Seleção de fotos: Cristóvão Crochemore Restrepo
Há espaço para tudo no mundo.
A escolha do Cristóvão não fala diretamente a meus instintos
mais primitivos, digamos assim. Mas fala aos mais sofisticados
(na medida do possível para um Milton Ribeiro)
e fazem pensar. São belos registros de um corpo que não parece ter nada
de incomum, sarado, siliconado ou fotochopado.
Uma vez, perguntaram para Monica Bellucci qual era o segredo de sua duradoura beleza.
A resposta de grande deusa e patrona de nosso PHES foi sensacional:
“Uso photoshop todo dia”.
Pois nossos corpos são bem assim — comuns, marcados, carentes de perfeições.
Mas como torna-se impecável e maravilhoso o corpo da pessoa que amamos
movendo-se em nossos braços!
Onde encontrar, em cada ser, o fragmento que dá raiz
a nosso desejo?
É isso que perguntaria hoje ao Cristóvão, se estivéssemos numa mesa de bar.
“Onde encontrar, em cada ser, o fragmento que dá raiz a nosso desejo?”. De fato, tal pergunta é fundamental, mas a resposta aproximada de tal questão passa por outra também complexa: “Onde encontrar, em cada ser, o fragmento que dá raiz a nosso desejo de povo?”
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Domingo passado, a maioria de nosso povo deu uma parte da resposta a ser construída pelo presente e pelo futuro de nossa história. Com certeza, daremos muitas cabeçadas: haverá avanços, mas também retrocessos, pois eles fazem parte de um processo irreversível que se dá em desequilíbrio. É assim mesmo. Esse é o sentido da seta do tempo. Criamos entropia à construção de nosso amor e liberdade. Seguimos em frente!, e a nossa força motriz tem um nome: esperança (com Deus, sem Deus ou, quem sabe, com a Natureza de Spinoza: o importantíssimo é que o caminho, se for um único, pertença a nós!).
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A vitória de Dilma me fez reescrever dois poemas… Ei-los:
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BARCOS BRASILEIROS
by Ramiro Conceição
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Nas praias do Brasil,
barcos são patéticos.
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A ESPERANÇA
está de papo pro ar.
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A LIBERDADE,
no quebra-mar,
está prenha
de peixes e
de homens:
aqueles do mar, ao ar,
estão mortos; aqueles
do ar, ao mar, têm
saudade da cidade.
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De repente, relâmpagos,
sustos de santa-bárbara,
e a tempestade da malícia,
da crina da maresia, criou
a ventania: naufragou o SENADO;
a CÂMARA naufragou; a JUSTIÇA
ficou à deriva; e a DEMOCRACIA
foi quase a pique; mas ainda bem
que o ÓDIO foi derrotado
pelos rochedos marítimos
da República…
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É, pela 2ª vez a PRESIDENTA valente
chegou à terra firme… com altivez.
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PARA DILMA
by Ramiro Conceição
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Entre os dionisíacos tropeços de vinhos,
de mil pedaços – nasceu um espantalho
apolíneo, que teima em proteger todos os ninhos.
Por isso – com malícia – Picasso recorta espaços
de um quadro, a ensinar Portinari; enquanto Einstein
ao tempo lança pedrinhas; mas Garrincha ri ao vento,
pois deixou Van Gogh a procurar o amarelo dum gol
dourado de Pelé, num sonho de Pessoa que, bêbado,
dorme até a hora da chegança de Caeiro com os seus
carneiros a balir entre os dentes os poemas de Dante,
de Goethe, de Poe, de Rilke, de Bandeira, de Whitman,
de Drummond à colossal manhã provisória do mundo.
Nietzsche explica o eterno retorno… Mas Shakespeare
reescreve: sem matar ninguém; e Cervantes abandona
Dulcineia a Camões que não é só zarolho; e triste, Marx procura
decifrar a história que Dostoievski crê estar nas batatas de Deus
que Machado doou ao vencedor; Sócrates cutuca Platão!: Freud
está feliz!; enquanto Joyce, Homero, Bach e Lennon&McCartney
inventam um cancioneiro para Beethoven, que pela primeira vez
irá ouvir, e para Dilma que quase completamente ri… plena de si.