O dia 13 de janeiro de 2017 foi de viajar de trem de Berlim para Praga. Linda viagem. A ferrovia margeia o Rio Elba por boa parte do caminho, passando inclusive por Dresden. Poderíamos ter feito uma parada na cidade, não? Bem, mas não paramos. A paisagem é lindíssima, tanto que preferi observar a tirar fotos. De resto, elas não estavam saindo muito boas. Foi uma viagem muito confortável. Almoçamos no trem e seu bom restaurante, apesar do ter-nos como reféns, apresentou preços razoáveis, sem tentar obter abusivas vantagens financeiras.
Em Praga, eu finalmente conheceria minha sogra, só que, como ela só fala russo, previa algo próximo do cômico. Eu sei poucas palavras da língua-mãe de minha Elena. Ambas tinham marcado um encontro no meio de nossa viagem, em Praga. O encontro teria o acompanhamento de dois diplomatas. Eu acompanharia Elena e sua prima Maya, a sogrinha. Ficamos todos hospedados no hotel Charles, bem próximo da Ponte Carlos, de onde certamente tirou o nome. O hotel é antigo e confortável, como Praga. Nosso quarto era um latifúndio decorado de uma forma um tanto original e éramos vizinhos da mãe e da prima da Elena.
Largamos as malas do jeito que vocês viram e descemos para o bar do hotel, que fica no subsolo, a fim de eu ter meu primeiro contato com Klara. Abraçamo-nos e tal, tudo estava muito tranquilo e gentil até eu tirar a máquina fotográfica.
D. Klara é uma pessoa expansiva e alegre, algo excêntrica. É uma personalidade muito peculiar e original. A tradução do que ela me dizia sempre me desconcertava um pouco. Estava vestida como uma hippie sob a neve, falava com os braços como uma italiana e soltava uma voz forte, com um tom de décadas de cigarros. Logo nos entendemos, auxiliados pelo espetacular chope preto de Praga. Uma barbada.
Depois de algum álcool, risadas e pouca participação minha na conversa, fiz questão de ir ao restaurante U Mecenáše, que já conhecia de quatro anos atrás, por ter ido com minha filha Bárbara. A comida era maravilhosa.
Era. A coisa for reformada e gourmetizada. O cardápio mudou completamente. Disseram-me no hotel que o restaurante era fantástico na época do comunismo e que permaneceu excelente até poucos anos, mas que agora tudo tinha mudado para pior. Pudemos comprovar: ficou um horror. A porta por onde entrávamos, uma curiosa porta lateral após passar por um corredor escuro, estava fechada. A entrada agora estava aberta para a rua. Abaixo a antiga porta, agora encerada para os turistas.
Ficou feio, sem o ar de restaurante onde os habitantes da cidade comem, sem cor local. Aliás, as pessoas da cidade tinham sumido.
As mesas ganharam ar moderno e também a cozinha ficou sem graça, adaptando-se aos lugares de reles turismo. Enfim, uma traição completa.
Só ficamos ali porque a fome era grande e em razão do rapaz abaixo ter nos conquistado com sua simpatia. Mas era só simpatia.
A comida era bem ruinzinha. Na mesa, a coisa era muito mais divertida. Apesar de eu entender pouca coisa das conversas, todos eram sorrisos. Maya Dubnikova, a prima, muitas vezes interrompia Klara, parecendo servir de censura e freio para a intrépida mãe, que lhe fazia gestos de fingida irritação.
Apesar da foto abaixo, a reunião foi alegre.
Klara não parava de contar as novidades enquanto
eu boiava em minha vida interior, na verdade, boiava em uma nuvem de incompreensão.
Voltamos ao quarto do Charles bem tarde. Abaixo, estou deitado na cama confortabilíssima do hotel e foco meus pés e a parede à frente.
Ergo a câmera para mostrar a parede em frente e o começo do teto.
Subo mais um pouco e agora tudo é teto.
Desço pelo outro lado e vejo o fim do teto e os quadros de cabeça para baixo.
E durmo, após o grande dia em que finalmente conheci minha sogra sem entender quase nada, harachó?