Pegamos o vôo para Roma pela Ibéria, já acostumados ao mau tratamento e aos atrasos da empresa. Chegamos às 22h ao aeroporto de Fiumicino e o amigo da Claudia, Mario De Cristoforo, já estava nos esperando. Ele me perguntou se eu já conhecia Roma e, ouvindo minha resposta negativa, propôs a seu colega Pedro, que dirigia o carro, um rápido tour pela cidade. Senti-me protagonizando a cena final de Roma de Fellini, na qual um grupo de motociclistas percorrem alucinadamente a cidade, passando — e não poderia ser diferente, porque a cidade é um museu a céu aberto — por vários de seus monumentos históricos. Vimos o Altar de Pátria, o qual foi descrito por Pedro como um horror criado por Mussolini (verdade); paramos em frente ao Coliseu, muito bonito e fantasmagórico à noite; e vi ruínas, ruínas, ruínas por todo o lado, as quais vão sendo sistematicamente cuidadas, recolhidas e remontadas. Percorrendo Roma de carro, à noite, certamente estava despejando ohs! e ahs! para todo o lado, nem que fosse em silêncio.
Ficamos insuficientes 4 dias na cidade. A chuva, aquela que costuma me acompanhar e que desta vez até transformou-se em neve, esteve sempre presente em Roma, mas não nos impediu de passar todo o tempo fora de casa. Penso que o ponto alto foram as caminhadas pelas ruelas da cidade histórica, com o ambiente barulhento e desorganizado em torno de nós e as surpresas que aconteciam a cada virada de esquina. Deixando de lado o mapa, tínhamos a possibilidade de ver uma Piazza Navona, uma Fontana di Trevi, o bairro judeu, uma pequena piazza ou apenas mais uma rua ao fazermos uma curva. Se tivesse que eleger o que mais gostei em Roma, ficaria com suas ruas, depois com o Pantheon, a Fontana di Trevi, a Piazza Navona, a Piazza di Spagna ligada à Scalinata della Trinità dei Monti, o Caffè Greco, os estupendos Musei Vaticani, a estranha imensidão do Circo Massimo com seus atletas de fim de semana e o mercadão dominical de Porta Portese. Também adorei as pequenas igrejas da Via del Corso, os notáveis afrescos de Santa Maria del Popolo na Piazza del Popolo e mais vinte outras que esqueci os nomes.
As decepções foram a Catedral de São Pedro, uma ostentação medonha que parece existir mais com a intenção de oprimir os pobres seres humanos com o poder da igreja do que ser um local de devoção e fé. Sinceramente, a Catedral do Papa pareceu-me destinada a arrancar exclamações de turistas deslumbrados. A mim, causou um pouco de medo e fantasias rápidas de inquisição. Também fiquei desiludido ao ver a chocha expressividade perfeita da Pietà – esperava algo com a intensidade da clássica cena de Bergman em Gritos e Sussurros e vi apenas algo impecável, perdido na riqueza da Catedral. E voltando ao Altar da Pátria (Altare della Patria)… aquilo é um trambolho imenso, heróico e mussoliniano a estragar a paisagem, só tornando-se interessante de longe, quando não se vê seus detalhes.
Comemos sempre muito bem. Se íamos fazer economia nas pizzeria al taglio, o resultado era maravilhoso; se íamos gastar numa gelateria das piazze, experimentávamos o melhor dos sorvetes; se estávamos congelando e entrávamos num caffè ou numa cioccolateria, tínhamos vontade de passar lá o resto da tarde, lendo, bebendo e conversando. É natural que a comida italiana seja melhor na Itália, não? As pizza al taglio deles – que ficam atrás de vitrines acompanhadas de atendentes apressadas e simpáticas, sempre querendo nos cortar pedaços muito maiores do que o solicitado — poderiam ser servidas, com vantagem, nas melhores pizzarias brasileiras. Uma questão de qualidade dos ingredientes, explicava-me a Claudia.
