Caetano Veloso e sua homenagem a Carlos Marighella

Em seu último disco, Abraçaço, Caetano Veloso surpreende com uma canção dedicada a Carlos Marighella. É bastante longa e explicativa. Era desconhecida a admiração que Caetano e Gil tinham pelo também baiano Marighella. Ele e Gilberto Gil apareceram na capa de uma revista — onde eu li esta informação não dizia que revista foi –, dizendo “nós estamos mortos, ele está mais vivo do que nós”. Na mesma época, enviou ao jornal “Pasquim” um texto sobre Marighella. Caetano diz que, na época, ninguém no Brasil entendeu que a tristeza que expressava no texto, assim como na manchete da revista, não era apenas a tristeza do exílio, mas uma referência à morte de Marighella.

Montagem: http://paginadoenock.com.br/

http://youtu.be/otiZAYPP200

Um Comunista

Caetano Veloso, no CD Abraçaço, 2012

Um mulato baiano,
Muito alto e mulato
Filho de um italiano
E de uma preta uça

Foi aprendendo a ler
Olhando mundo à volta
E prestando atenção
No que não estava a vista
Assim nasce um comunista

Um mulato baiano
que morreu em São Paulo
baleado por homens do poder militar
nas feições que ganhou em solo americano
A dita guerra fria
Roma, França e Bahia

Os comunistas guardavam sonhos
Os comunistas! Os comunistas!

O mulato baiano, mini e manual
do guerrilheiro urbano que foi preso por Vargas
depois por Magalhães
por fim, pelos milicos
sempre foi perseguido nas minúcias das pistas
Como são os comunistas?

Não que os seus inimigos
estivessem lutando
contra as nações terror
que o comunismo urdia

Mas por vãos interesses
de poder e dinheiro
quase sempre por menos
quase nunca por mais

Os comunistas guardavam sonhos
Os comunistas! Os comunistas!

O baiano morreu
eu estava no exílio
e mandei um recado:
“que eu que tinha morrido”
e que ele estava vivo,

Mas ninguém entendia
Vida sem utopia
não entendo que exista
Assim fala um comunista

Porém, a raça humana
segue trágica, sempre
Indecodificável
tédio, horror, maravilha

Ó, mulato baiano
samba o referencia
muito embora não creia
em violência e guerrilha
Tédio, horror e maravilha

Calçadões encardidos
multidões apodrecem
Há um abismo entre homens
E homens, o horror

Quem e como fará
Com que a terra se acenda?
E desate seus nós
discutindo-se Clara
Iemanjá, Maria, Iara
Iansã, Catijaçara

O mulato baiano já não obedecia
as ordens de interesse que vinham de Moscou
Era luta romântica
Ela luz e era treva
Feita de maravilha, de tédio e de horror

Os comunistas guardavam sonhos
Os comunistas! os comunistas!

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