Publicado em 8 de fevereiro de 2014 no Sul21.
O Facebook, um vício irremediável, lançado em 4 de fevereiro de 2004, tem o mesmo número de usuários que a internet toda tinha em 2007. Em âmbito mundial, o Facebook já ultrapassou o número de 1 bilhão de usuários.
Traçando um paralelo simplório — pois desconsidera os perfis de empresas e de outras organizações — , diríamos que 14% da humanidade tem conta no Facebook. Proporcionalmente, o Brasil foi o país que mais deu usuários a Mark Zuckerberg nos últimos anos. O país saltou de 35 milhões de usuários em 2011 para 76 milhões. Mais da metade acessa pelo celular. Todos os dias, 61,4% dos usuários que residem na América Latina conectam-se à rede social. Isso representa uma audiência de 47 milhões de brasileiros, 28 milhões de mexicanos e 14 milhões de argentinos, porcentagem é significativamente mais alta que a média dos outros países.
Atualmente, o Brasil está na terceira colocação em número de usuários, perdendo apenas para os Estados Unidos e a Índia (41,3). Se o Facebook fosse um país, seria o segundo mais populoso do mundo, empatado com a Índia e apenas atrás da China, tendo ultrapassado de longe os Estados Unidos da América com seus 310 milhões de habitantes. Recentemente, o valor da empresa foi avaliado em mais de 100 bilhões de dólares, ficando atrás apenas do Google e da Amazon dentre as empresas da Internet. Mark Zuckerberg, principal proprietário da rede social, tem uma fortuna avaliada em 16,8 bilhões de dólares.
Nesta semana, a empresa lançou um novo e bonitinho produto. Como aos dez anos de idade já dá para ser nostálgico, o Recorde Momentos cria um filme com trilha dramática cheio de fotos animadas do indivíduo desde que este entrou na rede social, também mostra as postagens mais curtidas, os melhores amigos, etc. Foi a forma encontrada pela empresa para que os usuários participassem da festa dos dez anos. Ainda que pareça meio emocionado demais.
Recorde momentos:
As razões do sucesso
Se o Google serve como plataforma de pesquisa, se o Twitter é rápido em suas frases e links e se o YouTube aos vídeos, principalmente os de entretenimento, o Facebook dá um importante retorno emocional a seus seguidores.
Estes veem seus pequenos textos e opiniões aprovadas, veem fotos de amigos sumidos, batem papo um com o outro ou em grupo, formam grupos por interesse, pesquisam sobre os amigos dos amigos (“quem será essa pessoa?”) acompanham se aquela(e) amiga(o) está tendo um “relacionamento sério” com outrem (analisamos quem é e examinamos as fotos, se tivermos permissão), reagem quando um destes status se altera (às vezes com alegria, outras vezes com inveja ou ódio), ficam preocupados com a falta de uma resposta (“será que ele(a) não se conecta ou não deseja responder?”), compartilham imagens e textos entre os amigos (“gostei tanto daquilo que meu amigo escreveu que repassei a todos os meus seguidores”) e bloqueiam seus desafetos (“para que ela(e) não saiba nada de minha vida!”).
Surgem com grande frequência notícias que relacionam o site com fatos que parecem saídos de revistas de fofocas do gênero a-mulher-que-descobriu-que-o-marido-já-era-casado ou pai-descobre-filhos-desaparecidos-há-anos, mas o site — concebido justamente para utilização pessoal — também passou a ser utilizado com finalidades políticas e pelos jornais que buscam interatividade com seus leitores e divulgam suas notícias.
Mas antes um pouco de história. O Facebook foi um sucesso instantâneo. Mark Zuckerberg, juntamente com Dustin Moskovitz, Eduardo Saverin e Chris Hughes, fundou o “The Facebook” enquanto frequentava a Universidade de Harvard. Era 4 de fevereiro de 2004 e, até o final do mês, mais da metade dos estudantes da Universidade foi registrada no serviço. Então Zuckerberg partiu para a promoção do site e o Facebook ficou disponível também para a Universidade de Stanford, Columbia e Yale. Esta expansão continuou em abril de 2004 com as universidades de Cornell, Brown, Dartmouth, Pensilvânia e Princeton. Logo foi aberto para fora do ambiente universitário e… Bem, o número de usuários chegou ao primeiro milhão em dezembro de 2004, apenas 10 meses após a fundação.
O serviço é gratuito e a receita é gerada por publicidade, incluindo banners, destaques patrocinados na coluna de notícias e grupos patrocinados. Os usuários criam perfis que contêm fotos e listas de interesses pessoais, trocando mensagens privadas e públicas entre si. As pessoas e empresas que estiverem interessadas em serem vistas na timeline de usuários escolhidos por profissão, interesses, região etc., podem pagar uma módica quantia que Mr. Zuckerberg divulga a eles. A visualização dos perfis detalhados dos membros é restrita a amigos confirmados e para membros de uma mesma rede, conforme as opções de privacidade. Há também opções de jogos. Trata-se de uma receita aparentemente perfeita e que faz com que cada usuário tenha uma média de 200 amigos e permaneça cerca de 750 minutos por mês no site.