Gastamos muito e bem em Roma. Há coisa barata e boa fora do circuito Helena Rubinstein; deveríamos ter viajado com a mala vazia para enchê-la com roupas de inverno na Itália. Os eletrônicos de pequeno porte também são acessíveis. Comprei um Walkman com CD, MP3, etc. por 39 euros. Tinha I-Pods a partir de 50 euros. Por que o mesmo Walkman custa R$ 300,00 no Brasil? Já os CDs são caros, principalmente para alguém financeiramente contido como eu, mas há honestos balcões de ofertas que me fizeram comprar uns 20 de primeira linha, sem cometer suicídio financeiro. Os livros também são muito acessíveis. O que é caro é a comida, as lojas para turistas e a hospedagem.
Depois destes 4 dias de caminhadas malucas, fomos para Verona de carro, com o casal Marisa Machado e Mario De Cristoforo, amigos da Claudia, como já disse. Mas isso fica para um próximo post. Finalizo Roma com fotos.
Escultura de Arnaldo Pomodoro na parte interna dos Museus do Vaticano, adornada pelo brinco da Claudia (lado direito da foto).
Os museus do Vaticano têm um acervo artístico interminável, seja em obras sacras, seja em profanas, afrescos, etc. De quebra, ainda temos a insuperável Cappella Sistina e os aposentos de Rafael, etc. Compreensivelmente, as fotografias são proibidas, mas não aqui, neste corredor bloqueado.
Caffè Greco: local onde pobres mortais podem alimentar-se acomodados em salas antes frequentadas por gentalha como Goethe e Byron.
O Coliseu: o cartão postal é uma ruína mais bonita por fora do que por dentro. A Arena de Verona, apesar de menor, é mais interessante.
Mesmo sem Anita Ekberg e com um frio do cão, a Fontana di Trevi é belíssima.
Do outro lado, o Imperador; deste lado, o povo; no meio, corridas de bigas e outras competições. Hoje, apenas atletas de fim de semana com seus abrigos e Nikes.
A escadaria da Trinità dei Monti com a Piazza di Spagna lá embaixo. Procurei em vão a janela utilizada por Bertolucci em Assédio. Acho que foi montagem…
Chamem a Inquisição! Perdoem-me, mas penso que a Pietà montada por Bergman em Gritos e Sussurros era tão intensa que olhei para aquela coisa toda perfeitinha e achei sem nenhuma alma… Esperava muito mais. Pietà por Pietà, fico com esta, muito mais humana.
Não pensem que vou só ficar falando mal de Michelangelo por aí… Vale o torcicolo ficar admirando esta pequena parte do teto da Cappella Sistina. Melhor sentar ao fundo da Cappella para olhar. Mesmo assim, saí com o pescoço duro. A Sistina é o ponto alto dos Musei Vaticani e, mesmo que estejamos acompanhados por centenas de turistas, observá-la é uma experiência inteiramente individual que nos leva aos céus e nos traz de volta várias vezes. É Bach em pintura.
Ótimas as fotografas. Ah, fiquei com saudades de viajar por lá. Beijos, Silvia
Silvia Chueire Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 19 2005
Milton, Viajei dentro da sua viagem. Quantas lembranças…Que delícia, hem? E conhecer a Nora ao vivo e a cores deve ser como se sentar no chão para ver o teto da Capela Sistina. Fico feliz por vocês. Beijo e saudades dessa família maravilhosa!
Laura Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 16 2005
Aproveita ,aproveita que nós aqui fica deslumbrando!A máquina usada nas fotos é de que marca ?
monica Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 16 2005
Belíssima descrição, com poesia, ironia, informação…
Cláudio Costa Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 15 2005
PLÁGIO by Ramiro Conceição Nada é meu e nem teu. Tudo são pedaços da Vida. Com o pedaço do meu ladrão, roubei uma síntese que fiz da prosa do poeta Carpinejar e que se enquadra no Blog teu, Milton: Quando se ama: as paredes dão licença!
Ramiro Conceição Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 15 2005
Milton, que legal que voce vai mostrar todas as fotos. Além disso, me fez voltar a idéia de fazer um post sobre Michelangelo e a Sistina. Talvez leve mais alguns meses, mas ainda faço. Um grade abraço, meu pit… meu guru.
