Este é um livro que merece atenção. É um livro sobre uma professora do ensino médio da rede pública de Porto Alegre. Ela trabalha como uma condenada para poder fazer frente a seus modestos gastos e ser muitas vezes atacada por colegas e alunos. Há também seu passado: ela não suporta que estranhos venham colocar a mão no seu ombro, tal intimidade faz-lhe lembrar do tio asqueroso. Às vezes do ex-marido.
Os alunos são difíceis de controlar, apesar das eventuais manifestações de carinho. Não é uma vida fácil, as tentativas de se distrair com o vinho, com a amiga, com a bicicleta, sempre com ajuda de antidepressivos e de terapia não dão muito certo. Tu tens que ter tua vida… É algo assim que dizem para a professora que trabalha 60 horas semanais.
Este é um livro de ódio muito original. Não fala na nobreza da profissão de educador, não fala na formação da juventude do país, fala é do desespero de uma professora de artes para suportar a vida e fazer seu trabalho como pode. Eu, Milton, trabalho atrás de um balcão ouvindo muitas pessoas, muitas delas professoras, e sei bem que a vida desta professora está longe de ser ficcional. Há um cansaço monumental que antidepressivo nenhum vence. Ganham pouco, trabalham muito, e silenciar adoece.
A história de Astúria tem pontos em comum com o filme de John Waters “Mamãe é de Morte”, mas sem seu registro trash-cômico. A relação da professora com as pessoas de seu trabalho está muito mais para Thomas Bernhard, mas sem a minúcia descritiva do austríaco. Talvez ela nem tenha tempo para odiar tão minuciosamente. Já a repetida sensação de estar num beco sem saída se aproxima de cenas “O Ateneu”, de Raul Pompeia.
E a professora perde o réu primário de uma forma que eu jamais contaria aqui. O livro está catalogado como romance psicológico / suspense. Está correto.
Por fim, recomendo este A professora que perdeu o réu primário que será lançado aqui na Livraria Bamboletras nesta sexta-feira (29), entre 17 e 20h.
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