmo tempo na máquina. Sim, sou um péssimo dono de casa, quase tão ruim quanto sou jogador de futebol. Talvez até pior, devo ser algo como um Gravesen do lar.
Assim, obtive minha camisa que era para ser do Zidane mas acabou sendo do Beckham. E será com essa camisa que torcerei para o time hoje treinado por um dos meus maiores ídolos esportivos na final do Mundial de Clubes da FIFA contra o time que mais detesto na face da Terra, treinado por alguém que suporto menos ainda. Sou colorado e secador, sem vergonha nem pudor.
As estatísticas esportivas e demais dados jornalísticos frios podem desmentir o que vou escrever, mas é possível que Zizou seja o primeiro homem na história do futebol a conquistar títulos nacionais, continentais e mundiais como jogador e técnico pela mesma equipe. Só espero que ele não permita que o Renato seja o próximo dessa lista. Que ela seja, portanto, apenas o vice.
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(*) Thomaz Santos é bacharel em Direito (UFRGS), mestre em Relações Internacionais (UnB), doutor em Direito (UFSM) e professor adjunto do curso de Relações Internacionais da UFSM.