O leitor André Luiz Zambom resolveu me dar uma alegria: pediu que eu lesse a última crônica de Lya Luft na Veja. Eu sou um cara obediente e logo fui à banca comprar a coisa. O título da crônica é Crime e Castigo e este fato indignou o André. Pus-me a caminhar pela rua enquanto lia Lya. Nossa, que falta de horizontes e informação, que bisonhice. Lya fala da forma mais simples que se possa imaginar sobre “nossa sociedade enferma”. Atira para todos os lados sem fixar-se em nenhum: nossas crianças não recebem educação de boa qualidade, formamos criminosos ou inúteis, os pais não lhes dão limites e são dominados pelos primeiros, os professores são cheios de falsas teorias e parecem existir apenas para enfiar ideologias nas cabeças dos pobrezinhos dos alunos, as ruas são locais de descontrolada criminalidade e há que mudar tantas leis quanto possível, precisamos de autoridade e de punições justas.
Em um momento, a autora perde aquele tom messiânico que a auto-ajuda lhe deu e parece gritar com o leitor: “Antes de mais nada, é dever mudar as leis — e não é possível que não se possa mudar uma lei, duas leis, muitas leis. Hoje, logo, agora!”. Ela tem objeções que não acabam mais, só não consegue propor nada.
É um texto indigente demais para merecer uma das melhores grifes de São Petersburgo, trata-se de uma mera exposição de lugares-comuns, é de chorar de ruim. Pretendo chegar à Raskólnikov, mas primeiro seria adequado dar uns raquetaços nos argumentos da Lya que lia e até se informava, uma dia. Lya, tu que carregas o nome do grande Celso Pedro Luft devias saber isto: aquilo que reprime o crime não é o tamanho da punição, mas a INFABILIDADE da pena, ou seja, uma justiça de braço longo e correto. A atividade criminal é tão apreciada em nosso país não pela inexistência de leis, mas pela forma obtusa, eletiva e errática com que são aplicadas. Quanto aos professores e pais: será que antes — quando os alunos eram punidos, ameaçados e até apanhavam — era melhor? Sobre a sociedade enferma: houve acaso alguma época em que ela foi considerada sã? “Sociedade enferma” é um daqueles truísmos que querem silenciar o debate. Ora, essas expressões são tão úteis quanto dizer que o governo X “não fez nada” (assim como o Y e Z), que os todos os governantes estão lá para se locupletar, que os negros agridem e roubam, que os judeus só roubam, etc. São coisas do mais baixo senso comum, ficam ridículas num texto.
Eu ainda acho que uma revista de circulação nacional devia se preocupar com a qualidade do conteúdo e chamar à razão os articulistas que espalhassem — “avalizassem” talvez fosse um verbo melhor — as tolices do senso comum. Mas, sei, é pedir demais para a Veja, cujo maior produto de venda é a confirmação das impressões que assaltam as mentes dos brasileiros médios, principalmente as paranóicas.
Crime e Castigo… Todos os alentados volumes de Dostoievski deveriam se revoltar e cair na cabeça da Lya sem ley. O que tem a ver uma das mais belas histórias inventadas por um ser humano com o lastimável texto de Lya Auto-Ajuda? Vejamos. O livro trata do estudante Rodion Raskólnikov. Ele é paupérrimo como o texto de Lya e, tal como ela, tem a certeza de que é um ser extraordinário. Acontece com muitos, só que Raskonikov age. Cheio de teorias confusas sobre a superioridade de uns sobre os outros, acha-se no direito de utilizar quaisquer meios para cumprir seu destino de grande homem. Tem sempre em mente o nome de Napoleão, cuja biografia seria a comprovação de que é preciso agachar-se, chafurdar na lama e mesmo matar com a finalidade de tomar o poder — o dinheiro, no caso de Raskolnikov. E ele resolve tomá-lo de uma agiota, uma velhinha que além de inútil ainda era um câncer social. Para fazer este trabalho de corrigir Deus, faz-lhe uma visita acompanhado de um machado, porém a coisa começou a se complicar quando a sobrinha Lisavieta chegou repentinamente e viu a tia caída num mar de sangue enquanto Raskolnikov pegava a grana. O que fazer senão matar também Lisavieta? E pimba nela também!
