O tradutor americano deu o nome de In Concert Performance para este Em Ritmo de Concerto de Nikolai Dejnióv. Lendo o livro, vê-se que o americano saiu-se muito melhor. O inventivo e amalucado livro deste escritor e físico russo é mesmo aparentado a uma enorme improvisação. Vagamente inspirado no realismo mágico, o romance conta a história de Lucário, um anjo que volta à terra ao apaixonar-se por Ana, o que o impedirá de seguir seu caminho em direção à purificação total. Claro, nada de terrivelmente original, mas o livro é delicioso, anticlerical e anti-stalinista. Ah, por falar em Stálin, ele quase foi assassinado por Lúkin – o Lucário em terra. Quase.
Eu queria gostar deste livro emprestado por uma querida amiga, mas não foi possível. O Duelo de Batman contra a MTV, além de um título apelativo, é uma série de poemas de Sérgio Capparelli baseados na relação entre um pai e um filho. A estrutura é interessante, são cinco seções: na primeira o pai fala ao filho, depois temos o filho sozinho, seguido pelo que diz o filho ao pai e pelo solo do pai, terminando com uma espécie de homenagem aos que os antecederam. Sem dúvida, uma boa idéia, não fosse o fato dos poemas mostrarem-se muitas vezes fora do foco do livro, como se tivessem sido primeiro escritos para depois entrarem à fórceps na estrutura inventada. O leitor tem que ter muito boa vontade para entender que aquela voz é a do pai ou a do filho, pois elas são muito parecidas. Há raros momentos em que são mostradas as diferenças e pontos em comum entre pai e filho assim como as dificuldades ou não de comunicação entre eles. Não há profundidade nem drama sincero. Um pasmo: a mãe, que se bem me lembro morreu durante o parto do filho, não parece ser uma falta muito importante para nenhum dos dois. O filho não é um mamífero.
Os Novos, romance de Luiz Vilela, foi comprado num balaio da Feira do Livro do ano passado. O exemplar que levei já tinha até tomado banho, suas folhas têm aquelas ondas que denunciam muita água. Deve ter custado uns R$ 2,00, mas pela diversão vale muito mais. Pode-se dizer que a história dos amigos candidatos a escritores é datada, pode-se garantir que é obra de um Vilela iniciante, pode-se reclamar que os caras não param de beber cerveja, mas, por favor, os diálogos são maravilhosos, vivos, humanos. E aqui há, de forma muito intensa, o conflito entre gerações que faltou no livrinho aí de cima. Outro pasmo: por que o livro não foi censurado se os caras cagam sobre os milicos? Ora, certamente porque nenhum censor deu importância a um livro editado pela obscuríssima e carioca “Edições Gernasa” em 1971… Agora, é um mistério como ele, depois de tanta água, foi chegar a mim num balaio da Feira do Livro de 2006.
DIÁLOGO
by Ramiro Conceição
Disse o filósofo ao poeta:
“Suas palavras precisam de ritmo
pois são incapazes de andarem sozinhas”.
Disse o poeta ao filósofo:
“Suas idéias sempre induzem às correntes
porque não têm a beleza…das dançarinas.”
Engraçado… me veio a impressão, pelas capas, de serem livros de não mais que 200 páginas. o que tá acontecendo com você??
No carnaval, durante o tempo livre, li o delicioso “A Mulher do Próximo”, Do Gay Talese. O livro trata de uma série de eventos aleatórios acontecidos desde cem anos que serviram para desaguar na revolução sexual dos anos 1960. Parece tudo tão extraordinário e improvável, que se não fosse Talese um conceituado compilador de fatos, acharia ser fruto de sua imaginação. Sociedades de nudismo, a fundação da revista Playboy (e de uma série de outras, como a de título sugestivo SCREW [Trepada]), casais de cristalizado puritanismo que se entregam a desbragados encontros de troca de casais…
O livro, lançado no começo da década de 80, convida_ não, não: força_ a uma leitura compulsiva. Um dos livros realmente viciantes que já li. Contudo,assistindo ao Roda Viva com o Talese, nenhum dos entrevistadores fez a pergunta que a mim pareceu óbvia: Por que talese pintou todas essas libertinagens com cores angelicais, como se os personagens, saindo de séculos de dominação moral pela igreja e política, fossem de uma pureza rosseaniana do bom selvagem. Onde estavam as drogas, a imposição por parte das revistas eróticas de que as modelos trepassem com os diretores para saírem nas fotos; as consequências do início da AIDS e da promiscuização dos costumes, da família, da música etc.