Flavio Prada Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
Como disse o Allan, Roma deve ser visitada em etapas… E por mais que se visite, sempre falta algo, alem da vontade de voltar a muitos lugares. Por isso aquela moedinha jogada na Fontana de Trevi. Nao sei se funciona ou nao, mas joguei nas duas vezes que estive la: vai que se nao jogar eu nao consiga voltar? Muito boas as fotos. abraco
marcelo Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
Viagem realmente perfeita!! Estou no aguardo dos próximos posts!! Abraços! =)
Alice Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
Relato deliciosamente crítico. Vc deveria conversar com o Luiz sobre o Vaticano! Beijão querido. PS. Adorei os brincos da Cláudia. rssss
Mônica Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
É impressionante como qualquer foto na Europa fica excelente. Aquela com o brinco da Claudia ficou muito legal. A que tu está na fonte pode botar num porta-retrato e no teu curriculo. MAAIS FOTOS! MAAIS FOTOS! MAAIS FOTOS!
Fabricio Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
viajando contigo nos retalhos. muito boas as fotos. continue o tour. estou te acompanhando. bj
maira Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
Roma deve ser visitada em etapas. Nos intervalos, visitas a um bom fisioterapeuta. – Não sei se você leu um meu comentário alguns posts abaixo, mas a Cláudia esqueceu a sombrinha vermelha e as luvas pretas no meu carro. Considerei uma saudação rubro-negra. 😀
Allan Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 14 2005
Querido pai virtual, gostaria de pedir desculpas sinceras pela minha ausência. Mas o bom filho à casa torna. Andei vagando por aí, distante do mundo dos blogues. Como disse à minha mãe virtual, a Ana Merege, acho que foi o desencanto com meu próprio espaço. Quis fugir de casa. Mas as idéias iam e vinham, até que enfim, hoje, resolvi inaugurar um novo espaço. Com uma idéia que venho amadurecendo há muitos meses. O “Pegou o bonde e sentou na janelinha” (http://noisdebuzum.blogspot.com). Venha tomar um chá, que eu vou contando a novidade! Posso adiantar que ela anda de ônibus! Beijos sinceros! Mariana (Alemanha! Aí vou eu!) Ps: vi que lançaram um livro, alguns dos meus blogueiros prediletos. Vi também que foi à Itália. Hoje mesmo falava a um amigo da vontade de conhecer o páis que não consegui visitar entre tantas empreitadas na Europa!
Mariana Antoun Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
PARA XENÓFANES by Ramiro Conceição Se eu fosse um cavalo, minhas patas da imaginação correriam sobre as planícies azuis. Se eu fosse um pássaro, minhas asas voariam sobre os girassóis amarelos. Seu eu fosse um ser humano, seria o meu irmão mais ingênuo andando com esperança — sobre as cidades!
Ramiro Conceição Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Roma é um arraso, linda mesmo… Adorei suas fotos. bjs,
Leila Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Oi, Milton, Eta viagem legal, essa que você fez, está fazendo. Acabei de ler lá no Pradinha uma estória incrível das suas capacidades divinas e gigantescas. Como ele, quedei-me aterrorizado. Abração fernando cals ps: sem esquecer a tomadinha e os shampoos que ele diz que vc esqueceu por lá. rsrsrsrsr fc
fernando cals Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
“Chamem a Inquisição! Perdoem-me, mas penso que a Pietà montada por Bergman em Gritos e Sussurros era tão intensa que olhei para aquela coisa toda perfeitinha do Michelangelo e achei-a sem nenhuma alma… Esperava muito mais. Pietà por Pietà, fico com esta, muito mais humana.” Aí, Milton, discordo de você! Bergman precisou chorar — e chorar muito e refletir muito — diante da Pietà de Michelangelo, para chegar aos seus “Gritos e Sussurros”.
