Revelamos a carta ipsis litteris, logo após recebê-la das mãos de Luciana Genro.
Querida Magda.
Ela era apenas uma mera duma Yeda Rorato quando conheceu a barbicha de Carlos Augusto Crusius. Tu sabes, desde jovenzinha ela não devia ser flor que se cheirasse, mas a coisa só piorou, pois às vezes é atrás do Crusius que o diabo se esconde. O casal ficou junto por 38 anos. Tiveram dois filhos, César e Tarsila, que geraram mais quatro netos. Porém, na parte final de seu casamento, nossa desgovernadora passou a me assediar, digo, a me perseguir sexualmente. Como homem, fiquei entre a Crusius e a espada, digo, entre a Crusius e o barbicha ou entre a Crusius e o Crusius, não sei. Bem que me disseste, Magda: “Cada um carrega sua Crusius, Marcelo; e a tua sou eu”; mas o que fazer contra alguém tão alta, inteligente e bonita quanto a desgovernadora?
Tentei te obedecer e passei a fugir dela. “Foge o diabo da Crusius e o morcego da luz”, mas ela ia à Brasilia atrás de mim. Passou a me chamar de seu embaixador na capital federal. Não gosto dessas coisas, Magda. E ela vinha com decotes profundos e pelancudos, sempre com aquele colar de onde pendia uma cruz. La Crusius en los pechos y el diablo en los hechos. A Crusius nos peitos e o diabo nos feitos. Então, ela me falava sobre o dia em que o Ministério Público me chamaria para depor. Tentava me acalmar, me tranquilizar. Era a Crusius sobre o peito e o diabo no coração. Ela dizia que não ia acontecer nada comigo, mas sei que a credulidade dos tolos é o patrimônio dos velhacos. A Polícia Federal e o MP deviam saber de tudo e para que o mal triunfasse, bastaria que os homens bons crusiusassem os braços… Em outras palavras, eu seria o boi de piranha.
Magda, antes de tomar esta decisão tinha medo. Não me acusarão, insultarão; não me combaterão, caluniarão! E não me darão o direito de defesa. Eu disse a ela:
— Cada um com sua Crusius, desgovernadora. Já carrego a minha e não desejo carregar a dos outros.
— A tua Crusius, benzinho, sou eu.
— A minha Crusius é Magda.
— Podes carregar duas ou mais. E minha Crusius não é pesada, o barbicha não sabia, mas posso ser leve como uma pantalha.
(Intermezzo)
Opa, cadê a pantalha que estava aqui?
(Fim do intermezzo)
— Prefiro fabricar minha Crusius com dois palitos do que com colunas do Piratini.
— Ai, não. Palitos são tão fininhos.
— Desgovernadora!
— Sabes qual é a diferença entre um japonês e cem mil reais, Marcelinho?
— Não, desgovernadora…
— É que os dois são quase 100 pau… E por cem mil eu nem levanto meu traseiro. Nem para ti…
— Des…
— Hahahaha, adoro piada de japonês!
— Sabemos disso, desgovernadora.
— Seja meu companheiro fiel e exemplar, Marcelo. Esqueçamos o barbicha dos churrascos dominicais.
Magda, sabes como é essa gente. Entre a honra e o dinheiro, o segundo é primeiro. Ela não queria que soubessem de nossas tramóias em hipótese alguma e estava disposta a trocar seu corpo pela manutenção de sua casa e vantagens. Ela passou a me perseguir, passou a me oferecer cargos e mais cargos. E sexo. Me queria junto dela. Um dia, anunciou que largara o barbicha DE VERDADE. Anunciaria para a RBS. A pressão aumentou. Era tudo tão difícil, Magda, que passei a refletir sobre as águas revoltas da paranóia, digo, do Paranoiá, putz, digo, do Paranoá.
Contei a ela de minhas intenções aquáticas, revelei a ela a possibilidade de eu sair da vida para entrar na História, e ela me respondeu que nunca deixaria que algas entrassem em meu pulmão. Confesso que não entendi.
Magda, eu tenho suportando tudo em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo e à minhas convicções… Agora chegou a hora de decidir. Falei com os caras do dinheiro, disse a eles que pediria exoneração de meu cargo de chefe da representação do governo gaúcho em Brasília. Seria menos uma Crusius para mim. Quando falei com aquele cara do PP que já andou na Procergs, no Banrisul e agora esconde-se no subúrbio, ele respondeu que pensaria. Por fim, recebi um torpedo:
— De cada dez políticos que conhecemos, cinco é a metade.
Confesso que novamente não entendi. Yeda, PP, PMDB e PSDB me fazem propostas. Porém, eu sei. Na verdade, queriam que eu — um homem acuado, incapaz de mentir — sumisse. Eu dei a eles a minha vida. Agora lhes ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História.
P.S.- Magda, meu amor, penso que deliro. É muita pressão. São necessários nervos de aço para suportar. Sim, deliro. Imagine que entrei há pouco na internet e a Nova Corja me pareceu de esquerda. Eu só sei é que quando vejo a desgovernadora me dá um desejo de morte ou de dor. A Yeda tem muito poder. Demais para mim. Ué, tem gente na porta a esta hora tardia?