Um caso entre mulheres

Ontem, estávamos falando sobre as disputas femininas e eu dizia que estas aconteciam de várias maneiras e que podiam até mesmo não ocorrer. Lembrei-me então de uma curiosidade sobre a qual não penso muito, mas que é digna de ser contada neste blog secreto. Quando me separei, fui morar um tempo na casa de minha mãe. Na primeira noite, ainda não estava deprimido — pensava estar com espírito objetivo e cheio de planos — e fui para o telefone a fim de resolver algumas coisas paralelas que não poderia resolver abertamente na casa em que antes residia. Era uma quarta-feira à noite e vários amigos, sabedores do que era aquela “a primeira noite”, tinham me convidado para sair, mas escolhi ficar em casa. A primeira coisa seria ligar para HC e encaminhar o final de nosso casinho; a segunda, falar com VK para nos encaminhar. As conversas foram bastante amenas, facilitadas pela longa amizade no caso da primeira e pelo bom humor no caso da segunda. VK nunca deu certo, mas ríamos bastante juntos. Lembro que a conversa com ela passou incontrolavelmente para nossos filhos, meus e dela. Era um difícil acerto entre duas mães.

Quando desliguei o telefone, finalizadas minhas pobres conversações galantes, o telefone tocou. Ora, pensei que era D. me perguntando se eu estava querendo me suicidar ou apenas dormir. Mas não, era uma amiga de minha ex que me telefonava. Ela conseguira o número da casa de minha mãe através de um colega meu de trabalho. Muito esforço, nossa. Nunca tinha falado com ela pelo telefone e, a meu ver, ela era casada. Obviamente, desliguei todas as intenções que manifestara nos outros telefonemas e passei ao modo de conversação simpática e asséptica. Afinal, conhecia de vista o marido da moça e tenho aquela coisa de lealdade correndo em meu sangue. Ou penso ter. Conversamos sobre o frio, sobre livros e a coisa estava agradável até que ela começou a tornar a conversa lenta, deixando-me meio sem respostas, sinal inequívoco de que desejava finalizar o papo ou mudar de assunto. Entrei no jogo dando um longo suspiro que seria utilizado pela vontade dela — ou como uma pausa que permitiria o tchau, ou como uma chance para entabular um novo assunto. Novo assunto.

Ela falou que eram foda os primeiros dias de qualquer separação. Mas não parecia penalizada. Depois finalmente entrou no assunto que parecia ser seu objetivo: começou a falar mal de minha ex como colega de trabalho. (Desculpem, nunca lembro do nome de minha ex; acho que seu nome é Pâmela ou Suélen, sei lá). Após várias referências à politicagem interna do Departamento delas na Universidade e do Hospital onde trabalhavam — não dei grande atenção àquilo que depois foi caracterizado por outra amiga como um “cesto de ofídeos” — , a nova amiga me disse que minha ex era “de plástico”, ou seja, que era fria e calculista. Como a interlocutora parecia ser tudo que Suélen não era, depreendi que o significado daquilo era “e eu sou de carne, quente e apaixonada”. Nunca fui um Paul Newman e a maioria das mulheres se aproximam de mim por me acharem legal, não para ir para a cama. Não é falsa modéstia, é a realidade. Na hora pensei que deveria convidá-la para sair naquele momento, talvez naquele dia, mas os feios que se acham inteligentes são também profiláticos. Desligamos com a coisa temporariamente suspensa.

No dia seguinte, uma ligação matinal para o meu trabalho. Vamos almoçar? Fomos.

Hoje, quando penso naqueles poucos dias, concluo que foi uma atitude de vingança. Não era para ter acontecido, mas era divertido ficar abraçado na cama falando mal de Pâmela, ainda mais que eu ainda ia nas sessões com a “terapeuta familiar” na companhia de Su. Eu parecia estar acentuando (ou resolvendo) um problema de relacionamento entre mulheres, mas era bom. Volta e meia, recebo ligações com atualizações das news do Departamento, mas estas estão cada vez mais raras.

Ah, e acho que tem tanta mulher naquele local da UFRGS que a amiga vai achar este post engraçado, se o ler. Ou será que terei que deletá-lo?

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  1. Um melodrama tratado a frio. Gostaria de saber como você escreveria isso no calor do momento. Sabendo exatamente nome e sobrenome de sua ex-esposa (como, aliás, acredito que saiba muito bem hoje, mas prefere fazer o charme da boa vingança).

  2. “Quando me separei, fui morar um tempo na casa de minha mãe. Na primeira noite (…)”.

    “A primeira coisa seria ligar para HC e encaminhar o final de nosso casinho; a segunda, falar com VK para nos encaminhar”.

    Você estava traindo a sua esposa? Céus!

  3. Teus posts sexuais sempre me trazem uma frustração: quando você trata de prostitutas, amantes, encontros ou namoros, os comentários aqui sempre são curtinhos – legal, gostei, uau. Onde estão os depoimentos pessoais, o “já aconteceu comigo”? Todos calam.