Ah… compreio-o_ o Talese_ por míseros dez reais na Estante Virtual. Aos interessados, ainda há alguns exemplares lá pelo mesmo preço.
Dez pilas? Bá!
Acabo de conferir: há uns de 7 reais, 9 reais, 14…
Capa dura, quinhentas e poucas páginas, e cujo novo da cia. das letras é mais de 70 reais.
Uia! Eu sei. Só quero ver o precinho do 2666…
Não, o russo tem umas 400 páginas. Os outros são curtos.
Ô Charlles!
Se quiseres publicar resenhas ou críticas aqui, o espaço é teu.
Abraço.
Oh, amigo Milton, sobrando tempo te envio alguma coisa, com certeza. Ando tão sem rumo nestas últimas semanas, ocupado em trabalhar e, nas horas vagas, de portas fechadas e a sós debaixo do chuveiro tendo esse diálogo com essa peça de tamanho médio, para um não daltônico, pendurada entre as pernas e que nos determina biologicamente como do sexo masculino:
EU: Que fé você tem! O mundo derretendo a 44 graus; raios ultravioleta procurando vítimas à sombra; catástrofes antinaturais de uma natureza que agoniza; furacões; enchentes; desmoronamentos; se não bastasse que a falida humanidade ainda continua tão prodigiosamente enfezada nos mesmos erros, seguindo para a abismo; o comércio das drogas cada dia mais poderoso e perigoso para uma criança; a política cada vez mais trabalhando para que não nos assombremos com a roubalheira e o lixo, tornando tudo naturalmente aceitável; as tradições que nos davam algum horizonte, como a família, o amor aos livros, a amizade, a cordialidade, todas ruídas ou em processo acelerado de destruição; num mundo que confirma que a coisa sagrada é cada um por si e todos contra todos: VOCÊ ainda aposta que se deva trazer alguém novo a esse mundo??
ELE:….
É que, semana passada, contra todas as predições e cuidados, minha esposa me apresentou o exame de que está grávida.
Depois dos monólogos da vagina, os diálogos com o pênis.
Parabéns!
(Ter filhos é ótimo, esqueça o mundo horrível).
Também tenho um bom histórico de relacionamento com livros banhados. O último foi um do Nicholas Humphrey.
Pois é. Livros molhados costumam aparecer em sebos a toda hora.
Foi só provocação da minha parte. “O Coração das Trevas” é bem fininho e tem uma enorme carga espiritual.
(agora, de forma que não nos ouçam: há tempos que te acompanho; como no livrinho do Exupéry_ grande obra que as misses esculhambaram por aqui_ você se torna eternamente responsável por aquele que cativa; então, enfrentando as suspeitas dessa distância virtual em que nossa amizade se sustenta, afirmo que, sim, fiquei preocupado quando não publicou as muié (no dizer simpático da Caminhante), e principalmente quando justificou assim…assim…como não querendo nada, que anda tão INFELIZ que não se motivou a procurar as assanhadas.
Apesar de VOCÊ ser o blogueiro (alguém que, fundamentalmente, quer compartilhar seu cotidiano com absolutos estranhos íntimos), ainda assim não me sinto intruso o suficiente para perguntar a razão. Espero que não seja nada que leve um ateu ao suicídio. Vai por mim, mais jovem mas com uma porção de cicatrizes: All Things Must Pass, ou, por outro beatle, let it be. Ou então, um tanto mais condizente com as perspectivas gerais, o número musical dos crucificados em A Vida de Brain.
Só espero_ sinceramente_ que sua tristeza não tenha a ver com aqueles sombrios sintomas que os especialistas dizem rondar alguns homens acima dos 50, e neste sábado a suspeita não se confirme com uma série de fotos picantes do Jesus Luz.)
Faço minhas as palavras do Charlles – fiquei preocupada mas não me senti bem perguntando. Seja lá o que for, espero que seja circunstancial, passageiro e superável. =/
Hoje fui à biblioteca e quase procurei pelo Colapso. Aí achei melhor não, porque voltei a ler meu material de sociologia e estou em Weber. Vai que eu começo a achar que a Ética Protestante está por trás de tudo isso? Fiquei só no Livro do Desassossego e Corpo de Baile mesmo.
hahahaha! Não, não… Já li a Ètica na faculdade de história. Se tivéssemos mais Webers nascendo no mundo….