As motivações de Raskólnikov nada têm a ver com aquelas explicadas por Lya, mas e o Castigo do título? O Castigo é o mais curioso. O investigador Porfiri Pietróvitch tem diversas entrevistas com Rodion, que se compromete a cada conversa. Porfiri sabe perfeitamente que Rodion é o assassino, mas nega-se a prendê-lo. Na verdade, ele passa a admirar o pobre estudante e faz questão que ele se entregue. Diz-lhe várias vezes: “Estou esperando você na delegacia com a confissão dos assassinatos; não me faça prejudicá-lo. Sua pena será MENOR se você se entregar”. Bem, aqui a analogia da Lya Louca Por Punições se desmancha inteiramente. Assim como os professores e pais tentam compreender seus filhos, Porfiri vai com consideração e — por que não dizer? — amor à humanidade deste rapaz inteligente e cheio de febres e confusão. A pena é inevitável, o erro é irreparável e Raskolnikov irá para a Sibéria, mas o que Porfiri quer e aposta é em dobrar o estudante, dando-lhe de presente uma pena do tamanho que um ser humano pode suportar e não um castigo perpétuo. Há no livro tudo o que falta à crônica de Lya: compreensão, amor e respeito pelo ser humano. Piedade. Fica claro que o Castigo que Porfiri impõe a Raskolnikov é o de dobrar-se e admitir o erro, saindo do episódio como um homem melhor, sem as teorias alucinadas que justificaram o ato de matar (“Se não há Deus, tudo é permitido”). Tudo isso ocorre em diversos diálogos de fantástica qualidade e ironia. Eles são de compreensão bastante simples para qualquer leitor, apesar do subtexto.
(Estou passando por cima de personagens importantes como Sônia, Svidrigáilov, Lújin e outros para ficar só com o cerne da história).
Agora, eu pergunto: será que Lya Luft — a que diz “que só tudo piora” (não que eu ache que “tudo só melhora”) — não prejudica e confunde ao exigir Autoridade, Punições e Leis mais fortes, atribuindo a seu texto a grife de um marco de nossa cultura? Será que o castigo inteligente e interessado de Porfiri Pietróvitch serviria para a Valquíria da Vingança? Claro que não! O que há naquela crônica é um pensamento superficial acompanhado de um substrato de profunda ignorância. Pobre do Brasil que tem Lya Luft escrevendo para milhares, talvez milhões, de leitores. É de chorar.
..oOo..
A Valquíria Punitiva finaliza seu texto assim…
Muito crime, pouco castigo, castigo excessivo ou brando demais, leis antiquadas ou insuficientes, e chegamos aonde chegamos: os cidadãos reféns dentro de casa ou ratos assustados na rua, a bandidagem no controle; pais com medos dos filhos… usw.
… e tira fotos assim:
A salvação siberiana de Lya Luft seria confessar, aos pés de nós, admiradores e estudiosos do velho Dasta, que não leu Crime e Castigo (ou Crime e Punição, como defendem alguns tradutores diretos do russo)e pegou somente o título para se deixar levar pelo lugar comum. Não sei… mas.. não se pode ler uma obra como essa e usá-la num artigo como esse… Bem, talvez eu esteja sendo levado pela forte emoção de falarem do romance que marcou minha vida – quando eu o li tinha a idade de Rodka. Mas Milton, seu texto é excelente!
Ps: e a Lya traduziu tantos romances bons…
Também marcou a minha, Thiago. Livro inesquecível que reli há uns 5 anos.
Obrigado pelo comentário.
Ah, é verdade. Traduziu um monte de bons livros.
Lya ou Lia? tbem nunca sei se é Diego ou Diogo o nome do colega de páginas do hebdomadário dos Civita…
bem, Lya/Lia é uma grande autora de…platitudes.
Acho que é Diogo, minha filha garante que é Diego. Como vês, é marcante pacas!
