Quando as pernas (todas) e os decotes (nem todos) desaparecem

Tom Jobim cantava as águas de março que fechariam nossos verões. Eu mentiria se as cantasse em Porto Alegre, pois março e abril foram quentes e parcos em chuvas. Foi uma seqüência de dias lindos, os tais dias lindos do mais puro azul que Drummond dizia acontecerem na segunda metade de abril.

São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração.

TOM JOBIM em Águas de Março – Grande autor, péssimo meteorologista.

Acontece em abril, nessa curva do mês que descamba para a segunda metade. Os boletins meteorológicos não se lembraram de anunciá-lo em linguagem especial. Nenhuma autoridade, munida de organismo publicitário, tirou partido do acontecimento. Discretos, silenciosos, chegaram os dias lindos. E aboliram, sem providências drásticas, o estatuto do calor.

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE em Os Dias Lindos – Grande autor, razoável meteorologista

Drummond tem razão, o estatuto do calor está abolido, mas no segundo dia de maio caiu o mundo em forma de chuva. Dirão vocês que não importa, que Drummond é um dos picos da evolução humana e que a culpa deve ser do aquecimento global. OK, sou simpático a qualquer argumentação que enalteça o itabirano, porém lamento dizer que minha contestação aos dias lindos vai além. Saúdo-os ao mesmo tempo que lamento as perdas.

Hoje fui ao centro da cidade. Acostumei-me a caminhar pelas ruas quentes vendo as pernas e decotes das gaúchas. Ficava feliz com a crescente e elegante ousadia daquelas que mostram sua boa forma, suas belas formas, seus bronzeados e seus seios remodelados ou originais. Também apreciava a classe das mulheres que exibiam o que tinham de melhor, escondendo sob panos coloridos o indesejável, o inevitável, o irremediável ou o inexorável. Sou um admirador das artes femininas. Só que hoje o panorama era outro. Os decotes estavam mais fechados, as pernas haviam quase sumido e o colorido das roupas tendiam à diluição. Viram? O dia lindo e seus dezoito graus matinais derrubaram a libido do caminhante.

Mas quem viverá seu qüinquagésimo inverno nesta cidade, sabe que este é um fenômeno sazonal e logo nós, os homens, estas criaturas tão visuais para com o outro sexo, iremos nos readaptar. Ficaremos excitados apenas com um belo rosto e pelo prenúncio de um tornozelo. Conheço alguns que enlouquecerão por um mero salto alto. Pior, há os que abraçarão suas mulheres e amigas apenas para sentirem o aroma do perfume que acompanhará o ar expulso de suas peles pelo abraço. Voltaremos a adivinhar as formas sob as roupas e teremos vontade de levar em nossos carros as mulheres encolhidas nas paradas de ônibus. (Tratar-se-á da mais desinteressada e solidária gentileza.)

Drummond esquece-se de dizer que os dias lindos são o prenúncio de uma época em que o espírito vencerá a observação, em que a cogitação precederá o fato, em que os cobertores serão os companheiros mais adequados a quaisquer primícias e que serão jogados longe apenas durante os clímax. Os dias lindos nos fazem lembrar que, daqui seis meses, haverá uma primavera onde as flores, os plátanos, os guapuruvus e as mulheres reapararecerão. Deslumbrantes.

Porém, o leitor atento que há dentro de mim bate em meu ombro a fim de chamar minha atenção. Diz ele que Drummond vivia no Rio de Janeiro, que lá as pernas e decotes nunca desaparecem, que este é um fenômeno gaúcho, subtropical e que não tenho razão em reclamar do poeta. Acabo esta crônica fazendo tamborilar os dedos da mão direita sobre a mesa. Um por um, repetidamente. É o movimento característico da contrariedade do vencido.

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Final: Inter 8 x 1 Juventude

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Bagdá

Pessoal, depois do vendaval, ficamos sem água e luz em casa (escrevo numa lan house).

A Zona Sul de Porto Alegre está assim há quase 22 horas.

O celular não pega – a antena deve estar desligada.

O telefone – só temos sem fio e sem luz não funciona.

Estamos incomunicáveis.

Merda.

Mas tomamos banho na casa da sogra.

(Talvez na próximas horas peçamos alimentos não perecíveis, sabe-se lá. Estejam atentos e não nos deixem sós.)

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Porque Hoje é Sábado, Scarlett Johansson

Esta parte de seu corpo certamente agrada ao Marconi e a mim, imagine se não!

