“Prezados colegas,
Optei por me afastar das discussões sobre os acontecimentos na OSB, por motivos que todos conhecem. Mas lendo algumas mensagens e depois de uma conversa no último sábado com a Léa, preferi me manifestar sobre algumas imprecisões nas informações que os colegas têm sobre nossa reestruturação. Eu sou oboísta da Osesp há trinta anos, fui o presidente da Aposesp à época da reestruturação e fiz minha dissertação de Mestrado sobre a Osesp,colocando o foco nesse período, tenho informações mais precisas. Uma colega menciona no Fórum da Aposesp quatro pontos pouco claros, que são:
1) O nosso maestro foi um dos escolhidos de uma lista tríplice feita pela orquestra.
2) Ele teve o respaldo da comissão da orquestra e de vários músicos para a reestruturação.
3) Nós tivemos 6 meses para nos prepararmos para o teste e a banca era de alto nível sendo que o maestro não fazia parte dessa avaliação.
4) Quem não quis fazer o teste ou não passou, não foi demitido e sim, continuou na Fundação Padre Anchieta tocando na Sinfonia Cultura.
É preciso lembrar aos colegas que o sistema de escolha por lista tríplice foi uma sugestão minha, copiando o modelo existente nas universidades estaduais paulistas e no Ministério Público. É necessário dizer, também, que o nome do Neschling já era sondado antes mesmo do falecimento do Eleazar de Carvalho, sendo que o Secretário de Cultura de então, Marcos Mendonça, já havia se encontrado com ele no Rio. Fizemos depois intenso “lobby” a favor do nome do Neschling, especialmente porque ele estava em alta aqui depois da gravação do “Il Guarany” com o Plácido Domingo.
Após a nomeação do Neschling, houve reuniões para tomarmos conhecimento da proposta do maestro e ver o que seria possível para que o processo fosse mais brando. O que pudemos influenciar, na verdade, foi a proposta de nomes para comporem a banca, pois a reavaliação se tornou inegociável. Tentamos fazer com que não houvesse audições, mas Neschling, mesmo podendo fazer um raio X e saber que músicos estavam ou não aptos para integrarem a nova estrutura de trabalho, ele quis que todos tivessem a mesma chance em audição, pois senão ele poderia ser acusado de ter feito uma escolha pessoal. Os músicos souberam que haveria audições pelo menos seis meses antes, mas teriam que trabalhar até lá. A sorte é que foram cancelados concertos, sendo o último em 23 de abril, e a partir daí tivemos mais tempo para a nossa preparação. O cancelamento dos concertos se deu porque muitos músicos estavam fazendo reuniões e movimentos para cancelar as audições e boicotar a reestruturação. Houve até maestros que se posicionaram contra, acusando o processo de desumano. Houve colegas da Osesp que tentaram destituir a mim e ao Marcelo Lopes da diretoria da Aposesp, com assembléias com muita emoção, desmaios simulados etc.
Fala-se da composição das bancas nas provas da Osesp e da OSB. As provas da OSB contaram com nomes tão importantes como os que compuseram as bancas da Osesp, mas infelizmente alguns dos convidados cancelaram a vinda, depois dos protestos. Na época da nossa reestruturação isso também aconteceu, sendo que pelo menos um clarinetista italiano, o Carbonari, deixou de vir. Abaixo farei alista dos convidados e os presentes às audições da OSB.
Há também uma informação equivocada sobre a participação do Neschling nas bancas. Ele não participou fisicamente, pois já havia fechado contratos para reger no exterior, mas trouxe pessoas de sua confiança, como o maestro Roman Brogli ,a Brigitte Bolliger, sua esposa à época e o Emilian Dascal, amigo violista de Saint Gallen. O Roberto era somente um dos membros da banca, não participando somente de minha audição. A banca entrava em contato ao fim de cada etapa das audições e fazia um relato completo ao Neschling sobre cada músico, e então ele decidia quem estava ou não aprovado.
A nossa sorte é que tivemos um grupo na Aposesp que apoiava uma mudança de rumo artístico na orquestra, algo raro na maioria das orquestras. Infelizmente a OSB é uma instituição privada, não tendo um lugar para onde transferir os que não fizessem audição, como fizeram a Osesp e a Filarmônica de MG.
Deve-se levar em consideração que um músico que tem ao menos 45 dias sem qualquer atividade na OSB, pudesse tocar o repertório exigido, nada mais do que um concerto tradicional e excertos, especialmente de obras executadas no ano anterior. Que músico não teria condições de se preparar nesse período? Talvez o colega que negligenciou sua profissão por longo tempo. Outros talvez não tenham concordado porque passariam a ter ensaios à tarde; outros porque teriam que sair de outras orquestras, pois o novo regimento exigiria exclusividade, com exceção das atividades pedagógicas. Outros simplesmente não concordam como pelo modo como foi comunicado o processo, ou como ele próprio desenvolvido. Outros porque já são aposentados e estão em idade avançada e sem ânimo para audicionar mais uma vez na vida.
