Lingerie

Copiado do blog Championship Chronicles.

– Querido?

— Hum?

— Posso falar com você?

— Claro.

— Olha para mim?

— Pronto. Desculpe… Ei, nós vamos sair?

— Não, por quê?

— Então porque você está trocando de roupa?

— Não estou me trocando.

— Então porque você está só de calcinha e sutiã?

— Porque eu quero falar com você.

— Mas você precisava estar sem roupa?

— Sim.

— Você não está doente, está?

— Como assim?

— Você aparece aqui quase sem roupa e dizendo que precisa conversar. É sinal que eu vou ter que apalpar algo. Não é câncer de mama, né? Você sentiu algum caroço?

— Não é nada disso!

— Ok, mas você precisa concorda comigo. Eu apareço na cozinha vestindo cuecas e dizendo que preciso conversar com você. Aposto que você ia pensar na mesma hora que era sobre aquele meu joelho bichado.

— Não. Eu iria achar sexy.

— Oi?

— Sim, eu acharia sexy. Você não me acha sexy com esse lingerie?

— Acho. Essa calcinha fica bem em você. Era isso?

— Não. Eu quero contar uma coisa.

— Diga.

— Eu bati o carro hoje.

— Pelo amor de Deus! Quando? Você está bem?

— Mas não foi nada grave… Só arranhou a porta lá na entrada do prédio.

— Quando foi isso? Você se machucou?

— Não, não. Eu estou bem, só me assustei um pouco.

— Mas quando foi isso?

— Foi agora, quando cheguei, faz uma meia hora.

— Mas não está doendo nada? Tem certeza? Quer ir ao hospital?

— Não, estou bem. Pode ficar tranquilo.

— Mas por que você não me avisou? Você entrou em casa, me deu oi, saiu e voltou de novo!

— Então, é porque eu fui até essa loja comprar a lingerie.

— Oi?

— Sim, esta que estou usando.

— Essa calcinha é nova?

— Sim.

— Espere. Deixe eu entender. Você bateu o carro, entrou em casa, e não falou nada. Saiu, foi comprar uma calcinha, voltou, vestiu e decidiu falar sobre o carro?

— Isso.

— Maristela, você está bem?

— Claro. Eu já disse, não machucou.

— Não, não é isso. Você não poderia ter entrado em casa e falado “arranhei a pintura do carro, mas estou indo ali comprar uma calcinha e já volto”?

— É que eu queria estar sexy para você.

— Por causa do carro?

— Sim.

— Mas não tem porque ficar bonita para isso!

— Eu queria.

— Você não bateu a cabeça quando bateu o carro? É normal ficar um pouco desorientada…

— Claro que não! Estou ótima!

— Mas por que você quis ficar sexy para me contar que a porta do carro está amassada?

— Ai, Alfredo… Vem cá para perto…

— Para de esfregar as mãos nos seios! O que você está fazendo?

— Você não gosta?

— Claro que gosto, mas você acabou de bater o carro! Não faz sentido. Bater o carro te excita?

— Claro que não!

— Porque você está estranha.

— Ai Alfredo… Estou apenas seduzindo você.

— Mas e o carro? Você não está nem aí?

— Não, e você?

— Não, eu fiquei aliviado por que você não se machucou. Mas fiquei aliviado, e não morrendo de tesão.

— Ai, Alfredo… Você é tão devagar…

— Tem certeza que isso não te excita? Eu vi um filme uma vez…

— Chega, Alfredo.

— É sério. As pessoas se excitavam com porrada de carros…

— Desisto.

— Você não é assim, é? Teve aquela vez que eu dei ré e enfiei o carro num poste e você não ficou assim. Se ralar a pintura deixou você acesa desse jeito, aquela vez deveria ter deixado você em ponto de bala. Foi uma baita pancada.

— Como você é grosso, Alfredo!

— Não, eu só não entendo a lógica da coisa. Você bate o carro e vem aqui de lingerie me contar. A gente vai comemorar?

— Ai, Alfredo, esquece!

— Não, eu quero saber. É como se fosse um aniversário de casamento? Esta é a nossa primeira porta amassada do casamento, então você coloca uma calcinha nova, vamos abrir uma champagne… É isso?

— Esquece!

— Não, senhora! Quero saber de onde você tirou essa ideia!

— Não. Vou para o quarto colocar uma calça.

— Primeiro, responde. De onde você tirou essa ideia?

— Eu vi na TV, ok?

— Quê?

— Vi uma propaganda que diz que a lingerie sexy ajudar a contar notícias ruins para o marido.

— Oi?

— É. É isso. Pronto, falei! E você cortou o clima!

— Sério, Maristela… Eu não fiquei bravo porque você bateu o carro, eu fiquei preocupado com você. O carro que se foda. Para de alisar a barriga e fazer biquinho!

— Esquece, Alfredo. Você é insensível demais!

— Não tem lógica! Quer dizer que se eu perder o emprego, tudo o que preciso fazer é entrar em casa, tirar a roupa e ficar usando uma cueca nova para te contar a novidade?

— Eu vou para o quarto!

— Isso. Eu vou descer para ver o carro e você vai colocar uma roupa.

— Pode apostar que eu vou! Você nunca mais vai me ver de lingerie!

— Para de gritar, Maristela. O que é isso? Essa nota aqui?

— Que nota?

— Maristela, você pagou oitenta paus nessa calcinha!

— Não é calcinha, é lingerie!

— Oitenta reais? Nisso aí?

— Sim! Porque eu queria que você não se magoasse com o carro!

— Eu não me magoei! Mas oitenta reais!? Com oitenta reais eu compro cuecas para uns dez anos! E ainda pego umas meias!

— Alfredo, você é um insensível mesmo.

— Não importa! Oitenta reais?

— Eu queria que você não ficasse bravo com o carro!

— Não estou bravo com o carro, mas sim com você pagar oitenta reais numa calcinha!

— Não é calcinha! É lingerie!

— Você que vai pagar a funilaria desse carro, Maristela!

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