Lia não leu. mas afinal, que esperar de uma senhora dessas que demonstra um desconhecimento profundo sobre tudo o que escreve? que esperar da veja?
fico com o Crime e Castigo, que é das coisas mais brilhantes que já se escreveu neste mundo, fundamental pra quem precisa de literatura. talvez seja isso: ly(i)a não gosta, não precisa de literatura – o que explicaria aquelas coisas que ela escreve.
quanto a foto, achei indecente.
abração!
“… fundamental pra quem precisa de literatura.”: disseste tudo, Theo.
Deixarei a classemedianice de Lya de lado. Para que contestá-la, refutá-la? Deixa a velhinha descansar em paz com seus fantasmas de assassinos, traficantes e estupradores dançando à sua volta a exigir, eles mesmos, em cantiga “Nós queremos penas mais duras / tortura, pena de morte / para nós é pouco, é sorte”. Lá-lá-lá-lá-lá-dó!
Seu amigo não podia passar só o texto da Lya por e-mail? Comprar a Veja não provocou reações químicas adversas? Ou você aproveitou para ler o Reinaldo Azevedo, o Diogo Mainardi, etc? Suas considerações sobre os cuidados editoriais que eles deveriam ter são de uma ironia dispensável, quer dizer, supondo que tenha sido de fato ironia…
Crime e Castigo, em comentário ainda mais resumido:
Um ponto sobre o livro de Dostoiévski é sua posição pró-eslavófila, afim à ortodoxia da igreja russa e o país como solo guardião do cristinianismo mundial em sua acepção mais pura. A luta de Raskólnikov, que o faz adoecer, é contra a alma russa que o atormenta, apesar dele ter se deixado levar pelo europeísmo, seduzido pela glória e pelo poder, nele completamente imaginários. Raskólnikov luta contra a Rússia dentro dele, mas ela ganha e nela ele chega à redenção, porque seu amor não é apenas por Sônia, mas algo a que ele chega somente por recolocar no seu íntimo panteão Deus e a pátria russa, sempre acolhedora, como a autoridade policial, que investe nele compaixão e perdão, para que ele de fato se reintegre a outra luta, que é a do espírito, contra o materialismo cru, principalmente do que Dostoiévski chamava depreciativamente de “a ideologia alemã”, título, aliás, de um livro dum autor meio marginalizado por aí. Como “os Demônios” ou “Os Possessos”, é literatura engajada contra uma tendência que o escritor considerava preocupante e que varria o solo de sua amada Rússia; o resultado transcende suas preocupações imediatas, e o livro vale como triunfo do impulso humano à justiça e à solidariedade, contra as tentações do poder e a louca busca pela fama, glória, celebridade. Pô, assim, fica parecendo até Lya Luft!
Eu comprei a Veja, sim. Consegui! Há uma boa entrevista com o ex-Borat, atual Brüno. A avaliação qua a Boscov faz do Baader é incrível. Ela até admite a Alemanha como um estado policial, mas diz que o filme demonstra como os caras do Baader era problemáticos, malucos, radicais, etc. Mais ou menos como os caras do bunker de Hitler em “A Queda”.
Bá, igualzinho….
“…livro dum autor meio marginalizado por aí.”: HAHAHAHA
Eu quase caí no terreno eslavófilo ontem à noite, mas sacumé, depois de Inter x Barueri me paraceu demais!
Estava a ver o Botafogo, depois o Fluminense, a imaginar teu sofrimento frente à ameaça baruína, berueriense, barueriana, barueriada… É claro que só de pensar eu morria de rir.
Baader: sim, eles ficam parecendo malucos, radicais, etc., frente a uma polícia política fria, organizada, alemã de filme americano, etc. Mas penso que a “mensagem” é mais ou menos clara: o Estado descobriu um filão a mais em sua ação política interna e externa, e a esquerda perdeu para sempre sua comunicação com a sociedade, sendo por esta última associada ao “terrorismo” fundamentalista com o qual se associou e por ele corrompeu-se em ações armadas equivocadas.
Bom dia Milton…
Você citou no texto que “resolvi te dar uma alegria”, pelo visto te dei um enorme sofrimento ao ter que ler uma crônica tão infeliz, e pior, comentar uma coisa que não merece comentários…..