Mas o rosto de Scarlett Johansson é dos mais belos que já passaram por minhas retinas tão fatigadas e curiosas.

Nascida em novembro de 1984, é certamente a mais famosa e interessante atriz com menos de 30 anos em atividade.

E é um espanto de mulher.

Scarlett é uma raridade que parece apreciar o bom cinema e já foi dirigida por…

… Sofia Coppola num belo filme, por Brian de Palma num equívoco, por Peter Webber em um …

… inesperado acerto, e parece ter virado figurinha comum em filmes de Woody Allen.

Passemos a palavra a Allen: “Ela tem tudo: é linda, sexy, inteligente, divertida, espirituosa …

… e boa para se trabalhar. Gosto de tudo nela. Se ela mantiver a cabeça no lugar nesse campo de trabalho maluco, o futuro será dela.”

Se o que Woody Allen diz é verdade: que é linda e sexy a gente está vendo, mas se ela ainda é …

… inteligente, divertida, espirituosa e boa para se trabalhar, eu não sei o que poderia haver de mais perfeito.

Em 2008, ela virá envenenando maridos em Lucrécia Bórgia e como Ana Bolena …

… junto de Natalie Portman (1981), lutando pelo amor de Henrique VIII. Querem me matar!

Entre as duas, ficaria com Scarlett, nem que fosse para dá-la a meu filho, um grande admirador da moça. Afinal, com 23 para 24 anos… Não sou o tio da Sukita. Mas aceitaria one night stand, claro.

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Ássia, de Ivan Turguêniev

Assia Ivan TurguenievComparar Dostoiévski e Tolstói sempre me pareceu coisa de amador. Os dois são tão diferentes que parecem trabalhar em faixa própria. Tolstói tem melhor texto, se o encararmos do ponto de vista clássico, e, de certa forma, é um escritor que aspira à imortalidade. Ele a obteve com folgas… Já Dostoiévski é mais escabelado e moderno, fazendo com que sua prosa dobre-se aos personagens. Eu, que não sou bobo, não faço escolhas e gosto de ambos. Porém, havia outros enormes escritores circulando pela Rússia czarista e havia um que trabalhava na faixa de Tolstói. Era Ivan Turguêniev. Escritor de grandes recursos, criou algumas novelas perfeitas e um romance idem: Pais e Filhos.

Tenho especial consideração pelas novelas, estas narrativas que ficam entre o conto e o romance, seja em tamanho, seja em alargamento de intenções. Grandes escritores se dedicaram ao gênero. Kafka escreveu A Metamorfose, A Colônia Penal e outras; Henry James tem obras-primas como A Volta do Parafuso, Os Amigos dos Amigos, A Vida Privada, O Altar dos Mortos, a insuperável A Fera na Selva, etc.; Isak Dinesen tem Os Sonhadores e outras; Heinrich von Kleist escreveu uma inesquecível: Michael Kolhaas; Tolstói tem seu trio de ferro: Sonata a Kreutzer , A Morte de Ivan Illich e A Felicidade Conjugal; Goethe tem Werther. Estes exemplos foram os primeiros a me ocorrer, há muitíssimos mais.

Voltemos a Turguêniev ou Turguenev, como queiram. Quando vi que a Cosac & Naify tinha lançado a novela Ássia, animei-me imediatamente – seria ela um outro O Primeiro Amor, seria ela outra grande novela de Turguêniev? Não, não é tão boa, mas estão lá todas as características que fizeram deste russo um escritor tão singular. Lá está a prosa impecável do russo e lá estão os aristocratas inúteis de sempre, porém o narrador de Ássia é, além de inútil, um covarde emasculado. Ássia é uma jovem que se apaixona por ele. Só que o narrador fica confuso no momento decisivo e deixa a moça pensar que ele não a ama.

Este tema é um clássico em várias literaturas. Inclusive Machado de Assis constrói um de seus melhores e mais importantes contos sobre o tema do momento decisivo – o Missa do Galo (que é muito melhor que Ássia, bem entendido). Só que Turguêniev não deseja apenas mostrar um desencontro fortuito entre dois amantes, mas uma “história moral de sua geração”. Talvez por isto tenha criado um narrador tão inerte e irritante. Esta aristocracia russa, cuja psicologia é tão bem descrita neste livro e em grande parte da obra de Tchékov, mereceu plenamente a revolução que a sepultou.

Não ignoro que na literatura russa do século XIX havia eslavófilos e europeístas. Eu passei intencionalmente por cima desta esta classificação, OK?

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