Relato de uma Viagem à Itália (III)

Fomos de Roma para Verona de carona. Um pequeno problema na saída: tínhamos crescido e não coubemos no Skoda do Mario. Mudamos para uma enorme van da Fiat chamada Ulysse que deve ter consumido muito mais combustível do que o pretendido pelo Mario e pela Marisa… Verona é muito menor do que Roma, é claro, mas nela podemos ter uma perspectiva histórica muito diferente. Lá, a Idade Média permaneceu. O Renascimento, em Roma, destruiu muitas obras da Roma Antiga e praticamente sepultou a Idade Média. Os veroneses, muito mais pobres naquela época, mantiveram um registro menor, porém mais completo de seu passado. E, se em Roma a Claudia estava em casa, o que dizer de Verona, cidade onde ela morou por sete anos? Ela conhecia não somente todos os pontos turísticos como também os gastronômicos, as ruas, as linhas de ônibus e os supermercados… Minha lembrança da cidade estará sempre misturada com as figuras gentis e engraçadas do Mario, da Marisa e da Bruna, pessoas que a Claudia adora (não é para menos) e que depois nos deram as chaves de seu apartamento de Verona — trabalham lá — e foram embora para o Brasil preparar sua festa de 25 anos de casados… Numa espécie de estranho e benigno ciúme restrospectivo, deu-me desejos autênticos de um dia também morar lá. É uma cidade lindíssima, pequena (250.000 habitantes), com trânsito inexplicavelmente complicado e cartazes anunciando concertos de música erudita em muitas paredes — dei-me ao trabalho de contar os cartazes nas ruas, assim como as páginas culturais dos jornais. Os concertos eruditos e óperas de que ocorrem em Verora durante um mês, correspondem a seis anos de Porto Alegre, sem contar a qualidade. Uma cidade pequena, latina, linda, com todas as estações bem definidas e música… É o meu país inventado, é o paraíso!

Só não gostei de ter entrado numa gelateria para comer brioche — um pãozinho doce — com sorvete. Uma ideia legal no papel, mas por demais embuchante para meu estômago, que costuma aceita qualquer coisa em quaisquer quantidades.

Vamos às fotos?

A Arena de Verona vista de fora. Suponho que esteja abaixo do nível da rua para facilitar a entrada e armazenamento de água em seu centro, pois primeiramente era utilizada para servir de palco a batalhas navais, assim como o Coliseu de Roma.

A Arena é o Coliseu de Roma menor, porém completo. Fiquei abismado com sua beleza e, depois de ouvir a Claudia contar sobre as óperas tinha visto ali, pedi ela ir lá embaixo, pois queria sentir um pouco da acústica. Olha, eu conheço bem a mulher com quem vivo há 3 anos e meio; então, sei que ela falou bem baixo mas a ouvi perfeitamente uns 40 metros acima. Um espanto. É evidentemente, um local perfeito para óperas. Não se faz necessária nenhuma amplificação eletrônica. Só instrumentos e gogó.

Foto da Piazza Bra, tirada do alto da Arena. Era 11h30 mas, com aquele frio, nem os veroneses se arriscavam muito na rua.

Detalhes da porta da Igreja de San Fermo.

Mais do mesmo. Sua construção foi feita sobre outra igreja, esta medieval, que está recuperada abaixo. É isso mesmo, San Fermo está ao nível da rua e há outra igreja, plenamente recuperada, tosca, linda, medieval e ativa no sub-solo.

O claustro de San Fermo.

O Castel Vecchio à beira do rio Adige é uma antiga fortificação onde há um museu e mostras de artes plásticas, com acervo permanente e visitante.

O rio Adige é limpo e ali reúnem-se milhares de aves ao final da tarde com finalidades não declaradas. Só sabe-se, ou melhor, vê-se, que elas obedecem a um instinto súbito de levantarem vôo todas ao mesmo tempo e que é bonito de se ver.

Dizem que dá sorte colocar a mão no seio direito de Julieta. Todo mundo faz, não custa tentar, apesar de ser um seio gelado.

Na próximo segmento, Veneza e, depois, Riva e Flavio Prada.

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Relato de uma Viagem à Itália (II)

Pegamos o vôo para Roma pela Ibéria, já acostumados ao mau tratamento e aos atrasos da empresa. Chegamos às 22h ao aeroporto de Fiumicino e o amigo da Claudia, Mario De Cristoforo, já estava nos esperando. Ele me perguntou se eu já conhecia Roma e, ouvindo minha resposta negativa, propôs a seu colega Pedro, que dirigia o carro, um rápido tour pela cidade. Senti-me protagonizando a cena final de Roma de Fellini, na qual um grupo de motociclistas percorrem alucinadamente a cidade, passando — e não poderia ser diferente, porque a cidade é um museu a céu aberto — por vários de seus monumentos históricos. Vimos o Altar de Pátria, o qual foi descrito por Pedro como um horror criado por Mussolini (verdade); paramos em frente ao Coliseu, muito bonito e fantasmagórico à noite; e vi ruínas, ruínas, ruínas por todo o lado, as quais vão sendo sistematicamente cuidadas, recolhidas e remontadas. Percorrendo Roma de carro, à noite, certamente estava despejando ohs! e ahs! para todo o lado, nem que fosse em silêncio.