Quanto a foto, não sei qual dos três é o pior, se é a Lya, a Ieda ou o fotógrafo que registrou.
Abraço
Claro que foi uma alegria. Eu acho que a Lya Luft é uma perda. Ela se vendeu, apenas isso. Boa tradutora, escritora de bom nível, deve ter dito a si mesma: “Se é merda que dá dinheiro, lá vou eu!”. Não suporto isso.
Acho um pouco de desrespeito com dona Lya… Para um politicamente correto como tu, é estranho!
O grande problema é que Lya deve ter LIDO Crime e Castigo, a julgar pelo histórico de traduções que a exime da desculpa da ignorância (traduzir_ e justiça seja feita: bem_ Günter Grass, Sebald e Mann, a cobre de responsabilidade). É mais um dos intelectuais analfabetos funcionais deste país, que a Veja tem em fartura. É mais um dos “especialistas” sobre a condição humana, legitimada por diplomas acadêmicos, que representam a empáfia da suposta elite pensante nacional. A Veja é um balaio tão rico de egolatrias masturbatórias, que numa escala de ridículo, Lya se situa numa posição de relativa vantagem. É só obtusa em seu arremedo lastimável de uma Hanna Arendt nacional_ e se dá bem num país em que o pensamento se centra no próprio umbigo de uma distorção ufanista, de uma sociologia capenga (Gilberto Freire, Caio Prado Júnior, etc), e que a classe A da inteligência brasileira pouco lê, ou nada lê, ou lê os livros errados, ou quando lê os certos, não os entendem, ou os entendem à sua maneira. Assim, Lya é menos deplorável que o Mainardi, em que em uma edição da Veja, aparece, a título de heroicisar esse colunista, representado em seus áureos tempos da juventude quebrando a vitrine de um banco, em que se faz questão de salientar sua botinha vison e seu rolex. Seu vazio é menos irritante que o do Reinaldo Azevedo, esse compositor de truísmos que querem acabar com o discurso, e que aparece na lista de sites recomendados pelo Idelber Avelar.
E eu sei que é bom às vezes desopilarmos a bile, que sofre de insuficiência para digerir esse grande país de merda em que estamos condenados a viver, o que justifica termos de falar da Lya, da Winchestershoten, do suassuna, do Sanches Neto, e de todos esses pâezinhos de confeitaria de aparência inofensiva mas tão irrecomendáveis para uma dieta saudável. Mas o muito olhar para o abismo, nos faz alvo da atenção do abismo, como disse aquele sifilítico abstêmico, e uma vez um gavião ferido que criei por pura dó junto com as galinhas, aos poucos já abaixava o corpo pra monta do galo. Cobrei do grande Grijó que escrevesse post maiores, sem medo de se aprofundar, e ele, excelente professor que na certa é, me respondeu o óbvio: pelo formato dessa mídia, escrever muito não desperta atenção. Escrever mais que umas dez linhas bem claras, ninguém lê. O New York Time, que aparece no livro do Talese como potência imbatível de refinada informação, agoniza em sua declinante versão impressa, e sua versão online recebe visitas em que demora-se, em média, um minuto e vinte segundos por consulta. Ninguém lê! Os intelectuais brasileiros se ajustam mais à figura do Razumikini, o estudante de Crime e Castigo pautado pela razão (daí o nome), pelo equilíbrio, o que descamba para o reducionismo das análises sobre as infinitas questões nacionais, o diletantismo e o pedantismo. Um passo em falso e toda a estrutura desaba, e ela sempre desaba.
Eu já trabalhei em presídios brasileiros, e o problema é bem mais grave daqueles dos tempos da sibéria pré-revolucionária. Um advogado caricato costumava livrar seus clientes com a defesa de que seus crimes era um só: o de terem nascido pobres. A grande maioria de presos não sabe assinar o nome, e o crime mais comum é o de associação ao tráfico de drogas ou ao tráfico. Mas com essa realidade legislativa tradicional sarneyana, continuaremos a viver no contraponto de equilíbrio em que os Elóis, que vivem na superfície, estarão sempre em oferta para saciar a fome dos Molocks, que vivem nos subterrâneos. Mas não pretendo mais que resvalar nesse assunto e penso que seria bom para todos a interpretação detalhada de um dos discursos do Lula.