Uma vantagem do processo da OSB em relação ao da Osesp foi a relação contratual. Lá os músicos já seriam contratados com CLT. Eu tive que desistir de um contrato com a Fundação Padre Anchieta, de 16 anos, CLT, com FGTS e 13°, adicional por tempo de serviço, entre outras vantagens, para embarcar num contrato frágil, sem todas vantagens acima mencionadas, que durou quase nove anos.
Pensem, também, nas mudanças positivas ocorridas nos últimos anos na OSB, promovidas pelos conselheiros, diretores administrativo e artístico. Antes eles ficavam de tempo em tempo com salários atrasados, girando em torno de R$ 2.000. Hoje os salários estão em dia e vão de R$ 9.000 a R$ 11.000. Agora atrasos não mais acontecem e eles têm uma programação muito boa. O Roberto tem perfil empreendedor. Outros bons maestros, como o Karabtchevsky, que já teve força política, oportunidade e verba, no Municipal de São Paulo (orquestra com grande potencial, mas também com enormes deficiências) e em Porto Alegre, não conseguiu transformar esses grupos em sequer boas orquestras, não construiu teatro novo e a programação era muito limitada, de pouca dificuldade técnica, boa, mas fraca em comparação à da Osesp. Há jovens maestros que também são bons instrumentistas, que assumiram orquestras recentemente e não tinham projetos de requalificação artística, somente criando série pops e diziam que iriam manter todos os músicos, independentemente do nível deles, contando somente com a boa vontade e paciência para transformar água em vinho. Enfim, bom-mocismo e jeito “naive”. Nessas horas concluindo esse ponto, os maiores empreendedores maestros no Brasil são o Neschling, o Mechetti e o Roberto. Eles são perfeitos? Não. Mas têm esse perfil positivo.
Uma coisa que não pode ser ignorada é a vontade de uma parte considerável da OSB de fazer as audições, sendo que muitos têm sido assediados moralmente e ameaçados de forma violenta por outros colegas contrários ao processo. Também é estranho apoiar certas manifestações por jovens mal influenciados.
Muitos problemas de comunicação aconteceram dos dois lados, houve gente oportunista e outros realmente idealistas. É difícil não apoiar as mudanças artísticas propostas pela direção da OSB, mas também o colega músico se sente no dever de se manifestar apoiando seus colegas que considera injustiçados. O que deve ser evitado, sim, é agir de forma exagerada emocional e apoiar atitudes pouco “profissionais”, mesmo quando se trata de uma orquestra jovem.
Arcadio
Jurados que vieram;
Michael Faust – flautista da Orquestra de Colônia
Ioan Cristian Braica – contrabaixista da Orquestra de Frankfurt
John Roderick MacDonald – trompetista da Gewandhaus de Leipzig
Mark Timmermann, percussionista do Metropolitan
Fred Pot – cellista da Concertgebow de Amsterdã
Yacov Haendel, engenheiro de gravação, Alemanha
Bart Vanderbogaard, spalla da Orquestra de Roterdan
Jurados que não vieram:
Blair Bollinger – trombonista da Orquestra da Filadélfia
Isaac Duarte – oboísta da Tonhalle de Zurique
Rebecca Young, violista da Filarmônica de NY
Charles Neidich, clarinetista, prof. da Juilliard School
Os da Osesp em 1997:
Issac Duarte
Afonso Venturieri
John Roderick MacDonald
Antonio Meneses
Regis Pasquier
Briget Bolliger
Herbert Meyer
Yves Brustaux
Roman Brogli
David Kreibel”
Milton, muito bacana você ter trazido uma carta aberta defendendo o outro lado.
Particularmente, apesar do evidente “bias” (afinal, Arcádio é irmão de Roberto Minczuk), a carta é muito interessante e bem fundamentada. O outro “bias” é que Arcádio, em geral, defende o Neschling, e, na briga, os regentes parecem tender a se posicionar a favor de Minczuk.
Mas confesso que ainda estou com a impressão de que, dos dois lados, essa história toda está muito mal contada. Assim, quanto mais visões opostas tivermos, melhor.
A hipótese que consegui formar é esta: a idéia inicial de uma reavaliação era, sim, bem intencionada, mas foi tão mal feita e mal comunicada que pareceu que era uma forma disfarçada de caçar bruxas. Isso enfureceu os músicos num nível que Minczuk não esperava, o que também o enfureceu – daí em frente, ficou essa zica toda.