Comecei a reler Ai de ti, Copacabana só para entrar no espírito do autor e escrever um artigo sobre seus 100 anos de nascimento no último sábado. Ia ler cinco ou seis crônicas, mas não consegui parar e fui até o fim. É um de meus livros preferidos de Braga. Delicadíssimo, inspiradíssimo, Ai de ti, Copacabana foi lançado em 1962 e traz 60 crônicas, escritas entre abril de 1955 e fevereiro de 1960. Na época, Braga já tinha expandido seus domínios, criando uma forma de crônica que por um lado roçava a poesia e por outro namorava o conto. Na matéria para o Sul21, cujo link coloquei acima, copio duas crônicas absolutamente notáveis de Ai de ti. Assim como Machado é o grande modelo e referência na ficção brasileira, Rubem Braga ocupa a principal posição na crônica. É uma voz compassiva, lírica, inteligente, sensível e tarada — sim, nosso RB era um mulherengo de escol. E olha que não é pouca coisa, pois seus “concorrentes” são bem mais fortes que os de Machado: Nelson Rodrigues, Stanislaw Ponte Preta, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, Millôr Fernandes, Luís Fernando Verissimo… Sim, eu simplesmente adoro Rubem Braga.
“Velhos, velharias, velhacos”
O velho Braga foi como um Netuno de Copacabana
mito que frutificou entre nossos males de origem.
Sempre preferi o velho Graça, capiau e casmurrento
exemplar da ambiguidade que vai da página à mão, e morre ali
Noutro dia percebi que no meu crânio foi construído
um museu de velharias; essas velharias eram meu eu feito memória
Nunes, ouvi dizer que disseram, não passa de um velhaco, ao que
protesto: ao menos, em meu curto itinerário, amei alguém
Amor, ora amigos, é só uma palavra cultivada nos jardins
da Babilônia; quando as bíblias ainda nem existiam, já havia o amor
Hoje, ao que parece, há muitos velhacos, de toda espécie
e orientação; alguns já contam com bustos e estátuas nas praças
Um velho amigo então me conta uma efeméride: ah, o velho Braga!
Teço entre meus dedos umas palavras ambíguas; que me perdoe!