Texto grande demais. Parei no Caio Prado Júnior,
hahahahahaha
Pô, ceis sabem que sô um admirador da estética. Por isso, Nunes, “Parei no Caio Prado Júnior,”que diabo de humor mais sofisticado representado por essa virgulinha!
Eu realmente tinha esquecido de Razumikine, outro grande personagem do livro. Essa foto do Mainardi no banco… Tu a tens??? Quero!
Confira na edição de 12 de outubro de 2007, tá disponível no site da revista. A sutileza característica da dobradinha Mainardi Azevedo começa pelo título da loa: “No tempo em que Diogo depredava bancos”, sendo uma análise da delicada peça perpetrada pelo revolucionário de butique intitulada (ah! que sutileza, até o Nunes seria arrebatado pela beleza do título) “Lula é minha anta”. Vá lá e confira.
Mas…, só, só um coda rápido: assisti a um documentário semana passada, chamado “Pro dia nascer feliz”, sobre o sistema educacional brasileiro. De um lado, as escolas públicas, em ruína material e espiritual, professores ausentes, alunos que admitem terem de traficar pra sobreviver_ alguns zelosos pelas promessas de poder que essa condição os adulam. De outro lado, a escola particular, controlada desde a entrada por cartões magnéticos personalizados, alunos admissívelmente belos desde que descem dos carros insufilmizados dos pais, modelos de uma acuidade por informações importantes para cumprir o que seus futuros determinam. Nossos dirigentes do amanhã. As alunas, olhos claros e aquele ar sacerdotal de imunidade quanto ao que fica pra fora das roletas eletrônicas e do arcondicionado. Dentro de suas cabeças potentes, tabela periódica, cifras precisas, fórmulas matemáticas, todo o intrínseco passado da espécie ali armazenado para aproveitamento posterior. E treinados á exposição espartana desse material com a preocupação estética de impregnar a crítica. Uma delas diz: não temos culpa de termos nascido com o privilégio de estudarmos aqui. Nós sentimos muito vermos aqueles meninos nos sinaleiros, esfarrapados, dependendo de ajuda. E, em contraste com esse ambiente cheio de luz, o relato em sombra da total ausência de arrependimento de uma garota, 16 anos, que esfaqueou seis vezes uma rival no corredor do colégio estadual: “aquele vadia merecia mesmo morrer; e daí, tô aqui internada por dois ou três anos e depois saio de boa, sou de menor.”
Ahn? Sofisticação? Qual? Quê? Por quê?
Quadro: reunião de estetas discutindo o verso “A rosa é uma rosa é uma rosa é uma rosa”. Ficaria melhor “A rosa é uma rosa é uma rosa”? Ou apenas “A rosa é uma rosa”? Depois de horas de debate, assina-se a brilhante proposição comum: “Gertrude Stein pecou pelo excesso. Para o efeito desejado, lhe bastaria ‘A rosa é'”. Felizes, satisfeitos e com a noite ganha, cogitam fechá-la com chave de ouro no puteiro “Rosa Íntima”.
hahahahahaha
Porra, depois dizem que intelectuais de merda não sabem escrever piadas. Eu mesmo ri depois que terminei de escrever esse conto mínimo. Foi mesmo do caralho.
Que eu saiba, quem de nós que se preocupou em mandar um romance pra concurso não fui eu (pra dois concursos se não me engano!), pra ser avaliado por uma comissão de estetas. E quando estavam eles no “Rosa Intima”, não era da luz que se acende que descansavam. Rancor?
A luz do poema estava fria
A luz do poema estava fria, a energia
extinguiu-se quando do verso se quis
criar o mundo que, reticente, se retraiu
e disse “não” àqueles que diziam: eu
te criei; não, fui eu; nunca, não foste tu
mas eu, que das minhas vísceras arranquei a lua.