Ramiro Conceição Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
“… a Catedral de São Pedro, uma ostentação medonha que parece existir mais com a intenção de oprimir os pobres seres humanos com o poder da igreja do que ser um local de devoção e fé.” Amado Milton, sua reflexão acima é duma extraordinária lucidez. Penso-sinto de maneira semelhante. Não sou arquiteto, mas a arquitetura dos templos católicos parece querer trazer à realidade todo um imaginário mórbido de opressão. Para mim é uma arquitetura sádica que se completa com fiéis masoquistas. É uma arquitetura que possui como substrato a Dor da “Paixão” e não a Luz da “Ressurreição”. Um outro exemplo que corrobora a sua reflexão, em minha opinião, é “A Sagrada Família” de Gaudi. Se eu fosse um diretor de cinema e planejasse um filme de terror, sem qualquer sombra de dúvida: passaria algumas semanas, no interior da “Sagrada Família”, desenhando e fotografando tudo e, depois, com auxílio de um programa de computador, certamente, chegaria a cenários horripilantes. Fico imaginando, cá com os meus botões, como seria caminhar na Catedral de São Pedro e/ou na “Sagrada Família” à luz de velas!!!!!!!!!!! (penso-sinto um arrepio na espinha!)
Ramiro Conceição Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Milton Tenho mais acompanhado (lido)seus relatos do que comentado. Há um motivo. Por alguma razão a seqüência que vc fez deles, desde a preparação da viagem,o durante e o depois, me remeteu ao inesquecível Journey Without Maps do também inesquecível Graham Greene. Guardada as devidas comparações (vc foi para Europa, ele pro norte da África), o seu texto é tão fascinante qto o dele. Fascinante pq nos leva, nos carrega pros locais. E é isso que faz a gente ler “gostoso” todos os seus relatos. Pense nisso, reúna todos eles e que tal, no seu caso, um journey com maps? rs grande abraço Ilidio
Ilidio Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Vim de carona após ler seu comentário no blog da Cora. Adorei seu espaço e mais ainda por ter relembrado duas viagens que fiz: em 98 – Roma, Florença e Veneza; e em 2000 – Madrid. Ah, que saudades! Ainda volto aqui para ler com mais calma seus relatos. Obrigada por ter me proporcionado tão doces lembranças.
Jussara Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Viajamos contigo. Que deleite.
Roberson Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Pra você ver que cada pessoa sente de forma distinta as coisas, não é? Eu chorei de emoção diante da Pietá e queria que não houvesse mais ninguém em sua volta naquele momento. Eu queria estar a sós com ela. Inesquecível! As ruas de Roma sim, me enamorei delas. Seus recantos, suas portas, suas paisagens. Eu me deixava perder só para ter as surprêsas, assim como vocês. Quando eu voltar lá, talvez minha forma de vê-la seja outra, mas a lembrança que trago no coração é de puro encanto.
nora borges Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
Mílton Vindo de visita ao meu blog para deixar um recado pra os companheiros, aporto aqui onde você me faz reviver minha viagem em 1970. Li avidamente tudo, mas não dá para comentar, só para agradecer o prazer que você me proporcionou. Passe no meu e pegue seus abraços antes que acabem. E agora, rumo ao Natal! Que venha recheado de doces alegrias para a nossa felicidade.
Magaly Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 13 2005
milton, me dê licença, mas vou me demorar muito por aqui vendo este post… grande abraço!
theo Relato de uma Viagem à Itália (II) Dec 12 2005
Milton, tá ótima esta re-viagem.
A sua impressão sobre a Catedral de São Pedro me remeteu à Pérola do saudoso Mauro Rasi (a verdadeira, não a da peça), que ao visitar aquele assombro se pôs a pensar em quem seria o responsável por limpar aquelas paredes todas, aqueles tetos altíssimos.
Enfim, a Itália e seu blog são sempre um grande passeio.
Abraço forte!
ESCALA
by Ramiro Conceição
Desprezo todo tipo de adereço
seja de ouro, de prata ou de platina.
Por outro lado, prezo muito quando
tais metais têm aplicações especiais.
Na classificação dos valores humanos
existe a escada; e as classes sociais…
Porém, se tal espiral não existisse,
o que teria valor se a escala
de medida fosse… o amor ?