Marino Boeira é o cara. Bem humorado, cultura vastíssima, professor universitário, ele é um elegante socialista que, já não acreditando na doce ilusão de uma sociedade sem classes, concordou em viver numa sociedade sem classe, mantendo a sua. Seu apelido é O Mestre, mas ele não é aquele que anda de régua em punho ameaçando e corrigindo tudo e todos, é antes o sujeito irônico e piadista, que nos ensina com graça.
O que é complicado de explicar é sua produção literária. Mesmo sendo cinéfilo e gourmet, mesmo sempre se mantendo atualizado com a bagaceirice política de nosso país, ele escreve muitos textos, um melhor do que o outro, publicando-os em vários veículos. É uma maravilha ler sua prosa limpa, ateia e radical, nada próxima de lacrações e cancelamentos e à léguas das trevas, das milícias e outros endireitamentos.
Curiosa fusão de despretensão e inteligência, a série “Aconteceu em” não é apenas um roteiro de viagem, mas pequenas narrações de alguém informado e politizado sobre as viagens que fez. Ficamos sabendo o que atraiu o Mestre em Havana, Bratislava, Cochabamba, Corumbá, Óbidos ou Paris. É interessante para quem conhece as cidades — quem não gosta de retornar às cidades que conheceu? — e para quem pretende visitá-las.
Qualquer lugar do mundo tem uma história para contar – e traços culturais específicos. Marino faz um peculiar apanhado do que viu em cada cidade. Não é o viajante festivo, praieiro ou consumista — e esqueça o ecoturismo, por favor –, mas pode-se dizer que ele não frequenta os locais habituais do circuito Elizabeth Arden.
Boa leitura!