Especialistas pedem regulamentação após o mais recente fracasso em restauração de arte na Espanha

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Pintura da Imaculada Conceição de Murillo foi supostamente limpa por restaurador de móveis

No The Guardian
Traduzido por Milton Ribeiro

O trabalho original de Bartolomé Esteban Murillo (à esquerda) e as duas tentativas de restaurá-lo. Foto: Cedida pelo colecionador / Europa Press 2020

Especialistas em conservação na Espanha pediram maior rigor nas leis que controlam os trabalhos de restauração depois que uma cópia de uma pintura famosa do artista barroco Bartolomé Esteban Murillo se tornou a mais recente da longa linha de obras de arte que sofreram reparos ruinosos.

Um colecionador de arte particular em Valência teria sido cobrado em € 1.200 por um restaurador de móveis para limpar a imagem da Imaculada Conceição. No entanto, o trabalho não correu conforme o planejado e o rosto da Virgem Maria ficou irreconhecível, apesar de duas tentativas de restaurá-lo ao seu estado original.

O caso resultou inevitavelmente em comparações com o infame incidente do Macaco Cristo, de oito anos atrás, quando uma tentativa de um paroquiano devoto de restaurar uma pintura do Cristo açoitado, que estava na parede de uma igreja nos arredores da cidade espanhola de Borja, foi alvo de manchetes em todo o mundo.

Paralelos também foram traçados com a restauração fracassada de uma estátua policromada de São Jorge e dos dragão do século XVI no norte da Espanha, que deixou o santo guerreiro parecido com Tintin ou uma figura da Playmobil.

Fernando Carrera, professor da Escola Galega de Conservação e Restauração do Patrimônio Cultural, disse que esses casos destacam a necessidade de que o trabalho seja realizado apenas por restauradores adequadamente treinados.

“Eu não acho que esse  sujeito ou essas pessoas possam ser chamadas de restauradoras”, disse Carrera ao Guardian. “Sejamos honestos: são pessoas que estragam tudo. Eles destroem arte”.

Carrera, ex-presidente da Associação de Conservação e Restauradores Profissionais da Espanha (Acre), disse que, atualmente, a lei permite que pessoas se envolvam em projetos de restauração mesmo que não possuam as habilidades necessárias. “Você pode imaginar alguém sem formação autorizado a fazer cirurgias? Ou alguém autorizado a vender quaisquer remédios sem uma licença médica? Ou alguém que não é arquiteto ou engenheiro autorizado a construir um edifício? Embora os restauradores sejam “muito menos importantes que os médicos”, acrescentou, o setor precisa ser estritamente regulamentado para o bem da história cultural da Espanha. “Vemos esse tipo de coisa uma e outra vez e, no entanto, continua acontecendo”.

“Paradoxalmente, mostra o quão importantes são os restauradores profissionais. Precisamos investir em nossa herança, mas mesmo antes de falarmos sobre dinheiro, precisamos garantir que as pessoas que empreendem esse tipo de trabalho tenham sido treinadas. ”

Maria Borja, uma das vice-presidentes do Acre, também disse que incidentes como este de Murillo eram “infelizmente muito mais comuns do que se imagina”. Na entrevista à Europa Press, onde informou “reparo” de Murillo, ela afirmou: “Nós só descobrimos que uma obra foi destruída quando as pessoas denunciam à imprensa ou nas mídias sociais, mas há inúmeras outras situações das quais só ficamos sabendo anos depois ou nunca, pois as coisas desaparecem.”.

As intervenções não profissionais, acrescentou Borja, “significam que as obras de arte sofrem e os danos podem ser irreversíveis”.

Carrera disse que a Espanha tem uma enorme quantidade de patrimônio cultural e histórico em razão da riqueza cultural de todos os diferentes grupos étnicos que passaram pelo país ao longo dos séculos, deixando para trás suas marcas e monumentos.

Outra parte do problema, acrescentou, é que “alguns políticos simplesmente não dão a mínima para o patrimônio”, o que significa que a Espanha não tem recursos financeiros para salvaguardar todos os tesouros de seu passado. “Precisamos focar a atenção da sociedade nisso, para que escolhamos representantes que coloquem a herança cultural em suas agendas”, disse ele.

“Não precisa estar no topo das prioridades, porque obviamente não é como cuidados de saúde ou emprego — mas nossa história é também importante.”

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