Minha arbitragem no CGL (Campeonato Gaúcho de Literatura)

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Retirado daqui.

JUIZ
Milton Ribeiro
– Prefere apresentar-se apenas como um voraz literato, melômano e cinéfilo. Por insistência de sete leitores, mantém um blogue e outras coisas por aí. É sócio do Sport Clube Internacional e sósia de Mahmoud Ahmadinejad, além de ser daltônico, cambota e de ter os pés chatos. Tem curriculum vitae completo em seu blogue, o que torna desnecessário dar mais informações.

OS TIMES

TIME 1: Cris, a fera, de David Coimbra

UNIFORME: A camiseta de Cris, a fera é retrô, o distintivo é uma mulher parecida com Rita Hayworth descendo uma escadaria. Na mão, um cigarro. Destaque para a coxa, que fica de fora, aproveitando uma fenda do robe de chambre – para utilizar um termo antiquado como a capa do volume. Não chega a chamar atenção pela beleza ou originalidade, mas é adequado.

ESQUEMA DE JOGO: Sete histórias entre o conto e a novela. Há unidade temática sim, e como! O assunto é sexo do princípio ao fim. O estilo do autor é bem-humorado, mais para a pornografia leve, sem conseguir alçar-se ao erotismo.

GOL DE PLACA: Bandeira 2, a história de abertura, é a melhor do livro. Um conflito bem montado, com boa solução.

BOLA FORA: Cris, a fera, o conto, é previsível e de psicologia pouco profunda.

TIME 2: O girassol na ventania, de Marco De Curtis

UNIFORME: Decididamente, o uniforme não chama atenção. É mais um time listrado como tantos. É o velho e bom pôr-do-sol, neste caso sem sol, porém com o colorido das nuvens. Pode-se dizer que são histórias de Porto Alegre e que o céu de nossos entardeceres é o mais belo de todos, mas… Não, o uniforme é mesmo muito comum.

ESQUEMA DE JOGO: Por incrível que pareça, trata-se igualmente de sete histórias, sendo cinco contos e duas novelas. As histórias tratam de conflitos humanos e amores urbanos, classificação vaga que demonstra que não há estrita unidade temática.

GOL DE PLACA: Amor por um triz é uma bela e muito bem narrada história. Porém, o autor estraga o final através de uma solução simples que imita Brokeback Mountain. Explico: quando o casal – em nosso caso, heterossexual – parte para uma decisão, o roteirista mata um dos dois e finaliza a obra. Tsc, tsc, tsc.

BOLA FORA: Não há exatamente uma bola fora, mas acredito que o final de Beijos de Borboleta seja de difícil deglutição. Marco De Curtis usa de certa indulgência ao finalizar seus textos.

O JOGO

INICIADO O ESPETÁCULO, o time comandado por David Coimbra tomou logo a iniciativa e foi para cima dos intimidados atletas de Marco De Curtis. Logo, demonstrou algumas qualidades, tais como o bom humor e uma tremenda vontade de seduzir. A vontade era tanta que o treinador se esquecia das primícias. Os leitores – seres sensíveis, delicados e BALDOSOS – têm de ser tratados com jeito. Nem todos estão prontos para entrar em ação após cinco segundos e David pretendia deixá-los excitados sem emitir sinais prévios de suas reais intenções. Logo de cara, colocou em campo um vistoso plantel de mulheres. A plateia ficou interessada e vibrou com este GOL, mas, fato curioso, todas eram iguais. Notou-se que, ao longo das páginas, sua TOTALIDADE tinha 1,70 m, pernas intermináveis e fortes, abdomens malhados, seios rijos, postura sedutora e salto alto. Só variavam no cabelo. Apesar da boa e longilínea forma, as Feras não pareciam levar a sério o esporte bretão. Também se notou que por todos os lados havia referências ao emprego do autor ou a seus colegas, numa incrível sucessão de homenagens que passavam por diversos departamentos da RBS. Tomados de forte NÁUSEA CELETISTA, os leitores se retraíram e passaram a vaiar as Feras, que choraram em campo. Meu coração oprime-se ao narrar tais fatos, mas, como repórter, tenho de me comportar como se fosse o espelho do mundo, refletindo os fatos de forma a que você, querido leitor, confie e acredite. E podeis acreditar, asseguro-vos.

O técnico Marco De Curtis sentiu o gol tomado logo nos primeiros minutos da PELEJA. Foi um golpe que o deixou assustado e sem saber como finalizar o primeiro conto. Porém, o DEMIURGO ao lado do campo reorganizou sua equipe, fazendo-a adquirir o indisfarçável charme de Celso Roth, entocando-se na defesa. Como não tinha saída rápida para o ataque, perdendo-se em digressões e VERBOSIDADES dispensáveis, deixou as Feras fazendo graça pelo campo. Apesar da faceirice e da vontade de pressão do adversário, a postura de De Curtis impedia as penetrações de lado a lado. Porém, Celso Roth é Celso Roth e às vezes faz das suas, tornando-se Sexy Hot. Foi o que ocorreu com o time de De Curtis. Em três INSIDIOSAS estocadas, os Girassóis lograram marcar três gols no segundo tempo. Foram momentos de real grandiosidade e variação de jogadas proporcionadas pela equipe HELIOTROPISTA. Uma surpresa para as Feras! Afinal, o que há em comum entre cães mortos, contos surrupiados e descompassos afetivos? Foram três estranhos gols – o segundo bastante vingativo, demonstrando abissal ressentimento contra o salto alto das Feras – , feitos em sequência naquele futebol de passes curtos, mas que resolveram a partida com facilidade.

Parabéns aos Girassóis!

Entrevistados após a partida, os técnicos demonstraram visões diversas. David Coimbra, em entrevista à nossa reportagem, declarou que o placar foi injusto, pois o árbitro o prejudicou, demonstrando preconceito contra sua condição de conhecido jornalista e fauno do IAPI. Prometeu ir ao tapetão até se esgotarem todas as instâncias da Justiça Desportiva. Já Marco De Curtis irritou-se com os repórteres que insistiam em falar em futebol de resultados.

— Nossa vitória foi justa. Demos um chocolate, um banho tático, tanto que fizemos três belos gols. O que importa são os três pontos, o resto são filigranas, coisas que vocês inventam para vender jornal — garantiu.

PLACAR
Feras 1  x 3 Girassóis

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