Era um problema. Um pequeno grande problema. Não, era um grande problema. Simplesmente, ele não tinha dinheiro para comprar o presente de aniversário para o filho. Ele possuía uma pequena empresa à qual não conseguia dar atenção e havia um acordo do casal: a mulher estava fazendo doutorado — estudava, pesquisava e recebia uma bolsa, enquanto ele cuidava da empresa e das crianças. Júlio levava-as e buscava-as no colégio, ia e vinha, trabalhava apenas até às 16h30, depois saía correndo para pegá-las. Em vários dias de semana, levava-as para almoçar ao meio-dia. Pela manhã, chegava cedo na empresa a fim de organizar as coisas, mas os clientes só chegavam ou telefonavam mais tarde. Os finais de semana também eram passados com os guris. Ele vivia na certeza de que ia falir. Sentia-se como se acelerasse um carro de encontro a um muro, sem conseguir uma forma de desviar ou parar.
Seu sócio já estava atrás de um emprego. Era uma boa pessoa, disse que eles não tinham perfil de empreendedores e que ia embora logo que pudesse.
Ele não podia — ou pensava que não podia — descumprir o acordo com a mulher. Tinha garantido que tirava de letra. Dissera para ela gastar o dinheiro da bolsa com ela mesma e ele arranjaria o resto. Seria briga certa e grave se ele quisesse alterar o acordo. Com a palavra empenhada, escondia as dívidas da mulher — o colégio dos filhos estava com pagamentos em aberto — e tinha vergonha de pedir dinheiro a ela que, além disso, faria perguntas. A situação já perdurava há meses e ela já falara que o salário dele na firma devia ser uma pensãozinha. Ah, se ela soubesse…
Júlio adorava os filhos. Gostava de brincar e de conviver com eles. Esquecia dos problemas na companhia dos filhos. Divertia-os com sua presença. Então, havia uma ilha de pobreza em casa, ilha que ele tratava de esconder sob as névoas da alegria infantil e do bom humor.
Mas como não dar um presente?
No domingo seguinte, ele levou Leo a um jogo de futebol para o qual o menino tinha sido convidado. O pai de um amigo do filho tinha alugado uma quadra de futsal pras crianças. Júlio tinha só o pouco dinheiro do bolso. Os valores no banco, estes só apareciam em algarismos vermelhos. Quando chegaram, Leo pediu para que ele colocasse uma moeda numa máquina que dava em troca uma bolinha transparente. Era uma surpresa. Dentro vinha um chiclete e um bichinho de plástico que quebrava em dois dias. A moeda não mudaria grande coisa da situação, mas mesmo assim Júlio hesitou em gastá-la e o menino deve ter notado.
Então Leo disse:
— Tu não me deu nada de aniversário. Quero isso. Vale como presente.
Recebeu a moeda.
— Taqui meu presente, pai! Achei legal! Guarda pra mim?
Ele foi jogar bola e Júlio ficou na beira da quadra, lutando contra as lágrimas, ainda mais isolado. Sem poder e sem saber como gritar.
(Então, como havia quatro pais assistindo o jogo, Júlio foi convidado a jogar. Dois para cada lado. Os pais não procuravam tirar a bola das crianças, mas enfrentavam-se um ao outro em jogadas gentis, sem nenhum impacto físico. Não queriam machucar um ao outro, tratavam-se com respeito enquanto riam e gritavam como crianças. Júlio era um bom jogador, mas estava desconcentrado, ainda comovido com o gesto de Leo. Foi quando recebeu uma batida de ombro do pai que era o dono da festa. Não foi com força, mas Júlio pensou vou cair e caiu. O outro pediu desculpas e estendeu-lhe o braço, perguntando se tinha se machucado. Não, não foi nada, estou bem.
Júlio foi invadido por um ressentimento avassalador. O cara que lhe derrubara tinha um tremendo carro, esbanjava seu dinheiro para divertir o filho. Os outros dois pais também tinham aquele jeitão de bem-sucedidos. E Júlio deixou de correr, com um azedume tipicamente infantil. Quando cruzou com o pai rico, tentou dar-lhe uma rasteira.
O homem não gostou
)