Por Hélio Schwartsman (retirado do blog Náufrago da Utopia)
Se parássemos de tocar canções com alusões racistas, sexistas etc., estaríamos sinalizando que a moral é absoluta e estática, isto é, que sempre foi errado escravizar pessoas, discriminar minorias, impor castigos físicos a crianças e outras mazelas que eram regra no passado.
Além de historicamente insustentável, essa interpretação, bem ao gosto das religiões fundamentalistas, praticamente fecha as portas para a possibilidade da ampliação do círculo de solidariedade moral da humanidade, fenômeno que, na visão de alguns autores, estamos experimentando ao longo do último par de séculos.
Com efeito, antigamente, o homem ligava só para si e, por imperativos biológicos, para seus filhos. Com o decorrer do tempo e a melhora das condições materiais de vida, passou a preocupar-se (talvez mais em teoria que na prática) também com vizinhos, compatriotas, correligionários e, por fim, com todo o gênero humano e até com alguns animais.
Trocando em miúdos, militar para banir marchinhas ou impor outras formas de sanitização politicamente correta é, numa analogia pintada com tintas fortes, o equivalente intelectual de depredar museus ou queimar livros para apagar registros da história.
Ouso até dizer que seria mais proveitoso para os militantes usar músicas e referências literárias para mostrar com clareza quão disseminado e naturalizado era o preconceito e quanto conseguimos melhorar nos últimos tempos, já que hoje a ideia de que todos devem ter os mesmos direitos independentemente de raça, cor, gênero, orientação sexual etc. está plenamente incorporada à visão de mundo ocidental.