Rangem as correntes do infinito por onde
trafegam as sandices dos seres; os macacos
não pedem rezas; os ursos não reclamam às autoridades
e muito menos os guaxinins fazem petições
à ceia de Natal. Tu me dizes: os dentes ressoam
nas lívidas lápides acadêmicas? Eu digo: não
porque nas páginas os acordes, maiores, dissonantes
reverberam em silêncio, assim preenchendo o delírio
A luz do poema estava fria, mas o coração
preenchendo a anotomia, enlouqueceu, perfurado
à bala. A lembrança fica, da ilusão se ri
e à crítica o sorriso distante cala, como um monge
ressoa o acorde que lhe percorre sua mente e
preenche suas ilusões. E quem a elas imune está?
Normalmente, a diferença entre os públicos e os privados são os prédios, o ar condicionado da sala… Quanto ao conteúdo, olha, são bem parecidos.
Não sabes o sufoco que foi arranjar uma escola em P Alegre que tivesse CONTEÚDO, mais latim e filosofia. Mas consegui…
Discordo com conhecimento de causa, Milton. Estudei em colégios particulares, e pra me virar enquanto fazia veterinária, purguei seis anos como professor pró-labore na rede pública como professor de matemática e biologia, em Minas Gerais. O caos está instalado pra tudo quanto é lado, e não creio que nos estados do sul a diferença seja relevante. E educação e criminalidade estão intimamente ligados. E sei que a administração dos setores de ensino público está em mãos de velhíssimas e velhacas professoras beneficiadas por máfias políticas que mantem calados professores e infantilizados alunos. Não lhe disse há pouco?: a secretaria de educação do Rio Grande do Sul, junto com outras, escolheu “Um contrato com Deus” achando se tratar de ameno material evangelizador, como um dos livros pra ser lido nesse ano. Quando lhe chegam a feliz remessa de milhares de livros, esses profissionais dos papéis de final de mês deparam-se com um livro em quadrinhos do Will Eisner, com material julgado subversivo, o que de imediato peleja pra devolvê-los. Isso tá na Carta Capital, de dois ou três meses. Também censuraram um livro do Tezza. Na certa, a sua filha, leitora de Cortázar, não estuda em colégio público, né?
Lya está resolvendo sua culpa judaico-cristã. Seduziu Celso Luft mas, mas nunca foi punida, e o castigo é nosso em ter de suportá-la.
Porra, mas que interpretaço perfeito! És psiquiatra, Gilmar?
:¬)))
Burguesa de merda.
A Veja escolhe bem…
Pois é Milton. Não é privilégio dela citar o Crime e Castigo sem ter lido ou sem sequer ler uma resenha esclarecedora como a sua. Mas o “crime” dela é mais grave. O senso comum alimentado por esse tipo de críticas vazias deslegitima um sistema legal cujo maior defeito, venhamos e convenhamos, está nos seus aplicadores.
Quando assimilamos que é preciso mudar as leis, isso siginifca que nenhuma lei tem legitimidade e, bem, porque devo obedecer a uma lei sem legitimidade???
É bem verdade que não temos um sistema criminal perfeito, que padecemos de muitas falhas legais. Mas isso não nos dá o direito de criar nossas próprias leis, ao nosso prazer. Isso é, no mínimo, antidemocrático. Mas a Veja não liga pra democracia. Nem a Lya. Nem o Jabor.
Ora, os pensantes do Brasil, hoje, são os que dizem o que as classes médias querem ouvir. Então, quando há um crime, ou um tipo de crimes de maior visibilidade para essas classes, logo se quer transformá-los em hediondos, ou pedir a pena de morte, ou a prisão perpétua, ou acabar com o processo legal, com o sistema recursal, enfim… O que as classes dominantes querem ouvir, infelizmente, é o fim dos direitos e garantias que se levou séculos para alcançar. Defendem isso porque não lhes cabe que Nardonis ou Beira-Mares tenham qualquer tipo de direito. Ninguém se lembra é que essa bomba pode cair em suas próprias cabeças, pois o fim dos direitos é, em tese, para todos.
Enfim… A Lya, como o Jabor, como a Veja, quer dizer o que os outros querem ouvir. Não sabem a gravidade do que estão dizendo. Mas falam mesmo assim.
Onde assino?
Melhor botar pra correr um abaixo-assinado. Título: Contra a insanidade dos pseudo bonsensistas. Ou coisa assim. Eu assino.