Ficamos insuficientes 4 dias na cidade. A chuva, aquela que costuma me acompanhar e que desta vez até transformou-se em neve, esteve sempre presente em Roma, mas não nos impediu de passar todo o tempo fora de casa. Penso que o ponto alto foram as caminhadas pelas ruelas da cidade histórica, com o ambiente barulhento e desorganizado em torno de nós e as surpresas que aconteciam a cada virada de esquina. Deixando de lado o mapa, tínhamos a possibilidade de ver uma Piazza Navona, uma Fontana di Trevi, o bairro judeu, uma pequena piazza ou apenas mais uma rua ao fazermos uma curva. Se tivesse que eleger o que mais gostei em Roma, ficaria com suas ruas, depois com o Pantheon, a Fontana di Trevi, a Piazza Navona, a Piazza di Spagna ligada à Scalinata della Trinità dei Monti, o Caffè Greco, os estupendos Musei Vaticani, a estranha imensidão do Circo Massimo com seus atletas de fim de semana e o mercadão dominical de Porta Portese. Também adorei as pequenas igrejas da Via del Corso, os notáveis afrescos de Santa Maria del Popolo na Piazza del Popolo e mais vinte outras que esqueci os nomes.

As decepções foram a Catedral de São Pedro, uma ostentação medonha que parece existir mais com a intenção de oprimir os pobres seres humanos com o poder da igreja do que ser um local de devoção e fé. Sinceramente, a Catedral do Papa pareceu-me destinada a arrancar exclamações de turistas deslumbrados. A mim, causou um pouco de medo e fantasias rápidas de inquisição. Também fiquei desiludido ao ver a chocha expressividade perfeita da Pietà – esperava algo com a intensidade da clássica cena de Bergman em Gritos e Sussurros e vi apenas algo impecável, perdido na riqueza da Catedral. E voltando ao Altar da Pátria (Altare della Patria)… aquilo é um trambolho imenso, heróico e mussoliniano a estragar a paisagem, só tornando-se interessante de longe, quando não se vê seus detalhes.

Comemos sempre muito bem. Se íamos fazer economia nas pizzeria al taglio, o resultado era maravilhoso; se íamos gastar numa gelateria das piazze, experimentávamos o melhor dos sorvetes; se estávamos congelando e entrávamos num caffè ou numa cioccolateria, tínhamos vontade de passar lá o resto da tarde, lendo, bebendo e conversando. É natural que a comida italiana seja melhor na Itália, não? As pizza al taglio deles – que ficam atrás de vitrines acompanhadas de atendentes apressadas e simpáticas, sempre querendo nos cortar pedaços muito maiores do que o solicitado — poderiam ser servidas, com vantagem, nas melhores pizzarias brasileiras. Uma questão de qualidade dos ingredientes, explicava-me a Claudia.

Gastamos muito e bem em Roma. Há coisa barata e boa fora do circuito Helena Rubinstein; deveríamos ter viajado com a mala vazia para enchê-la com roupas de inverno na Itália. Os eletrônicos de pequeno porte também são acessíveis. Comprei um Walkman com CD, MP3, etc. por 39 euros. Tinha I-Pods a partir de 50 euros. Por que o mesmo Walkman custa R$ 300,00 no Brasil? Já os CDs são caros, principalmente para alguém financeiramente contido como eu, mas há honestos balcões de ofertas que me fizeram comprar uns 20 de primeira linha, sem cometer suicídio financeiro. Os livros também são muito acessíveis. O que é caro é a comida, as lojas para turistas e a hospedagem.

Depois destes 4 dias de caminhadas malucas, fomos para Verona de carro, com o casal Marisa Machado e Mario De Cristoforo, amigos da Claudia, como já disse. Mas isso fica para um próximo post. Finalizo Roma com fotos.

Escultura de Arnaldo Pomodoro na parte interna dos Museus do Vaticano, adornada pelo brinco da Claudia (lado direito da foto).

Os museus do Vaticano têm um acervo artístico interminável, seja em obras sacras, seja em profanas, afrescos, etc. De quebra, ainda temos a insuperável Cappella Sistina e os aposentos de Rafael, etc. Compreensivelmente, as fotografias são proibidas, mas não aqui, neste corredor bloqueado.

Caffè Greco: local onde pobres mortais podem alimentar-se acomodados em salas antes frequentadas por gentalha como Goethe e Byron.

O Coliseu: o cartão postal é uma ruína mais bonita por fora do que por dentro. A Arena de Verona, apesar de menor, é mais interessante.

Mesmo sem Anita Ekberg e com um frio do cão, a Fontana di Trevi é belíssima.

Do outro lado, o Imperador; deste lado, o povo; no meio, corridas de bigas e outras competições. Hoje, apenas atletas de fim de semana com seus abrigos e Nikes.

A escadaria da Trinità dei Monti com a Piazza di Spagna lá embaixo. Procurei em vão a janela utilizada por Bertolucci em Assédio. Acho que foi montagem…

Chamem a Inquisição! Perdoem-me, mas penso que a Pietà montada por Bergman em Gritos e Sussurros era tão intensa que olhei para aquela coisa toda perfeitinha  e achei sem nenhuma alma… Esperava muito mais. Pietà por Pietà, fico com esta, muito mais humana.

Não pensem que vou só ficar falando mal de Michelangelo por aí… Vale o torcicolo ficar admirando esta pequena parte do teto da Cappella Sistina. Melhor sentar ao fundo da Cappella para olhar. Mesmo assim, saí com o pescoço duro. A Sistina é o ponto alto dos Musei Vaticani e, mesmo que estejamos acompanhados por centenas de turistas, observá-la é uma experiência inteiramente individual que nos leva aos céus e nos traz de volta várias vezes. É Bach em pintura.

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