Dias antes do falecimento de Aldyr Garcia Schlee (1934-2018), em novembro do ano passado, recebemos na Bamboletras seu último livro, O Outro Lado – Noveleta Pueblera (Ardotempo, 152 páginas). A leitura do livro, realmente muito bom, só pode nos deixar ainda mais tristes pela perda. A primeira coisa que chama a atenção é a linguagem fronteiriça, algo que talvez só se mantenha naquela região. Costumava ouvir muitas daquelas palavras e expressões da boca de meus pais, parentes e amigos. E isso só até os anos 60 ou 70, porque depois parece que fomos invadidos por um dicionário urbano, feio e descolorido. A linguagem utilizada por Schlee é linda, muito influenciada por uruguaios e argentinos.
Schlee foi escritor, jornalista, tradutor, desenhista e professor universitário. Fundou a Faculdade de Jornalismo da Universidade Católica de Pelotas / UCPel e de lá foi expulso durante o golpe civil militar de 1964. Sua cidade, Jaguarão, é ligada ao Uruguai pela bonita ponte que está na capa de O Outro Lado.
O Outro Lado conta a história de Martita e José Jacinto, personagens humildes em uma paisagem deserta. José Jacinto é um andariego sem paradeiro que gosta mais de pueblos do que de cidades e que vive circulando entre as coxilhas. Martita é a mulher que o espera. É daqueles livros em que delicadas nesgas poéticas giram em torno de um fato muito forte que… não contarei. É um livro é comovente sem ser piegas — ou uma história nada simples de gente humilde. É diferente daqueles livros amalucados de Schlee – também ótimos — sobre Gardel, Jaguarão e Melo, como, por exemplo, O Dia em que o Papa foi a Melo, livro de contos que deu origem ao filme O Banheiro do Papa.
Schlee tem extremo senso de estilo e bom gosto literário. Ele amava o Brasil de Pelotas e o Inter de Porto Alegre. Nossa, foi uma pessoa perfeita, daquelas que estavam lá no topo da evolução.
Recomendo muito.