  4. Leonardo, não chega a ser tão horrível assim se for considerado o longo processo de separação. Os detalhes não serão, digamos, detalhados por mim.

  5. Claudia, ontem mesmo eu comentava com 2 amigos: como os homens se acham espertos qdo, ao se separarem, resolvem “dar um tapa de luva”, deixando a ex em ótimas condições financeiras, com as contas pagas, etc. Tapa de luva nada!!!! As q são sacanas e espertas adoram esta atitude, e o citado normalmente sai depenado e “se achando”!

    citado = coitado (não aquele que pratica o coito, entenda-se)

  6. Milton,

    creio que você gosta de, ou está procurando, sarna pra se coçar. Aliás, esse post já é o primeiro sintoma da manifestação alérgica. Meu conselho é que você compre, o mais rápido possível!, um pote de permetrina. É melhor sempre prevenir do que remediar.

    Outra coisa, percebo que essa sua sarna é a forma mais grave de coçação, ou seja, aquela causada por parasitas acadêmicos que, como sabemos, é a pior espécie de artrópodes, pois tal classe de aracnídeo possue ética de micrômentros, mas desfaçatez de quilômetros.

    Portanto, cuidado meu amigo.

  7. Milton, seu Don Juan
    Da próxima vez que eu dormir na tua casa, levarei uma maçaneta nova e trancarei a porta da Edícula. Sim, porque agora estou entendendo aquela maçaneta eternamente estragada, que obriga a gente a dormir com a porta vulnerável. O próximo passo é comentar, casualmente, que é sonâmbulo… Pra cima de mim não!!!

  8. Milton, minha companheira (caras de esquerda não tem esposas) define mulher assim: “é um homem louco”. Eu, de minha parte, até hoje estou em dúvida: mulher é meio de consumo ou de produção?

  9. Meu último comentário.

    Milton, você sabe a maneira mais eficaz de caçar uma baleia? Pois é: manter a cria entre o barco e o magnífico que se quer abater. Então se sangra, seriamente, o filhote. A baleia, em sua colossal maternidade sagrada (ou paternidade), por não querer ferir o filhote, não ataca o barco. Assim, em seguida, se fere o extraordinário, com a nossa ganância, sangrando-o até morrer…

    Ou seja: COM AMOR SE MATA!

  10. Pelos comentários, a ANDREA E A CLÁUDIA são duas mulheres espetaculares. Cabeça de homem em corpo de mulher! Tem coisa melhor? Explico: em minha opinião, para se dar bem, o casal precisa da seguinte característicä: a parte feminina da mulher tem que se acertar com a parte masculina do homem e a parte feminina do homem tem que se acertar com a parte masculina da mulher. Eu, por exemplo, que faço a mediação perfeita entre as duas metades, me daria muito bem com qualquer uma das duas. Diga aí, Milton…

  11. Milton, fiquei com a sensação de que és um minotauro devorador de mulheres. Texto a Nelson Rodrigues; comportamento a Vinícius de Morais…

    Deve haver algo em ti que atrai o sexo oposto… Mas isso já é papo de mulher… Sai pra lá!

  12. Ary, se quiseres fazer um teste, fique limitado à Andréa, OK?

    Farinatti e Charlles, tenho um comportamento de agricultor, durmo e acordo cedo, leio no ônibus, ouço música e até olho pouco para os lados. Mas minha filha diz que as mulheres vêm atrás… Eu, sinceramente, acho que é mentira, mas como divulgo fico com a fama.

  13. De fato, tem isso: a indiferença atrai algumas mulheres. Viúvo, “amaciando” após a perda, comigo aconteceu caso recente. A companheira de um ano e meio, vez ou outra me repetia da sua paixão por mim, exatamente porque eu não levava nossa relação a sério, coisa que jamais havia lhe acontecido. Acostumara-se às paparicagens masculinas, inclusive do apaixonado ex-marido. Foi eterno, lindo e aprazível enquanto durou!

  14. Leila.

    Sinceramente, não entendi. Nos Cem Dias Entre Céu E Mar amyrklinkianos, encontra-se, não com as mesmas palavras, mas com a mesma semântica, o modus operandi associado à caça da baleia em pequenos barcos.

    Portanto, quer você goste ou não tudo é, infelizmente, assim. Desta maneira, a espécie humana é a única capaz de utilizar o amor (DO OUTRO!!!!!!!!!!!) como arma (estou admitindo, aqui, que o instinto de preservação à cria, demonstrado pela baleia adulta ao ver seu filhote sangrar, seja uma manifestação de amor).

    Logo, somos capazes de MATAR COM AMOR!!!!!!!!!!!!

    É óbvio que fiz uma metáfora de alerta ao Milton, pois o dito-cujo tem dois “filhotes” e a internet é um mar bravio repleto de caçadores assassinos.

    Entendeu, Leila, ou preciso escrever mais devagar?

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