Um dia, eu fiz a seguinte brincadeira aqui no blog:
Numa noite fria do século XVIII, Bach escrevia a Chacona da Partita Nº 2 para violino solo. A música partia de sua imaginação (1) para o violino (2), no qual era testada, e daí para o papel (3). Anos depois, foi copiada (4) e publicada (5). Hoje, o violinista lê a Chacona (6) e de seus olhos passa o que está escrito ao violino (9) utilizando para isso seu controverso cérebro (7) e sua instável, ou não, técnica (8). Do violino, a música passa a um engenheiro de som (10) que a grava em um equipamento (11), para só então chegar ao ouvinte (12), que se desmilingúi àquilo.
Na variação entre todas essas passagens e comunicações, está a infindável diversidade das interpretações. Mas ainda faltam elos, como a qualidade do violino – e se seu som for divino ou de lata, e se ele for um instrumento original ou moderno? E o calibre do violinista? E seu senso de estilo e vivências? E o ouvinte? E… as verdadeiras intenções de Bach? Desejava ele que o pequeno violino tomasse as proporções gigantescas e polifônicas do órgão? Mesmo?
E depois tem gente que acha enfadonha a música erudita…
Há que acrescentar a transcrição (esplêndida, esplêndida) de Busoni para o piano até chegarmos às mãos da belíssima e talentosa Hélène Grimaud. Talvez seja a obra mais perfeita que conheço, ao lado das Goldberg e da Arte da Fuga.
E aqui, o original para violino. Maxim Vengerov — meu violinista preferido dentre os da nova geração — interpreta a obra enquanto caminha pelos corredores e exteriores de Auschwitz. O filme faz parte do filme Holocaust: A musical memorial film from Auschwitz. É absolutamente arrepiante, principalmente porque Vengerov não quis limpar a gravação de seus pequenos pecados. Como o conheço de várias entrevistas, sei que ele gosta de registros ao vivo e não costuma corrigi-los. Deveria repetir a sessão em Gaza.
Não consigo pensar em música mais bonita ou profunda.
E Grimaud rules!
Ainda é inexplicável, para mim, a profundidade indiscutível da música de Bach.
Apaixonante!
Com efeito, minha cara!
Liguei o notebook no amplificador e soltei o som nos altofalantes, com graves bem balanceados e agudos equalizados, mode theater. Estou agora mergulhado num espaço transicional onde me vejo participando de energias emotivas que me levam a agradecer-lhe, caro Milton, por esta dádiva. Bom domingo.
Também tenho um bom som em meu micro. A descoberta deste vídeo gravado na Sala de Música de Câmara da Filarmônica de Berlim é que foi uma dádiva.
AVENTURADO
by Ramiro Conceição
Bem-vindo
aventurado
que pensa
e sente
diferente
de mim,
que canta
no telhado
qual um
bem-te-vi
que pula
– qual saci –
ao sublime
que vi.
PS: Milton,
estarei em Porto Alegre, na próxima quarta.
Entrarei em contato. Abraços…
Lindo, Ramiro. Mas aqui sentimos e pensamos igualmente, não?
Te aguardo!
Bach, grande, imenso Bach! Ótimo texto! Obrigado pelo comentário em meu poema, e mais uma vez agradeço sua contribuição ao meu texto referente à Mônica Leal. Abraços.
Fundamental Bach! Aquele poema (e outros) são muito bons, Reiffer.