Por Graça Ramos
O Salão FNLIJ do Livro para Crianças e Jovens era para ser só festa, como tem sido há 17 anos, mas o que encontrei lá foram editores arrasados com notícias oriundas dos governos federal, capitaneado pelo PT, e do Estado de São Paulo, comandado pelo PSDB. Ambos estão suspendendo compras de livros que deveriam ser entregues a estudantes e professores. Os dois partidos rivais na última disputa presidencial aproximam-se no desprezo à leitura.
O governo de Dilma Rousseff deverá prorrogar para o próximo ano os programas de distribuição de livros literários a escolas públicas previstos para este ano. A informação foi repassada a editores do segmento infantojuvenil por técnicos vinculados ao Ministério da Educação (MEC). Os cortes orçamentários são responsabilizados pela suspensão das compras, não anunciada oficialmente. Mas que, na prática, já está acontecendo no âmbito do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) em função da morosidade no cronograma de atividades, o que equivale a um adiamento.
Os avisos dão conta ainda de que o presidente do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), Antônio Idilvan Alencar, nomeado pelo ex-ministro Cid Gomes (PROS), argumentou contra os cortes, sendo voto vencido. A justificativa dada pelos técnicos da equipe do novo ministro, Renato Janine Ribeiro, é que cortes precisam ser feitos e as obras de literatura são consideradas menos prioritárias. Prorrogada a entrega dos livros do PNBE, aproximadamente 6,7 milhões de exemplares deixarão de chegar aos leitores de escolas públicas de todo o País este ano.
Grandes números – O outro corte foi assumido semana passado, sendo mais expressivo em números, mas localizado em um só estado. O governo de Geraldo Alckmin informou aos editores a suspensão da chamada pública relativa ao ano de 2013 do Programa Estadual do Livro, responsável por abastecer os Programas Sala de Leitura, Leitura do Professor e Apoio ao Saber nas escolas de ensino fundamental e médio, além daquelas inseridas na Educação de Jovens e Adultos. Cerca de 18 milhões de livros que deveriam estar nas mãos de alunos e professores paulistas desde o ano passado não serão entregues. Os cortes orçamentários também foram responsabilizados pela atitude drástica.
O menosprezo à leitura dissemina-se em outras instâncias: a Prefeitura de São Paulo, há quatro anos, não compra livros de literatura para os programas Minha Biblioteca, Acervo Inicial, Acervo Complementar e Sala de Leitura. Portanto, nas gestões do PSD, de Gilberto Kassab, e de Fernando Haddad, do PT. No município do Rio de Janeiro, a situação é melhor, pois permanecem os projetos de compra para creches e aluno concluinte, embora tenha sido suspenso o programa Biblioteca do Professor, que entregava 16 obras literárias aos docentes. Algo próximo de 370 mil exemplares. E, observo, a Prefeitura, via Secretarias de Cultura e Educação, manteve o apoio ao Salão FNLIJ, viabilizando a presença de 17 mil alunos e a compra de livros pelos professores – os outros patrocinadores foram a Petrobras e o Instituto C&A.
Ainda no âmbito federal, ações do Programa de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) 2014, considerado prioritário na campanha da presidente Roussef, também estão bastante atrasadas. Consultadas sobre atrasos e suspensão dos programas, as Assessorias de Comunicação do MEC e do FNDE, responsável pela execução dessas ações, deram resposta semelhante, que, analisada, só confirma o quadro de descaso.
Diz o email enviado pelo MEC: “Os resultados das avaliações do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático) estão previstos para publicação no dia 29/06. E os do PNBE em outubro/novembro. No caso do PNLD Pacto, os resultados já foram divulgados e os guias finalizados, portanto estão em preparação para aquisição. O PNBE temático também já teve resultado divulgado, mas ainda aguarda avaliação da área responsável, a SECADI”. Abaixo, avalio item por item o estado desses e outros programas.
Tudo indica que o PNLD 2016 está dentro desse prazo anunciado, pois dele não se fala em prorrogação, pelo entendimento de que são livros essenciais de disciplinas como matemática, história, física. E, há duas semanas, em reunião com a Abrelivros (Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares), a Diretora de Apoio à Gestão Educacional da Secretaria de Educação Básica, Manoela Dutra, disse que espera divulgar os resultados na segunda quinzena de junho.
