Hoje é o data do 117º aniversário da morte de Anton Tchékhov. Ele é considerado um dos maiores escritores de contos de todos os tempos, e suas peças, hoje clássicas, estabeleceram as bases para o realismo do teatro contemporâneo. Além disso, ele foi médico praticante durante a maior parte de sua carreira de escritor. O que esse cara não poderia fazer? Mas até Tchékhov ficava constrangido.
Em 1887, ele — até então basicamente um satírico e contista — foi contratado por um gerente de teatro para escrever sua peça de estreia, Ivanov. Escreveu Ivanov em apenas duas semanas e a peça foi imediatamente produzida. Tchékhov ficou puto. Em uma carta para seu irmão Alexandr, logo após a primeira apresentação, Tchékhov criticou os atores como “irreconhecíveis”, “bêbados como sapateiros”, transformando seu texto em algo “tedioso e nojento”. No entanto, o público adorou a peça, que foi aplaudida e elogiadíssima. Tchékhov resumiu seus sentimentos conflitantes sucintamente: “No geral, me sinto cansado e irritado. Foi repugnante, embora a peça tivesse sido um sucesso”.
Aqui está a carta completa e incrível:
Bem, a primeira apresentação acabou. Vou lhe contar tudo em detalhes. Para começar, Korsh me prometeu dez ensaios, mas deu apenas quatro, dos quais apenas dois poderiam ser chamados de ensaios, pois os outros dois eram torneios em que messieurs les artistes se exercitavam em brigas e discordâncias. Davydov e Glama eram os únicos dois que conheciam seus papéis, os outros improvisavam.
Ato um. – Estou atrás do palco em uma pequena caixa que parece uma cela de prisão. Minha família está nervosa. Contrariamente às minhas expectativas, estou calmo. Os atores estão nervosos. Se benzem. A cortina sobe… O ator principal esquece suas falas e diz qualquer coisa. Kiselevsky, em quem eu depositava grande esperança, não proferiu uma única frase corretamente — literalmente nenhuma. Ele disse coisas de sua própria larva… Apesar disso e dos erros do diretor de palco, o primeiro ato foi um grande sucesso.
Ato dois. – Muitas gente no palco. Eles não conhecem suas partes, cometem erros, falam bobagens. Cada palavra me corta como uma faca Mas — ó Musa! — esse ato também foi um sucesso. Houve chamadas para todos os atores e fui chamado duas vezes ao palco antes de fechar a cortina. Parabéns e sucesso.
Terceiro ato. – A atuação não é ruim. Sucesso enorme. Tive de me aproximar da cortina três vezes e, ao fazê-lo, Davydov apertou minha mão e Glama, como Manilov, apertou minha outra mão em seu coração. O triunfo do talento e da virtude…
Quarto ato, cena um. – A plateia, desacostumada a deixar seus lugares e ir ao bar entre duas cenas, reclama. A cortina sobe. Tudo bem: avista-se a mesa da ceia (de casamento). A banda toca floreios. Os padrinhos saem: eles estão bêbados, então você vê que eles acham que devem se comportar como palhaços e dar cambalhotas. A brincadeira e a atmosfera me reduzem ao desespero. Sai então Kiselevsky: é uma passagem poética, comovente, mas o meu Kiselevsky não conhece o seu papel, está bêbado e um breve diálogo poético se transforma em algo tedioso e nojento: o público fica perplexo. No final da peça, o herói morre porque não consegue superar o insulto que recebeu. A audiência não entende essa morte. Aplausos para os atores e para mim. Ouço sons de assobios, abafados pelas batidas de palmas.
No geral, sinto-me cansado e aborrecido. Foi repugnante, embora a peça tivesse sido um sucesso considerável…
Os frequentadores do teatro dizem que nunca tinham visto tal efervescência no teatro, tantos aplausos. E nunca o autor fora chamado para ser aplaudido depois do segundo ato.
Portanto, dramaturgos, se vocês já se irritaram com o resultado de seu trabalho…