(poemeto corrigido)
A luz do poema estava fria
A luz do poema estava fria, a energia
extinguiu-se quando do verso se quis
criar o mundo que, reticente, se retraiu
e disse “não” àqueles que diziam: eu
te criei; não, fui eu; nunca, não foste tu
mas eu, que das minhas vísceras arranquei a lua.
Rangem as correntes do infinito por onde
trafegam as sandices dos seres; os macacos
não pedem rezas; os ursos não reclamam às autoridades
e muito menos os guaxinins fazem petições
à ceia de Natal. Tu me dizes: os dentes ressoam
nas lívidas lápides acadêmicas? Eu digo: não
porque nas páginas os acordes, maiores, dissonantes
reverberam em silêncio, assim preenchendo o delírio
A luz do poema estava fria, mas o coração
preenchendo a anatomia, enlouqueceu, perfurado
à bala. A lembrança fica, da ilusão se ri
e à crítica o sorriso distante cala, como um monge
ressoa o acorde que lhe percorre a mente e
preenche suas ilusões. Quem a elas imune está?
Gostei da dialética dúbia infundida na oposição dos termos “mente” e “ilusões”, cujo efeito de incompreensão monocromática se ressalta pela inversão do sujeito em “quem a elas imune está?”, o que não teria o mesmo efeito se a ordem fosse subjugada pela imposição da norma coloquial de “quem está imune a elas?”. Ainda mais que o sentido pretendido por você, assim creio (mas, aí que está…!, é uma visão interpretativa entre outras tantas possíveis!) é de retratar a condição de incerteza a que o ser sensível (sensível numa definição foulquiana, e por favor cuidado na leitura dessa sinonimização hahahahaah,aiai!, mas insensibilizada pela “rotinização do carisma” da definição de modernidade civil em Einseingenstein, em sua obra “Könnten Sie mir bitte sagen”, tomo II, p. 3.517, subnível 3 _ao lado do extintor) está condicionado no arquétipo opressivo da realidade ditada pela configuração midiática ativa e inativa em último grau. E “rangem as correntes” oferece um abrigo dessa turba ignóbil que se avoluma sobre as cabeças dos incautos por tocar, de leve, a pressuposição de um consolo retrógrado à la irmãs Brontë, e favor se atentar que não são as irmãs mediúnicas estudadas pela escola transcendental Steineana, que não tinham trema além do tremor que infundiam às mesas (o trocadilho é cobrado à parte) em sua recepções de espíritos, seres desencarnados, desacorrentados, crianças tragicamente retiradas da pressão da existência terrena, idosos que não admitem a perda da vida e seus assessórios terrenos, cães labradores e coelhos siameses que na confusão da alfândega da transmigração das almas não aceitam bem a fila para a incorporação em inimigos milenares, cães em gatos, coelhos em demônios da tazmânia com o acréscimo de seus contratos para novas películas da Warner Brothers, até que as tais, vítimas da acomodação e da certeza de que trapaças bem treinadas caem no domínio público de forma inquestionável se dão mal, bastante mau, e se vêem ludibriadas pela falta de sono de um dos integrantes da platéia (das cadeiras dos que ainda não desencarnaram, e que teem à disposição a polícia e o inspetor mor da Scotland Yard daqueles tempos burlescos) que percebe a velhacaria, os joelhos acostumados que roçam na força precisa por debaixo das mesas e produzem o tremor dito do além; Não são essas, apesar das “correntes” aludidas e das “lívidas lápides”, o que de pro
Você perdeu a chave da interpretação do poema. Ela se encontra em um texto publicado por Sokal em Social Text. Por isso, trafegou nas nuvens, e errou a referência mais essencial de Einseingenstein, em sua obra “Könnten Sie mir bitte sagen”, que na verdade está no tomo XVII, p. 1.395, subnível 12_no muro das lamentações. Sorry!
Não, não, não.
Está no tomo XVIII, p. 1.247, subnível 17.
Milton, tempinho atrás escrevi um resumo crítico sobre uma coluna da mesma autora, curiosamente mais ou menos na mesma linha: do ‘chover no molhado’, do dizer o já dito, aquele negócio de ‘truísmos’. Só agora publico no blog. Está lá, se quiser conferir. Abraço.