Estranhamento – Quanto ao PNBE, a informação de que só em outubro/novembro sairão os resultados dos livros escolhidos leva à conclusão de que obras de literatura não serão compradas em 2015. Leva-se tempo no processo de negociação com as editoras, e dezembro fica muito próximo da data do anúncio informado pela Comunicação do órgão. O estranho é que, há algumas semanas, tive acesso a uma planilha do MEC com o cronograma do PNBE 2015 que apontava ser o prazo para publicação do resultado das avaliações dos livros escolhidos o dia 28 de julho. Tal data permitiria a entrega dos volumes ainda este ano. O que, reitero, pelo visto, não ocorrerá.
O PNBE temático de 2013 vem sendo negociado com editoras desde setembro de 2014. Até o momento não foram assinados contratos. Portanto, há um atraso de dois anos na entrega das obras de referência destinadas aos alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio. O PNBE Indígena 2015 também se encontra sem qualquer notícia. Está atrasada ainda a largada do PNBE de 2016, que deveria ter publicado edital no final de 2014, como era a praxe do calendário do MEC. O órgão alega aos editores que o documento se encontra em fase de confecção, pois houve mudanças na equipe de avaliação e estão sendo preparados novos critérios para a próxima edição. Já o PNBE do Professor 2015 parece ter sido abortado, nada se sabendo dele, e estamos na metade do período letivo.
No caso do PNLD/ PNAIC, que busca garantir a alfabetização das crianças até os oito anos como determina o Plano Nacional de Educação (PNE), a habilitação das editoras já foi concluída. Porém, os contratos, o que inclui definição de tiragem e preço, não foram assinados. O atraso pode não significar nada para burocratas que definem cortes em orçamentos, porém, atrapalha a formação de alunos em seus anos iniciais de aprendizado de Português e Matemática e pode incidir negativamente na meta do PNE. Outro indício que preocupa é a possibilidade do PNAIC do próximo ano não acontecer, pois o FNDE está convocando editores para apresentarem os contratos internacionais – que dizem respeito a obras traduzidas – mas solicitando vigência para 2016.
Transparência – Considero absurdo o governo não adotar transparência e deixar de explicar para a sociedade os cortes de orçamentos, programas e prazos. Também me chama atenção que, naquilo que se refere à literatura infantojuvenil, não exista uma entidade capaz de capitanear as insatisfações e cobrar do governo respostas mais efetivas. Seja de professores, de pais e, especialmente, de editores. Somente no final do mês, um grupo destes últimos participará de audiência pública em Brasília para cobrar transparência nas contas de programas de educação e formação do leitor. A demora e a timidez no enfrentamento mais agressivo da questão provocam a sensação de que associações que cuidam dos negócios do livro no Brasil – como Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), Abrelivros, Liga Brasileira de Editores (LIBRE) e Câmara Brasileira do Livro (CBL) – não se unem, deixando de estabelecer marca representativa e forte na defesa da importância da literatura para crianças e jovens.
Diante de tal desarticulação, talvez esse papel devesse ser assumido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), cujo Salão tem a mesma idade do PNBE – portanto, tendo usufruído do fortalecimento que os programas institucionais de leitura possibilitaram ao segmento. Afinal, embora nele nenhuma mesa tenha se dedicado ao tema dos cortes nos programas, a Secretária-Geral da entidade, Beth Serra, resumiu toda a questão colocada para a sociedade brasileira: “a conquista de 20 anos de programas de leitura não pode ser interrompida”, disse.
Ela falou na abertura da instrutiva palestra da educadora argentina Emília Ferreiro, que apresentou pesquisa sobre como as crianças percebem três instâncias literárias – o autor, os personagens e o narrador – e demonstrou como essa percepção está contaminada pela linguagem das telas digitais. O que me levou a pensar que o Brasil, ao desconsiderar a importância dos programas de leitura nesse cenário dominado pelas tecnologias, poderá fomentar gerações de leitores precários.
Claro, quanto mais anlfabeto e ignorante a população, mais o povo vai ter de escolher entre PSDB e PT..
Quando é que vamos parar com essa balela…
Desde quando escolaridade significa sabedoria???
O que falta é consciência histórica e sabedoria política, principalmente de nossa classe média cada vez mais idiotizada.
Assino embaixo…, pois, ao contrário, em cima está a Democracia…