A primeira parte de 2666 é dedicada às peregrinações dos críticos Jean-Claude Pelletier (francês), Manuel Espinoza (espanhol), Liz Norton (inglesa) e Piero Morini (italiano) em busca do famoso escritor desaparecido de nome impossível: Benno von Archimboldi. Há um culto em torno de Archimboldi, eterno candidato ao Nobel e autor reconhecido mundialmente por especialistas, diferentemente da Cesárea Tinajero de Os Detetives Selvagens. Ele seria uma espécie de Thomas Pynchon alemão, um autor sem fotos, sem biografia e muito estudado. Sabe-se que é muito alto, tendo deixado rastros de sua existência aqui e ali.
A paixão por Archimboldi faz com que os críticos fiquem amigos, formem uma espécie de confraria logo atacada por outras e acabem todos amando a inglesa Liz Norton, às vezes em dupla. As histórias de Bolaño vão novamente saindo umas das outras de forma absolutamente hipnotizante. É difícil largar o livro. Em dado momento parte dos críticos resolvem seguir uma pista mais do que tênue e partem para procurá-lo em Santa Teresa, na fronteira do México com os EUA, onde sabemos que ocorrerão os crimes contra mulheres. Um grande livro, um livro genial? Sim, não tenho motivos para duvidar. Porém La parte de los críticos não é um romance completo e creio que os herdeiros de Bolaño têm razão em não editá-lo separadamente. É uma fantástica abertura de romance. Ponto.
Bolaños volta a fazer arte nas belíssimas trocas de foco narrativo. O final de La parte de los críticos é pura música com suas recapitulações resumidas. O efeito poético dos encontros de Espinoza com Rebeca, entremeadas das conversas noturnas com Pelletier e pela narrativa de Liz Norton de sua viagem à Turim é arrasadora. Ronaldo Bressane chamou inteligentemente a prosa de Bolaño de fluxo de onisciência. É a melhor defnição que li até agora para um narrador que se mascara por detrás de inúmeros personagens com uma única e muito perceptível voz. Bolaño não esconde-se, mas filtra.
Agora, farei uma pequena interrupção para ler o último livro de Carol Bensimon e depois retorno ao 2666, mas exatamente à La Parte de Amalfitano, onde já sei que os 4 críticos vão apenas e simplesmente sumir, para voltar daqui a centenas de páginas.