Ospa é coadjuvante em bom show dedicado a Geraldo Flach

Ospa é coadjuvante em bom show dedicado a Geraldo Flach
Toca-discos da Philips: o meu era azul e branco
Toca-discos da Philips: o meu era azul e branco

Quando começou o show do último domingo no Araújo Vianna, lembrei de um toca-discos portátil azul e branco da Philips que ganhei de meus pais nos anos 70. Funcionava com 4 pilhas grandes e também ligado na luz. A tampa tinha um alto falante acoplado. Não dava para afastar muito a tampa do prato — o fio que os ligava era curto (ver foto ao lado) e ficava pelo lado de dentro quando se fechava a malinha. Era muito bonito, moderno e eu o carregava orgulhosamente para a casa de amigos, acompanhado de meus poucos discos. Bastaram 5 segundos para que o querido aparelho me viesse à memória. Onde andará hoje? Ele tinha um som de… vitrola, parecido com o que ouvi no início do concerto. Depois, o som amplificado da orquestra oscilou para melhor, mas nunca foi tudo aquilo.

Era natural, pois, que a Ospa não brilhasse muito no último domingo. Esta série do Araújo Vianna poderia ser chamada de “A Ospa convida”, porque a orquestra sempre será auxiliar para o brilho de solistas populares armados de instrumentos mais adequados ao espaço. Prova disso disso é o Cultura RS, espaço da Secretaria da Cultura do RS no Facebook. Um amigo me chamou atenção: das muitas fotos do show, apenas uma é da orquestra. Bem, o concerto aconteceu e foi excelente, mas apenas em razão da extraordinária banda formada por Cristian Sperandir (piano), Ricardo Arenhaldt (bateria), Ricardo Baumgarten (baixo) e Fernando do Ó (percussão). Ainda tivemos as participações dos cantores Luciah Helena e Marcelo Delacroix, músicos de raro brilho.

Foi um evento curioso. Olhei para os lados, o publico básico era o da Ospa, mas tinha muito mais gente. Muitos alunos de música estavam lá, além de frequentadores do Parque da Redenção e turistas com máquinas fotográficas. Movimentou muita gente mas não acredito que aquele formato crie público para a orquestra. Cria para a banda, a real estrela do show. Por isso, os músicos populares gostam tanto dos crossovers. É uma ótima divulgação. Claro, essa coisa de tocar Beatles in Concert promove… os Beatles. O Música de Filmes provoca lembranças de imagens de prazer cinematográfico na plateia. Os caras saem de lá com cenas na cabeça, loucos para rever os filmes, basta ouvir os comentários na saída. O fato gerador é o filme e o ponto de chegada também.

Como diz a música de Gil, eu tiro os outros por mim. Comecei a amar a música pelo Concerto de Brandemburgo Nº 3 e pela Sinfonia Nº 10 de Shostakovich. O primeiro me mostrou como um tema pode ser apresentado de muitas maneiras diferentes — pareceu uma interessante metáfora ao adolescente que eu era –, o segundo me assustou pelo poder de evocar o sofrimento de um povo. E ambos sugeriram um sistema linguístico como o da literatura, foco principal de minha modesta vida de sempre. Não creio que no Araújo Vianna, com som deficiente e protagonismo alheio, alguém vá se apaixonar pela orquestra como acontecia nos saudosos Concertos para a Juventude da época de meu toca-discos. Só a música erudita promove a música erudita, diz minha militância.

Porém, não obstante o caráter secundário da orquestra, gostei do show. Pelo que pude ouvir, os arranjos eram interessantes, assim como a música de Geraldo Flach. Mas olha, valeu pelo quarteto, que é sensacional, e por Marcelo Delacroix, que é mesmo estupendo.

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