Eu não disse? Eu não disse? Esse dois aí, acima, se amam.
Riobaldo e Diadorim ficariam vermelim,vermelim.
Milton,
não o conheceu e esbarrei em seu blog ontem, quando usava o Google para procurar alguma outra coisa.
Hoje resolvi lê-lo com mais calma e encontrei essa sua imperdível reflexão sobre o artigo de Lya Fraude Luft. Creio jamais ter lido algo tão claro, escrito com tanta humanidade, sobre Crime e Castigo.
Obrigado pelo texto e parabéns pelo ótimo blo. Vou linká-lo desde já no meu Caótico (www.caotico.com.br)
na primeira linha do comentário acima, favor ler “não o conheço”…
Milton,
eu discordo que a Lya seja uma escritora de auto-ajuda. Estes livros têm por objetivo oficialajudar as pessoas em determinados assuntos. Onde ela faz isto?
Penso-a como uma velha rabugenta, já deslocada no mundo.
Tenho duas histórias.
Uma tia, fumante, vive a reclamar que não do gosto das frutas de hioje. Depois de tragar por quase 50 anos!
Já ouvi um quase octonogenário, agora falecido, comentar dos bons tempos em que se dava partida com manivela nos automóveis (sim, ele pegou). Argüi (tem trema, agora?) que bom era ele , não os tempos.
O mesmo se dá com a Lya, ela saiu do mundo, não entende suas novas incapacidades e vive a reclamar da vida. Eu leio a Veja, mas sempre pulo seu texto. Já tenho que ouvir muito estas mesmas coisas, mas dos parentes nós lhes devemos…
Devido ao seu passado, torço pra que seja senilidade.
Branco
PS.: lí esta semana um pequena análise do Camus sobre Crime e Castigo, dentro do processo do niilismo russo, influenciado pela ideologia alemã. Muito boa, está no livro O Homem Revoltado.
O post e seus comentários… bom dimais, sô!
“Substrato de profunda ignorância” está ótimo para Lya L.
Que sina a do grande professor Celso Pedro Luft, um pedaço moral dele estar alienado à Lya, essa pobre de espírito!
Abç.
CF
Estou perplexa com o nivel dos senhores que demonstram tanta segurança ao criticar uma escritora que no minimo mereceria o respeito por ser uma senhora. Não acredito que efetivamente tenham lido o texto da Lia, apenas revelaram que têm a segurança que a própria ingnorância dada…
Respeito à Sra. Lya Luft eu tenho. Já a sua produção atual…
Conheci pessoalmente a Lya Luft e tive o desprazer de encontrá-la novamente em ocasião subsequente. Que pessoinha mais antipática. E de escrita rasa.
Milton, só não entendi uma coisa: como você foi gastar QUALQUER dinheiro com uma Veja? Logo você?
Preciso te passar uns links…
Putz….
Nã imaginei que meu comentário sobre a cronica da Lya Fraude Luft fosse render tanto…….
Pelo visto ela tem muitos “admiradores invejosos de sua capacidade literária”…rsrs
Abraços
Dostoiéwski não merece isso! Para mim ele é “The Best” enquanto a ‘fascistóide’ é atualmente ‘Uma Besta’.
Sds,
Giovani
Milton, tu sabes quem é a digníssima esposa do Vicente Pereira, presidente do DAER? Pois é, esta mesmo que tu lias. Está aí a razão daquela foto ridícula e de todo o “babaovismo”.
Penso que Lya/Veja foi superfical e triste em sua crônica. No meu ponto de vista ela não esta de todo errada. Está??? O Brasil, ou melhor, as pessoas estão perdidas. O mundo esta de perna para o ar. Quem são os mocinhos e quem são os bandidos? Não é assim? aprendi que nenhuma pessoa esta sempre certa, mas tambem nunca esta sempre errada. Veja bem, não estou defendendo a colunista nem tão pouco atirando pedras no seu ponto de vista. Digo apenas que as pessoas podem ser horriveis quando querem. Concordam?