A política e a censura
Sendo tão presente no cotidiano, o Facebook espalha a sua influência. Juntamente com o Twitter, o Facebook foi fundamental para espraiar rapidamente o clima de revolução nos países do mundo árabe. Em 2011, a Primavera Árabe iniciou na Tunísia, levando à queda do presidente Ben Ali, e espalhou-se pelos países a sua volta, numa onda de contestação aos governos.
Em outro país, o Egito, vimos o ex-presidente Hosni Mubarak fechar, pela primeira vez na História, o acesso de um país inteiro à internet, numa tentativa inútil de conter a mobilização do povo. Todas estas revoluções tiveram um ponto que, se não foi único, foi comum: o Facebook. Mas não precisamos ir tão longe. As manifestações de junho de 2013 no Brasil também foram marcadas e canceladas e planejadas via Facebook, assim como os recentes rolezinhos dos moradores da periferia aos shoppings da classe média. De certa forma, o Facebook é um lugar seguro para este tipo de concentração.
Entretanto, os usuários políticos fazem pesadas críticas à censura que o site apresenta. Ao lado das esperadas deleções dos perfis que estimulam a pedofilia, a pornografia e as drogas, houve atitudes inexplicáveis como aquelas que retiraram fotos de lactantes dando de mamar a seus filhos e aquela que deletou fotos da famosa capa do disco Nevermind, do Nirvana, em razão de que “O Facebook não permite fotos que agridam indivíduos ou grupos, ou que contenham nudez, uso de drogas, violência, ou outras violações das normas de uso”.
A interpretação das violações das normas ou de incitação à violência é bastante livre. Por exemplo, o movimento 15-M da Espanha passou a ser censurado, suas mensagens foram deletadas e os ativistas tiveram que usar redes sociais paralelas. Depois, tudo foi recolocado no ar com um pedido de desculpas.
Há denúncias por todo lado: membros do PT denunciaram que o Facebook estava censurando suas críticas a Aécio Neves, mas o contrário já teria ocorrido. O Observatório de Imprensa acusou o Facebook de reintroduzir no país a velha senhora: a censura. O sociólogo argentino Atilio Boron, diretor do Programa Latino-americano de Educação à Distância em Ciências Sociais de Buenos Aires, teve seu popular perfil deletado após críticas feitas à Secretária de Estado Hillary Clinton. (Aqui, o artigo traduzido).
Os moderadores do Facebook parecem bastante eletivos. Um post que oferecia recompensa a quem sequestrasse determinado soldado israelense foi compreensível e rapidamente deletado, mas um análogo que desejava o sequestro de um árabe foi excluído apenas após denúncia. No constante tiroteio há sinais de que a ferramenta aprecia o sionismo…
O brasileiro do Facebook
O brasileiro Eduardo Saverin é um dos fundadores do Facebook. Hoje bilionário, vivendo recluso em Singapura, ele é um dos maiores desafetos de Mark Zuckerberg. O escritor Ben Mezrich, autor do livro que deu origem ao filme A Rede Social, nutre alguma desconsideração por Saverin — diz que ele é um bilionário por acaso.
Saverin nasceu em uma família rica de São Paulo. No início da década de 90, ainda criança, mudou-se com a família para os Estados Unidos. O motivo era o medo de sequestros na capital paulista. Em 2003, iniciou o curso de economia na Universidade de Harvard. Lá, conheceu Zuckerberg, aluno de ciência da computação, considerado um gênio. Ficaram amigos e Mark o levou ao projeto do Facebook.
Ao que tudo indica e contrariando Mezrich, Saverin foi fundamental. Não teve participação importante no desenvolvimento da ferramenta, mas financiou a muito bem sucedida divulgação inicial do Facebook. Ou seja, ele bancou os investimentos que levaram o Facebook a ganhar adeptos rapidamente nos primeiros meses. Segundo documentos do próprio Facebook, “Saverin administrou o desenvolvimento de negócios e aspectos comerciais da rede social em seus primeiros anos”.
Logo Zuckerberg quis diminuir a participação do brasileiro nos ganhos. A redução era espetacular: de 24% para 0,3%. Saverin reagiu abrindo um processo contra a empresa. Venceu e passou a deter 5% do Facebook, percentual que tem vendido pouco a pouco. É o 680º homem mais rico do mundo, com uma fortuna estimada em 2,75 bilhões de dólares, segundo a Forbes.